sábado, 22 de abril de 2017

A hora e a vez dos bancos

Eis que a Lava Jato não será tão veloz como o seu nome sugere. Se for aceita a oferta do ex-ministro Antonio Palocci, ao juiz Sérgio Moro – e tudo indica que sim -, de abrir nova vertente de denúncias, focada no sistema financeiro, mais um ano de investigações e escândalos se descortina. É o que Palocci avalia.

Todo o alvoroço até aqui provocado na vida pública brasileira envolveu basicamente agentes públicos (parlamentares, prefeitos, governadores, presidente e ex-presidentes da República, juízes) e empresas do setor de infraestrutura. Roubalheira monstruosa, cuja devassa equivale a uma revolução desarmada.

Mas há mais, muito mais.

O que se depreende da Era PT (que inclui seus parceiros do PMDB e PP - e, em graus variados, todo o espectro partidário) é que, em síntese, nenhum cofre público restou ileso. Fundos de pensão, imposto sindical, bolsa família, verbas da cultura, reforma agrária, Receita Federal, merenda escolar, presídios – nada escapou.

O secretário de Saúde de Sérgio Cabral, por exemplo, contrabandeava prótese e material cirúrgico; no mesmo segmento, descobriu-se contrabando de sangue em Pernambuco, ao tempo em que o Ministério da Saúde estava sob o comando do hoje senador petista Humberto Costa. O ex-senador Gim Argelo lavava dinheiro de propina com doações a uma igreja em Brasília; idem o ex-deputado Eduardo Cunha, ambos reconhecidamente homens de fé.

Paulo Bernardo, quando ministro do Planejamento de Dilma, cobrava um adicional dos empréstimos consignados aos aposentados. A roubalheira, com apoio logístico do PT, rendeu R$ 100 milhões.


Mas tudo isso é varejo. Nada se compara em extensão e profundidade ao que ocorria na área das empreiteiras, onde reinou um cartel, em que pontificava a Odebrecht. Destroçou, entre muitas outras, a Petrobras, a Eletrobras, o Dnit, os Correios e respectivos fundos de pensão. Ali, a roubalheira era na escala dos bilhões.

Mas o mundo das finanças, em que Palocci, ex-ministro da Fazenda de Lula e da Casa Civil de Dilma, circulou com total desenvoltura – e que conhece como poucos -, ainda carece de devassa. O que se sabe não passa de vislumbres.

Há dias, por exemplo, o Ministério Público denunciou falcatrua na aquisição pela Caixa Econômica de ações do Banco Panamericano (cerca de R$ 800 milhões), em 2011 – governo Dilma.

A Caixa Econômica está quebrada, idem o Banco do Brasil. O TCU examina contratos irregulares do BNDES, a maior parte em obras no exterior, que somam R$ 1,3 trilhão. O governo Temer acenou com o saneamento da máquina estatal, mas o máximo que conseguiu – se é que conseguiu – foi estancar a sangria.

Nada revelou sobre o que houve, de como se chegou a esse resultado. As caixas pretas continuam lacradas. O que se sabe veio das delações premiadas e das investigações da Lava Jato.

É compreensível. O governo Temer é o segundo escalão do PT. E a lei permite que o réu se poupe de fornecer informações que o comprometam. Os esclarecimentos estão vindo pela via judicial. Os petistas roubavam em nome da causa revolucionária, que, mesmo não se consumando, oferecia-lhes pretexto moral; os peemedebistas prescindiam de causa e pretexto; bastava-lhes o produto.

Enquanto os interesses convergiram, manteve-se a aliança, que não recusava auxílio eventual aos adversários, o que explica a ausência de oposição ao longo de todo esse período.

Tudo iria bem se o país, a certa altura, não tivesse falido, na reta final do primeiro governo Dilma. A Lava Jato já estava em ação, mas poucos a percebiam, o que permitiu a reeleição de Dilma.

Deve-se à Força Tarefa e ao juiz Sérgio Moro a reviravolta que se operou na política brasileira, colocando em cena a população, em megamanifestações sem precedentes na história.

O PT foi apeado do governo pela pressão das ruas, não de seus adversários políticos. O impeachment veio apesar deles. PSDB e PT se uniram para evitá-lo. FHC, por exemplo, avalizou a honestidade de Dilma com uma veemência superior à dela própria.

O desmentido veio pelas delações dos parceiros: empreiteiros, parlamentares e ex-ministros. O estrago da Odebrecht ainda está sendo assimilado e o STF anuncia que terá de pedir auxílio a outros magistrados para lidar com a montanha de inquéritos que dali resulta. Mas há ainda as delações da Andrade Gutierrez, OAS, Queiroz Galvão, UTC, Delta etc. O país oficial está no banco dos réus.

Em meio a isso, Palocci entra em cena – e com ele os bancos.

O mal do petismo

Os futuros presidentes da República terão de se esforçar muito se quiserem impingir ao País mal semelhante ao causado por Lula da Silva e Dilma Rousseff. O verdadeiro legado de suas gestões – evidente aos olhos dos que não costumam brigar com a realidade – é o mais absoluto retrocesso, sob quaisquer aspectos que se avalie: econômico, político, social e, sobretudo, moral. Uma marca difícil de ser batida.

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A serem comprovadas as acusações do Ministério Público Federal (MPF) e o conteúdo estarrecedor das delações de ex-funcionários da Odebrecht – notadamente as de Emílio e Marcelo Odebrecht, pai e filho, controladores da empreiteira –, estaremos diante de um caso inédito de venda do governo federal aos interesses de uma empresa privada, que em troca da facilitação de seus negócios pela cúpula governante bancou o enriquecimento ilícito de centenas de agentes públicos.

O PT deixou como marca indelével de sua passagem pelo poder a percepção de que onde houve governo, houve corrupção. É verdade que o partido não inventou a corrupção. Historiadores terão de recorrer ao período colonial para traçar as origens do crime no Brasil. Entretanto, uma vez no poder central, o PT fez da corrupção um método de governo com denodo jamais visto.

A cada dia, uma grande parcela dos brasileiros parece tomada pela sensação de que nenhum espaço da administração pública deixou de ser visto por petistas e seus apaniguados como oportunidade de negócios cujo desígnio principal foi o desvio de dinheiro público. Mesmo as “políticas sociais” do PT – bandeira que o partido e seus defensores sempre fizeram tremular com galhardia – foram concebidas para criar uma legião de cativos que, por dependência e não desenvolvimento, garantiriam a sustentação do grupo de poder e, assim, a manutenção de um sofisticado sistema engendrado para assaltar os contribuintes.

Não por acaso a popularidade de Lula segue alta no Nordeste, região mais pobre do País e onde está a maior concentração de beneficiários do programa Bolsa Família, segundo dados do IBGE.

O discurso pelo fortalecimento do Estado para enfrentar a “ganância do capital” e, assim, proteger os desvalidos – a eterna cantilena da esquerda – foi a desculpa perfeita para a ocupação e aparelhamento da administração pública pelo PT de modo a transformar o Tesouro Nacional numa espécie de “fundo partidário” privativo do partido e seus aliados.

O que as investigações da Lava Jato e a revelação das chamadas delações premiadas da Odebrecht escancaram ao País é que não houve uma só política de governo durante as gestões de Lula da Silva e Dilma Rousseff – ela mesma um improviso do ex-presidente para seguir com seu plano após as quedas de José Dirceu e Antonio Palocci – que não tenha sido pensada como meio de obtenção de vantagens ilícitas para o PT e, como ninguém é de ferro, para assegurar uma vida materialmente confortável aos próceres do partido. Lula e sua família, principalmente.

Com a política externa não foi diferente. As frentes de negócio abertas por Lula e Dilma em países como Argentina, Venezuela, Angola, entre outros, serviram para que empresas “eleitas” pudessem celebrar contratos que, na verdade, serviam tão somente para aumentar a captação de recursos que, por vias tortas, acabavam nas contas do PT e de outros partidos aliados. Todo o programa de governo petista, no Brasil e no exterior, parece ter sido montado tendo qualquer coisa como prioridade, menos aquilo que deveria pautá-lo na origem, o interesse público.

É compreensível o desalento da população diante da profunda crise na qual o PT afundou o País. Porém, mais forte do que o ímpeto criminoso de Lula e seus asseclas é a arraigada honestidade do povo brasileiro, que arrosta grandes sacrifícios sem se desviar do caminho da honra. É daí que vem a esperança que vencerá o medo e a incerteza. Desta vez, não como um mote publicitário vazio de significado, mas como a crença genuína de que um Brasil melhor há de surgir após este processo de depuração.

Gente fora do mapa

A Bodi woman - Salamago District, Omo Valley. Ethiopia. By Ingetie Tadros::
 Distrito de Salamago (Etiópia),  Ingetie Tadros

A antilista da Odebrecht

Está em curso no Brasil uma revolução sui generis. Sem armas, sem exércitos, sem líderes revolucionários autonomeados. Uma velha ordem está sendo derrubada. Com ricos e poderosos sentados no banco dos réus, assiste-se à degola metafórica de toda a classe política, sem que desponte uma nova ordem como as que anunciam as revoluções.

O sistema político partidário está sendo contestado de fora para dentro. O que nos confronta com um paradoxo: a política está em estado terminal enquanto a democracia está mais forte do que nunca.


Milhões de brasileiros clamam por decência, uma palavra fora de moda, uma causa justa que hoje mobiliza mais do que as caquéticas ideologias. Querem coisas simples, como viver num país em que o dinheiro de impostos seja aplicado na saúde da população e não saqueado por criminosos cujo cinismo e insensibilidade moral raiam à obscenidade.

O Brasil era governado por uma empresa que corrompeu a República. Tinha, no Senado, uma bancada majoritária, a soldo de seus interesses. A população está chocada como quem foi assaltado. E fomos.

Desmascarados, estes parlamentares perderam a legitimidade, sobretudo para votar uma reforma política. Com mão de gato, ainda tentam incluir na proposta de voto em lista fechada (destinada a garantir sua reeleição e foro privilegiado) o sigilo sobre os nomes nela incluídos. Para eles, não existimos.

O desrespeito à população tem sido a tônica da vida política. Marqueteiros pagos com dinheiro ilícito vendem uma imagem falsa dos candidatos tal como aconteceu na última eleição presidencial. O recurso sistemático à impostura se espalha país afora, chegando até as eleições municipais. Haja dinheiro de empresas para pagar fortunas a quem melhor vender gato por lebre ao eleitor.

Esta deformação alimenta um discurso perverso: ladrões foram eleitos pelo povo, logo a culpa é do povo que vota mal. Não, o povo compra o que a propaganda enganosa, financiada pelo roubo do dinheiro público, lhe vende. Os recursos que deveriam pagar escolas e hospitais financiam campanhas publicitárias que prometem as escolas e os hospitais que o povo não verá jamais. Mágica da corrupção que desmoraliza a democracia legitimando com o nosso voto os mesmos que nos assaltam.

O juiz Sérgio Moro restabeleceu a confiança na Justiça graças a um princípio claro e simples: ninguém está acima da lei. Moro não está só. Com ele, juízes, procuradores e a Polícia Federal estão envolvidos na apuração dos crimes. A reconstrução do país já está em curso, é preciso lembrar, quando a exposição diária à escabrosa criminalidade que nos assola estimula a depressão e a impotência.

O sistema político acabou e deixa um vazio. O buraco negro da política, sorvedouro de energias e esperanças, não se transforma da noite para o dia. Não saber como se faz o que precisa ser feito não impede que continue a ser preciso fazê-lo. A solução desse quebra cabeças tem que ser buscada em outros espaços e atores, nas novas formas de reivindicação de direitos e de ação transformadora já presentes na sociedade, a exemplo do que se fez na Campanha da Fome, de Betinho, e na Lei da Ficha limpa. A política só se regenera da sociedade para os partidos.

Desmistificar o discurso paralisante da falta de lideranças no país é parte da reconstrução. Há lideranças, sim, que, por palavras e obras, conquistaram a confiança da população. Drauzio Varella, sem ser político, é uma liderança nacional. É urgente fazermos um mapeamento, nos círculos de confiança em que nos movemos, de gente em quem votaríamos com orgulho.

Precisamos de uma antilista da Odebrecht, feita de homens e mulheres em quem a população se reconheça e que possa vir a representá-la. Para que essa lista de honra e não de vergonha seja viável precisamos de uma campanha nacional em prol da possibilidade de apresentação de candidaturas independentes, desvinculadas dos partidos e suas máquinas carcomidas.

Precisamos de uma Constituinte com o mandato de refazer as instituições políticas adaptando-as aos tempos em que vivemos, às novas formas de expressão de opiniões e de comunicação que estão hoje à nossa disposição.

Do estatuto de um dos países mais corruptos do mundo passamos ao do país que melhor luta contra a corrupção. A volta por cima que estamos dando, quero ver quem dava. O mais difícil foi feito: enfrentar gigantes empresariais e caudilhos, quebrar o padrão de impunidade que estimulava a bandidagem.

Inovar é preciso. O novo não vem do velho. Ele se gera a si mesmo e cria o espaço para se expandir.

Rosiska Darcy de Oliveira 

A bomba no ventre

Supermercado das campanhas

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Eleição e dinheiro não são consectários necessários. Não é necessário que haja dinheiro para que haja campanha eleitoral. Eleição se faz gastando sola de sapato. Eleição se fazia boca a boca, de porta em porta, de pessoa a pessoa
Célio Borja, ex-ministro da Justiça na gestão de Fernando Collor e ex-ministro do STF

'Chegamos aqui através do voto popular'

É o que tenho ouvido de muitos congressistas empenhados em drenar da dignidade do voto algumas gotas de virtude para substituir os hectolitros dessa mesma substância moral que deixaram verter pelo caminho.

Como assim, Excelência? Não dá para resgatar a honra do voto popular se ele foi obtido por péssimos meios para ainda piores fins. O que a cada dia fica mais evidente perante os olhos da sociedade brasileira é que um número substancial de mandatos em pleno uso de seu poder de fogo são mandatos usurpados, obtidos fora das regras do jogo e perverteram a representação democrática.

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A questão já foi posta por outros analistas, mas cabe reavivá-la aqui: o que é social e moralmente mais danoso? Fazer uso de dinheiro roubado para robustecer o patrimônio pessoal, ou para perverter a democracia mediante abuso do poder econômico durante a disputa eleitoral? Parece claro que atacar a virtude da disputa política, viciar a representação, corromper o voto popular é muito mais funesto. A certeza se extrai de realidade palpável porque - feitas as muitas devidas, honradas e honrosas exceções -, é impossível negar que tais práticas têm contribuído, de modo crescente, para desqualificar a representação, apetrechando o país com uma cada vez menos confiável, menos competente e menos esclarecida elite política.

Converse com antigos servidores de qualquer poder legislativo e ouvirá o testemunho do fato: a cada legislatura decai a qualidade da representação parlamentar, até sermos arrastados às atuais societas sceleris. Depois, observe os resultados dos pleitos presidenciais e me diga se alguma empresa, de capital aberto ou fechado, com acionistas ou proprietários, entregaria seu comando a pessoas como Lula e Dilma Rousseff. No entanto, o Brasil confiou-se a eles em quatro pleitos sucessivos.

Acompanhei em Porto Alegre, a última eleição da Câmara Municipal e sei o quanto ela, com recursos limitados a pequenas doações pessoais, dependeu principalmente da atividade voluntária de apoiadores e do trabalho diuturno dos candidatos. Bem diferente do que estava habituado a observar, quando, às primeiras horas do início efetivo das campanhas, a cidade amanhecia com suas principais avenidas tomadas por material publicitário de meia dúzia de candidatos.

Obviamente, a democracia ganha muito mais quando quem tem que buscar voto é a pessoa do candidato, quando é ele que trabalha e não sua máquina eleitoral, formada por legiões de militantes pagos, frotas de veículos e muito recurso sonante para atender demandas de cabos eleitorais espalhados de uma forma que lembra a tomada de território em guerra de ocupação.

Não venham, então, os que se locupletam com caixa dois, os mercadores de emendas, os que mascateiam favores, os beneficiários de exuberantes e mal havidos fundos partidários, advogar, em benefício dos próprios pescoços, por listas fechadas, abuso de autoridade, anistia de caixa 2. A nação dispensa tais trabalhos! É hora, então, de os bons congressistas se unirem para o expurgo dos maus.

Percival Puggina

Sozinho e abandonado

Chega a dar pena o abandono em que se encontra o ex-presidente Lula. No caso, abandonado por antigos amigos e líderes políticos de diversos matizes. Quanto a seus eleitores e admiradores, será melhor aguardar as manifestações programadas para a greve geral, dia 28, e demais protestos contra as iniciativas do governo Michel Temer e o próprio presidente.

O que salta aos olhos é o comportamento da mídia, das elites e dos partidos até pouco formando ao lado do primeiro companheiro. Teriam um apartamento de luxo no Guarujá e um sítio em Atibaia bastado para transformar um ex-operário em réu sem sentença e sem perdão?

É certo que os salários de torneiro-mecânico e depois, de presidente da República por oito anos, além de uma aposentadoria, não bastariam para justificar um patrimônio do valor apresentado pelo Lula. Só que não constituem motivo para a transformação do Lula em réprobo ou inimigo público número um. Por trás dessa carga de cavalaria desenvolvida contra ele não estão erros e exageros praticados no passado. Abre-se o medo do futuro. Há meses que ele lidera as pesquisas presidenciais para 2018. Diante da possibilidade de voltar ao palácio do Planalto, levantam-se as elites temerosas de que, eleito, ele desmanchará diretrizes e realizações de Michel Temer favoráveis à manutenção das massas assalariadas no patamar da pobreza e da indigência. É o medo dos poderosos de perder os privilégios que agora vem sendo restabelecidos pelas reformas neoliberais daqueles que tomaram o poder.

Por isso desencadeia-se a campanha que é menos contra o ex-presidente e mais em favor do que representaria sua volta ao poder, ou seja, o fim das mudanças previdenciárias, trabalhistas e fiscais favoráveis às elites.

Ignora-se em que vão dar os choques e as tertúlias entre as duas forças secularmente empenhadas na luta pelo poder. O Lula é apenas um símbolo. Se quiserem, um detalhe: a retomada de medidas que poderiam melhorar a vida dos menos favorecidos. A interrupção da escalada que manterá os benefícios das elites. Assim, tornou-se um perigo para os mesmos de sempre. Mesmo que para afastá-lo o argumento se concentre num apartamento de luxo e num sítio paradisíaco em meio à Serra do Mar…

Paisagem brasileira

Parque Estadual José Lutzenberger - Torres, RS ©Germano Schüür:
Parque Estadual José Lutzenberger, em Torres (RS) - Germano Schüür

Mãe em cena: e a hora do vamos ver de Moro e Lula

“No meio do caminho desta vida / me vi perdido numa selva escura, / solitário, sem sol e sem saída./ Ah, como armar no ar uma figura / dessa selva selvagem, dura, forte, que, só de eu a pensar, me desfigura?/ É quase tão amargo como a morte; / mas para expor o bem que eu encontrei, / outros dados darei da minha sorte”
(Trecho de “Inferno”, Canto I, extraído de “A Divina Comédia”, de Dante Alighieri)

Abril de 2017 corre infernal e desabalado no mundo, mas principalmente neste lado de baixo da linha imaginária do equador que nos toca viver: o incrível outono brasileiro deste tempo temerário trafega do jeito que o diabo gosta, mas com Deus de olhos bem abertos. Parece que estamos na encruzilhada entre as melhores apostas de redenção de um País (para muitos) e das maiores desesperanças (para outros tantos).

Os dias são assim: nem a senhora mãe de 93 anos de idade do figurão, do poder baiano e nacional, fica de fora. Foi arrastada também, esta semana, pela hecatombe política, governamental e moral causada pela saraivada de depoimentos, em delações premiadas, dos dois donos e dos principais executivos do império empresarial Odebrecht, no processo histórico da Lava Jato. Liberados semana passada pelo STF, devidamente acompanhados de áudios e imagens que seguem causando abalos e devastando biografias e reputações por toda parte.

Crua, popular e implacavelmente. Sem poupar ninguém com real ou aparente culpa no cartório. É bem o caso – para citar apenas um, mas emblemático, grave e assustador exemplo – da revelação feita por Hilberto Mascarenhas (deslavado executivo encarregado de tocar o departamento principal de distribuição de propinas do grupo comandado pelo patriarca Emílio Odebrecht (e seu filho Marcelo, preso há quase do  is anos em uma cadeia de Curitiba).


A partir de Salvador, a cidade de todos os santos e de quase todos os pecados (no dizer de um dos seus maiores cronistas do cotidiano, já falecido), Mascarenhas chefiava o clandestino setor que funcionou, a pleno vapor, durante anos seguidos. Principalmente, e com mais intensidade e amplitude corruptora, em períodos eleitorais ou de apresentações ou votações no Congresso, e assembleias estaduais, de projetos e medidas não de relevância pública, e sim de interesse financeiro direto da empreiteira fundada pelo velho Norberto.

Ao longo de três gerações, a maior empresa nacional da construção civil criou muitos braços. Afiou suas garras. Virou também a máquina "bem azeitada" (expressão mais ao gosto de seus donos na Bahia) de controle e dominação política e governamental, que a sociedade brasileira e o mundo cada dia descobrem um pouco mais, desde o começo da Lava Jato, quando a Polícia Federal, os procuradores da República e o juiz Sergio Moro começaram a escarafunchar a roubalheira sem tamanho alastrada na Petrobras, maior orgulho nacional até então. Práticas que vêm de longe, já se sabe, mas que encontraram em 13 anos dos governos petistas de Lula e Dilma o terreno mais pantanoso e adequado para crescer, prosperar, dominar um país e se expandir continente e mundo afora, avassaladoramente.É o que se vê, pelos rela tos de entrega da dinheirama da corrupção em quartos de hotéis, em desvãos de aeroportos, em baias de hipódromos... E as revelações mais escabrosas não param de surgir, a cada dia e a cada noticiário.

Os delatores não poupam nada nem ninguém, aparentemente. O homem do setor de pagamentos de vendidos políticos, governantes e altos burocratas do governo, Hilberto Mascarenhas, por exemplo, contou que a pessoa que recebia a propina indicava o local de entrega. O caixa-mor do propinoduto revelou então, que teve entrega de propina até em casa de mãe. Confirmou que foram pagos R$ 500 mil para o então governador da Bahia, Jaques Wagner, na casa da mãe dele, no Rio de Janeiro.

"Ele (Wagner) teve algum problema lá com a mãe dele e não queria mais que fosse usada a casa da mãe dele para fazer esse pagamento. Ele pediu e nós fizemos um esforço grande e conseguimos pagar em Salvador", contou cruamente Mascarenhas. Wagner repudiou as afirmações do homem da Odebrecht. Disse em nota ao JN, que o delator é um criminoso confesso que tenta reduzir a sua pena, "nem que para isso tenha de envolver uma senhora de 93 anos". Em Feira da Santana, na condição de secretário do governo petista de Rui Costa, reforçou a negativa ao participar de comício político mal disfarçado de ato administrativo, já de olho na reeleição do afilhado que colocou no Palácio de Ondina. A conferir.

E, como se não bastasse, ainda tivemos na quinta-feira, os depoimentos de Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, e de Antônio Palocci, ex-ministro da Fazenda, ambos com potência explosiva suficiente para deixar o ex-presidente Lula e Brasília insones e em estado de pavor. Tudo isso enquanto Curitiba vive dias de expectativas. No dia 3 de maio, o ex-presidente Lula, acusado de praticar crimes de corrupção passiva e de lavagem de dinheiro, prestará depoimento na Justiça Federal, diante do juiz Sérgio Moro.

Na capital paranaense os comentários sobre o "duelo" corre em todas a bocas, a começar pela "Boca Maldita", ponto referencial de manifestações políticas da cidade. Estive por lá no começo deste ano. No mês que vem não poderei ir. Mas espero se repita agora, algo semelhante ao pensamento expressado pelo motorista de taxi, um simpático tipo nipônico, quando conduzia o jornalista ao hotel, em janeiro. Comentei sobre a chuva que caía então em Curitiba. E o japa, tranquilo, sorrindo, falou: "é bom chover, que haja muita chuva, assim não faltará água para a Lava Jato continuar seu trabalho de limpeza de toda a sujeira em nosso país". Então, que venha maio e a chuva.

Quatro alegações falsas de céticos do clima

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A mudança climática não é apenas uma questão de acreditar ou não: sobre o tema, há pesquisas e fatos. Portanto, é hora de examinar as afirmações dos céticos - e mostrar por que elas estão erradas.
1 – Se o aquecimento global é real, por que estamos vivendo invernos com recorde de frio? Por que 1998 foi muito mais quente do que a maioria dos anos seguintes. Por que a superfície congelada no Hemisfério Sul está aumentando? O planeta não deveria estar ficando mais quente?
Sim, os fenômenos são reais. É errado, porém, considerá-los uma prova contra o aquecimento global. Isso porque as temperaturas globais não aumentam de forma linear e uniforme: alguns invernos no hemisfério norte, como no ano 2009/2010, foram particularmente frios, e outros mais quentes. Muitos fatores influenciam o clima: extraterrestres e terrestres, naturais ou antropogênicos (causados pelas atividades humanas), que interagem uns com os outros.

Por exemplo, há o El Niño, um fenômeno climático que, nos últimos anos, causou frequentemente altas temperaturas. Além de causar inundações em certas partes do mundo e secas em outras, o El Niño acarreta também temperaturas recordes temporárias – como no ano de 1998.

A extensão da cobertura de gelo na Antártida aumenta, enquanto no Ártico acontece exatamente o oposto. A principal razão é que a Antártida é afetada de forma diferente, em comparação com o Ártico, por ventos e correntes marítimas que protegem a região contra muitas influências climáticas. Portanto, o caso especial da Antártida não coloca em xeque o aquecimento global.

Apesar de todas as variações, observa-se, desde o início das medições sistemáticas, em 1880, um aumento das temperaturas médias da atmosfera terrestre e do mar. O ano de 2016 foi o mais quente desde 1880, sendo que o segundo e o terceiro mais quentes foram 2015 e 2014. Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), a temperatura global média aumentou em 0,85 graus Celsius de 1880 a 2012. Cada uma das últimas três décadas foi mais quente do que todas as anteriores desde 1850.
2 – A mudança climática é um processo natural e não causado pelo homem. As emissões de CO2 pelos humanos são pequenas demais para influenciar o clima.
Sim, é verdade. O clima está mudando desde que a Terra existe. No decurso de milhões de anos, os períodos frios e quentes sempre se alternam – um processo natural. A natureza tem também sua parcela nas mudanças climáticas desde a industrialização, ou seja, no aumento da temperatura global, aquecimento dos oceanos e aumento dos gases de efeito estufa na atmosfera.

Mas a mudança climática dos últimos 50 a 150 anos ocorre muito mais rápido do que quaisquer outras fases de aquecimentos conhecidas na história recente do nosso planeta.

Em seu último relatório de 2013, o IPCC considera como "muito provável" que a influência humana é a principal causa do aquecimento desde a metade do século 20. O aumento da liberação de gases de efeito estufa como o dióxido de carbono e metano pelo homem levou a uma concentração de gases na atmosfera que não ocorria desde 800 mil anos atrás. Segundo o IPCC, desde 1750, a concentração de CO2 aumentou 40% e, de metano, 150%.

É verdade que o CO2 também é liberado por vulcões e está contido no mar, no ar, em plantas e em regiões permafrost. Mas a natureza absorve o CO2 que ela também libera, gerando, assim, um equilíbrio. No entanto, as emissões adicionais dos seres humanos não podem ser totalmente absorvidas: elas são "em excesso" e acabam na atmosfera terrestre. Este processo se torna ainda mais significativo, por exemplo, devido ao desmatamento de florestas e o degelo das regiões permafrost.

Cerca de 97% de todos os pesquisadores sobre o clima estão certos de que as atividades humanas influenciam a mudança climática. Portanto, pode-se falar de um consenso científico. De acordo com estudos, os 3% dos cientistas que negam o aquecimento global antropogênico – quer dizer, causados pelo homem – são, muitas vezes, menos especializados na área. Eles vêm geralmente de observatórios conservadores como o Instituto Cato, que é financiado, entre outros, pela Volkswagen e empresas de energia.
3 – Se não conseguimos prever com exatidão como será o tempo amanhã, como podemos antever o clima daqui a 100 anos?
Quem não conhece essa situação: a previsão era de um fim de semana com muito sol, mas, no final das contas, ele foi chuvoso.

Em princípio, as previsões meteorológicas são diferentes dos modelos climáticos. O tempo é referente a um período mais curto, caótico e influenciado por muitos fatores. Por outro lado, o clima é referente a um prazo mais longo, e eventos caóticos são estatisticamente equilibrados. Portanto, reconhecer uma tendência climática ao longo de várias décadas – no caso de um aumento de temperatura causada por gases de efeito estufa – é mais fácil do que prever o tempo com precisão de horas.

Segundo o IPCC, a confiabilidade das previsões climáticas nos últimos anos melhorou significativamente. Muitos modelos climáticos foram desenvolvidos e são capazes de fazer uma simulação mais completa.

4 – Ok, então a temperatura está aumentando em todo o mundo em apenas alguns graus Celsius. Isso é realmente tão ruim? Afinal, a Terra já lidou com muitas mudanças.
Dois ou três graus a mais não parece muito. Algumas pessoas acham até melhor ter mais verão e menos inverno. Mas esses graus Celsius de diferença podem ter consequências extremas para o clima global.

De acordo com o IPCC, sem uma proteção ambiciosa do clima, a temperatura média global poderia subir 5,4 graus até o final do século 21 em comparação ao período pré-industrial. Isso significaria mais eventos climáticos extremos, como secas e precipitações intensas.

Assim, as geleiras continuariam a derreter, o nível do mar subiria e muitas regiões habitadas pelos humanos seriam inundadas. Os oceanos se tornariam mais quentes e ácidos, e a flora e fauna sofreriam.

A Terra é um sistema flexível. No passado, ela e seus habitantes já tiveram que se adaptar a notórias mudanças. Mas a capacidade de mudar também tem seus limites: a mudança climática antropogênica é muito mais rápida do que a capacidade de adaptação da natureza a essas alterações causadas pelos homens.

Os cidadãos brasileiros diante da crise política

A divulgação do pagamento de propinas expôs os responsáveis pelo desmantelamento do país, diante do desvio dos recursos da saúde, da educação, do saneamento e da infraestrutura. Os brasileiros ficaram, então, revoltados, pregando severa punição aos criminosos e questionando o processo administrativo, porque as autoridades roubam descaradamente, enquanto milhões de contribuintes não dispõem de recursos mínimos para sobreviver.

Atravessamos, portanto, um período crítico, pois os corruptos ainda podem levar a melhor, em sua matreirice parlamentar, mantendo suas estratégias para sugar o patrimônio público e dominar a população ignorante e dependente de benesses oficiais. Ou teremos avanço considerável se os cidadãos honestos assumirem o protagonismo, exigindo revisão geral da gestão pública, com novo código de conduta para que as autoridades fiquem comprometidas com a transparência, a austeridade e os projetos indispensáveis ao bem-estar coletivo.


Uma reviravolta dessa magnitude cobra intensa participação em todos os ambientes, preparando-nos para as eleições de 2018, quando selecionaremos novos governantes pelo voto soberano, consciente e livre, prestigiando lideranças confiáveis e eliminando oportunistas, desonestos e demagogos, que pretendem apenas perenizar seu poder, transferindo-o depois a seus descendentes.

Não cabe fazer agora campanha contra o sufrágio obrigatório, porque isso pode ensejar a permanência de alguns vícios, enquanto radicais discursam sobre a falácia da democracia e a necessidade de retorno do regime militar. Quando houve a redemocratização do Brasil, em 1985, imaginamos que as eleições diretas proporcionariam liberdade e desenvolvimento, mas os escândalos tornaram-se rotina nas administrações subsequentes. Os últimos acontecimentos estão apenas trazendo mais lama para a história política, expondo a inesgotável capacidade das autoridades para ludibriar um país que poderia viver dias melhores. A aversão ao voto obrigatório tem crescido, pois os candidatos de sempre não se acanham de recorrer a meios ilícitos para atingir objetivos que estão sempre na contramão dos interesses nacionais. Alguns cidadãos mais críticos dizem que os brasileiros vão reconhecer sua conivência com meios sórdidos para obter sucesso, o que seria uma demonstração de nossa decadência moral.

Precisamos resistir a proposições sobre anulação do voto para demonstrar repulsa à criminalidade na administração pública, porque isso não é solução para alterar o quadro político. Estaríamos abrindo mão de um direito essencial à cidadania sem oferecer alternativas para um grave problema, pois o candidato de alguns será o governante de todos. Ou seja, a ética passiva não contribui para a transformação dos esquemas viciados, pois lideranças nocivas crescem justamente no vácuo deixado por aqueles que não se posicionam efetivamente no pleito, delegando a outros a escolha de quem assumirá o poder.