sexta-feira, 23 de setembro de 2016
Por que gritamos tanto?
Vivemos na sociedade do grito. Falamos em voz alta. Gritam os pastores religiosos nos templos; gritam e se insultam os políticos no Congresso; gritam os juízes e promotores: gritam as pessoas nas redes sociais, e gritamos nós, os jornalistas. Apenas as vítimas permanecem em silêncio.
Um excelente artigo de Ana García Moreno sobre o silêncio, neste jornal, me fez refletir sobre o imperativo do grito em nossa sociedade, como se estivéssemos convencidos de que quem levanta mais a voz, e com palavras mais grossas, é quem mais tem razão.
O insulto, tanto o falado como o escrito, é um grito que fere o diálogo. O grito gratuito lançado contra o outro é uma ofensa que revela mais a fraqueza que a força de nossas razões.
O silêncio do diálogo nos assusta porque nos obriga a desnudar nossos preconceitos para ouvir o outro.
A persuasão é feita mais de silêncios que de ruídos.
Um excelente artigo de Ana García Moreno sobre o silêncio, neste jornal, me fez refletir sobre o imperativo do grito em nossa sociedade, como se estivéssemos convencidos de que quem levanta mais a voz, e com palavras mais grossas, é quem mais tem razão.
O insulto, tanto o falado como o escrito, é um grito que fere o diálogo. O grito gratuito lançado contra o outro é uma ofensa que revela mais a fraqueza que a força de nossas razões.
O silêncio do diálogo nos assusta porque nos obriga a desnudar nossos preconceitos para ouvir o outro.
A persuasão é feita mais de silêncios que de ruídos.
Um grito legítimo é o que lançamos sozinhos quando a dor nos aperta ou quando a injustiça nos afoga. É um grito de desespero que não fere já que costuma ser uma pergunta sem resposta.
É o grito que, de acordo com os Evangelhos, Cristo soltou na cruz ao morrer: “Jesus exclamou em alta voz: Meu Deus, por que me desamparaste” (Mateus 27).
Era um grito que chamava para se afogar no silêncio de Deus.
Talvez deveríamos lembrar aquele provérbio chinês, coletado pelo genial escritor argentino Jorge Luis Borges: “Não fale, a menos que possa melhorar o silêncio”.
Hoje falta filosofia e sobra intriga e cálculo político. E a primeira pedra dos templos da filosofia, como já dizia Pitágoras, é o silêncio.
Não se costuma dizer que os rios mais profundos são os que fazem menos barulho? A superficialidade é a que mais levanta a voz hoje.
Deveríamos todos lembrar nas horas em que disputamos para ver quem grita mais, quem insulta mais, quem se destaca como campeão da única verdade, que a razão fica humilhada no tiroteio verbal.
Afinal de contas, essa predileção pelo grito e pelo insulto contra quem pensa diferente, não seria o medo de ouvir a nós mesmos?
Não teremos, no fundo, medo de que a reflexão e a escuta das razões do outro possam nos desnudar, enquanto o ruído, serve como escudo contra nossa própria insegurança?
Quem está convencido de sua verdade não precisa impô-la a socos aos outros. Pode colocá-la sobre a toalha do diálogo, como um banquete para que todos possam desfrutar, sem pretensões de exclusividade.
O grito e o insulto são sempre fascistas. A democracia é construída com o duro exercício do diálogo, que significa a convicção sincera de que ninguém é dono de toda a verdade.
Os dogmas são sempre de cunho autoritário. Evocam intransigência e caça às bruxas. A laicidade, como a ciência, é feita de incertezas, medo de estar errado e desejos de compartilhar as razões dos outros.
Vamos deixar, se for o caso, que gritem os poetas e suas imagens, que são eles que melhor sabem nos revelar a força de certos silêncios.
Todos os outros ruídos nos desumanizam
É o grito que, de acordo com os Evangelhos, Cristo soltou na cruz ao morrer: “Jesus exclamou em alta voz: Meu Deus, por que me desamparaste” (Mateus 27).
Era um grito que chamava para se afogar no silêncio de Deus.
Talvez deveríamos lembrar aquele provérbio chinês, coletado pelo genial escritor argentino Jorge Luis Borges: “Não fale, a menos que possa melhorar o silêncio”.
Hoje falta filosofia e sobra intriga e cálculo político. E a primeira pedra dos templos da filosofia, como já dizia Pitágoras, é o silêncio.
Não se costuma dizer que os rios mais profundos são os que fazem menos barulho? A superficialidade é a que mais levanta a voz hoje.
Deveríamos todos lembrar nas horas em que disputamos para ver quem grita mais, quem insulta mais, quem se destaca como campeão da única verdade, que a razão fica humilhada no tiroteio verbal.
Afinal de contas, essa predileção pelo grito e pelo insulto contra quem pensa diferente, não seria o medo de ouvir a nós mesmos?
Não teremos, no fundo, medo de que a reflexão e a escuta das razões do outro possam nos desnudar, enquanto o ruído, serve como escudo contra nossa própria insegurança?
Quem está convencido de sua verdade não precisa impô-la a socos aos outros. Pode colocá-la sobre a toalha do diálogo, como um banquete para que todos possam desfrutar, sem pretensões de exclusividade.
O grito e o insulto são sempre fascistas. A democracia é construída com o duro exercício do diálogo, que significa a convicção sincera de que ninguém é dono de toda a verdade.
Os dogmas são sempre de cunho autoritário. Evocam intransigência e caça às bruxas. A laicidade, como a ciência, é feita de incertezas, medo de estar errado e desejos de compartilhar as razões dos outros.
Vamos deixar, se for o caso, que gritem os poetas e suas imagens, que são eles que melhor sabem nos revelar a força de certos silêncios.
Todos os outros ruídos nos desumanizam
Todos são iguais perante a lei. Menos a maioria
Ou havia fortes motivos para prender temporariamente o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega ou não havia. Se havia ele não deveria ter sido solto. Se não havia, não deveria ter sido preso. Simples assim.
O juiz Sérgio Moro mandou prender e depois soltou Mantega porque ele estava em um hospital de São Paulo acompanhando sua mulher, preste a ser operada. Moro alegou tratar-se de “questão humanitária”.
Foi isso ou Moro, espertamente, quis esvaziar o discurso do PT de que cometera uma barbaridade prendendo um homem no momento em que sua mulher mais precisava dele? Foi mais político do que juiz?
Questão humanitária não pesou na hora em que José Genoíno, ex-presidente do PT, foi trancado em uma cela da Papuda, penitenciária de Brasília, apesar de seu estado clínico exigir severos cuidados.
O empresário José Carlos Bumlai foi solto outro dia depois que se descobriu que sofria de câncer. Pois um dia desses voltou a ser preso apesar do câncer.
Está para se conhecer a história do procurado pela polícia que escapou de ser preso porque sua mulher, paciente do SUS, ia começar a ser operada. Ou todos são iguais perante a lei ou não são.
Aqui, mas não só, e com uma frequência abusiva, fica demonstrado que poucos são iguais perante a lei. O rigor da lei aplica-se aos mais fracos, aos desorganizados, aos sem voz. Ou seja: à maioria anônima do povo.
A distância entre o andar de cima e o de baixo é muito mais abissal do que sugere de pronto a imagem. Vozes famosas exprimiram seu horror com a situação vivida por Mantega.
“Foi uma violência”, decretou o ex-ministro Delfim Netto, que ontem tinha um almoço marcado com seu colega. “Foi constrangedor para todos”, disparou Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal.
Voz alguma comentou o motivo pelo qual Mantega foi preso durante quatro horas. Ele é acusado de ter pedido R$ 5 milhões ao empresário Eike Batista para pagar dívidas do PT contraídas nas eleições de 2010.
O mais longevo ministro da Fazenda da história do Brasil, o responsável, em parte, pela ruína da economia, foi também aquele que usou o poder do seu cargo para tomar dinheiro de empresário.
Tenho a impressão de que isso é mais triste e mais grave do que o fato de agentes federais terem prendido Mantega na porta de um hospital.
O juiz Sérgio Moro mandou prender e depois soltou Mantega porque ele estava em um hospital de São Paulo acompanhando sua mulher, preste a ser operada. Moro alegou tratar-se de “questão humanitária”.
Foi isso ou Moro, espertamente, quis esvaziar o discurso do PT de que cometera uma barbaridade prendendo um homem no momento em que sua mulher mais precisava dele? Foi mais político do que juiz?
Questão humanitária não pesou na hora em que José Genoíno, ex-presidente do PT, foi trancado em uma cela da Papuda, penitenciária de Brasília, apesar de seu estado clínico exigir severos cuidados.
O empresário José Carlos Bumlai foi solto outro dia depois que se descobriu que sofria de câncer. Pois um dia desses voltou a ser preso apesar do câncer.
Está para se conhecer a história do procurado pela polícia que escapou de ser preso porque sua mulher, paciente do SUS, ia começar a ser operada. Ou todos são iguais perante a lei ou não são.
A distância entre o andar de cima e o de baixo é muito mais abissal do que sugere de pronto a imagem. Vozes famosas exprimiram seu horror com a situação vivida por Mantega.
“Foi uma violência”, decretou o ex-ministro Delfim Netto, que ontem tinha um almoço marcado com seu colega. “Foi constrangedor para todos”, disparou Gilmar Mendes, ministro do Supremo Tribunal Federal.
Voz alguma comentou o motivo pelo qual Mantega foi preso durante quatro horas. Ele é acusado de ter pedido R$ 5 milhões ao empresário Eike Batista para pagar dívidas do PT contraídas nas eleições de 2010.
O mais longevo ministro da Fazenda da história do Brasil, o responsável, em parte, pela ruína da economia, foi também aquele que usou o poder do seu cargo para tomar dinheiro de empresário.
Tenho a impressão de que isso é mais triste e mais grave do que o fato de agentes federais terem prendido Mantega na porta de um hospital.
O tamanho da podridão
A prisão do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, ainda que apenas por algumas horas, significa que o escândalo da Petrobrás alcançará mais gente e gente muito mais graúda do que os notórios operadores do PT que hoje amargam a prisão. Já se sabia que o propinoduto que ligou a máquina do Estado aos cofres do PT era o pilar de um método de governo, sendo o ex-presidente Lula o “chefe supremo” do esquema de corrupção, como autoridades já denunciaram. Mas as suspeitas que recaem sobre Mantega, se comprovadas, mostrariam a extensão do contágio por grande parte do primeiro escalão da administração, passando o próprio governo a ser visto como uma organização criminosa.
Mais longevo ministro da Fazenda da história brasileira, Mantega tornou-se, ao lado da presidente cassada Dilma Rousseff, o grande símbolo do jeito petista de governar. Enquanto Dilma, em seu dialeto peculiar, agredia a realidade de sua desastrosa administração com frases desconexas, Mantega, sempre com ar professoral, tratava de insultar a inteligência alheia com dados sem sustentação e retórica vazia para comprovar o acerto da famigerada “nova matriz econômica” – aquela que quase quebrou o Brasil. O ministro da Fazenda era a face mais conhecida da impostura do PT na condução da economia, um obediente executor das fantasias nacional-desenvolvimentistas de Dilma. Nada, porém, indicava que ele tivesse feito uso de seu cargo e de seu poder para fazer algo além de destruir as finanças do País.
Tudo isso mudou ontem. O juiz Sergio Moro aceitou pedido do Ministério Público Federal para que Mantega fosse preso, sob acusação de que o petista, em novembro de 2012, quando era ministro, solicitou ao empresário Eike Batista recursos para o pagamento de dívidas de campanha do PT. A informação foi prestada pelo próprio Eike em depoimento ao Ministério Público em maio passado.
Em 2012, o Grupo OSX, de Eike, integrava um consórcio que havia obtido um contrato de US$ 922 milhões com a Petrobrás para a construção de plataformas. Suspeita-se de que Mantega tenha pedido a propina como compensação por esse contrato. Sem experiência na área, o consórcio contemplado não conseguiu entregar as plataformas.
Em seu depoimento, Eike disse que Mantega solicitou R$ 5 milhões para o PT. O dinheiro, depositado no exterior, foi entregue por meio de falsa prestação de serviços pela empresa de João Santana, o marqueteiro do PT. Para Eike, não estava claro que se tratava de uma contrapartida por seu contrato com a Petrobrás, mas não é preciso grande perspicácia para desconfiar dos reais motivos de Mantega – afinal, como disse Eike, “o ministro da Fazenda me pediu, o que é que você faz?”. Além de ministro da Fazenda, Mantega era presidente do Conselho de Administração da Petrobrás.
Eike e Mantega, segundo o depoimento do empresário, trataram a propina como “doação eleitoral”. Em seu despacho, Moro lembra que não cabe a um ministro de Estado “solicitar doações eleitorais ao partido do governo, ainda mais doações sub-reptícias”, feitas “através de contas secretas mantidas no exterior e com simulação de contratos de prestação de serviço, meio bem mais sofisticado do que o usual mesmo para uma doação eleitoral não contabilizada”.
Para Moro, está clara a “similaridade com o modus operandi verificado no esquema criminoso da Petrobrás”. Eis o que realmente importa a essa altura. São muitas as evidências de que o grande sistema de corrupção implantado pelos petistas pode ter tido entre seus operadores o mais importante ministro de Estado tanto de Lula como de Dilma. Terá sobrado um canto que seja de seus governos que não tenha sido conspurcado?
É claro que os petistas, sem ter como defender o ex-ministro, apelam à já tradicional vitimização, pois Mantega foi detido quando estava num hospital acompanhando a mulher, que se tratava. Ao decidir revogar a prisão – pedida porque, segundo os procuradores, havia risco de destruição de provas –, Moro disse que ele, os policiais e o Ministério Público desconheciam a situação familiar do ex-ministro. Mas Lula, sempre ele, já andou dizendo que a prisão de Mantega prova que “qualquer tese de humanitarismo foi jogada no lixo”. Sobre a grave acusação que pesa sobre o ex-ministro, nem um pio.
Mais longevo ministro da Fazenda da história brasileira, Mantega tornou-se, ao lado da presidente cassada Dilma Rousseff, o grande símbolo do jeito petista de governar. Enquanto Dilma, em seu dialeto peculiar, agredia a realidade de sua desastrosa administração com frases desconexas, Mantega, sempre com ar professoral, tratava de insultar a inteligência alheia com dados sem sustentação e retórica vazia para comprovar o acerto da famigerada “nova matriz econômica” – aquela que quase quebrou o Brasil. O ministro da Fazenda era a face mais conhecida da impostura do PT na condução da economia, um obediente executor das fantasias nacional-desenvolvimentistas de Dilma. Nada, porém, indicava que ele tivesse feito uso de seu cargo e de seu poder para fazer algo além de destruir as finanças do País.
Em 2012, o Grupo OSX, de Eike, integrava um consórcio que havia obtido um contrato de US$ 922 milhões com a Petrobrás para a construção de plataformas. Suspeita-se de que Mantega tenha pedido a propina como compensação por esse contrato. Sem experiência na área, o consórcio contemplado não conseguiu entregar as plataformas.
Em seu depoimento, Eike disse que Mantega solicitou R$ 5 milhões para o PT. O dinheiro, depositado no exterior, foi entregue por meio de falsa prestação de serviços pela empresa de João Santana, o marqueteiro do PT. Para Eike, não estava claro que se tratava de uma contrapartida por seu contrato com a Petrobrás, mas não é preciso grande perspicácia para desconfiar dos reais motivos de Mantega – afinal, como disse Eike, “o ministro da Fazenda me pediu, o que é que você faz?”. Além de ministro da Fazenda, Mantega era presidente do Conselho de Administração da Petrobrás.
Eike e Mantega, segundo o depoimento do empresário, trataram a propina como “doação eleitoral”. Em seu despacho, Moro lembra que não cabe a um ministro de Estado “solicitar doações eleitorais ao partido do governo, ainda mais doações sub-reptícias”, feitas “através de contas secretas mantidas no exterior e com simulação de contratos de prestação de serviço, meio bem mais sofisticado do que o usual mesmo para uma doação eleitoral não contabilizada”.
Para Moro, está clara a “similaridade com o modus operandi verificado no esquema criminoso da Petrobrás”. Eis o que realmente importa a essa altura. São muitas as evidências de que o grande sistema de corrupção implantado pelos petistas pode ter tido entre seus operadores o mais importante ministro de Estado tanto de Lula como de Dilma. Terá sobrado um canto que seja de seus governos que não tenha sido conspurcado?
É claro que os petistas, sem ter como defender o ex-ministro, apelam à já tradicional vitimização, pois Mantega foi detido quando estava num hospital acompanhando a mulher, que se tratava. Ao decidir revogar a prisão – pedida porque, segundo os procuradores, havia risco de destruição de provas –, Moro disse que ele, os policiais e o Ministério Público desconheciam a situação familiar do ex-ministro. Mas Lula, sempre ele, já andou dizendo que a prisão de Mantega prova que “qualquer tese de humanitarismo foi jogada no lixo”. Sobre a grave acusação que pesa sobre o ex-ministro, nem um pio.
Fogo no canavial
Quando a Câmara dos Deputados tenta votar na surdina uma anistia secreta a todos os parlamentares processados ou condenados por caixa dois, e um ministro de Estado diz que o caixa dois não deve ser criminalizado, e sim discutido sem preconceito, sem patrulha e sem histeria, atingimos um novo patamar de cinismo e de afronta ao eleitorado e à inteligência alheia.
Fraudar o processo eleitoral, corromper a democracia, manipular as escolhas dos cidadãos, levar vantagem ilegal sobre os outros candidatos, lavar dinheiro sujo e criar vínculos criminosos entre empresas e políticos, que os deputados e o ministro Geddel chamam carinhosamente de caixa dois, é um crime muito mais grave do que um roubo individual contra uma empresa ou o Estado, porque rouba direitos de toda a sociedade e pode mudar a história do país. Não há preconceito, patrulha ou histeria que desminta isso.
Ao mesmo tempo, o multidenunciado Renan Calheiros ameaça a independência do Ministério Público e do Judiciário com leis aparentemente justas contra abusos de autoridade, mas que podem ser manipuladas pelos interesses dos políticos ameaçados pela Justiça e virar o jogo. Os primeiros alvos seriam os procuradores e policiais da força-tarefa da Lava-Jato e os juízes: no surrealismo brasileiro, os xerifes serão julgados pelos bandidos.
Numa ação rápida e heroica, um grupo de parlamentares de pequenos partidos de oposição denunciou e fez abortar a conspiração multipartidária da anistia do caixa dois em cima da hora. Mas os que estão sujos na Lava-Jato são brasileiros, não desistem nunca: eles são muitos, andam em bandos e, quando a manada é ameaçada, se unem e são capazes de tudo.
Na Itália, a Operação Mãos Limpas começou a naufragar quando os partidos tradicionais foram destruídos e os políticos desesperados por impunidade votaram leis que limitaram a ação do Judiciário e abriram caminho para leniências e anistias — e para Berlusconi e seus novos corruptos, entre eles, os velhos, em novos partidos. A Itália ficou pior, e a política continuou tão suja como antes da Mãos Limpas.
Enquanto isso, em Brasília...
Nelson Motta
Ao mesmo tempo, o multidenunciado Renan Calheiros ameaça a independência do Ministério Público e do Judiciário com leis aparentemente justas contra abusos de autoridade, mas que podem ser manipuladas pelos interesses dos políticos ameaçados pela Justiça e virar o jogo. Os primeiros alvos seriam os procuradores e policiais da força-tarefa da Lava-Jato e os juízes: no surrealismo brasileiro, os xerifes serão julgados pelos bandidos.
Numa ação rápida e heroica, um grupo de parlamentares de pequenos partidos de oposição denunciou e fez abortar a conspiração multipartidária da anistia do caixa dois em cima da hora. Mas os que estão sujos na Lava-Jato são brasileiros, não desistem nunca: eles são muitos, andam em bandos e, quando a manada é ameaçada, se unem e são capazes de tudo.
Na Itália, a Operação Mãos Limpas começou a naufragar quando os partidos tradicionais foram destruídos e os políticos desesperados por impunidade votaram leis que limitaram a ação do Judiciário e abriram caminho para leniências e anistias — e para Berlusconi e seus novos corruptos, entre eles, os velhos, em novos partidos. A Itália ficou pior, e a política continuou tão suja como antes da Mãos Limpas.
Enquanto isso, em Brasília...
Nelson Motta
Álbum de figuraças
Na quarta-feira última, falei de como uma enciclopédia da corrupção brasileira preencheria uma lacuna no nosso mercado editorial. Sua produção exigiria uma equipe de redatores versados em leis criminais, técnicas contábeis e relações internacionais, mas, até aí, tudo bem. O problema é que, entre o término da preparação dos verbetes e a ida do original para a gráfica, tantos novos tipos de corrupção seriam descobertos que a enciclopédia, por mais ampla, nunca se poderia dizer completa.
Um leitor acaba de sugerir coisa melhor: um álbum de figurinhas – como esses sobre futebol que os garotos colecionam na Copa do Mundo. E nas mesmas condições: o álbum é grátis e as figurinhas, em pacotinhos de cinco, são compradas no jornaleiro. Sua vantagem é que, embora a corrupção sempre se renove, os corruptos tendem a ser os mesmos, entra ano, sai ano, e todos sabemos quais são.
O álbum teria cerca de 400 figurinhas, comportando os políticos, de qualquer partido, que respondam hoje a processo em alguma instância. Se tomarmos por base que o Congresso tem cerca de 300 picaretas — cálculo do então candidato Lula, antes de se aliar a eles na Presidência —, ainda teremos 100 figurinhas para contemplar ex-tesoureiros de partidos, ex-marqueteiros de campanha, ex-diretores de estatais, ex-funcionários de empreiteiras e outros ex, muitos atualmente cumprindo sentença, sem prejuízo dos ainda à solta.
Algumas figurinhas viriam carimbadas, mas só por uma questão de respeito — imagine quais. Outras, aleatoriamente, seriam mais "difíceis" — um Bumlai, por exemplo, valeria pelo menos cinco Dirceus num troca-troca. E virar um Renan num bafo-bafo seria a glória.
Comercialmente falando, o álbum de figurinhas dos corruptos teria tudo para estourar. Até os adultos iriam querer colecionar.
Ruy Castro
Um leitor acaba de sugerir coisa melhor: um álbum de figurinhas – como esses sobre futebol que os garotos colecionam na Copa do Mundo. E nas mesmas condições: o álbum é grátis e as figurinhas, em pacotinhos de cinco, são compradas no jornaleiro. Sua vantagem é que, embora a corrupção sempre se renove, os corruptos tendem a ser os mesmos, entra ano, sai ano, e todos sabemos quais são.
Algumas figurinhas viriam carimbadas, mas só por uma questão de respeito — imagine quais. Outras, aleatoriamente, seriam mais "difíceis" — um Bumlai, por exemplo, valeria pelo menos cinco Dirceus num troca-troca. E virar um Renan num bafo-bafo seria a glória.
Comercialmente falando, o álbum de figurinhas dos corruptos teria tudo para estourar. Até os adultos iriam querer colecionar.
Ruy Castro
A calamidade histórica da educação de base
Inundações, terremotos, deslizamentos, filas de desempregados são calamidades visíveis que assustam, mas, felizmente, duram pouco tempo. Mas há calamidades invisíveis cujos efeitos só são percebidos quando já não há mais tempo para corrigi-las: são calamidades históricas.
Recentemente, foi divulgado o estado de nossa educação de base no ano de 2015, conforme avaliada pelo Índice de Desenvolvimento da Educação de Base (Ideb). A catástrofe não é visível de imediato, mas indica uma tragédia anunciada e duradoura por décadas. A falência do sistema educacional impede de preparar nossas crianças para que elas enfrentem o próprio futuro e para que participem da construção do futuro do país. Há décadas pode-se perceber as consequências desse descaso. Mas, ao não ser visível, não tem sensibilizado o Brasil a dar o necessário cuidado à educação de base.
Os resultados do Ideb mostram estagnação do ensino fundamental em baixíssimas notas – 5,5 e 4,5 – em seus dois níveis e mostram o retrocesso do ensino médio, em pleno século XXI, com a vergonhosa nota 3,7. Por essas notas, o Brasil foi reprovado em 2015. Essa média é ainda mais assustadora se levarmos em conta que metade das crianças brasileiras ficam fora da avaliação por ter abandonado a escola antes do ensino médio – com a nota desse grupo, o Ideb seria muito menor. O Ideb também não reflete plenamente a gravidade de nosso problema educacional, se lembramos que ele não indica a brutal desigualdade na educação de nossas crianças conforme a renda das famílias nem mostra que outros países estão ultrapassando o Brasil, oferecendo melhor educação a suas crianças.
Essa calamidade deveria ser tão visível quanto a seca no Nordeste, a avalanche em Mariana, as filas de desempregados e a falência financeira do Estado brasileiro. Mas nossos governos têm sido cegos para percebê-la. Por isso, nossos presidentes não manifestaram até hoje horror diante dessa tragédia, não declararam calamidade histórica, não indicaram o que deve ser feito para o Brasil enfrentar a maior e mais duradoura de nossas crises.
Bastaria uma política decidida para, ao longo de alguns anos, substituirmos as deficientes escolas estaduais e municipais por escolas federais, cujos Idebs estão se aproximando da nota 7. Esse enfrentamento permitiria superar a crise social e econômica que assola o país.
O abandono da educação, que o Ideb 2015 indica, é uma das causas da crise econômica, que provém sobretudo da baixa produtividade e da irrisória capacidade de inovação; a violência, a corrupção, o populismo, a irresponsabilidade fiscal têm como uma das causas a deseducação geral.
Talvez esta seja a maior de nossas calamidades, que o Ideb tem mostrado ao longo dos últimos anos: os governos descomprometidos com a educação e, por omissão, condenando o futuro de nosso país. Pior é, no lugar de despertarmos, usando o Ideb para corrigir essa calamidade histórica, algum governo tomar a iniciativa de parar de estimar o Ideb, como um médico curando a febre ao quebrar o termômetro.
Os resultados do Ideb mostram estagnação do ensino fundamental em baixíssimas notas – 5,5 e 4,5 – em seus dois níveis e mostram o retrocesso do ensino médio, em pleno século XXI, com a vergonhosa nota 3,7. Por essas notas, o Brasil foi reprovado em 2015. Essa média é ainda mais assustadora se levarmos em conta que metade das crianças brasileiras ficam fora da avaliação por ter abandonado a escola antes do ensino médio – com a nota desse grupo, o Ideb seria muito menor. O Ideb também não reflete plenamente a gravidade de nosso problema educacional, se lembramos que ele não indica a brutal desigualdade na educação de nossas crianças conforme a renda das famílias nem mostra que outros países estão ultrapassando o Brasil, oferecendo melhor educação a suas crianças.
Essa calamidade deveria ser tão visível quanto a seca no Nordeste, a avalanche em Mariana, as filas de desempregados e a falência financeira do Estado brasileiro. Mas nossos governos têm sido cegos para percebê-la. Por isso, nossos presidentes não manifestaram até hoje horror diante dessa tragédia, não declararam calamidade histórica, não indicaram o que deve ser feito para o Brasil enfrentar a maior e mais duradoura de nossas crises.
Bastaria uma política decidida para, ao longo de alguns anos, substituirmos as deficientes escolas estaduais e municipais por escolas federais, cujos Idebs estão se aproximando da nota 7. Esse enfrentamento permitiria superar a crise social e econômica que assola o país.
O abandono da educação, que o Ideb 2015 indica, é uma das causas da crise econômica, que provém sobretudo da baixa produtividade e da irrisória capacidade de inovação; a violência, a corrupção, o populismo, a irresponsabilidade fiscal têm como uma das causas a deseducação geral.
Talvez esta seja a maior de nossas calamidades, que o Ideb tem mostrado ao longo dos últimos anos: os governos descomprometidos com a educação e, por omissão, condenando o futuro de nosso país. Pior é, no lugar de despertarmos, usando o Ideb para corrigir essa calamidade histórica, algum governo tomar a iniciativa de parar de estimar o Ideb, como um médico curando a febre ao quebrar o termômetro.
O neo coronelismo da picaretagem ainda continua
A moralização das eleições no Brasil, apesar alardeada com o fim das contribuições de empresas, ainda está longe. Não é apenas a descarada contribuição de mais de R$ 16 milhões dos beneficiários do Bolsa Família.
No mapa, eleitores podem observar os disparates da relação entre o arrecadado pelos candidatos e o número de eleitores com o que vê em suas ruas nesta época.
As campanhas não ficaram assim tão pobres ainda mais quando há candidaturas da situação. O país continua sofrendo com o poderio econômico de quem tem a caneta na mão. A força da situação, nos municípios médios e pequenos, ainda é avassaladora.
As eleições de outubro não trarão nada de novo como foi tanto apregoado como "festa cívica". Continuará a parecer, entre as médias e pequenas cidades, mais com "arraiá" de aldeia, patrocinado pelos coronéis do continuísmo. As mesmas promessas, os velhacos arranjos e o esbanjamento do dinheiro público que era para amparar a população e passar a jorrar em prol das candidaturas situacionistas.
No mapa, eleitores podem observar os disparates da relação entre o arrecadado pelos candidatos e o número de eleitores com o que vê em suas ruas nesta época.
As campanhas não ficaram assim tão pobres ainda mais quando há candidaturas da situação. O país continua sofrendo com o poderio econômico de quem tem a caneta na mão. A força da situação, nos municípios médios e pequenos, ainda é avassaladora.
Os cofres públicos substituem folgadamente o empresariado para garantir os aberrantes casos de situacionistas já largarem a duas semanas das eleições com a garantia de eleger mais de um terço de vereadores, em suas famigeradas coligações, e o prefeito. Uma derrota clara para a democracia e a grande vitória do coronelismo, principalmente apoiado no cabresto das ações sociais, que viraram mantra.
As eleições de outubro não trarão nada de novo como foi tanto apregoado como "festa cívica". Continuará a parecer, entre as médias e pequenas cidades, mais com "arraiá" de aldeia, patrocinado pelos coronéis do continuísmo. As mesmas promessas, os velhacos arranjos e o esbanjamento do dinheiro público que era para amparar a população e passar a jorrar em prol das candidaturas situacionistas.
Saiu da boca de cena, mas continua nas coxias da maracutaia, o poder do dinheiro para colocar na política aqueles que interessam aos partidos. E para isso não faltam meios muito além de éticos. Afinal o cofre público ainda é a caixinha de surpresas e doces para muito canalha.
Luiz Gadelha
Diga não!
Roubaram até nosso século 18
Lula poderia ter escolhido um fim mais digno.
Olho para o homem que sai vociferando palanques afora melancolia, ressentimento e bravatas e me dou conta do desfecho miserável que terá a personagem inventada pelos sonhos de reparação da esquerda intelectual brasileira.
O retirante pobre, operário de baixa escolaridade e militante sindical que chegou à Presidência da República tinha tudo para ser um exemplo do milagre da democracia. Em vez disso, a sua maior obra, já apontei uma vez nesta coluna, foi ter recuperado a comunhão etimológica entre "política" e "polícia".
De tal maneira fez uso das licenças da democracia para corrompê-la que ninguém se mostra disposto a ouvir nem eventuais restrições procedentes à forma como se dá a merecida persecução penal dos crimes cometidos pelo partido, por seu representante maior e por seus sócios.
Acuado pelos fatos, Lula decidiu reviver a figura do mártir, que, segundo ele mesmo, está sendo perseguido por ter tido a ousadia de tirar os brasileiros do século 18. A fala tem o seu encanto involuntário. O século 18, no Ocidente, costuma ser celebrado como aquele em que o homem redescobriu as Luzes. Em certa medida, o Apedeuta não nos tirou "do" século 18. Ele nos roubou também "o" século 18.
É compreensível que Lula busque tal conforto moral. Ele já não tem mais tempo de se reinventar. Mas não é sem estupefação, embora não me surpreenda, que os, vá lá, ditos "intelectuais de esquerda" se neguem a reconhecer, com o esfacelamento do petismo, o último suspiro da ilusão de que um ente de razão pode, mais do que governar, substituir a sociedade.
Um líder e um partido que estivessem conformados com a democracia nem enxergariam na vitória dos adversários o triunfo de uma conspiração nem numa eventual virada do jogo, se um dia vier, a redenção da verdade e o juízo final. A razão é simples: esse pensamento ou pertence à esfera religiosa, escatológica, ou à cultura revolucionária. E revolução se faz com sangue. Eventualmente, pode-se tentar aniquilar o "inimigo" com mensalão, petrolão e outras corrupções da verdade e da vontade.
Não tivesse se tornado boneco de ventríloquo da esquerda, anunciando velharias cuja exata extensão desconhece, Lula poderia ter sido nosso Lincoln, mas sem desfecho trágico. Em vez disso, tornou-se um zumbi.
DISSONANTE
Escreveu Sergio Moro ao aceitar a denúncia contra Lula: "É durante o trâmite da ação penal que o ex-presidente poderá exercer livremente a sua defesa, assim como será durante ele que caberá à acusação produzir a prova, acima de qualquer dúvida razoável, de suas alegações caso pretenda a condenação. O processo é, portanto, uma oportunidade para ambas as partes".
Sem a última frase, seria apenas uma tautologia. Acrescido o trecho daquele rabicho, aí se está diante de um entendimento torto do que é o direito numa democracia. Caberá sempre ao acusador o ônus da prova. O acusado não tem como produzir prova negativa. Não se trata, pois, de "uma oportunidade para ambas as partes" porque estamos falando de estatutos absolutamente diversos. As palavras fazem sentido, e eu cobro o sentido das palavras. De um petista ou de Moro.
MANTEGA
Prisão e soltura nada têm a ver com Justiça e cumprimento da lei. Chanchada. Força-tarefa e juiz quiseram dar um recado: "Mandamos soltar e prender quando nos der na telha. São todos criminosos". E são. Mas se age como se não houvesse lei. A cereja do bolo é a divulgação do vídeo com Eike Batista. A revelação de um crime serve para lavar uma arbitrariedade. É um mau caminho.
Olho para o homem que sai vociferando palanques afora melancolia, ressentimento e bravatas e me dou conta do desfecho miserável que terá a personagem inventada pelos sonhos de reparação da esquerda intelectual brasileira.
O retirante pobre, operário de baixa escolaridade e militante sindical que chegou à Presidência da República tinha tudo para ser um exemplo do milagre da democracia. Em vez disso, a sua maior obra, já apontei uma vez nesta coluna, foi ter recuperado a comunhão etimológica entre "política" e "polícia".
De tal maneira fez uso das licenças da democracia para corrompê-la que ninguém se mostra disposto a ouvir nem eventuais restrições procedentes à forma como se dá a merecida persecução penal dos crimes cometidos pelo partido, por seu representante maior e por seus sócios.
É compreensível que Lula busque tal conforto moral. Ele já não tem mais tempo de se reinventar. Mas não é sem estupefação, embora não me surpreenda, que os, vá lá, ditos "intelectuais de esquerda" se neguem a reconhecer, com o esfacelamento do petismo, o último suspiro da ilusão de que um ente de razão pode, mais do que governar, substituir a sociedade.
Um líder e um partido que estivessem conformados com a democracia nem enxergariam na vitória dos adversários o triunfo de uma conspiração nem numa eventual virada do jogo, se um dia vier, a redenção da verdade e o juízo final. A razão é simples: esse pensamento ou pertence à esfera religiosa, escatológica, ou à cultura revolucionária. E revolução se faz com sangue. Eventualmente, pode-se tentar aniquilar o "inimigo" com mensalão, petrolão e outras corrupções da verdade e da vontade.
Não tivesse se tornado boneco de ventríloquo da esquerda, anunciando velharias cuja exata extensão desconhece, Lula poderia ter sido nosso Lincoln, mas sem desfecho trágico. Em vez disso, tornou-se um zumbi.
DISSONANTE
Escreveu Sergio Moro ao aceitar a denúncia contra Lula: "É durante o trâmite da ação penal que o ex-presidente poderá exercer livremente a sua defesa, assim como será durante ele que caberá à acusação produzir a prova, acima de qualquer dúvida razoável, de suas alegações caso pretenda a condenação. O processo é, portanto, uma oportunidade para ambas as partes".
Sem a última frase, seria apenas uma tautologia. Acrescido o trecho daquele rabicho, aí se está diante de um entendimento torto do que é o direito numa democracia. Caberá sempre ao acusador o ônus da prova. O acusado não tem como produzir prova negativa. Não se trata, pois, de "uma oportunidade para ambas as partes" porque estamos falando de estatutos absolutamente diversos. As palavras fazem sentido, e eu cobro o sentido das palavras. De um petista ou de Moro.
MANTEGA
Prisão e soltura nada têm a ver com Justiça e cumprimento da lei. Chanchada. Força-tarefa e juiz quiseram dar um recado: "Mandamos soltar e prender quando nos der na telha. São todos criminosos". E são. Mas se age como se não houvesse lei. A cereja do bolo é a divulgação do vídeo com Eike Batista. A revelação de um crime serve para lavar uma arbitrariedade. É um mau caminho.
Lula fala sobre Mantega sem tocar no essencial
Palco de um ex-protagonista caindo em si ou picadeiro de um cômico fora de si. Escolha sua metáfora para as encenações de Lula nos palanques do Nordeste. A descrição mais adequada talvez seja essa: uma sequência de discursos sem nexo de um pajé inocente que, flechado por denúncias e inquéritos, faz lembrar as virgens de Sodoma e Gomorra.
Na noite passada, num comício em Recife, o morubixaba do PT comentou a prisão de seu ex-ministro Guido Mantega. Abstendo-se de mencionar a soltura determinada horas depois pelo juiz Sérgio Moro, Lula disse à plateia de convertidos:
A cena dos agentes federais invadindo a sala cirúrgica é uma fábula do orador. Na vida real, um delegado tocou o telefone para Mantega. Que se apresentou do lado de fora do hospital. E foi conduzido educadamente para um automóvel comum, sem a logomarca da PF.
O juiz da Lava Jato, os procuradores da força-tarefa de Curitiba e a Polícia Federal informaram que não sabiam da internação da mulher de Mantega. Lula chama todo mundo de mentiroso. Deve saber o que diz, já que é um PhD nessa história de “não sabia”. O repórter jamais se atreveria a discutir com um especialista. Porém…
Lula talvez devesse incluir em suas próxima manifestações meia dúzia de palavras sobre o inusitado que salta da nova fase da Lava Jato: um ministro da Fazenda convertido em coletor de verbas sujas para campanhas do PT.
Quando discursa de improviso e esquece de abordar o essencial, Lula dá sempre a impressão de que procura uma boa explicação desesperadamente —mais ou menos como um cachorro que escondeu o osso e esqueceu onde.
Na noite passada, num comício em Recife, o morubixaba do PT comentou a prisão de seu ex-ministro Guido Mantega. Abstendo-se de mencionar a soltura determinada horas depois pelo juiz Sérgio Moro, Lula disse à plateia de convertidos:
''Hoje, a Polícia Federal foi buscar o Guido no hospital. Entraram na sala de cirurgia, onde a mulher dele, que está com câncer, começava uma cirurgia. Levaram ele e, depois, com a maior desfaçatez, disseram que não sabiam que ela estava doente. Sabiam! Ela não estava dentro de um hospital para se embelezar. É preciso que esse país volte a normalidade. Isso exige que as instituições respeitem as pessoas e a sociedade.''
A cena dos agentes federais invadindo a sala cirúrgica é uma fábula do orador. Na vida real, um delegado tocou o telefone para Mantega. Que se apresentou do lado de fora do hospital. E foi conduzido educadamente para um automóvel comum, sem a logomarca da PF.
O juiz da Lava Jato, os procuradores da força-tarefa de Curitiba e a Polícia Federal informaram que não sabiam da internação da mulher de Mantega. Lula chama todo mundo de mentiroso. Deve saber o que diz, já que é um PhD nessa história de “não sabia”. O repórter jamais se atreveria a discutir com um especialista. Porém…
Lula talvez devesse incluir em suas próxima manifestações meia dúzia de palavras sobre o inusitado que salta da nova fase da Lava Jato: um ministro da Fazenda convertido em coletor de verbas sujas para campanhas do PT.
Quando discursa de improviso e esquece de abordar o essencial, Lula dá sempre a impressão de que procura uma boa explicação desesperadamente —mais ou menos como um cachorro que escondeu o osso e esqueceu onde.
O clima hoje, os dramas de amanhã
As notícias vêm de várias partes. Do centro do Brasil, as informações de que o Rio Araguaia, um dos maiores do País, já “perdeu mais de 100 de suas ilhas”, com o assoreamento documentado pelos cientistas da Universidade Federal de Goiás. Os cardumes de peixes desapareceram (O Popular, 18/9). O canal principal de navegação reduziu-se de mais de 70 metros para 5 metros. E o auge da seca ainda não chegou, está previsto para outubro. Segundo o jornal, “a drenagem de água para fins de agricultura contribui para o agravamento da crise”.
O Plano de Recursos Hídricos do Estado segue em marcha lenta – quando segue – na Assembleia Legislativa goiana. E o Araguaia é apenas um dos exemplos. Vários outros rios estão sendo assoreados com resíduos que vêm das culturas agropecuárias em faixas de preservação. Na histórica cidade de Goiás, o Rio das Almas pode ser atravessado a pé, depois que plantadores de cana-de-açúcar passaram a captar água nas partes mais altas.
Goiás é parte do problema do Centro-Oeste e de outras faixas de transição onde é feita a conversão de florestas para lavoura, podendo aumentar a temperatura da superfície em até 5 graus Celsius e reduzi r em 30% a quantidade de água que retorna para a atmosfera em forma de vapor (Estado, 18/9). Queimadas são cada vez mais frequentes. O desmatamento em partes da Amazônia ficou em 5 mil quilômetros quadrados em 2015.
Há outros ângulos. A Secretaria de Abastecimento goiana lançou no final de agosto o Plano Estadual de Mitigação e Adaptação às Mudanças Climáticas. Um dos objetivos é reduzir a emissão de carbono na agricultura. Planeja-se recuperar 15 milhões de hectares de pastagens degradadas; ampliar o plantio direto em oito milhões de hectares; ampliar a fixação biológica de nitrogênio em 5,5 milhões de hectares. As várias ações deverão permitir a redução de emissões em 2,25 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalentes, graças também ao incremento de áreas de florestas plantadas em 50 mil hectares por ano, à adoção de sistemas agroflorestais em 4 milhões, à fixação biológica do nitrogênio em 5,5 milhões de hectares.
A cada dia surgem mais notícias inquietantes. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) há pouco informou que a extração de matérias-primas triplicou em quatro décadas; contribui fortemente para as mudanças climáticas e para a contaminação da atmosfera com o uso intensivo de combustíveis fósseis. Estudo da Fundação Oswaldo Cruz concluiu que a região amazônica poderá sofrer mudanças climáticas bruscas nos próximos 25 anos por causa do desmatamento; a temperatura aumentará 5 graus Celsius e o volume de chuvas diminuirá 25% (geodireito, 19/9).
Não é exatamente nessas direções que vamos caminhando. Este ano, El Niño aumentou a concentração de gases do efeito estufa para nível recorde (Reuters, 13/6), ultrapassando pela primeira vez 400 partes por milhão. Mudanças climáticas estão provocando deslocamento de nuvens para os polos e exposição de zonas tropical e subtropical do planeta à radiação solar e desertificação, segundo pesquisadores da Universidade da Califórnia em San Diego. Este ano, seca e excesso de chuvas em regiões produtoras brasileiras já contribuíram para queda de 0,3% no PIB agropecuário de um trimestre.
Para outubro está prevista uma reunião em Kigali, capital de Ruanda, de dirigentes de todas as partes do mundo, na tentativa de alcançar um acordo que permita chegar ao fim do século com aumento de apenas 0,5% na temperatura, equivalente a metade da elevação que já provocamos desde o início da revolução industrial. O foco principal estará na redução de hidrofluorcarbonos, ou HFCs, encontrados em aparelhos de ar-condicionado, geladeiras e aerossóis. E em seu período de vida de 13,4 anos eles causam 1.300 vezes o aquecimento que o dióxido de carbono provoca ao longo de cem anos.
As negociações já duram sete anos. E a implementação terá custo muito alto. Vai-se chegar a um bom final?
Washington Novaes
Ilhas do Araguaia |
Mas o problema não é só lá. Goiânia e Aparecida de Goiânia sofrem sem água em partes das cidades, porque fazendas desviaram o curso de um rio. Também nas proximidades houve outros desvios no leito do Rio Meia Ponte, que abastece 50% da capital; por isso a captação ali teve de ser baixada de 80 para 30 litros por segundo. A Ilha do Bananal só existe agora como ilha durante parte do ano porque o Rio Javaés, borda ocidental dessa ilha, só tem água durante dois meses no ano. Em vários outros municípios, incluídos Anápolis e Cidade Ocidental, de maior porte, a crise na captação também é forte. Só na Serra das Areias 15 nascentes e 9 cachoeiras secaram.
O Plano de Recursos Hídricos do Estado segue em marcha lenta – quando segue – na Assembleia Legislativa goiana. E o Araguaia é apenas um dos exemplos. Vários outros rios estão sendo assoreados com resíduos que vêm das culturas agropecuárias em faixas de preservação. Na histórica cidade de Goiás, o Rio das Almas pode ser atravessado a pé, depois que plantadores de cana-de-açúcar passaram a captar água nas partes mais altas.
Goiás é parte do problema do Centro-Oeste e de outras faixas de transição onde é feita a conversão de florestas para lavoura, podendo aumentar a temperatura da superfície em até 5 graus Celsius e reduzi r em 30% a quantidade de água que retorna para a atmosfera em forma de vapor (Estado, 18/9). Queimadas são cada vez mais frequentes. O desmatamento em partes da Amazônia ficou em 5 mil quilômetros quadrados em 2015.
A cada dia surgem mais notícias inquietantes. O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) há pouco informou que a extração de matérias-primas triplicou em quatro décadas; contribui fortemente para as mudanças climáticas e para a contaminação da atmosfera com o uso intensivo de combustíveis fósseis. Estudo da Fundação Oswaldo Cruz concluiu que a região amazônica poderá sofrer mudanças climáticas bruscas nos próximos 25 anos por causa do desmatamento; a temperatura aumentará 5 graus Celsius e o volume de chuvas diminuirá 25% (geodireito, 19/9).
Bob Eckstein |
Para completar a preocupação com o calor recorde que já está por aqui, estudo recente do Painel do Clima (IPCC), publicado na revista Nature, atualizou a correlação entre volumes de emissão de gases do efeito estufa (GEE) e aumentos da temperatura média na Terra até o fim do século – a continuarem como hoje as políticas, o aumento será entre 3,2 e 4,4 graus. Mesmo que os países cumpram os compromissos voluntários assumidos no passado, o aumento ficaria entre 2,9 e 3,8 graus. E mesmo que se excluam causas, como a liberação de metano pelo Ártico, do permafrost siberiano e do fundo dos oceanos, perdas nas florestas tropicais, ficar abaixo do aumento de 2 graus na temperatura em 2075 pressupõe o abandono do carvão e do petróleo como combustíveis e sua substituição por energias limpas e renováveis; a eletrificação dos transportes; técnicas de sequestro de carbono; grandes projetos de reflorestamento; agricultura e pecuária de alta produtividade e baixo carbono (Eco-finanças, 11/7). Essa transição pressupõe investimentos de US$ 3 trilhões por ano (quando se fala hoje em US$ 100 bilhões), fora retirar subsídios de US$ 1 trilhão para combustíveis fósseis.
Não é exatamente nessas direções que vamos caminhando. Este ano, El Niño aumentou a concentração de gases do efeito estufa para nível recorde (Reuters, 13/6), ultrapassando pela primeira vez 400 partes por milhão. Mudanças climáticas estão provocando deslocamento de nuvens para os polos e exposição de zonas tropical e subtropical do planeta à radiação solar e desertificação, segundo pesquisadores da Universidade da Califórnia em San Diego. Este ano, seca e excesso de chuvas em regiões produtoras brasileiras já contribuíram para queda de 0,3% no PIB agropecuário de um trimestre.
Para outubro está prevista uma reunião em Kigali, capital de Ruanda, de dirigentes de todas as partes do mundo, na tentativa de alcançar um acordo que permita chegar ao fim do século com aumento de apenas 0,5% na temperatura, equivalente a metade da elevação que já provocamos desde o início da revolução industrial. O foco principal estará na redução de hidrofluorcarbonos, ou HFCs, encontrados em aparelhos de ar-condicionado, geladeiras e aerossóis. E em seu período de vida de 13,4 anos eles causam 1.300 vezes o aquecimento que o dióxido de carbono provoca ao longo de cem anos.
As negociações já duram sete anos. E a implementação terá custo muito alto. Vai-se chegar a um bom final?
Washington Novaes
'Rouba, mas faz!'
Fui buscar na estante de casa, empoeirado, o velho Dicionário Universal de Citações, de Paulo Rónai, de 1985 (Editora Nova Fronteira). Minha curiosidade era saber se o famoso bordão “Rouba, mas faz!”, de Ademar de Barros, constava do verbete corrupção. Foi uma frustração, a citação mais recente era dos tempos do Império, nas Máximas do Marques de Maricá (1773-1848): “um povo corrompido não pode tolerar governo que não seja corruptor”.
Havia outras citações mais antigas: “Ah, se as propriedades e títulos e cargos/ Não fossem fruto da corrupção! E se as altas honrarias / Se adquirissem só pelo mérito de quem as detém / Quantos, então, não estariam hoje melhor do que estão? / Quantos, que comandam não estariam, entre os comandados?”, de Shakespeare (1564-1616), no Mercador de Veneza. “A corrupção do melhor é a pior das corrupções”, de São Gregório, o Grande (540-604), nas Considerações Morais. E “Em Roma tudo está à venda”, de Salústio (86?-35 a.C.), na Guerra de Jugurta.
Havia outras citações mais antigas: “Ah, se as propriedades e títulos e cargos/ Não fossem fruto da corrupção! E se as altas honrarias / Se adquirissem só pelo mérito de quem as detém / Quantos, então, não estariam hoje melhor do que estão? / Quantos, que comandam não estariam, entre os comandados?”, de Shakespeare (1564-1616), no Mercador de Veneza. “A corrupção do melhor é a pior das corrupções”, de São Gregório, o Grande (540-604), nas Considerações Morais. E “Em Roma tudo está à venda”, de Salústio (86?-35 a.C.), na Guerra de Jugurta.
Nenhuma delas se equipara à máxima de Ademar de Barros, uma síntese da velha tradição patrimonialista da política brasileira no regime republicano. Apadrinhado do chefe de polícia de Getúlio Vargas, Filinto Müller, foi nomeado interventor de São Paulo, em abril de 1938, logo após a implantação da ditadura do Estado Novo. Médico, cultivou a imagem de administrador competente, realizador de grandes obras públicas e político de preocupação social. Construiu as rodovias Anchieta, iniciada em 1939, e Anhanguera, em 1940, e do Hospital das Clínicas, que começou em 1938. O Aeroporto de Congonhas foi iniciado em 1936, mas passou como se fosse de sua iniciativa.
Denúncias de peculato e enriquecimento ilícito, porém, levaram Vargas a afastá-lo da interventoria em junho de 1941, mas as suspeitas não impediram que fosse eleito governador, em 1947, cargo que exerceu até 1951. Uma série de reportagens intitulada “O meu destino é o Catete”, de autoria do jornalista Paulo Duarte, tornou famoso o “rouba, mas faz!”, frase atribuída ao próprio Ademar. Em 1949, teria comprado em benefício próprio, com dinheiro público, 11 automóveis e 20 caminhões da General Motors. O Ministério Público abriu um processo e pediu sua prisão preventiva. Em março de 1956, Ademar foi condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo a dois anos de reclusão e perdeu os direitos políticos por cinco anos. Mas, em maio do mesmo ano, foi absolvido por unanimidade pelo Supremo Tribunal Federal.
Livre das denúncias, Ademar foi eleito prefeito de São Paulo em 1957. Em três eleições — prefeitura de São Paulo (1953), governo do estado (1955) e Presidência da República (1960) —, foi vencido por Jânio Quadros (1917-1992), seu maior rival político. Perdeu para Juscelino Kubitschek (1902-1976) na disputa pela Presidência, em 1955. Em 1962, finalmente, Ademar superou Jânio, que havia renunciado à Presidência, na eleição para o governo do estado. Em 1969, a ex-presidente Dilma Rousseff planejou e participou do roubo do cofre de Ademar de Barros, numa mansão de Santa Tereza, no Rio de Janeiro, onde vivia a ex-amante do político, Ana Capriglioni, uma ação armada da Var Palmares, organização guerrilheira liderada pelo ex-deputado Carlos Araújo, seu ex-marido.
É impossível não resgatar a memória de Ademar de Barros, em razão de um trecho do discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na quinta-feira em São Paulo, quando se defendeu das acusações dos procuradores da Operação Lava-Jato. “A profissão mais honesta que existe é a de político, sabe por quê? Porque, por mais ladrão que ele seja, de 4 em 4 anos, ele está suando e pedindo voto, o concursado não! O concursado faz a faculdade, passa num concurso e tem o seu emprego pelo resto da vida, sem precisar se preocupar”. A frase pode não ser digna do dicionário de Rónai, mas é uma pérola. Mostra uma concepção de governo na qual o Estado foi tomado de assalto e saqueado, verbalizada por quem ocupou a Presidência por 8 anos.
Lula quis agradar os políticos que querem acabar com a Operação Lava-Jato e anistiar todos os envolvidos no escândalo da Petrobras, mas essa esperteza choca os cidadãos e os servidores públicos concursados, principalmente a alta burocracia federal. Max Weber, em sua famosa palestra A política como vocação (Munique, em 1919), foi enfático ao destacar a tensão entre a ética da responsabilidade e a ética das convicções. A Operação Lava-Jato é uma síntese disso: enquanto auditores, corregedores, delegados, promotores e juízes zelam pela legitimidade dos meios empregados na política, o ex-presidente Lula e seus aliados acreditam que suas convicções estão acima do bem e do mal.
Denúncias de peculato e enriquecimento ilícito, porém, levaram Vargas a afastá-lo da interventoria em junho de 1941, mas as suspeitas não impediram que fosse eleito governador, em 1947, cargo que exerceu até 1951. Uma série de reportagens intitulada “O meu destino é o Catete”, de autoria do jornalista Paulo Duarte, tornou famoso o “rouba, mas faz!”, frase atribuída ao próprio Ademar. Em 1949, teria comprado em benefício próprio, com dinheiro público, 11 automóveis e 20 caminhões da General Motors. O Ministério Público abriu um processo e pediu sua prisão preventiva. Em março de 1956, Ademar foi condenado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo a dois anos de reclusão e perdeu os direitos políticos por cinco anos. Mas, em maio do mesmo ano, foi absolvido por unanimidade pelo Supremo Tribunal Federal.
Livre das denúncias, Ademar foi eleito prefeito de São Paulo em 1957. Em três eleições — prefeitura de São Paulo (1953), governo do estado (1955) e Presidência da República (1960) —, foi vencido por Jânio Quadros (1917-1992), seu maior rival político. Perdeu para Juscelino Kubitschek (1902-1976) na disputa pela Presidência, em 1955. Em 1962, finalmente, Ademar superou Jânio, que havia renunciado à Presidência, na eleição para o governo do estado. Em 1969, a ex-presidente Dilma Rousseff planejou e participou do roubo do cofre de Ademar de Barros, numa mansão de Santa Tereza, no Rio de Janeiro, onde vivia a ex-amante do político, Ana Capriglioni, uma ação armada da Var Palmares, organização guerrilheira liderada pelo ex-deputado Carlos Araújo, seu ex-marido.
É impossível não resgatar a memória de Ademar de Barros, em razão de um trecho do discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na quinta-feira em São Paulo, quando se defendeu das acusações dos procuradores da Operação Lava-Jato. “A profissão mais honesta que existe é a de político, sabe por quê? Porque, por mais ladrão que ele seja, de 4 em 4 anos, ele está suando e pedindo voto, o concursado não! O concursado faz a faculdade, passa num concurso e tem o seu emprego pelo resto da vida, sem precisar se preocupar”. A frase pode não ser digna do dicionário de Rónai, mas é uma pérola. Mostra uma concepção de governo na qual o Estado foi tomado de assalto e saqueado, verbalizada por quem ocupou a Presidência por 8 anos.
Lula quis agradar os políticos que querem acabar com a Operação Lava-Jato e anistiar todos os envolvidos no escândalo da Petrobras, mas essa esperteza choca os cidadãos e os servidores públicos concursados, principalmente a alta burocracia federal. Max Weber, em sua famosa palestra A política como vocação (Munique, em 1919), foi enfático ao destacar a tensão entre a ética da responsabilidade e a ética das convicções. A Operação Lava-Jato é uma síntese disso: enquanto auditores, corregedores, delegados, promotores e juízes zelam pela legitimidade dos meios empregados na política, o ex-presidente Lula e seus aliados acreditam que suas convicções estão acima do bem e do mal.
Assinar:
Postagens (Atom)