quarta-feira, 6 de agosto de 2025

Pensamento do Dia

 


'Por quanto tempo mais ficaremos parados?'


Estou na França, em Toulon,
Visitando minha filha, o verão está chegando.
O mar é quente, a luz é dourada,
Meu neto ri — estou envelhecendo.
Subimos as colinas, ainda através de aldeias,
Uma fonte canta, nós bebemos até nos fartar.
Pão e queijo sob as árvores,
Caprice des Dieux e a brisa do oceano.

Naquela noite eu acordo antes do dia,
A casa dorme, meus pensamentos não param.
Um jornal na língua de um estranho —
Números de jovens assassinados.
Gráficos e tabelas, nomes apagados,
Crianças perdidas e mães perseguidas.
Eu vi os pedágios de 48 —
A contagem sobe alto, o mundo espera.

Por quanto tempo mais ficaremos parados?
Quanto silêncio é preciso para matar?
Enquanto eu como queijo na Provença,
Uma criança morre com os lábios secos, sem nunca ter tido uma chance.
Por quanto tempo mais teremos que fingir
Que o conforto é a paz e o silêncio um amigo?
Quanto tempo mais?
Quanto tempo mais?

Ela mora no mesmo mar azul,
Mas ela não pode ir embora, ela não pode ser livre.
Nenhum barco para Gaza, nenhum socorro,
Sem pão, sem água, apenas tristeza.
Eu tenho tudo, ela não tem nada —
O céu acima, um sol escaldante.
Quando tudo se vai, a morte preenche o espaço,
Com a mão da fome, com o abraço da guerra.

Eles sabem — os ministros e os homens,
Aqueles que juram “Nunca mais”.
Eles sabem que não é “muito complexo para ver”,
Mas genocídio se desenrolando em uma tela.
Ainda falam de “equilíbrio”,
De “sombras” e “diplomacia”.
Mas o silêncio é uma escolha,
E o silêncio é uma arma.

Por quanto tempo mais ficaremos parados?
Quanto silêncio é preciso para matar?
Enquanto eu como queijo na Provença,
Uma criança morre com os lábios secos, sem nunca ter tido uma chance.
Por quanto tempo mais teremos que fingir
Que o conforto é a paz e o silêncio um amigo?
Quanto tempo mais?
Quanto tempo mais?

Isto não é 1942,
Não Ruanda, não é notícia velha.
Isto é agora — enquanto as flores desabrocham,
O jantar é servido em uma sala silenciosa.
Vejo meu neto perseguindo a luz,
E saiba que uma criança morreu em Gaza ontem à noite.
Uma risada terminou antes de começar —
Um nome apagado pelas mãos de um soldado.

Por quanto tempo mais ficaremos parados?
Quanto silêncio é preciso para matar?
Enquanto rolamos, bebemos e dormimos,
As sepulturas crescem, as feridas são profundas.
Não somos inocentes — não mais.
Cada boca calada, cada porta que se fecha.
Quanto tempo mais?
Quanto tempo mais?

Por que o bolsonarismo voltou às ruas?

Ao que tudo indica, o bolsonarismo voltou às ruas. Já não se veem as multidões impressionantes de 2016 a 2020, tampouco as mobilizações alcançam a escala nacional dos tempos gloriosos do movimento —mas cumprem bem a função que o consórcio Bolsonaros-Malafaia lhes designou.

Em uma época em que a presença digital e a política institucional são, de longe, mais efetivas do que 30 ou 40 mil pessoas aglomeradas ao redor de um carro de som, "as ruas" passaram a ter valor sobretudo simbólico e psicológico.

A nova extrema direita aprendeu com a esquerda tradicional, igualmente populista, que "ocupar as ruas" com multidões mobilizadas confere a qualquer causa um selo de legitimidade que a política institucional raramente alcança. Nesse sentido, 50 mil pessoas reunidas num domingo teriam mais valor simbólico como expressão da soberania popular do que os 513 deputados eleitos e os 120 milhões de votos depositados nas urnas.


Reunir uma multidão é enviar uma mensagem: se querem saber o que o povo quer, eis aqui o povo manifestando sua vontade. Com isso, o populismo de direita derrota a esquerda no seu próprio jogo, já que esta, que antes dominava nitidamente as praças, já não consegue, como antes, levar multidões significativas às ruas —salvo em ocasiões excepcionais. E é aí que entra o segundo ponto de interesse da extrema direita nas manifestações de rua: se é legitimidade o que está em jogo nesse exibicionismo, tamanho é documento, sim —e "as nossas manifestações são maiores do que as suas".

O que explica, naturalmente, o despeito que os exibicionistas de multidões costumam nutrir pelo "povo da USP" —o Monitor do Debate Político, liderado por Pablo Ortellado—, que introduziu critérios rigorosos e transparentes para estimar o número real de participantes em atos públicos, retirando do jogo de interesses a prerrogativa de inflar livremente o tamanho das massas mobilizadas.

Durante anos, foi fácil esticar os números até a escala assombrosa das centenas de milhares —ou mesmo do milhão—, até que os cientistas "encolhedores de multidões" estragaram a brincadeira e lembraram que política não se faz (só) com hipérbole.

Mas a questão não é apenas por que o bolsonarismo aprecia exibir grandes multidões, e sim por que elas voltaram a se reunir com mais frequência. A resposta está em outra função desses protestos: seu papel na reafirmação identitária e na compactação ideológica do grupo. Ao ocupar as ruas, o movimento mede seu próprio tamanho, reativa laços de pertencimento e renova a convicção de que ainda tem força.

Pessoas se dispõem a sair de casa e protestar quando se identificam fortemente com os outros manifestantes, acreditam que um valor essencial ou a sobrevivência do grupo está em risco ou sentem urgência diante de uma ameaça. Todas essas condições estão presentes para os bolsonaristas, desde que as narrativas sobre "a ditadura de Alexandre de Moraes" e a perseguição injusta a Bolsonaro foram plenamente incorporadas pelo movimento. As manifestações são, então, atos de autodefesa tribal, de sobrevivência da própria identidade.

É o "ninguém larga a mão de ninguém" de um grupo que faz da vitimização a principal estratégia de coesão e mobilização. Poucas coisas são tão eficazes para reforçar uma identidade e produzir o senso de "ou nos juntamos ou estamos perdidos" do que a convicção de estar cercado, ameaçado e sob ataque.

Nisso, o consórcio Bolsonaros-Malafaia é especialmente eficaz. Sabe que o bolsonarismo se move por medo e indignação, sentimentos que precisam de um bicho-papão para serem suscitados. Se o antipetismo perdeu apelo político, ou ficou menor que o antibolsonarismo — como comprova o fato de Lula ter sido reeleito em 2022 —, o novo monstro que frequenta os pesadelos é Alexandre de Moraes.

Se a Lula se odiava por corrupto, a Alexandre se odeia por ditador. Sem sombra de dúvida, o antialexandrismo é o antipetismo desta estação, assim como o sentimento anti-STF é a nova versão da antipolítica que protagonizou a eleição de 2018. Assistimos, em tempo real, ao bolsonarismo reciclando um mobilizador de fúria política e fabricando coletivamente a cola que une sua militância — ingredientes essenciais para pôr, mais uma vez, multidões indignadas nas ruas.

Eis por que a massa bolsonarista se agita, nas ruas e nas redes, para defender o que as narrativas do movimento garantem estar sob ataque: sua própria existência enquanto movimento político e moral. A ameaça, como convém, tem nome e rosto: o juiz-ditador, o monstro desta estação.

Ofensivas de Trump apenas vulgarizam o que as big tech já fazem desde sempre

É 2012 e pesquisadores do Facebook realizam experimento de manipulação psicológica com algoritmos e chocam-se ao perceberem que esqueceram que a plataforma foi criada para ranquear estudantes de forma misógina. É 2015: pesquisadoras identificam que recursos do Facebook ocultaram mobilizações do Black Lives Matter. É 2017: massacres em Myanmar levam à fuga de centenas de milhares – Anistia Internacional aponta papel da promoção algorítmica do ódio. É 2018, o escândalo da Cambridge Analytica reforça o poderio das big tech em influenciar eleições. É 2021, funcionários da Google e Amazon protestam contra o Projeto Nimbus, que oferece IA e infraestrutura digital ao apartheid israelense. É 2025: ferramenta Grok exalta Hitler no X, antigo Twitter. Caso relembra o célebre Tay Bot da Microsoft, que fez o mesmo no Twitter em 2016.

É janeiro de 2025: Mark Zuckerberg (Meta), Sam Altman (OpenIA), Elon Musk (X), Sundar Pichai (Google), Jeff Bezos (Amazon) e Peter Thiel (Palantir) participam da posse de Donald Trump, costuram novos contratos e abandonam compromissos de fachada – nunca realmente cumpridos – ligados à sustentabilidade, diversidade e transparência. No Brasil, a Advocacia Geral da União realiza audiência pública em reação à repentina mudança de termos de uso das plataformas. As empresas não enviam representantes.


Junho de 2025. Brasil lança, com pouca escuta da sociedade civil, versão atualizada “Plano Brasileiro de Inteligência Artificial” que inclui diversas menções positivas a empresas como OpenIA e, apesar de incluir menções à “redução da dependência externa”, as ações e investimentos são eclipsados pela enormidade de gastos que o país tem com as big tech. Só em 2024, foram R$ 10 bilhões gastos em ferramentas, softwares e serviços de nuvem que, ainda, vulnerabilizam dados de brasileiros. Pouco antes, o ministro da Fazenda se reuniu com representantes da Amazon e da Nvidia para levar um plano de incentivos fiscais para construção de data centers no Brasil. Brasileiros ainda não conhecem as condições do plano.

Chegamos a agosto de 2025 e a vulgaridade das ofensivas de Trump tem parceiros e beneficiários muito evidentes. Em declaração cheia de desinformação, a Casa Branca afirmou que a motivação para taxar desproporcionalmente o Brasil inclui as supostas ações do país para “tiranicamente e arbitrariamente coagir empresas dos EUA a censurar discurso político, desplataformizar usuários, entregar dados sensíveis ou mudar suas políticas de moderação”. 

O Brasil sofre de síndrome de Estocolmo com as big tech – o triste fenômeno psicológico quando vítimas de sequestro ou abuso desenvolvem sentimentos positivos e de dependência com seus agressores. As evidências do papel das big tech e capital financeiro sedento por usar tecnologias digitais e IA para aprofundar explorações parecem ser ignoradas por políticas públicas, ao mesmo tempo que a sociedade civil organizada não consegue espaço para participar – ou ao menos ter acesso a informações que deveriam ser transparentes.

As más decisões do Estado brasileiro sobre as big tech não acontecem num vácuo. Tais empresas são muito mais sofisticadas para incidir politicamente que a expressão mais agressiva do trumpismo deixa transparecer. Parte expressiva do Congresso Nacional brasileiro tem sido capturada pela influência dessas corporações, que contam com acesso privilegiado aos espaços decisórios e conseguem pautar a agenda legislativa em favor de seus interesses.

O abuso de poder econômico de grupos como Meta, Alphabet e Microsoft se manifesta não só na pressão sobre parlamentares, mas também na influência exercida sobre outros atores no campo da governança das tecnologias digitais. O investimento das big tech em think tanks, grupos de pesquisa em universidades privadas, conferências de privacidade de dados e outros espaços de debate sobre tecnologia criam um ambiente de promoção da ignorância e esquecimento sobre o histórico e o presente antidemocrático das big tech e o que representam.

Nesse contexto, o avanço da regulamentação das plataformas de redes sociais no Brasil, muitas vezes alardeado como censura prévia, aparece atravessado pelo lobby e pressão do setor privado, escancarando como seu poder se infiltra nas instituições e corrói a capacidade de defesa de um processo democrático efetivo.

Os impactos negativos da ofensiva de Trump a tantos setores brasileiros diferentes e os decorrentes benefícios de apoio ao governo federal na opinião pública, assim como a fragilização da confiança nos Estados Unidos, abrem uma janela de oportunidade ímpar. Agentes públicos, sociedade civil e pesquisadores acadêmicos, assim como o empresariado nacional responsável, podem tomar melhores decisões que reconheçam que o problema vai muito além de Trump – e que precisamos de um imaginário tecnológico de futuro que inclua soberania digital de forma significativa.

A marcha da insensaz

Não bastassem os cenários apocalíticos, cada vez mais frequentes, as erupções vulcânicas, os terremotos, tsunamis, inundações, o covid deixando para trás marcas de destruições catastróficas, os homens, mesmo assim, insistem em fazer guerra. É a "marcha da insensatez” de um grupo de meia dúzia de líderes empoderados pelas próprias ambições. Essa vaidade pessoal, transferida para os Estados Nacionais, extingue vagarosamente a vida no Planeta. Desorganiza países, economias, cidades, promove a morte de populações inteiras, fecham escolas, hospitais, explodem pontes e destroem terras agrícolas. Diante da dimensão que essas coisas estão tomando, perguntaria, se haverá tempo para um novo Plano Marsall, destinado a recuperação agora da Ucrânia, da Rússia, de Gaza, da Síria, do Líbano, do Iêmem, de Israel mesmo e até para uma reorganização do mundo.

Tem-se de admitir que esta geração política do Planeta é representada por lideranças paranóicas. Até fevereiro deste ano, a aventura de invadir a Ucrânia teria custado aos russos US$ 211 bilhões de suas reservas, de acordo com estimativas do Pentágono, já que a Rússia se recusa a tornar público este tipo de informação . Para os ucranianos, em fevereiro, os gastos aproximavam-se de US$ 320 bilhões. Mas eles receberam perto de US$ 100 bilhões de ajuda externa do mundo ao seu redor (Instituto Kiel da Economia Mundial). A Ucrânia mesmo teria investido em sua defesa entre US$ 150 a 200 bilhões.


No Oriente Médio, a guerra de Israel contra o Hamas, já levou a perdas físicas globais, projetadas para próximo de US$ 600 bilhões, incluindo a Síria, o Irã, o Líbano e o Iêmen, que vinham abrigando as guerrilhas revolucionárias do Hezbolah, do Hamas, dos Houtís, e outros grupos radicais clandestinos . Tiveram bombardeados campos de petróleo, fábricas e depósitos de armas. O Irã perdeu ainda unidades de geração de energia nuclear. Mas, a salvação da região está ainda no óleo combustível cru extraído.

Esta, contudo, não é ainda a guerra dos sonhos de Vladimir Putin - há 20 anos tentando expandir-se para territórios dos vizinhos. Da mesma forma, de Ali Kameini, Líder religioso Supremo do Irã que, sem muito sucesso, parece ter pretendido contaminar hegemonicamente o Oriente Médio. O mesmo se pode dizer de Kim Jong-un, da Coréia do Norte, que tem feito demonstrações de Poder para os países que estão à sua volta. Não teve, entretanto, coragem de testar sua capacidade militar com a Coréia do Sul e com o Japão. Nas primeiras tentativas de entrar na briga contra a Ucrânia, Kim perdeu em batalha a maioria dos seus homens e armamentos.

A impressão que se tem é que os líderes das superpotências parecem estar se aproveitando desses conflitos para treinar seus exércitos, assegurar prestígio no cenário político internacional e fazer testes com artefatos militares de última geração. Esta guerra está sendo travada, sobretudo, com foguetes de longa distância e famílias de “drones" que, projetados no espaço, se autodirigem, rastreaiam o inimigo, fotografam e lançam bombas. Apesar de voarem solitários, sem pilotos, os drones contabilizam a morte de mais de um milhão de combatentes e civis, conforme a OTAN- Organização do Atlântico Norte.

Os "senhores da guerra" tem dificuldade ainda de realizar seus sonhos paranoicos de uma "guerra total", esforçando-se em vão para atrair potencias ambíguas como a China e os Estados Unidos, bem como todos os 49 países europeus para conflitos bélicos que eles inventaram. O balanço das perdas físicas que essas guerras insanas estão provocando é dramático: crianças, idosos e mulheres, fugindo, como refugiados, desabrigados pelo mundo.

Essa geração de líderes surgidos na década de 50 eram infantes ou nem haviam nascidos quando ocorreu a Segunda Guerra Mundial, provocada por Hitler na expectativa de expandir território alemão e Poder pessoal. A aventura teria custado só para a Alemanha US$ 7,1 trilhões, para o Japão, 4,1 trilhões e para a Itália, 2, 5 trilhões. Perdida a guerra os alemães tiveram de indenizar países, vilas e pessoas , incluindo uma soma inicial de 20 bilhões de dólares o que fez em máquinas, matrizes tecnólogicas e fábricas. Morreram mais de 80 milhões de cidadãos. Até hoje os gregos cobram dos alemães indenizações pelos danos. Os cientistas alemães foram redistribuídos entre a Rússia e os Estados Unidos.

A França estimou o montante de suas perdas a três vezes o PIB nacional. A Bélgica e os Países Baixos sofreram danos em proporções semelhantes. A destruição física alcançou 40% das 49 das maiores cidades alemãs e 39% das habitações familiares, seguida de pilhagens retaliatórias de dimensões incalculáveis. As maiores cidades europeias registraram danos urbanos entre 20% a 30 % incluindo escolas, hospitais, universidades, os distritos comerciais centrais, e sistemas de transportes foram interrompidos. Locomotivas, vagões, barcaças, ônibus e até carros particulares foram confiscados. Pontes, estações ferroviários, aeroportos sofreram danos graves. A agricultura em todos os países ocupados teve destruídos milhões de hectares de terras de cultivo. Animais, fazendas, máquinas agrícolas, fertilizantes e mão de obra desapareceram. O abuso contra mulheres e crianças atingiu limites impensáveis.

Na Europa Oriental, a devastação foi ainda mais grave. A Polônia relatou que 30% de seus edifícios foram destruídos, bem como 60% de suas escolas, instituições científicas e instalações da administração pública; 30 a 35% de suas propriedades agrícolas e 32% de suas minas, sistemas de energia e indústrias foram danificados . A Iugoslávia teve destruídas 20,7% de suas moradias . Nos campos de batalha a Ucrânia e Rússia passaram por uma a destruição devastadora.

O mundo não merece isso. Viver é um privilégio. Passa-me pela cabeça que, de uma maneira geral, quem opta pela carreira política tem algum problema de adaptação aos modelos sociais e de trabalho vigentes ou tem dupla personalidade. Poucos resistiriam a testes psicológicos sérios. Recordo do meu amigo, Laerte Rimoli, segundo o qual estamos diante de uma hegemônica “Marcha da Insensatez". Não tivemos ainda ataques nucleares, mas já se fala em mísseis` lançados contra usinas nucleares espalhadas pelos territórios. Nelas se processa o urânio e produz-se o plutônio. Perguntas que não querem calar: Depois dessas guerras, haverá algo a ser recuperado por um novo Plano Marshall? Desta vez, com a inflação acusando picos e os correntistas bancários batendo às portas dos bancos russos, será que o Kremlim concordaria?

'Nós não temos um rei — temos um presidente'

Mais de 2300 nomes filiados ao Sindicato dos Roteiristas dos Estados Unidos (o Writers Guild of America) assinaram uma carta aberta denunciando "ataque autoritário sem precedentes” do presidente Donald Trump e seu governo. Entre os signatários estão nomes como Spike Lee, Adam McKay, Ilana Glazer, Mike Schur, Liz Merriwether e Tony Gilroy.

Segundo a revista Variety, o documento cita os “processos infundados” movidos pelo presidente norte-americano contra empresas de mídia que publicaram reportagens que o desagradaram" e que ele transformou em "acordos financeiros”, como o caso da Paramount, que pagou US$ 16 milhões a Trump para encerrar “um processo sem mérito” contra o programa "60 Minutes".

Os roteiristas também destacam que Trump “retaliou contra publicações que fizeram reportagens sobre a Casa Branca e ameaçou as licenças de emissoras”, além de pedir repetidamente o cancelamento de programas, noticiosos ou de entretenimento, que o criticam. Eis o texto:

Somos membros do Sindicato dos Roteiristas dos Estados Unidos (Writers Guild of America) que falam com uma só voz para denunciar os perigosos e crescentes ataques à Primeira Emenda, à mídia independente e à imprensa livre.

Somos um sindicato de roteiristas de cinema, televisão e jornalistas, construído e sustentado sobre a crença fundamental de que narrativas ousadas, comédias destemidas e reportagens firmes são indispensáveis para uma sociedade livre e democrática. Sempre soubemos que a fidelidade a esses princípios poderia nos tornar alvo de ataques — vindos de nossos empregadores, de interesses corporativos ou mesmo de políticos. Ainda assim, sempre compreendemos nosso papel em uma democracia saudável.

Agora, enfrentamos um ataque autoritário sem precedentes. Só nos últimos meses, o presidente Trump entrou com processos infundados contra organizações jornalísticas que publicaram reportagens das quais ele não gosta, e os transformou em acordos financeiros — o mais notório deles com a Paramount, que pagou US$ 16 milhões para encerrar um processo sem mérito contra o programa "60 Minutes". Ele retaliou contra publicações que relataram fatos sobre a Casa Branca e ameaçou as licenças de emissoras. Regularmente, pede o cancelamento de programas de notícias e entretenimento que o criticam, como os de fim de noite e, mais recentemente, "The View".

De forma alarmante, grande parte do governo federal agora se uniu a esses ataques. Republicanos no Congresso colaboraram para cortar o financiamento da Corporation for Public Broadcasting, com o objetivo de silenciar a PBS e a NPR. A FCC condicionou abertamente a aprovação da fusão entre a Skydance e a Paramount a garantias de que a CBS faria “mudanças significativas” no suposto viés ideológico de seu jornalismo e de sua programação de entretenimento. O presidente da FCC, Brendan Carr, ecoou as ameaças de Trump.

Ainda assim, a Paramount quer que acreditemos que o cancelamento de "The Late Show with Stephen Colbert" não teve relação com política ou com a aprovação da fusão.

Essas são tentativas antiamericanas de restringir os tipos de histórias e piadas que podem ser contadas, de silenciar a crítica e a dissidência.

Nós não temos um rei — temos um presidente. E o presidente não tem o direito de decidir o que vai ao ar na televisão, nos cinemas, nos palcos, nas nossas estantes ou nas notícias.

Conclamamos nossos representantes eleitos e os líderes da indústria a resistirem a esse abuso de poder. Conclamamos nosso público — cada pessoa disposta a lutar por um futuro livre e democrático — a levantar a voz.

Essa certamente não é a primeira vez que a liberdade de expressão é atacada neste país, mas ela continua sendo um direito nosso porque geração após geração de americanos se dedicou a protegê-la. Agora e sempre, quando escritores são atacados, nosso poder coletivo como sindicato nos permite reagir. Este período da vida americana não durará para sempre — e, quando terminar, o mundo se lembrará de quem teve coragem de se manifestar.