segunda-feira, 16 de dezembro de 2019

Pensamento do Dia


Brasil tenta bloquear acordo, mas discussões terminam em compromisso por metas mais rigorosas

As mais longas negociações climáticas da história das Nações Unidas finalmente chegaram ao fim em Madri e deixam como primeiro resultado um acordo de compromissos - ao mesmo tempo em que postergam decisões importantes para o encontro do ano que vem.

Quase 200 países participaram da Cop-25 (conferência do clima da ONU). Exaustas após madrugadas seguidas de negociações, as delegações presentes no encontro conseguiram chegar a um acordo sobre a questão crucial de aumentar a mobilização global por cortes nas emissões de carbono e endurecer metas.

Segundo o pacto, todos os países precisarão apresentar novas promessas climáticas na próxima grande conferência prevista para o ano que vem em Glasgow.

Mas soluções para outras questões controversas, incluindo os chamados mercados de carbono (a possibilidade de países que emitem menos carbono 'venderem' créditos de CO2 às nações mais poluentes) foram adiadas até a próxima reunião.

Chegando até a bloquear o acordo temporariamente, o Brasil foi um dos principais obstáculos à assinatura do documento - cuja assinatura foi atrasada em 2 dias.


Após dois dias e duas noites extras de negociações, delegados presentes na conferência definiram um acordo que prevê a apresentação de metas novas e mais ambiciosas de cortes nas emissões de carbono para o encontro que acontecerá em Glasgow.

Todos os países presentes deverão dar respostas efetivas ao vácuo entre o que os cientistas dizem ser necessário para evitar mudanças climáticas perigosas e as medidas tomadas atualmente - que no ritmo em que estão levariam o mundo a ultrapassar o limite para mudanças irreversíveis já nos anos 2030.

Apoiado pela União Europeia, o estímulo a metas mais ambiciosas teve a oposição de países como Brasil, Estados Unidos, Índia e China.

No entanto, o acordo conseguiu ser assinado prevendo que as nações mais ricas tenham que provar que cumpriram suas promessas sobre mudanças climáticas nos anos anteriores a 2020.

Na avaliação dos opositores, os países europeus pressionam os mais pobres, enquanto não fazem o trabalho "dentro de casa".

O Brasil tentou retirar dois parágrafos do documento final da conferência que prevêm estímulo a estudos sobre a relação entre os oceanos e o solo com as mudanças climáticas.

Pressionado por países como Chile, Rússia, Argentina, Austrália, Tuvalu e Belize, além da União Europeia, o Brasil acabou recuando e permitiu que os temas estivessem na redação final. A relação entre oceanos e solos com a urgência climática é respaldada por diversos artigos científicos publicados recentemente.

"O resultado desta Cop25 traz sentimentos mistos e está bem longe do que a ciência nos diz ser necessário", disse Laurence Tubiana, da Fundação Europeia do Clima e um dos responsáveis por arquitetar o Acordo de Paris.

"Países importantes que precisavam ser ativos em Madrid não atingiram as expectativas, mas graças a uma aliança progressista de pequenos países insulares, europeus, africanos e latino-americanos, nós conseguimos o melhor resultado possível, contra a vontade dos grandes poluidores", afirmou.

O acordo foi aplaudido por alguns ativistas. "As regras frágeis pautadas pelo mercado que foram defendidas por Brasil e Austrália e poderiam sabotar os esforços pela redução de emissões foram para a gaveta e a luta vai continuar na Cop-26 em Glasgow", disse Mohamed Adow, do grupo Power Shift Africa.

Muitos dos presentes ficaram insatisfeitos com o pacote final.

Para eles, o resultado não reflete a urgência sobre o tema. Ao mesmo tempo, os negociadores mostram satisfação por, ao menos, terem conseguido manter o processo de luta contra as mudanças climáticas vivo após as longas e complexas discussões de Madrid.

Registros de temperaturas desde o século 19 mostram que a temperatura média da superfície da Terra cresceu 0,8ºC nos últimos cem anos. Quase 0,6ºC desse total ocorreu nas últimas três décadas.

Os 20 anos mais quentes já registrados ocorreram nos últimos 22 anos, liderados pelo período entre 2015 e 2018.

Ao redor do planeta, o nível médio do mar cresceu 3,6 mm por ano entre 2005 e 2015. A maior parte dessa mudança ocorre em razão da expansão térmica da água do mar. Com o aumento da temperatura dela, as moléculas se tornam menos densas, levando ao aumento do volume do oceano.

Mas a redução da massa de gelo nos polos tem sido considerada o principal fator nessa tendência. A maioria das geleiras em regiões temperadas do mundo e ao longo da península da Antártida está diminuindo.

Desde 1979, imagens de satélite mostram um declínio dramático na extensão de gelo no Ártico, a uma velocidade de 4% por década. Em 2012, essa faixa atingiu seu patamar mais baixo, que é 50% menor que a média entre 1979 e 2000.

A camada de gelo na Groenlândia tem passado por um derretimento recorde nos últimos anos. Se todo esse gelo derreter, elevaria os níveis do mar em 6 metros.

Dados de satélite mostram que a camada de gelo oeste da Antártida também está perdendo massa, e um estudo recente indicou que o lado leste da região, que não tem apresentado qualquer tendência de aquecimento ou resfriamento, pode ter começado a perder massa nos últimos anos.

Mas cientistas não esperam mudanças drásticas. Em alguns lugares, a massa pode inclusive crescer, já que o aumento da temperatura pode levar à produção de mais neve.

Os efeitos das mudanças climáticas também podem ser vistos na vegetação e nos pastos. Eles incluem mudanças nos ciclos de vida das plantas, como uma floração antecipada, e alterações nos territórios ocupados por animais.

Há vários graus de incerteza sobre o tamanho do impacto do aquecimento global. Mas as mudanças decorrentes dele podem levar à escassez de água doce, a uma transformação radical da capacidade global de produzir alimentos, além do aumento de mortes por inundações, tempestades, ondas de calor e seca.

Isso ocorreria porque estima-se que as mudanças climáticas devem aumentar a frequência de eventos climáticos extremos, ainda que seja muito difícil associar qualquer evento isolado ao aquecimento do planeta como um todo.

Cientistas preveem mais chuvas em geral, mas apontam um risco maior de seca em regiões afastadas do litoral. Tempestades e aumento do nível do mar devem levar também a mais inundações. Haveria, no entanto, alta variação desses fenômenos ao longo das regiões.

Países mais pobres, que são menos preparados e equipados para lidar com mudanças bruscas, podem sofrer mais com as transformações.

Há previsões também de extinção de animais e plantas incapazes de se adaptar à mudança rápida do habitat, e a Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta que a saúde de milhões de pessoas pode ser ameaçada pelo avanço da malária, de doenças transmitidas pela água e da desnutrição.

Com o aumento do CO₂ emitido na atmosfera, há um avanço da captura desse gás pelos oceanos, o que torna a água mais ácida. Esse processo contínuo pode representar grandes problemas para os recifes de coral do mundo, pois as mudanças na química impedem que os corais formem um esqueleto calcificado, essencial para sua sobrevivência.

Modelos gerados por computador são usados nos estudos das dinâmicas do clima terrestre e levam a projeções sobre mudanças de temperatura.

Esses cenários variam em torno da "sensibilidade climática", a exemplo do peso de cada elemento (como o CO₂) no aquecimento ou no resfriamento. E mostram diferenças no modo com que esses "feedbacks climáticos" podem ocorrer.

O aquecimento global causará algumas mudanças que provavelmente levarão a mais aquecimento, como a liberação de grandes quantidades de metano dos gases de efeito estufa à medida que derrete o permafrost (solo permanentemente congelado encontrado principalmente no Ártico). Isso é conhecido como feedback positivo sobre o clima.

Mas feedbacks negativos podem compensar o aquecimento. Vários "reservatórios" na Terra absorvem CO₂ como parte do ciclo do carbono - o processo pelo qual o carbono é trocado entre, por exemplo, os oceanos e a terra.

A questão é: como eles vão se equilibrar?

Meritocracia e desigualdades sociais

As causas das grandes manifestações populares, recentemente, no Equador, no Chile, no Líbano, no Iraque, na Checoslováquia e em Hong Kong, que abalaram governos e instituições, são complexas, mas não há dúvida de que boa parte dos protestos se origina no aumento da desigualdade de renda que está ocorrendo no mundo todo.

Esse é também um dos temas centrais das eleições presidenciais dos Estados Unidos no próximo ano. Apenas 0,1% dos americanos – cerca de 300 mil pessoas, numa população de mais de 300 milhões – controlam 20% da riqueza nacional. A renda dessas pessoas nos últimos 40 anos cresceu muito mais rapidamente que a renda do restante da população.


O fosso entre ricos e pobres está aumentando não apenas nos Estados Unidos, como também no Chile, na Argentina, entre outros países, como o Brasil, conforme mostram dados recentes do IBGE. A desigualdade econômica, porém, é apenas parte do problema: desde os primórdios da civilização, 10 mil anos atrás, existem aristocracias que governam e se beneficiam do trabalho da população: as famílias imperiais da Antiguidade, os senhores feudais da Idade Média e o sistema colonial vigente até o século 20. Em todos esses sistemas, o mérito foi uma consideração secundária diante das relações de sangue, favoritismo e corrupção.

A Revolução Francesa, de 1789, extinguiu a monarquia e implantou o regime republicano, que abriu caminho para a emergência dos mais capazes, escolhidos pelo mérito. As vantagens da meritocracia foram compreendidas pelo rei Luís XV, da França, antes da revolução. Ele criou, em 1760, uma escola militar para treinar oficiais oriundos de famílias que não pertenciam à nobreza. Foi nela que Napoleão Bonaparte, vindo de uma província secundária como a Córsega, se distinguiu e iniciou sua meteórica carreira militar, o que então era raro.

A meritocracia para o serviço público foi introduzida na Inglaterra em 1830 e um dos sucessos indiscutíveis da colonização da Índia pelos ingleses foi a organização de um excelente serviço público, que dura até hoje.

Surgiram, contudo, recentemente nos Estados Unidos teorias de que a causa dos problemas da desigualdade de renda é a nova aristocracia de superdotados e supercapacitados, que substituiu a velha aristocracia do “sangue”, isto é das grandes famílias do passado, como Vanderbilt, Carnegie e Rockefeller. Os novos bilionários, como Bill Gates (Apple), Mark Zuckerberg (Facebook), Jeff Bezos (Amazon) e outros, passaram a ser membros da aristocracia do país. As universidades de elite como Stanford, Harvard, MIT, nas quais estudaram, estariam, portanto, alimentando a concentração de fortunas.

Mais ainda, os filhos desta nova aristocracia, que são excepcionalmente bem preparados para a corrida da meritocracia, reproduzem o que se chama de “casta hereditária”. Nessas universidades, a maioria dos estudantes vem efetivamente de famílias ricas.

Essas ideias se originaram na noção de que na Inglaterra o sistema educacional perpetuava o domínio da aristocracia nas posições do governo por meio dos egressos das grandes universidades, como Oxford e Cambridge, às quais as classes menos favorecidas não tinham acesso.

Um educador inglês de tendência socialista, Michael Young, escreveu em 1958 uma sátira sobre os efeitos que o sistema educacional vigente poderia ter no futuro. Na época os jovens de 11 anos eram submetidos a exames que mediam o seu QI (quociente de inteligência) e de acordo com seu desempenho eram encaminhados para os diferentes tipos de escolas: os melhores para as universidades, os piores para escolas profissionais para a indústria, o comércio e a agricultura.

A tese fundamental de Young é que faz sentido escolher pelo mérito as pessoas mais adequadas a uma atividade específica (como pilotar aviões ou dirigir uma empresa de energia), mas permitir que elas constituam uma nova classe social que não deixa espaço para outros é um absurdo.

A sátira de Young faz uma caricatura do que poderia acontecer no futuro: uma revolução populista que destrói o governo aristocrata criado pela meritocracia. Seu livro é da categoria das “distopias”, como o filme Metrópolis, de Fritz Lang, os livros Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, e 1984, de George Orwell, que imaginaram um futuro em que elites privilegiadas controlavam completamente a sociedade e exploravam o resto da população.

É evidente, hoje, que as previsões da distopia de Young não se concretizaram. O controverso QI como único critério para alocação de crianças em escolas foi abandonado, já que é obvio que ele poderia variar ao longo do tempo, bem como as qualificações e predicações das pessoas. Competição e esforço individual têm papel importantíssimo no sucesso das pessoas, e não apenas o seu QI.

Outras experiências de “engenharia social” foram tentadas, também sem sucesso: os comunistas, após a revolução russa de 1917, aboliram os exames de seleção (vestibulares) nas universidades, abrindo suas portas aos “filhos dos trabalhadores”. Passados alguns anos o próprio Lenin se deu conta de que a construção do socialismo precisava de técnicos competentes e reintroduziu a meritocracia.

Meritocracia não é a causa das desigualdades econômicas que existem atualmente em muitos países, o que pode e deve ser resolvido pelo sistema de taxação das grandes fortunas. Os problemas que enfrentamos hoje se originam das características do capitalismo do século 21: a tecnologia moderna, largamente baseada na informática, depende muito mais de pessoal superqualificado do que o sistema industrial do passado – mineração, siderurgia, transporte e produção de bens de consumo –, que exigia grande quantidade de mão de obra e de materiais, ao passo que a informática depende fundamentalmente da inteligência que se cultiva e desenvolve nas universidades.

Reza forte

O pobre continua pobrezinho, mas percebe movimentações que poderão ter desenvolvimentos propícios a uma descida na hierarquia de indigência para a qual foi atirado. Reza aos santinhos todos para que as suas impressões não o enganem 
Isabela Figueiredo 

No país do 'tá ok', a língua ficou furreca

O sujeito pode ser um estroina boquirroto, merecedor de piparotes e petelecos, mas, quando disparou a malcriação do "pirralha", ele fez com que eu imediatamente me lembrasse de "pixote", "pirroto", "traquina", "fedelho", e seguisse assim, viajando feliz.

São palavras supimpas. Estão lá, quietinhas no cemitério dos dicionários, e de vez em quando precisam vir aqui fora, numa página de jornal, tomar uma fresca e mostrar quão serelepes, doidivanas e bacanas ainda o são.

Salve a picurrucha e demais peraltas ressuscitadas a partir da declaração do xumbrega mequetrefe.

Um texto que se pretende moderno tem medo dessas estripulias. Acha datado demais e se pela de medo de soar muquirana. No lugar de trãchã, sonha-se cool. Qual tatuado transgênero escreveria "maçaroca" para resumir o Brasil?

Encafifado com a multidão de cognitivos no bojo dessas palavras, o intelectual deixa de lado as lindas sirigaitas do vernáculo. Elas só reaparecem como paralelepípedos, quando um tosco de poucas leituras, totalmente marmota, se vale da tradição oral dos mais velhos e esculacha como pirralha a espoleta sueca do meio ambiente.

É uma pena, mas desse forrobodó eu não abro mão. Como se fosse um passeador de cachorros, saio sempre com essas espevitadas que conheci na infância. De pura fuzarca, pelo prazer da coqueluche semântica, dou um saracoteio com elas pelas páginas dos livros e jornais. Elas se fazem songamongas, eu tiro uma chinfra.

Exibo-as, todo pimpão, vaidoso em lhes reconhecer o borogodó intrínseco. São minhas concubinas, durmo com elas. Nenhuma lambisgoia, muito menos patusca. Zero de borocoxô feeling. Inzoneiras. São senhoras dignas de poderem ter sido, quem sabe?, a musa daquela frase de um também desengavetador de teteias: "Outro dia", escreveu Mário Quintana, " uma palavra tirou a roupa e ficou nuinha pra mim".

Está cada vez mais próximo o dia em que palavras assanhadas, assim como as galochas, serão estrovengas escangalhadas, coisas de senhores caquéticos desatualizados com a contemporaneidade. O mundo está rápido demais para que se espere alguém terminar de pronunciar a palavra "catiripapo". "Inconstitucionalissimamente", por exemplo. Com a sua capacidade de ser ao mesmo tempo pompa e palavrão, seria perfeita para resumir o Brasil de hoje - mas quem ousaria? Não há tempo para tamanho esquartejamento de sílabas.

Neste momento de prezo ao tatibitate, uma start-up pesquisa nova geração de emojis. Eles não divulgarão apenas os sentimentos, se alguém está macambúzio ou estupefato. O emoji será a gramática do futuro, dará o recado do que vai na língua de cada um como se fosse uma abreugrafia digital. A palavra, principalmente a rechonchuda, esse maravilhoso pandemônio polissílabo, terá a mesma importância que o Durma Bem no enfrentamento do mosquito da dengue. Flopou.

A urticária também parecia ser companheira eterna do homem na Terra - e nunca mais foi diagnosticada. Qual o último médico que receitou vermífugo?

Essas palavras se empanturravam de letrinhas, pacificavam as índoles como se banhadas em camomila afetiva. Eram parrudas. A língua, sem preconceitos, metia-se onde não era chamada e lambia-lhes sovacos, cocurutos e demais idiossincrasias. Todas as palavras cabiam na boca do brasileiro. Aos poucos, foram desidratadas, trocadas pela urgência do "pq", "ñ", "tbm", "blz", "brs" e demais necessidades de se viver em estado de tweet. No país do "tá ok", a língua foi atrás. Ficou curta. Deu ruim. Furreca.