terça-feira, 2 de junho de 2015

O prazer do 'cara de pau'


“Tudo bem, caro jornalista... vou fazer umas confissões não digo políticas, mas existenciais. E tudo ‘off the record’, tá legal? Bem, digo-lhe que estou horrorizado com a hipocrisia reinante, quando todos negam o que sempre fizeram. Eu nunca reneguei minhas posições, digamos, estelionatárias. Para mim, nunca foi um defeito ou motivo de vergonha; sempre foi um grande prazer – chamemos de vocação. Por isso, vou me vingar da grossura que vejo no mundo da fraude clássica. Faltam à maioria dos ladrões elegância e ‘finesse’. Roubam por rancor, roubam o que lhes aparece na frente, se acham no direito de se vingar de passadas humilhações, mãe lavadeira, dores de corno, porradas na cara não revidadas.

Eu, não. Eu sou cordial, um cavalheiro; tenho paciência e sabedoria, comecei pouco a pouco, como as galinhas que roubei na infância, que de grão em grão enchiam o papo... Ha-ha-ha ...

Hoje, já estou bem de vida graças a Deus e posso aprofundar para você o que nos move à corrupção. Como bem observou o grande historiador Evaldo Cabral de Melo: mais do que afirmaram Sergio Buarque, Freire e Faoro, a incompetência e a corrupção são o que trava o pais há séculos. Tenho orgulho de nosso passado, tenho tradição.

Muita gente acha que roubamos por ambição. Mas, além do amor à bufunfa, à grana, roubamos por puro prazer. Isso. Grandes prazeres nos movem. Já tenho sete fazendas reais e sete imaginárias, mando em cidades do Nordeste, tenho tudo, mas sou viciado na deliciosa adrenalina que me arde no sangue na hora em que a mala preta voa em minha direção, cheia de dólares.

Vibro de alegria quando vejo os olhos indignados e envergonhados dos empresários me pagando a propina, suas mãos trêmulas me passando o tutu. Deleito-me quando o juiz me dá ganho de causa, ostentando honestidade, e finge não perceber minha piscadela marota na hora da liminar comprada. Sinto-me superior; adoro flutuar acima dos otários que me ‘compram’, eles se humilhando em vez de mim.

Roubar dá tesão; me liberta. Eu explico: roubar me tira do mundo dos ‘obedientes’ e me provoca quase um orgasmo quando embolso uma bolada. É um barato rolar nu sobre notas de US$ 100 na cama, comendo chocolatinhos do frigobar de um hotel vagabundo na cidade onde superfaturei uma rede de esgotos. Adoro ver o espanto de uma prostituta quando eu lhe arrojo US$ 1.000 entre as coxas e sinto sua gratidão nas carícias mais perversas.

Tenho prazer de ostentar dignidade em CPIs; sou ótimo ator e especialista em amnésias políticas. Tenho o grande prazer de usar palavras nobres em minhas negações: ‘Nego! Não admito aleivosias, patranhas assacadas contra minha honra ilibada, minha vida sem jaça’. E solto brados de honradez, socos nas mesas, babas indignadas, hipócritas lágrimas de esguicho e clamores a Deus. 


Sei dizer muito bem, melhor até que nosso guia Lula, que nunca soube de nada de nada... Já declarei de testa alta na Câmara: ‘Não sei como esses milhões de dólares apareceram em minha conta na Suíça se eu nem tenho conta lá!’ O venerável Maluf criou uma escola. Esse grau de mentira deixa de ser mentira e vira uma arte.

Tenho o prazer de ficar indiferente aos xingamentos da mídia... É o que chamo de ‘prazer da cara de pau’. Aliás, minha cara é de ‘pau-brasil’ em homenagem ao nosso passado.

E a doce volúpia de ostentar seriedade em salões de ‘homens de bem’ que me xingam pelas costas, mas me invejam secretamente pela liberdade cínica que me habita? Sou olhado com admiração nas churrascarias entre picanhas e chuletas, e suas mulheres me olham com volúpia, imaginando os milhões que amealhei.

Sinto prazer vendo os puxa-sacos que me lambem com olhos trêmulos e mãos frias de medo e reverência.

Adoro ver a palidez de guardas e contínuos diante de minha arrogância, quando lhes mostro a carteira do Senado. Até me satisfazem pequenas alegrias parlamentares, como usar um jaquetão igual ao do Sarney, feito de ‘teflon’, onde nada cola. Com bom humor fraternal participo do visual de meus colegas, pintando os cabelos de acaju ou preto-nanquim.

E o prazer de levar uma vida aventurosa, secreta. Nada da chatice terrível dos honestos, pois sabemos que virtude dá úlcera. Adoro os jantares nordestinos, com moquecas e maracutaias, amo as cotoveladas cúmplices quando se liberam verbas, os cálidos abraços, os sussurros segredados nas varandas das máfias rurais.

Tenho orgulho do mal; pois, como dizia minha avó, há males que vêm para o bem. Explico-lhe, amigo: eu e meus pares temos provocado uma indignação na opinião pública que ajuda a mudar o país – nós somos o ‘mal’ que traz o ‘bem’. Eu só tenho inveja da maneira petista de mentir. Eles não sentem culpa de nada, pois roubaram em nome do ‘povo’. Eles são o ‘bem’ que vem para o ‘mal’.

Me dá um grande prazer minha respeitabilidade altaneira que confunde meus inimigos, na dúvida se eu tenho mesmo grandeza acima dos homens comuns. Posso, do alto de meu cinismo transcendental, ter até a coragem de ser covarde. Levo desaforo para casa, sim, dou beijos de Judas, sei dar abraços de tamanduá e chorar lágrimas de crocodilo... No fundo, eu me acho mesmo especial; não sou comum.

Sou profissional e didático... Eu me considero um Gilberto Freyre da escrotidão brasileira. Eu estou no lugar da verdade. Este país foi feito assim, na vala entre o público e o privado. Há uma grandeza insuspeitada na apropriação indébita, florescem ricos cogumelos na lama das roubalheiras... Tenho orgulho de ser um dos fundadores de uma nova ciência: a ‘canalhogia’ ou talvez a ‘filha-daputice’.

É isso, tenho o prazer de não ser nem de esquerda, nem de direita, tenho o prazer de não ser porra nenhuma. Aliás, todos esses picaretas ideológicos também não são nada. Meu partido sou eu mesmo presidente e militante. Vivo feliz com a grande delícia de minha corrupção assumida. Eu sou antes de tudo um forte.”

Quinze anos de bônus demográfico vão pelo ralo

Fraqueza do mercado de trabalho, baixa taxa de poupança e produtividade estagnada podem encerrar o fenômeno que conduziu o crescimento econômico do país nas últimas décadas
Desde a década de 1970, o Brasil tem colhido frutos do chamado bônus demográfico, fenômeno que ocorre quando há, proporcionalmente, um maior número de pessoas em idade ativa, aptas a trabalhar, do que crianças e idosos. Quando esse benefício atinge uma sociedade em desenvolvimento, significa que ela disporá de mais força de trabalho do que pessoas inativas, que, em diferentes graus, são mais dependentes do Estado, como é o caso dos aposentados. Ou seja, há um excedente de pessoas para produzir e pagar impostos. Trata-se de um evento típico de países jovens. E, como tudo na vida, tem data para terminar. Uma vez que essa população envelhece, as novas gerações tendem a ser menos numerosas e a base da pirâmide demográfica se afunila cada vez mais. É o que acontece na Europa, cuja população idosa supera, em alguns países, os jovens em idade ativa. No Brasil, as previsões apontavam 2030 como a década em que os efeitos do bônus começariam a se dissipar. Contudo, devido justamente ao mau aproveitamento dessa vantagem demográfica, especialistas começam a projetar o início de seu fim para já: entre 2015 e 2020.


Segundo o demógrafo José Eustáquio Diniz Alves, da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Brasil não fez bom uso de seu bônus porque não investiu suficientemente em educação de ponta e inovação, a exemplo de países como China e Coreia do Sul. Soma-se a esse déficit as sucessivas crises econômicas que se abateram sobre o país nas últimas três décadas e tem-se o cenário perfeito para o desperdício da vantagem. "Surfar nesse fenômeno significa aproveitar a população ativa e torná-la cada vez mais produtiva. Hoje, temos 10 milhões de jovens que não estudam, nem trabalham: os 'nem-nem'. Isso é potencial desperdiçado. Esse seria o momento de melhorar as condições de vida da população, enriquecer antes de envelhecer. O que está acontecendo é que o país está envelhecendo sem enriquecer, sem conseguir equacionar os problemas básicos da população", afirma. Segundo Alves, a crise econômica atual encerra com chave de ouro um ciclo de mau uso do bônus. "O que vemos hoje na economia é resultado de decisões erradas e falta de investimento. O que foi feito na última década corroeu pelo menos quinze anos de bônus demográfico", diz.
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Sobre a quase reforma

Em obras

As propostas de reforma política, que levaram mais de 20 anos para serem colocadas em discussão, mostraram mais uma vez que grande parte dos congressistas é totalmente dispensável. Horas e horas de discussões que terminaram em quase nada só reafirmaram a condição de letargia dos parlamentares.

Pode-se atribuir às insanidades de Eduardo Cunha o fracasso dessa reforma política, mas, encerradas as tentativas de mudar a forma de eleger políticos no Brasil, é hora de indagar se uma transformação desta é realmente o que o Brasil precisa.

De que adiantaria restringir financiamentos privados se o caixa 2 continuaria existindo? Do que adiantaria unificar eleições se os eleitos continuariam sendo os mesmos?

A derrota do distritão e do distrital misto mantém o que esta aí, mas o que está estabelecido do ponto de vista eleitoral não é o pior que o Brasil apresenta.

Dos males, o menor. Sem a impunidade, talvez esse mesmo sistema, com pequenas alterações, configurasse entre os melhores do mundo.

Outras reformas, sim, são cruciais para o funcionamento deste país. Talvez a salvação para uma economia em frangalhos e uma crise que não é só financeira, mas, sobretudo, estrutural.

Uma mudança na forma de arrecadar impostos e tributos, privilegiando a produção em detrimento de setores especulativos, que só arruinam a economia, sim, faria a diferença que todos nós precisamos e sonhamos.

Também haveria de se aspirar um reforma jurídica, não aquela que discute apenas a diminuição da maioridade penal, mas uma que também seja capaz de trazer maior equilíbrio entre cidadãos.
Antes de pensarmos em reforma política, seria preciso ter políticos.

Pessoas públicas concentradas, minimamente honestas e preocupadas um pouco mais com a vida que acontece nas ruas, resistentes a este mundo de maravilhas, estratagemas e pilantragens de gabinetes e salões ovais.

Entre heróis que trabalham e geram as riquezas deste país e sanguessugas que se alojam na política e no sistema financeiro brasileiro há um abismo quase intransponível.

Se não se inverterem os papéis desse teatro de horrores, qualquer mudança eleitoral será mera fantasia. Por esse prisma, a derrota da reforma política nesta semana não é bem uma derrota do cidadão. Dependendo do que seria aprovado, o que tivemos pode até ser encarado como vitória.

A nossa verdadeira derrota está no dia a dia e na expiação pela qual passamos aos sermos diuturnamente bombardeados com a manutenção de dois tipos de gente no país: o que produz e o que se farta dessa produção, sem pensar na fome dos empobrecidos.

Movimentos de rua e a escolinha de futebol de Lênin

MARIN ex-presidente da CBF 6 da fifa sao presos pelo FBI tradicao em justica nao em fitebol Lula Dilma TV 2

Tempos de Fifagate são inspiradores... Imitemos o "treinador" $talinácio e vamos usar metáforas futebolísticas para demonstrar que o Brasil precisa passar, urgentemente, por uma ampla transformação estrutural, com conceitos corretos, definições estratégicas transparentes e valores morais claros para todos, como pré-condição histórica para que tenha a chance de chegar a ser um País no rumo concreto de desenvolvimento. Até a presente data, continuamos nos comportando como aquela pátria de chuteiras que tomou uma goleada de 7 a 1 (de quem mesmo?), mas insiste em permanecer refém dos erros históricos de sempre.

Desenhemos na prancheta do técnico! Meu time, o Flamengo, tomou do Corinthians do $talinácio o atacante Guerreiro - que tem um histórico de eficiência em fazer gols. O problema é que o rubro-negro tem uma deficiência tática crônica: o meio campo não funciona corretamente, e não faz a bola chegar ao artilheiro que deve cumprir a missão precípua de meter bola na rede. Além do problema de fragilidade psicológica do time, que não consegue segurar um placar favorável e se desespera facilmente quando o quadro é desfavorável, o clube padece do mesmo problema estrutural de tantos outros no decadente futebol brasileiro: seus dirigentes têm visão rentista, dando mais importância ao equilíbrio de caixa que aos resultados positivos concretos que a equipe precisa ter até para se sustentar suas finanças.

O desgoverno federal, e maioria esmagadora dos estados e municípios, apresentam a mesma deficiência estrutural daquela que é considerada a "Nação Rubro-Negra". O Capimunismo, combinado com a visão pragmático rentista que exige resultados no curto prazo, senão não presta, está inviabilizando o Brasil. Não é possível que nossos "treinadores" não percebam o suicídio tático de continuar fingindo acreditar que tenha chances de se desenvolver um País com juros estratosféricos, noventa e tantos "impostos" elevadíssimos e tanta corrupção institucionalizada. Marcamos um gol contra por segundo na gestão da coisa pública. Os negócios privados ficam reféns do mesmo esquema que tudo depende do poder estatal.

Pela mesma ótica ludopédica de análise, tem algo muito errado na estratégia e na tática dos movimentos que tentam se organizar para promover grandes protestos contra o desgoverno, pelos mais variados objetivos e fins. Alguns aparentemente parecem legítimos e outros claramente se comportam como oportunistas e sem legitimidade democrática. O que mais chama atenção é que todos eles carecem hoje de propostas concretas para sensibilizar e mobilizar o povo para as mudanças estruturais que o Brasil precisa, mas vive adiando. A pergunta mais comum é: "O que fazer?".

O líder da revolução russa Vladimir Lênin escreveu um livro sobre o assunto. Independentemente da ideologia, a obra pode ser muito útil para brasileiros perdidos na hora de mexer com a massa ignara - que não está a fim de nada, ou até tem boa intenção, mas não consegue traçar objetivos e metas bem claras e possíveis de serem cumpridas, em favor da Pátria (que não é aquela de chuteiras - muito bem explorada economicamente pelas as empresas CBF e Globo). Frases soltas de Lênin rendem excelentes reflexões. Afinal, foi ele quem disse: "Ideias são mais letais que as armas"

O pragmatismo de Lênin é objetivo: "Toda cozinheira deve aprender a governar o Estado". Lênin definiu: "O Estado é a organização especial de um poder: é a organização da violência". Lênin acrescentou: "Salvo o poder, tudo é ilusão". Lênin conceituou: "Ditadura é o poder baseado diretamente na força e irreprimido por quaisquer leis". Lênin também constatou: "O crime é produto dos excessos sociais". Lênin salientou: "Muitas vezes, é verdade, que, em política, você aprende com o inimigo". Lênin proclamou: "A morte de uma organização acontece quando os de baixo já não querem e os de cima já não podem". O mesmo Lênin observou: "Um imbecil pode, por si só, levantar dez vezes mais problemas que dez sábios juntos não conseguiriam resolver".

Um dos conselhos úteis de Lênin trata da relação entre o sonho das pessoas e o mundo real: "É preciso sonhar, mas com a condição de crer em nosso sonho, de observar com atenção a vida real, de confrontar a observação com o nosso sonho, de realizar escrupulosamente nossas fantasias. Sonhos, acredite neles"... Tanto é assim que Lênin também filosofou sobre o tempo real: "Há décadas em que nada acontece e há semanas em que décadas acontecem". E Lênin, grande frasista, tem outra muito útil aos brasileiros no momento presente: "Se você não é parte da solução, você é parte do problema".

Divertindo-me com tais frases soltas, juntadas em um texto de forma cinicamente maniqueísta, chego a conclusão que Lênin daria um belo treinador para o Flamengo. Infelizmente, não dá para dizer o mesmo do companheiro $talinácio ou da torcedora Dilma - mais "prestigiada" que técnico de time que não para de perder de goleada... Ou mais "prestigiada" que dirigente da Fifa no torneio de futebol do FBI...



Partindo dos entretantos para os finalmentes, como proclamaria o Presidente Odorico, o Brasil carece de uma Elite Moral que consiga definir rumos estratégicos para o País, obtendo o milagre comunicacional de conseguir convencer os "jogadores da nação" da estratégia e da tática correta para virar nosso jogo - há muito tempo em permanente derrota política, econômica e, pior ainda, cultural e civilizatória.

Não precisamos estudar na escolinha de futebol do professor Lênin... Mas não podemos continuar sob risco de sermos treinados por falsos mitos de visão egoísta como o treinador $talinácio. Da mesma forma, não podemos esperar que, milagrosamente, o time das Forças Armadas entre em campo para salvar um jogo que é perdido pela incapacidade de cada jogador brasileiro - que ignora ser a gestão de uma nação uma obra coletiva.

Enfim, não adianta achar que tudo no Brasil se resolverá com jogadas mágicas de uma partida de futebol. Impeachment, intervenção constitucional, renúncia ou derrubada do governo por outro fim, combate inocente à corrupção sistêmica... Tudo parece distante do cenário real previsível.

Precisamos, de verdade, criar as pré-condições históricas para a mudança. Isto dá trabalho, consome tempo, neurônio e dinheiro. Exige debate sincero, sem paixões ideológicas - que mais parecem manifestação de torcida de futebol. Tal trabalho tem de começar ontem, para que o hoje chegue até amanhã. A militância cidadã vai exigir, antes, que cada indivíduo cuidem bem da própria vida e da família, para não terminar morto em campo...

O jogo é jogado... E não é para principiantes nem amadores... Amador que deu certo só o Aguiar, do Bradesco... No entanto, se ninguém se precipar, nada vai acontecer...

Por isso, a dica aos organizadores de movimentos de rua e aos ativistas da internet é que desenvolvam, imediatamente, a capacidade de produzir soluções que as pessoas comuns entendam e constatem que têm capacidade real de, no mínimo, ajudar a realizar.

Se não for assim, manifestações públicas (na rua ou nas redes sociais) serão completamente inúteis. Nem adianta se matricular na escolinha do professor Lênin que o time continuará perdendo... E tomem cuidado com oportunistas, empresariais ou politiqueiros, que tentam se aproveitar da boa vontade e do voluntarismo das pessoas, principalmente as mais jovens...

Vamos sair do negativo e virar o jogo... Soluções, já! Ou, então, seremos o problema...

É proibido fazer cara de surpresa


Cara de nojo é permitida. Certamente recomendada. Provavelmente, deveria mesmo ser exigida. Não dá para testemunhar o grau de degradação dos tempos atuais sem pelo menos, alguma reação estomacal, sem ofender os narizes menos sensíveis, sem o nojo causado pela constatação da lama chegando a sola dos sapatos. Palpavel, malcheirosa, mas aparentemente inevitável.

Cara de surpresa, por outro lado, deveria ser proibida nestas circunstancias. Não dava para esperar outra coisa de um local que permitiu, sem jamais manifestar preocupação ou tomar ação, este processo gradual de degradação institucional, ética e mesmo moral.

É engano imaginar que a simples punição dos culpados da vez resolva qualquer coisa no longo prazo. Engaiolar gatunos é condição necessária, mas não suficiente para que as coisas melhorem. Mas esta fase é, por difícil que possa parecer, parcela mínima do esforço necessário.

Imagino que, se provocada a discussão, apareceriam dezenas de explicações sociológicas e históricas que explicariam como chegamos onde estamos. O passado tem muitas serventias, inclusive justificar qualquer coisa.

O problema nestas explicações genéricas é que elas levam a pouca ação. Parecem gerar aceitação das coisas como elas são. Sem esperança ou necessidade de mudança. Transformar passado em destino não é atitude sábia e muito menos conduz a uma vida melhor.

Mais eficiente seria aprender as lições passadas com os olhos voltados para o futuro e a atenção ligada em experiências bem sucedidas em outras paragens. Contrariamente a crença popular, na terra da jabuticaba, o sabiá não canta diferentes, e as palmeiras não são únicas. A gente tem, sim, muito que aprender com os outros.

Talvez a gente pudesse imediatamente voltar nosso interesse para temas de governança. Poderíamos, por exemplo, buscar inspiração nos países desenvolvidos. Estes, parece, chegaram lá porque seus habitantes constantemente estavam preocupados com o que é feito dos seus impostos, em como as decisões são tomadas, e quais são os conflitos de interesses envolvidos. Preocupações simples, mas que, quando constantes em uma sociedade, tudo funciona melhor.

Existem alternativas. Podemos claro, voltar atenções para os lugares onde orçamentos são peças de ficção. Onde bagunça é motivo de orgulho. Onde se cultua o mito de que não existe qualquer coisa a ser aprendida. Onde violência e corrupção não somente são normais, mas esperadas. Onde, enfim, se dá as costas a qualidade de vida. Existem muitos lugares assim e, diria, são até a maioria.

Não é verdade que morar em país desenvolvido é bom, mas viver lá é ruim. Isto é simples consolo para quem não quer melhorar. Nos lugares onde a qualidade de vida é alta e a cidadania é respeitada, a vida é mais simples, agradável, interessante. E mesmo o que não funciona tão bem, funciona melhor.

Favela não é lugar para ninguém

A esquerda caviar adora glamourizar as favelas, ou melhor, as “comunidades”. São lugares vistos como de vanguarda, onde há uma simplicidade maior, uma camaradagem espontânea, algo que nos remete ao “bom selvagem” de Rousseau, pessoas mais “puras”, enfim, pois não totalmente contaminadas pela “ganância capitalista” e a impessoalidade das cidades. Basta assistir a um programa “Esquenta!”, de Regina Casé, ou ler umaentrevista de Miguel Falabella, enaltecendo o estilo de vida mais descolado e divertido de lá, para se ter quase vontade de vender tudo e ir morar numa favela.

Na prática, não é nada disso. O que temos é um cotidiano de surras e pobreza, os “gatos” da Net feitos por “esperteza” e excesso de “malandragem”, e um clima de total insegurança, em que os pais vivem constantemente apavorados com o risco de seus filhos serem atraídos pelo tráfico de drogas, que domina quase todas as favelas cariocas. O gerente de tráfico da favela da Maré chegou a afirmar que matava um por dia, se quisesse. É esse o ambiente insalubre dos moradores dessas “comunidades”, sem falar da falta de saneamento adequado e tudo mais.

Enquanto o beautiful people dos bairros chiques elogia essa condição de vida de longe, muitos favelados (termo jamais usado por essa gente) desejam aquilo que os outros têm: consumir mais produtos modernos, viver com mais segurança, oferecer uma condição de vida melhor para seus filhos. Na resenha que escrevi de Um país chamado favela, tentei encontrar um ponto de equilíbrio entre a glamourização feita pela elite da esquerda e o preconceito destilado por muitos, sem deixar de criticar o viés esquerdista dos autores.


Mas tudo isso foi para chegar à entrevista recente que Seu Jorge concedeu à revista Rolling Stone. Ele, que veio de Belford Roxo e sabe do que está falando, ao contrário dos artistas e “intelectuais” nascidos em berço de ouro, como Chico Buarque e companhia, foi enfático ao dizer:
Favela não é lugar para ninguém. Favela não é legal. Não tem segurança, não tem saneamento, não tem hospital, não tem porra nenhuma. Favela só sofre preconceito. Eu quis sair mesmo. Eu não quis ficar enterrado na favela. Nasci lá, mas não quis ficar enterrado lá. Favela não é meu mundo, meu tudo, porra nenhuma. A favela é o abandono que o governo deixou pra gente. E hoje eu não quero tocar na favela para não me envolver com tudo que está errado lá dentro.
Sinceridade, algo que tanto falta aos nossos artistas da esquerda caviar. Ao contrário daqueles que elogiam Cuba, Venezuela e o socialismo, mas escolhem passar férias ou viver em Nova York ou Paris, Seu Jorge elogia os Estados Unidos mesmo, um “país diferenciado”, não por acaso onde escolheu viver. Quando questionado por que foi para Los Angeles, respondeu: “Tranquilidade. Eu precisava ser pai. No Brasil o Seu Jorge estava dentro de casa. Eu não conseguia levar minhas filhas para passear, ir à escola delas sem ter a aclamação do público. Nos Estados Unidos não tem isso. Lá eu tenho uma vida normal de pai, que sai, dá uma volta com o cachorro”.

Não é apenas a fama que o mantinha em casa, naturalmente. Pode ter sido o fator principal em seu caso, mas não foi o único. É o que faz muita gente, cada vez mais, temer um simples passeio no parque, ou andar de bicicleta pela orla: a violência, o risco de assalto, de levar uma bala perdida, de ser abordado por um marginal que depois é tratado como “vítima da sociedade” pelos sociólogos e poetas. Não há isso nos Estados Unidos. Aqui em Weston vemos vários ciclistas pelas ruas, e se eu perguntar se temem algum assaltante, não vão compreender minha pergunta. Posso sair de um restaurante às 23h de vidros abertos e parar em qualquer sinal sem medo. Tranquilidade, é a palavra certa, usada por Seu Jorge, que lamenta a perda de identidade do brasileiro:

Acho que a política brasileira está passando por uma crise de identidade muito grande. Não reconhecemos mais quem nos representa. É um problema muito sério, porque atinge a percepção da capacidade de o Brasil ser um país colossal, como ele merece e tem condições para ser. O mundo todo torce para o Brasil e para o brasileiro, eu percebo isso [lá fora]. Os programas sociais não são um problema, mas causam um rombo muito grande e fazem com que as pessoas não se movam para alcançar outro plano. As contas do governo também não batem. Acho que uma série de ministérios deveria ser suprimida e que precisamos de gestores mais sérios. Está cada vez mais difícil representar o Brasil fora daqui, e essa é minha função. Não saí do Brasil para me tornar um gringo – eu saí para afirmar o Brasil. Mas está difícil, porque nossas mazelas e feridas estão expostas e as pessoas não acreditam na gente. Isso interfere diretamente no meu trabalho e carreira.

Sobre aqueles que atacam o cantor por ele ter se mudado para os Estados Unidos, a típica elite da esquerda caviar que vive numa bolha, Seu Jorge solta o verbo em desabafo:
O patrulheiro que fica me enchendo o saco, dizendo “Pô, o Jorge agora mora nos Estados Unidos”, tem que se lembrar do seguinte: eu era morador de rua, um fodido e meu dinheiro eu fiz centavo por centavo sem sacanear ninguém, sem roubar ninguém. O Brasil em que eu acredito é esse que está na Avenida Paulista ralando; é o Brasil do motoboy, das mães solteiras fazendo faxina como diaristas, dos garçons, dos seguranças. Esse é o meu Brasil, eu vim daí. Agora, vem essa galerinha de Facebook e de Twitter [falar de mim]. Pô, morre e nasce de novo para poder chegar perto de mim, morou?

Morei. Entendo perfeitamente o desabafo de Seu Jorge, mesmo jamais tendo passado pelo que ele passou na infância. Isso nunca me impediu de ter sensibilidade para tentar me colocar no lugar do outro, e por isso mesmo minha revolta com essa elite hipócrita, que glamouriza o que é, para o outro, um fardo concreto. Se Seu Jorge tivesse ficado na favela até hoje, tendo que fazer parceria ou com o tráfico ou com a milícia, a esquerda caviar ia adorar, ia repetir que ele não perdeu os laços com sua essência humilde, enquanto, na prática, ele estaria prejudicando sua família e agredindo sua ética.

Em Los Angeles ele não precisa de nada disso. Pode oferecer uma qualidade de vida bem melhor para as filhas, pode dormir em paz, sair com tranquilidade, e não tem que contemporizar com bandido para fazer seus shows. E isso é condenado por aqueles que vivem no Leblon ou no Jardins, gente que vai para Paris ou Nova York todo ano, mas adora odiar os Estados Unidos, e “ama” as favelas, de preferência bem de longe, vendo-as como uma simples abstração, enquanto os favelados são apenas mascotes para alimentar sua vaidade fruto da autoimagem de abnegados e altruístas. Para esses “psicólogos sakamotianos“, Seu Jorge quer apenas o gozo da inveja alheia. Não é mole não!

Rodrigo Constantino

O melhor do Brasil em muitas décadas

Em relação ao que aconteceu e ao que não aconteceu no dia 27 de maio, firmo algumas certezas. Se três índios tivessem saído de Manaus a pé para Brasília, levando postulações ao Congresso, haveria forte mobilização da mídia nacional e internacional, repercutindo imagens e reivindicações. Se o senhor João Pedro Stédile, ou o frei Betto, fizessem algo parecido, as grandes emissoras de tevê acompanhariam passo a passo a peregrinação e os delírios revolucionários dos romeiros. Utopias são assim, quanto mais trágicas, maior a sedução e maior o número de adeptos. Vá entender!


Segunda certeza. Há uma deliberada intenção de dificultar, por todos os modos possíveis, o surgimento de lideranças jovens, cujas posições, no quadrante das ideologias, se situam do centro para a direita. Para quem estava acostumado a emprenhar a juventude brasileira pelos ouvidos e, depois, levá-la pelo nariz a colaborar com os objetivos do petismo e da esquerda, é intolerável o surgimento de núcleos de contestação e reação. De onde saiu essa moçada que se vai transformando em força política?

Isso não estava previsto. Não fazia parte do projeto. Gilberto Carvalho, então chefe de gabinete da presidente Dilma, confessou lisamente sua surpresa com o “surgimento de uma direita organizada e mobilizada”. Tal reconhecimento foi feito durante uma reunião com a turma de comunicação dos movimentos sociais, promovida para salvar o decreto dos sovietes de afogamento na onda de rejeição que contra ele se formara.

O projeto de construção da hegemonia petista precisou, então, ser revisto e as providências estão sendo tomadas. A primeira cuida de confinar esses jovens ao ambiente virtual onde teve início sua organização. É preciso transformá-lo em gueto e fazer com que dele não saiam. A segunda é desqualificar todos os grupos convertendo seus méritos em motivo de reprovação. Afinal, qual país do mundo precisa de jovens liberais ou de jovens conservadores? O bom para a hegemonia esquerdista é a militância comunista, coletivista, estatizante, castrista, guevarista, chavista, que tem o dom de destruir todas as economias e todas as sociedades em cuja teia envolve.

Os meios usuais de desqualificação não se aplicam ao caso. Não é possível identificar esses jovens com qualquer governo. Os pais deles eram crianças em 1964. Eles próprios sequer haviam nascido ao tempo da redemocratização. Nada há para agravá-los exceto o que são: liberais e/ou conservadores. Assim, esses inegáveis méritos são atacados por quem não tem mérito algum. Muitos dos que se integram à tentativa de jogar no ostracismo essa moçada brilhante – o que de melhor aconteceu ao país nas últimas décadas! - já abandonaram por desilusão moral o barco onde vinham. Já não defendem o indefensável (como fizeram por tanto tempo), mas não perceberam ainda que o problema não está no partido tal ou qual, no líder tal ou qual, mas na ideia. O que aconteceu no Brasil foi o processo natural de amadurecimento e apodrecimento de uma fruta que cairá pelo peso da gravidade. Quem quiser um Brasil melhor terá que mudar a natureza das ideias que planta.

Saibam os jovens que me leem: vocês não têm com o que se decepcionar. Vocês mobilizam a esperança de milhões de brasileiros que, como eu, não souberam fazer o que vocês estão fazendo. Vocês estão enfrentando a malícia e a perversidade das forças do mal. “Sede, pois, prudentes como as pombas e espertos como as serpentes”.

 Percival Puggina