sexta-feira, 29 de julho de 2016

A nova carta

Apenas para reativar a memória, este foi o documento apresentado em junho de 2002 pelo então candidato a presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, em que se comprometia a obter o superávit primário (sobra de arrecadação para pagamento da dívida) que viesse a ser necessário para controlar a inflação e a dívida pública. Foi a senha que garantiria uma administração responsável das contas públicas e dos demais segmentos da política econômica, a mesma que depois foi colocada em prática nos seus primeiros anos de mandato.

A conversão de Dilma à religião verdadeira não convenceria ninguém

Não está claro qual seria o conteúdo dessa nova carta, a ser assinada pela presidente Dilma. Mas, pelas suas poucas manifestações sobre a política econômica adotada pelo presidente em exercício Michel Temer, parece que a presidente Dilma pretende comprometer-se a adotar uma política econômica de linha ortodoxa, caso seja reconduzida ao Palácio do Planalto.

Apenas essa intenção já implica reconhecimento implícito dos equívocos cometidos durante seu primeiro mandato. Se promete mudança de rumo é porque entendeu que o rumo anterior estava errado.

E já se antevê sua ineficácia, na medida em que seu objetivo não é propriamente convencer a opinião pública de que finalmente beijou a cruz, mas apenas tentar reverter a tendência do Senado em votar pelo impeachment. Depois se veria o que fazer.

A conversão de Dilma à religião verdadeira não convenceria ninguém depois de tudo o que disse e demonstrou sobre seus pontos de vista pessoais. Não é de um mês para o outro que alguém abandona tão arraigadas convicções autoritárias e voluntaristas, como as de que governar é botar o Tesouro para gastar além de suas possibilidades, para depois esconder (ou pedalar) os resultados nefastos, como se viu.

Afora isso, não há o que possa garantir o que agora Dilma parece disposta a admitir: que convidaria a mesma equipe econômica do seu desafeto Michel Temer para conduzir sua política econômica. É ingenuidade admitir que Meirelles, Serra, Goldfajn, Pedro Parente e Maria Sílvia Bastos Marques aceitariam compor seu eventual quadro econômico.

Também seria ingenuidade pretender que Dilma conseguiria reunir gente da mesma qualidade e competência entre os que vêm apoiando sua recondução ao governo.

Depois, não basta declarar as melhores intenções e certa disposição para colocá-las em prática. É preciso ver primeiro quais seriam, na prática, as condições políticas em caso de retomada do governo. Como, por exemplo, poderia Dilma conviver com a ala agora irreconciliável do PMDB liderada por Michel Temer e com um PT que condena com todas as forças “a política neoliberal favorável aos rentistas e aos banqueiros”, a mesma que pudesse ser defendida na nova carta ao povo brasileiro?

É claro que existem duendes. Mas não desse tipo.

Milionários, mas insatisfeitos

Nem mesmo dispondo de bilhões de reais que caem anual e automaticamente em suas contas bancárias – e dos quais não precisam prestar contas nem ao poder público nem a seus associados – as entidades sindicais estão satisfeitas. Sindicatos, federações, confederações e centrais, patronais e trabalhistas, querem mais dinheiro do trabalhador e das empresas para continuar fazendo o que costumam fazer: remunerar regiamente seus dirigentes, assegurando-lhes adicionalmente presença destacada no ambiente social e no cenário político, investir em imóveis para auferir ainda mais renda e resistir com tenacidade à necessária modernização das relações de trabalho. Uma ou outra vez, atuam na defesa dos interesses daqueles que dizem representar. Afinal, em teoria eles existem para isso.

Com raras exceções, assim funcionam as entidades sindicais, sustentadas em sua grande maioria por transferências feitas pelo governo do dinheiro que corresponde a uma parte do salário dos trabalhadores – sindicalizados ou não – e do capital social das empresas.

No ano passado, essas entidades receberam R$ 3,4 bilhões. Levantamento feito pelo jornal Valor mostrou que aproximadamente 100 entre as mais de 10 mil entidades sindicais formalmente registradas no Ministério do Trabalho e Previdência Social – e, por isso, com direito a uma fatia do imposto sindical, cujo nome oficial é contribuição sindical – recebem valores superiores a R$ 3,6 milhões. Essa quantia corresponde ao limite de faturamento para que uma empresa seja considerada micro ou pequena e possa ser inscrita no regime tributário do Simples. Ou seja, uma centena de entidades sindicais obtém sem nenhum problema e sem necessidade de comprovar nenhuma atividade ou iniciativa, desde que registrada no Ministério do Trabalho, uma receita anual que a enquadraria no mínimo entre as empresas médias do País.

As principais centrais sindicais (CUT, Força Sindical e UGT) são as maiores beneficiárias desse sistema de transferência automática de dinheiro criado pelo Estado Novo varguista e que vem sendo modificado sempre em benefício das organizações sindicais.

Está em exame por uma comissão especial da Câmara projeto que trata do financiamento das entidades sindicais. Um de seus pontos principais é a regulamentação da chamada contribuição negocial ou assistencial, aquela que a maioria dos sindicatos cobra sobre o resultado das negociações coletivas. O Ministério Público do Trabalho tem acionado sindicatos que utilizam essa contribuição, que chega a 20% do salário mensal, impedindo sua cobrança de toda a categoria profissional e limitando-a ao quadro de associados. O projeto estende a cobrança para toda a categoria, permitindo a recusa do pagamento apenas a trabalhador que tenha participado da assembleia que criou o novo imposto ou a ele se oponha no prazo de dez dias.

Não parece difícil que a comissão aprove o projeto, pois seu presidente é o deputado Paulo Pereira da Silva (SD-SP), o Paulinho da Força, assim conhecido por ser o presidente da Força Sindical. O parlamentar tem acesso fácil ao Palácio do Planalto.

Do lado patronal, dirigentes de entidades como a Confederação Nacional do Comércio – a maioria dos quais está no cargo há décadas – consideram defasada a alíquota que incide sobre o capital das empresas e pedem a atualização da base de cálculo da contribuição dos empregadores.

Patronais ou profissionais, as entidades sindicais utilizam o dinheiro para sustentar viagens, salários e outras vantagens de seus dirigentes e, quando há sobra, aplicam na expansão de seu patrimônio imobiliário ou na construção de sedes suntuosas. Algumas utilizam seus recursos – que têm outras fontes, como rendas ditas sociais e extraordinárias, como informou uma delas – para confeccionar patos amarelos utilizados numa campanha contra a alta carga tributária com o título “Não vou pagar o pato”. E quem paga o pato da campanha e outros gastos de entidades como essa?

Realidades virtuais

A realidade diária anda dura e dolorosa demais no mundo inteiro. Menos nos países com maior Índice de Progresso Social (IPS), que mede não só o PIB e dados econômicos, mas também outros 47 indicadores de bem-estar social, qualidade de vida e oportunidades. Finlândia, Dinamarca, Noruega, Suécia, os suspeitos de sempre, lideram as tais “sociedades mais justas e solidárias” de que os políticos tanto falam.

Mas, pelo que se sabe e se vê, a realidade nesses paraísos sociais contemporâneos é virtualmente um império do tédio e da rotina, vivendo sete meses por ano sob um inverno infernal, com o sol se pondo às 2 da tarde. Quem sabe agora tentem medir o IFH, o Índice de Felicidade Humana, que é o que mais importa.

Entre 133 países, o Brasil está em 42º lugar, mas é o melhor colocado do Brics. Na América Latina, ficamos atrás de Uruguai, Chile e Argentina. Países desenvolvidos como Estados Unidos, Itália, Espanha, mas com grandes desigualdades, estão por volta do G20.

Estava pensando sobre essas coisas quando um amigo me trouxe uns óculos-fones de “realidade virtual” e logo me vi no meio do espaço sideral, como se estivesse dentro de um pequeno asteroide, vendo a Terra de longe, sentindo vertigens de olhar para baixo, ou para os lados, ou para cima, na imensidão do espaço, com cometas e asteroides passando.

Chad Knights’s 365 digital art challenge quickly turned into a coded personal journal.:
Ao contrário do 3D, em que a cena sai para cima do espectador, na RV é você que se coloca no centro da ação, com visão de 360 graus, a meio metro do piano de Paul McCartney, no centro do palco, no meio da música, vendo os músicos, a plateia e o backstage à sua volta. Ou assistindo a um jogo de futebol do mesmo ponto de vista dos jogadores, como se estivesse entre eles, na beira do gramado, atrás do gol ou na melhor cadeira.

Bilhões de dólares estão sendo investidos no desenvolvimento dessa tecnologia, um caminho sem volta que já está gerando farta produção de games, comédias, dramas, terror, esportes, natureza, cirurgias, publicidade, clips musicais e, naturalmente, pornô.

Nada melhor para escapar, pelo menos por um tempo, da realidade inescapável de nosso tempo, sem sair de casa.

Nelson Motta

Imagem do Dia

Arbebuk 

Por que Lula foi à ONU contra a Justiça brasileira

Ou Lula acha que vive numa republiqueta de banana onde a Justiça não passa de uma farsa, ou então seu medo de ser preso e condenado é tão grande, sua situação é tão desesperadora que ele perdeu a completa noção do ridículo, se é que a teve algum dia.

Há uma terceira alternativa e uma quarta que podem explicar o gesto de Lula de pedir socorro ao Comitê de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU). A terceira: ele quer constranger a Justiça brasileira. A quarta: ele prepara sua fuga.

Lula sabe que não vive numa republiqueta de banana. Presidiu-a por oito anos, fez sua sucessora e a reelegeu. As leis de que se valeu para isso continuam em vigor. Por desrespeitar algumas, ele pode acabar preso. Por desrespeitar outras, Dilma foi afastada.


O Natal não mudou. Lula foi que mudou. Elegeu-se pela primeira vez depois de denunciar a existência de 300 picaretas no Congresso. Governou com eles. Estimulou o seu apetite. No mínimo, fez vistas grossas à corrupção. Deu no que deu.

Imaginou voltar à presidência da República depois de um intervalo de quatro anos. Ao ver-se acuado pela Lava-Jato, empenhou-se em obstruir a Justiça. Disso são provas cabais várias de suas conversas grampeadas. Não deu certo.

É remota a possibilidade de que a Justiça, agora, se atemorize com as suas manobras. Como é remota a possibilidade de a ONU, por falta de cabimento, socorrê-lo metendo-se em assuntos internos de um país soberano e democrata.

Lula tenta preparar o caminho de sua fuga. Se preso e condenado, quer passar de um reles criminoso a perseguido político. Caso não suporte viver anos atrás das grades, poderá pedir asilo a algum país. Sempre haverá um disposto a acolhê-lo.

O direito de propriedade nos enrroscos da ideologia

Ser a terra um dom do Criador aos homens confere a cada pessoa direito a uma fração dessa Criação? Há quem responda que sim, quem afirme que não, e há quem sustente que o próprio direito à propriedade é um roubo, pois tudo deveria pertencer ao Estado para que, mediante ele, os frutos da natureza pudessem chegar igualmente a todos. Onde essa utopia foi aplicada, só os néscios se surpreenderam com o resultado: o Estado somou poder econômico ao seu poder político e escravizou a sociedade.

No Brasil, a visão coletivista, marxista, se vale da cultura indígena para exibir o estado “natural” e “original” de um mundo sem cercas nem proprietários, onde as necessidades de todos eram atendidas pela natureza dadivosa. Se retirarmos dessa análise o conteúdo poético, nada resta: os índios eram poucos, a terra imensa, e ainda assim havia períodos de escassez. Tal situação foi comum aos povos primitivos, nômades porque precisavam correr atrás do almoço. E quando faltava o almoço, era um alvoroço. O grupo mais forte jantava o mais fraco. A civilização começou exatamente quando - ofegantes e famintos - resolveram parar de correr, começaram a plantar seu próprio alimento, cravaram as primeiras divisas entre as propriedades e os muros foram envolvendo as cidades que nasciam.

O direito à propriedade privada surgiu, portanto, como uma concepção que corresponde ao bem comum, possibilitando e estimulando a produção e a organização da vida social. Desmentindo Malthus, viabilizou o atendimento das demandas alimentares de populações crescentes, mesmo com a acelerada urbanização das últimas décadas. Regimes que o suprimem geram a fome, o genocídio pela fome e a corrida às fronteiras em busca de alimentos, como agora se vê na Venezuela. Neles, o fracasso é regra sem exceção pela inadequação dos meios aos fins prometidos.

Ademais, no caso da propriedade da terra, tratamos de um bem não-elástico. Sua disponibilidade não aumenta com a população. O planeta não é inflável. Assim, o direito à terra não pode ser um direito “da pessoa”, nem é um direito que se configure pela simples manifestação do desejo de possuir. Menos ainda é um direito que possa ser exercido automaticamente por quem não tem terra em relação à propriedade alheia. Invocá-lo é tão socialmente nefasto que o Decálogo, há quase quatro mil anos, lista como pecado a simples cobiça dos bens alheios. Finalmente, ainda que existisse, tal "direito" não poderia ser exercido por alguém (viu, MST?) em relação a um bem determinado de outra pessoa, por livre escolha do cobiçoso.

Mas isso não significa que o contínuo parcelamento do solo rural seja um objetivo a ser perseguido. A tendência mundial aponta para propriedades cujas extensões médias já são superiores à brasileira, e indica, também, uma constante redução da população rural. Um expressivo contingente de população ativa no campo é característica compartilhada pelo Brasil com países como Paquistão, China, Etiópia, Índia, Nigéria, e Turquia. Sob o ponto de vista econômico, por fim, evidencia-se que quanto menor a população rural, maior a renda média do campo e maior a produtividade.

Penso, no entanto, que a questão não pode ser vista apenas em perspectiva econômica. Enquanto tivermos áreas não aproveitadas ou subaproveitadas, há que levar em conta o fato de que muitos brasileiros desejam trabalhar a terra. Mas é preciso agir dentro do quadro institucional, num cenário político e não revolucionário, buscando a eficiência dos investimentos que a sociedade fará. O governo não tem dinheiro seu; ele apenas gere o que a sociedade lhe repassa pelas vias fiscais. Os recursos para a reforma agrária são recursos do povo.

O MST se converteu em uma associação para o crime, a serviço de um partido político e de uma causa ideológica falida. Enquanto esse movimento mantiver qualquer relação de causa e efeito com a questão fundiária brasileira, os resultados serão, sempre, social e economicamente desastrosos. Até porque suas ações e a voz de seus líderes evidenciam não pretenderem, mesmo, aquilo que alegam.

A Criação é um dom de Deus aos homens. Foi concedido a todos e a todas as gerações para que a dominassem, deixando aos povos a liberdade de disporem sobre como fazer essa administração. A experiência histórica mostrou, de modo robusto e duradouro, ser a propriedade privada o meio mais eficiente e mais socialmente produtivo para essa gestão. Ela é um dos direitos naturais, junto com a vida e a liberdade. Não é, porém, direito a um conjunto de brindes que se ganhe ao longo da existência, mas algo que deve ser conquistado mediante o trabalho, cabendo ao Estado, em justa medida, viabilizar condições essenciais aos mais carentes, mediante Educação e capacitação para a vida produtiva.

Percival Puggina 

Não venerareis

EL ATRILERO: KRETINA EN EL ANTIGUO TESTAMENTO:
O meu ideal político é a democracia, para que todo o homem seja respeitado como indivíduo e nenhum venerado
Albert Einstein

Brasil da Casa de Noca agora quer trocar placas dos carros

Os burocratas do Contran decidiram que a partir do próximo ano os 45 milhões de carros que circulam no Brasil vão trocar de placas. Isso mesmo, uma resolução isolada do Conselho Nacional de Trânsito determina que até 2020 todos os veículos estarão identificados com as novas placas do Mercosul. Se você não gostou, vá reclamar com o bispo, porque o órgão do governo mais centralizador do país faz o que quer e quando quer. Considera-se o dono das leis e submete os proprietários de carros a prejuízos financeiros quando decide de cima para baixo mudar as chapas como se o dinheiro do contribuinte fosse lixo e as pessoas não tivessem o que fazer na vida.

E nesse país da indolência e da passividade tudo acontece sem que a população tenha sequer o direito de questionar essas sandices. O Contran bem que poderia esclarecer algumas coisas. Por exemplo: por que a placa do Mercosul? Qual interesse do órgão nessa mudança? Por que o próprio governo não paga as placas? Por que o contribuinte tem que perder tempo e dinheiro para mudar a placa do seu carro? Qual o significado disso e o que vai alterar na identidade dos carros? Quanto o proprietário vai pagar pela nova placa? Quem vai lucrar com isso? Quais os empresários envolvidos nessa negociata? E, finalmente, por que as mudanças não precedem de um debate com os donos de carros sobre essa medida que parece arbitrária e autoritária?

É assim mesmo, tudo é feito à revelia. Enquanto o brasileiro não chiar, não espernear e gritar, o governo vai continuar assaltando o seu bolso. Inventa coisas diariamente para insultar a paciência dos que já vivem no tormento da alta do custo de vida, dos juros exorbitantes dos cheques especiais e dos cartões de crédito, das passagens caras e do desemprego. A insensibilidade desses burocratas a essa situação é que torna a vida do brasileiro cada vez mais difícil e insuportável. Muitos têm procurado a porta de saída em definitivo alegando falta de segurança para viver com a família, indignados com a anarquia generalizada, a corrupção e o desmando dos últimos dez anos.

E razões para deixar o país não faltam. Não é fácil assistir diariamente o governo aumentar os preços das tarifas públicas, ameaçar a população com novos impostos, gastar mais do que arrecada e oferecer pão e circo à população patrocinando eventos bilionários como PanAmericano, Copa do Mundo e Jogos Olímpicos com o dinheiro que faz falta na saúde e na educação. Qual foi o legado deixado por esses megas eventos como o do futebol, por exemplo? Com exceção do vexame dos 7 a 1, o que existe hoje é um monte de estádios, elefantes brancos, espalhados por aí que engoliram bilhões e bilhões de reais que bem poderiam ter sido aplicados na infraestrutura e programas sociais para tirar o país da lista dos piores do mundo em desigualdade social.

Como o brasileiro pode ficar passivo diante da mordomia dos delatores da Lava Jato, outra aberração. Muitos deles cumprem pena em suas suas casas de veraneio depois do assalto aos cofres públicos. É a prova de que no Brasil o crime compensa. São os ladrões de gravata que malandramente se antecipam às prisões, entregam-se à Justiça espontaneamente, abrem o bico seletivamente, e depois voltam para suas mansões, onde vão esperar a maré baixar para desfrutar das contas milionárias no exterior.

E o que sobra para a população? Trabalhar cinco meses por ano apenas para pagar impostos. Ou ficar plantado na televisão para ouvir as explicações de um burocrata sobre a mudança das novas placas dos carros. No país da Lava Jato, o povo ainda não entendeu que o governo também assalta o bolso do contribuinte com decisões aparentemente legais.
Quem sair por último, por favor, apague a luz.

Dilma muda versão sobre caixa dois de campanha como quem troca de sapatos

Em matéria de contabilidade de campanha, a virtude de Dilma Rousseff é apenas um trissílabo que torna a vida mais virtual. Num momento, o caixa dois eleitoral não existe. Noutro instante, ele pode existir. Nessa matéria, Dilma muda de versão como quem troca de sapatos.

Em abril de 2015, numa entrevista à repórter Patricia Janiot, do canal CNN em espanhol, Dilma disse ter “certeza” de que o dinheiro roubado da Petrobras não chegara às arcas do seu comitê eleitoral. Eis o que madame declarou à época:

“Se dinheiro de suborno chegar a alguém, essa pessoa tem que ser responsabilizada. É assim que tem que ser. Eu tenho absoluta certeza que a minha campanha não tem dinheiro de suborno. Isso não significa que eu me coloque acima de qualquer brasileiro, cidadão ou cidadã. Eles têm que prestar contas do que fazem. E eu prestei. Para quem? Para o Tribunal Superior Eleitoral. Entreguei todas as minhas contas de campanha. Elas foram auditadas e foram aprovadas.”

Nessa época, Dilma amargava citações em depoimentos de dois delatores da Lava Jato. O ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Youssef. As investigações empacaram porque o ministro Teori Zavascki, relator da Lava jato no STF, avalizou o entendimento do procurador-geral Rodrigo Janot, para quem Dilma não poderia ser processada por fatos ocorridos fora do exercício do mandato.

O tempo passou. E surgiram novos delatores. Entre eles Ricardo Pessoa. Dono da construtora UTC, Pessoa informou à força-tarefa da Lava Jato que foi coagido pelo petista Edinho Silva a repassar R$ 7,5 milhões desviados da Petrobras para a campanha de Dilma. Deu-se na sucessão de 2014, quando Edinho respondia pela tesouraria do comitê reeleitoral de Dilma. Ambos insistiram: não há caixa dois.


Na semana passada, a coisa se complicou. Preso em Curitiba desde fevereiro, o próprio João Santana, marqueteiro de Lula e Dilma, destravou parcialmente a língua. Disse ter recebido numa conta secreta na Suíça US$ 4,5 milhões surripiados da Petrobras. Sem rodeios, informou que se tratava de caixa dois da campanha presidencial de Dilma em 2010.

Foi o bastante para que a “certeza” de Dilma ganhasse a consistência de um pote de gelatina: “Se houve pagamento, não foi com meu conhecimento”, ela anotou no Twitter. Nesta quarta-feira, em entrevista radiofônica, Dilma como que lavou as mãos. E fez sumir o sabonete.

Declarou o seguinte sobre a confissão de seu marqueteiro: “Se ele recebeu os US$ 4,5 milhões que diz que recebeu não foi da organização da minha campanha. Porque ele diz que recebeu isso em 2013. Como você sabe, a campanha começa em 2010 e, até o final do ano, ela é encerrada.”

Súbito, Dilma jogou a sujeira na portaria do PT: “A partir do momento em que a campanha é encerrada, tudo que ficou pendente de pagamento passa a ser responsabilidade do partido. A minha campanha não tem a menor responsabilidade sobre em que condições pagou-se a dívida remanescente de 2010. Não é a mim que tem que perguntar isso. Com quem ele tratou isso foi com a tesouraria do PT, como disse o próprio Santana.”

No depoimento que prestou a Sérgio Moro, juiz da Lava Jato, o marqueteiro de Dilma disse que 98% das campanhas eleitorais operam com dinheiro repassado por baixo da mesa. Afirmou que jamais conseguiu se livrar dessa prática. Significa dizer que manuseou dinheiro ilegal nas três campanhas presidenciais que ajudou o PT a vencer: Lula (2006) e Dilma (2010 e 2014).

Ficou entendido que nenhum político pode atirar pedra nos outros, porque todos têm telhado de vidro. Verdade. No caso de Dilma, porém, as evidências são tão abundantes que ela tem não apenas telhado, mas janela, porta, terninho, blusa, e sapatos de vidro.

Como uma cidade de 2 mil habitantes conquistou o maior IDH de educação

Se a interiorana Águas de São Pedro recebesse a Maratona Internacional de São Paulo, os atletas teriam de percorrer o município inteiro seis vezes para completar a prova. A cidade, um balneário turístico de águas medicinais, é a segunda menor em extensão territorial do país, com 3,6 quilômetros quadrados, atrás apenas de Santa Cruz de Minas, em Minas Gerais. Com cerca de 3.000 habitantes, grande parte de aposentados, Águas de São Pedro figura um outro dado, no mínimo, curioso. É o município com o maior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) na área da educação do país, indicador apurado pela Organização das Nações Unidas (ONU): 0,825 (em uma escala de zero a um). O IDH de educação mede a quantidade de anos de estudo dos adultos e a expectativa de anos de escolaridade das crianças. Não é apenas nesse quesito que a cidade se destaca, contudo. No ranking geral da ONU, a cidade tem o segundo maior IDH do país (incluindo índices de saúde, educação e renda). Águas de São Pedro perde somente para São Caetano do Sul (SP) em IDH municipal.


Na cidade, que no passado era só um bairro do vizinho São Pedro, é possível encontrar mais ônibus escolar do que municipal. Aliás, literalmente só existe um ônibus circular para os água-pedrenses. E ele é gratuito. Todos se conhecem, e é esta é uma das maiores vantagens de gerenciar a única escola da cidade, a Emef Maria Luiza Fornasier Franzin, segundo João Paulo Pontes, coordenador pedagógico. “Se o aluno falta, vamos buscá-lo em casa, vamos onde os pais trabalham, vamos em qualquer lugar que a criança possa estar - e geralmente já sabemos onde seria”, conta. Ele garante que, graças a isso, o índice de evasão escolar é nulo.

Claro que a estratégia não é aplicável nas grandes cidades, mas muitas das outras ações que a escola pratica, e que lhe garantem destaque no ranking educacional, podem servir de exemplo para realidades geográficas diferentes. A escola, por exemplo, trabalha com aulas em período integral, um sistema que é bastante difundido em colégios de primeiro mundo e amplamente defendido por movimentos ligados à educação no Brasil. De manhã, aulas do currículo padrão. À tarde, aulas de línguas, artes marciais, dança, pilates, futebol, robótica e até culinária - a favorita dos alunos, conforme destaca Pontes.

A escola que possui o maior IDH de educação do país está longe de parecer uma instituição do futuro. Pelos corredores, não voam drones feitos pelos alunos, nem robôs. Acima de tudo, parece com uma escola pública tradicional, com carteiras enfileiradas e lousa. Mas o cenário engana. uma das apostas para se manter na liderança do ranking é o uso da tecnologia como ferramenta de ensino.

Os 767 alunos possuem um netbook para realizar as tarefas. “A tecnologia nos permite integrar conteúdos de disciplinas diferentes, de trabalhar aulas mais multidisciplinares, e a tornar o aprendizado um pouco mais interessante para os alunos, pois a forma como o conteúdo é apresentado conversa melhor com a realidade deles”, acredita Pontes.

Um exemplo está na aula de matemática do professor Victor Pereira, de 26 anos. Os alunos do quinto ano do fundamental, sentados em grupos, resolvem juntos no computador exercícios de fração e dízima periódica. Na plataforma gratuita do MIT, a Khan Academy, montam pizzas, trabalho que vai ficando mais difícil conforme forem resolvendo os desafios. “Cada grupo trabalha no seu ritmo e até ajuda os colegas que não conseguem passar de fase. Me chamam raramente para ajudar. Ainda que estejam no computador, estão concentrados, se divertindo. E ninguém para para ver o Facebook”, afirma. Para o professor, a vantagem da tecnologia está em deixar um conteúdo abstrato mais visível para o aluno. Também é possível trabalhar com crianças em estágios diferentes de conhecimento numa mesma sala. “A aprendizagem acaba se adaptando à necessidade do aluno, sem atropelá-lo”, complementa.

O computador - ou o smartphone, dispositivo que a escola também utiliza como material de pesquisa em aula - pode ser levado para além dos muros do colégio. “Toda semana levo os alunos para o mini-horto da cidade, que fica ao lado da escola, para atividades ao ar livre. Na última atividade que fizeram, eles tinham que caçar QR Codes que eu espalhei pelas árvores para resolver equações”, complementa o professor.

Para o ano que vem, a escola pretende implementar um modelo de aprendizado por projeto, inspirada na Escola da Ponte, de Portugal, que, desde os anos 1970, tornou-se referência em educação com uma filosofia mais construtivista de ensino. “Hoje, falta muito as escolas perguntarem para os alunos o que eles querem aprender”, defende o coordenador pedagógico. Segundo ele, o ensino no Brasil ainda se pauta no tradicional modelo de explicar um conteúdo e, só depois, assimilá-lo à realidade. No aprendizado por projeto, inverte-se a lógica. “Partimos de um projeto prático para ensinar conceitos do currículo básico, o que faz com que o aluno entenda o porquê de estar aprendendo determinados assuntos”, destaca João Paulo Ponte.

Mas ser a única escola da cidade também tem o seu lado negativo. “Não há outra opção de escola para os filhos, então toda a estratégia pedagógica precisa ser muito mais cautelosa. As inovações precisam ser implantadas aos poucos”, afirma Ponte. O coordenador não informou números, mas garantiu que desde que passou a liderar o ranking de IDH educacional, em 2010, a escola está recebendo pedidos de matrículas de cidades ao redor, como São Pedro.