sexta-feira, 11 de outubro de 2024
Tecno-Apocalipse: a era das Redes Sociais
Em 1959, Günther Anders fez um discurso na Freie Universität Berlin que foi posteriormente publicado como “Teses para a Era Atômica”, no qual ele analisou o impacto apocalíptico da bomba nuclear na política. As reflexões abaixo, inspiradas por esse texto, abordam algumas das consequências da ascensão das plataformas sociais desde 2008 no mesmo âmbito. Enquanto as plataformas de trabalho são amplamente analisadas e criticadas pela precarização do trabalho que produzem, as plataformas sociais permanecem, apesar do reconhecimento generalizado de seus efeitos nocivos para a sociedade, o grande consenso do realismo capitalista atual, para usar a expressão de Mark Fisher. O objetivo aqui não é comparar as redes sociais ou as plataformas com a bomba atômica de forma literal, mas reconhecer seu efeito profundo e, até agora, irreversível na política.
Essas teses, embora teóricas, provêm de uma realidade muito empírica e fatual. Quando Jair Bolsonaro venceu as eleições de 2018 no Brasil com uma campanha de mídia social muito bem-sucedida, e os escândalos da Cambridge Analytica vieram à tona, o Brasil tornou-se um case de estudos global no que se refere à ascensão da extrema direita, um laboratório para o que chamo de “neofascismo de plataforma”, uma tendência imbutida nas novas tecnologias digitais e fomentada por nossas práticas cotidianas. Isso gerou uma espécie de apocalipse tecnológico, que, embora não seja advindo de uma bomba, pode, no entanto, produzir genocídios, como aconteceu no Brasil durante a pandemia da covid-19, em Mianmar em 2017 e na Índia sob o governo de Narendra Modi.
A crise de 2008 remodelou de vez nosso mundo digital, dando origem a uma nova era de capitalismo monopolista. Intelectuais como Yanis Varoufakis, Cédric Durand e Jodi Dean chegam até mesmo a apontar para uma mudança no nosso modo de produção atual (isto é, uma mudança na organização social e econômica) do capitalismo para o “tecnofeudalismo”. A digitalização e a plataformização não são apenas um novo “modelo de negócios”, como pregam o Vale do Silício e suas variantes ao redor do mundo, mas sim um novo cercamento dos mercados (até mesmo o mercado de trabalho), de modo que a privatização desses mercados aniquila o princípio de competição inerente a eles. Mas não são apenas os mercados que são cercados, mas também nossas formas primárias de sociabilidade, cultura, educação, comunicação, e, mais importante, a política. A nova infraestrutura digital tornou-se a principal forma de organização política da direita. Desde o boom das redes sociais, governos de direita se proliferaram em todo o mundo em uma escala nunca vista antes. Esse aparato não apenas conectou grupos que antes eram apenas marginais, mas constitui a base de uma direita internacional globalizada neofascista. Mesmo defendendo o nacionalismo na maioria dos países, eles compõem o movimento social mais importante (em termos eleitorais) sem fronteiras de nosso tempo. Altamente organizados pelas versões locais de um novo partido de massas digital que atua através de uma máquina de propaganda pervasiva e ostensiva, esse movimento lucra amplamente com a lógica algorítmica que compõe as redes sociais e transforma a linguagem política atual na linguagem da publicidade na qual se amparam essas plataformas. Como argumenta Cathy O’Neil, os algoritmos tornaram-se as novas armas de destruição em massa. Como a destruição de Hiroshima tornou-se algo que pode ocorrer em qualquer lugar do mundo após o advento da bomba atômica, o neofascismo político do Brasil, dos Estados Unidos e da Índia torna-se uma possibilidade muito provável para outras democracias no mundo após a ascensão das redes sociais. O neofascismo de plataforma é uma condição mundial.
As redes sociais não são um instrumento; são um conjunto de monopólios. Nunca na história, a proposta de Marshall McLuhan de que “o meio é a mensagem” foi tão verdadeira. Assim como a bomba atômica não é uma possibilidade de paz, mas sua própria impossibilidade, as redes sociais não são uma possibilidade de ampliar a democracia, mas um de seus principais fatores destrutivos. Os alegados efeitos progressistas que elas podem ter na política são de longe superados por sua capacidade de erosão democrática. As redes sociais não são apenas “tecnologia pura”. É uma tecnologia inserida dentro de uma lógica de plataforma que dita a forma da nossa sociabilidade atual, mesmo que sejamos levados a acreditar que produzimos seu conteúdo. Embora isso pareça absolutamente plausível, é enganoso dizer que as redes sociais existem em nossa situação política. Esta afirmação deve ser invertida para se tornar verdadeira, como diz Anders sobre a bomba atômica. Como a situação política hoje é altamente determinada e definida pela existência das redes sociais – que cercam a esfera pública e o debate político, nossas formas de interação e subjetivação, a forma como nos informamos (especialmente as gerações mais jovens, como vemos agora com a campanha bem-sucedida da AfD no Tik Tok), e a maneira como fazemos política – é preciso reconhecer que as ações e desenvolvimentos políticos de nossa era estão ocorrendo dentro de uma situação de redes sociais, de plataformas sociais, não o contrário. O problema não é apenas o Twitter ou Elon Musk, mas a situação em si. Apesar dos efeitos catastróficos que essas plataformas têm causado, há uma espécie de consenso tecnológico que impede qualquer tipo de crítica. Apesar de todas as posições neofascistas de Elon Musk, ninguém discute o boicote de uma rede como o X – o maior sucesso dessas empresas foi vender o seu negócio como liberdade de expressão. Não há acordo sequer sobre sua regulação em círculos de esquerda. Como argumentei aqui antes, o aparato de plataforma atual realizou o sonho erótico do anarcocapitalismo. Uma das principais características do capitalismo digital é eliminar a função mediadora do Estado e das instituições estatais em múltiplas esferas. As criptomoedas eliminam o papel das regulamentações financeiras estaduais, as plataformas de trabalho contornam as legislações trabalhistas e as redes sociais dispensam qualquer e todo controle democrático sobre o debate político. A chamada tecnologia mais avançada de nossa era não é nada mais que um Velho Oeste digital, um conto de Mahagonny, onde a política é feita pelos mais fortes, mais rápidos e mais poderosos, e onde os perdedores são mais uma vez os subalternos, os povos autóctones, a paisagem natural.
Embora propagandeiem que ultrapassam qualquer fronteira, as redes sociais produzem mais divisões sociais e políticas do que qualquer outra tecnologia anterior a elas, pois não são apenas uma tecnologia, mas um monopólio digitalmente controlado de nossas formas de política. Em suas “Teses,” Günther Anders afirmou que a bomba atômica de alguma forma desconectou a violência e o ódio, transformando a guerra em um assunto impessoal. Segundo ele, “como os alvos do ódio artificialmente fabricado e o alvo dos ataques militares serão totalmente diferentes, a mentalidade da guerra se tornará realmente esquizofrênica.” As redes sociais assumiram o papel de reorganizar o ódio (as comunidades incel, os movimentos digitais neofascistas, as organizações pró-armas e pró-guerra), reconectando as vítimas do ódio com o ataque militar ou paramilitar a elas. As campanhas digitais que incitam o genocídio na Palestina, são só um dos muitos exemplos disso. O ódio nas redes sociais é a face atual da era atômica. Sua lógica algorítmica se encaixa na dinâmica fascista de “in-groups e out-groups” como uma luva. Isso impede que a sociedade como um todo perceba que, com a bomba atômica e a crise climática, “qualquer distinção entre perto e longe, vizinhos e estrangeiros, tornou-se inválida” e que estamos vinculados não apenas nesta, mas também nas próximas gerações à ameaça de destruição na qual nossa existência está enquadrada.
De acordo com Anders, a possibilidade de acionar uma bomba e não assistir aos seus efeitos, a separação no tempo e no espaço de uma ação e suas consequências, é a versão hiper-pós-moderna do assassinato disfarçado de trabalho ou cumprimento do dever no fascismo. Por trás da ideia de “seguir ordens”, novamente, segundo Anders, esconde-se a isenção do trabalhador de responsabilidade por seus próprios atos, dos quais “simplesmente não pode ser culpado”. Clicar é como apertar o botão de uma bomba. Se o ambiente virtual pode de fato dar a sensação de participação política a pessoas de outra forma excluídas da política, ele também separa a ação e a sua consequência no espaço e no tempo. Apertar um botão e pressionar uma tecla são atividades semelhantes agravadas pelo fato de que, no segundo caso, o caráter virtual da ação faz parecer que suas consequências não são verdadeiras. Isso é válido tanto para o indivíduo isolado que repassa uma fake news, como para as fazendas de cliques usadas para disseminar notícias falsas e eleger governos de extrema direita, bem como para a formação de “in-groups” que atacam mulheres, pessoas racializadas, LGBTQIA+ e estrangeiros a ponto de provocar feminicídios, queercídios e até genocídios. O que antes significava ser politicamente crítico e envolvido, isto é, engajado, agora é uma expressão que designa nossa participação em um aparato que é político até o cerne, mas cuja política é coberta por um véu tecnológico. As redes sociais substituem a ação por um engajamento que impede qualquer ação real enquanto, ao mesmo tempo, produzem uma forma de política que parece desaparecer no espaço temporal que separa os cliques e as suas consequências finais. Como Anders afirmou sobre a bomba atômica, “esta, então, é nossa situação absurda: no exato momento em que nos tornamos capazes da ação mais monstruosa, a destruição do mundo, as ‘ações’ parecem ter desaparecido. Como a mera existência de nossos produtos já prova ser ação, a pergunta trivial de como devemos usar nossos produtos para ação é quase fraudulenta, pois a pergunta obscurece o fato de que os produtos, por sua mera existência, já agiram”. Em 2024, metade das interações na internet será por e com bots. Nosso futuro deve ser decidido por isso?
Enquanto a mudança climática reforça o Endzeit e faz de nosso presente a última era em muitos sentidos, o tempo que passamos rolando os feeds nos aprisiona na temporalidade vazia das plataformas das redes sociais, tornando-nos cada vez mais incapazes de perceber o que produzimos como sociedade, de ouvir o que Anders chamou de “a voz muda de nossos produtos.” A era da informação se torna a era da ignorância, e nossa situação como “utópicos invertidos”, isto é, incapazes de ver o que já fizemos, é combinada com a perda de nossa capacidade de imaginar o que poderíamos fazer. Para escapar desta situação, devemos primeiro nos perguntar, sem medo da resposta: existe alguma possibilidade de emancipação dentro deste aparato e situação? Ser antiapocalíptico, como afirmava Anders, é cultivar a capacidade de temer as consequências das nossas ações passadas e presentes para as gerações futuras. Conter o avanço desse aparato sobre a sociedade, especialmente no Brasil dos próximos anos, é uma tarefa mais que necessária para barrar a extrema direita que continua firme e forte nessas redes e para conceber uma política que seja algo mais que mercadoria e publicidade.
Essas teses, embora teóricas, provêm de uma realidade muito empírica e fatual. Quando Jair Bolsonaro venceu as eleições de 2018 no Brasil com uma campanha de mídia social muito bem-sucedida, e os escândalos da Cambridge Analytica vieram à tona, o Brasil tornou-se um case de estudos global no que se refere à ascensão da extrema direita, um laboratório para o que chamo de “neofascismo de plataforma”, uma tendência imbutida nas novas tecnologias digitais e fomentada por nossas práticas cotidianas. Isso gerou uma espécie de apocalipse tecnológico, que, embora não seja advindo de uma bomba, pode, no entanto, produzir genocídios, como aconteceu no Brasil durante a pandemia da covid-19, em Mianmar em 2017 e na Índia sob o governo de Narendra Modi.
A crise de 2008 remodelou de vez nosso mundo digital, dando origem a uma nova era de capitalismo monopolista. Intelectuais como Yanis Varoufakis, Cédric Durand e Jodi Dean chegam até mesmo a apontar para uma mudança no nosso modo de produção atual (isto é, uma mudança na organização social e econômica) do capitalismo para o “tecnofeudalismo”. A digitalização e a plataformização não são apenas um novo “modelo de negócios”, como pregam o Vale do Silício e suas variantes ao redor do mundo, mas sim um novo cercamento dos mercados (até mesmo o mercado de trabalho), de modo que a privatização desses mercados aniquila o princípio de competição inerente a eles. Mas não são apenas os mercados que são cercados, mas também nossas formas primárias de sociabilidade, cultura, educação, comunicação, e, mais importante, a política. A nova infraestrutura digital tornou-se a principal forma de organização política da direita. Desde o boom das redes sociais, governos de direita se proliferaram em todo o mundo em uma escala nunca vista antes. Esse aparato não apenas conectou grupos que antes eram apenas marginais, mas constitui a base de uma direita internacional globalizada neofascista. Mesmo defendendo o nacionalismo na maioria dos países, eles compõem o movimento social mais importante (em termos eleitorais) sem fronteiras de nosso tempo. Altamente organizados pelas versões locais de um novo partido de massas digital que atua através de uma máquina de propaganda pervasiva e ostensiva, esse movimento lucra amplamente com a lógica algorítmica que compõe as redes sociais e transforma a linguagem política atual na linguagem da publicidade na qual se amparam essas plataformas. Como argumenta Cathy O’Neil, os algoritmos tornaram-se as novas armas de destruição em massa. Como a destruição de Hiroshima tornou-se algo que pode ocorrer em qualquer lugar do mundo após o advento da bomba atômica, o neofascismo político do Brasil, dos Estados Unidos e da Índia torna-se uma possibilidade muito provável para outras democracias no mundo após a ascensão das redes sociais. O neofascismo de plataforma é uma condição mundial.
As redes sociais não são um instrumento; são um conjunto de monopólios. Nunca na história, a proposta de Marshall McLuhan de que “o meio é a mensagem” foi tão verdadeira. Assim como a bomba atômica não é uma possibilidade de paz, mas sua própria impossibilidade, as redes sociais não são uma possibilidade de ampliar a democracia, mas um de seus principais fatores destrutivos. Os alegados efeitos progressistas que elas podem ter na política são de longe superados por sua capacidade de erosão democrática. As redes sociais não são apenas “tecnologia pura”. É uma tecnologia inserida dentro de uma lógica de plataforma que dita a forma da nossa sociabilidade atual, mesmo que sejamos levados a acreditar que produzimos seu conteúdo. Embora isso pareça absolutamente plausível, é enganoso dizer que as redes sociais existem em nossa situação política. Esta afirmação deve ser invertida para se tornar verdadeira, como diz Anders sobre a bomba atômica. Como a situação política hoje é altamente determinada e definida pela existência das redes sociais – que cercam a esfera pública e o debate político, nossas formas de interação e subjetivação, a forma como nos informamos (especialmente as gerações mais jovens, como vemos agora com a campanha bem-sucedida da AfD no Tik Tok), e a maneira como fazemos política – é preciso reconhecer que as ações e desenvolvimentos políticos de nossa era estão ocorrendo dentro de uma situação de redes sociais, de plataformas sociais, não o contrário. O problema não é apenas o Twitter ou Elon Musk, mas a situação em si. Apesar dos efeitos catastróficos que essas plataformas têm causado, há uma espécie de consenso tecnológico que impede qualquer tipo de crítica. Apesar de todas as posições neofascistas de Elon Musk, ninguém discute o boicote de uma rede como o X – o maior sucesso dessas empresas foi vender o seu negócio como liberdade de expressão. Não há acordo sequer sobre sua regulação em círculos de esquerda. Como argumentei aqui antes, o aparato de plataforma atual realizou o sonho erótico do anarcocapitalismo. Uma das principais características do capitalismo digital é eliminar a função mediadora do Estado e das instituições estatais em múltiplas esferas. As criptomoedas eliminam o papel das regulamentações financeiras estaduais, as plataformas de trabalho contornam as legislações trabalhistas e as redes sociais dispensam qualquer e todo controle democrático sobre o debate político. A chamada tecnologia mais avançada de nossa era não é nada mais que um Velho Oeste digital, um conto de Mahagonny, onde a política é feita pelos mais fortes, mais rápidos e mais poderosos, e onde os perdedores são mais uma vez os subalternos, os povos autóctones, a paisagem natural.
Embora propagandeiem que ultrapassam qualquer fronteira, as redes sociais produzem mais divisões sociais e políticas do que qualquer outra tecnologia anterior a elas, pois não são apenas uma tecnologia, mas um monopólio digitalmente controlado de nossas formas de política. Em suas “Teses,” Günther Anders afirmou que a bomba atômica de alguma forma desconectou a violência e o ódio, transformando a guerra em um assunto impessoal. Segundo ele, “como os alvos do ódio artificialmente fabricado e o alvo dos ataques militares serão totalmente diferentes, a mentalidade da guerra se tornará realmente esquizofrênica.” As redes sociais assumiram o papel de reorganizar o ódio (as comunidades incel, os movimentos digitais neofascistas, as organizações pró-armas e pró-guerra), reconectando as vítimas do ódio com o ataque militar ou paramilitar a elas. As campanhas digitais que incitam o genocídio na Palestina, são só um dos muitos exemplos disso. O ódio nas redes sociais é a face atual da era atômica. Sua lógica algorítmica se encaixa na dinâmica fascista de “in-groups e out-groups” como uma luva. Isso impede que a sociedade como um todo perceba que, com a bomba atômica e a crise climática, “qualquer distinção entre perto e longe, vizinhos e estrangeiros, tornou-se inválida” e que estamos vinculados não apenas nesta, mas também nas próximas gerações à ameaça de destruição na qual nossa existência está enquadrada.
De acordo com Anders, a possibilidade de acionar uma bomba e não assistir aos seus efeitos, a separação no tempo e no espaço de uma ação e suas consequências, é a versão hiper-pós-moderna do assassinato disfarçado de trabalho ou cumprimento do dever no fascismo. Por trás da ideia de “seguir ordens”, novamente, segundo Anders, esconde-se a isenção do trabalhador de responsabilidade por seus próprios atos, dos quais “simplesmente não pode ser culpado”. Clicar é como apertar o botão de uma bomba. Se o ambiente virtual pode de fato dar a sensação de participação política a pessoas de outra forma excluídas da política, ele também separa a ação e a sua consequência no espaço e no tempo. Apertar um botão e pressionar uma tecla são atividades semelhantes agravadas pelo fato de que, no segundo caso, o caráter virtual da ação faz parecer que suas consequências não são verdadeiras. Isso é válido tanto para o indivíduo isolado que repassa uma fake news, como para as fazendas de cliques usadas para disseminar notícias falsas e eleger governos de extrema direita, bem como para a formação de “in-groups” que atacam mulheres, pessoas racializadas, LGBTQIA+ e estrangeiros a ponto de provocar feminicídios, queercídios e até genocídios. O que antes significava ser politicamente crítico e envolvido, isto é, engajado, agora é uma expressão que designa nossa participação em um aparato que é político até o cerne, mas cuja política é coberta por um véu tecnológico. As redes sociais substituem a ação por um engajamento que impede qualquer ação real enquanto, ao mesmo tempo, produzem uma forma de política que parece desaparecer no espaço temporal que separa os cliques e as suas consequências finais. Como Anders afirmou sobre a bomba atômica, “esta, então, é nossa situação absurda: no exato momento em que nos tornamos capazes da ação mais monstruosa, a destruição do mundo, as ‘ações’ parecem ter desaparecido. Como a mera existência de nossos produtos já prova ser ação, a pergunta trivial de como devemos usar nossos produtos para ação é quase fraudulenta, pois a pergunta obscurece o fato de que os produtos, por sua mera existência, já agiram”. Em 2024, metade das interações na internet será por e com bots. Nosso futuro deve ser decidido por isso?
Enquanto a mudança climática reforça o Endzeit e faz de nosso presente a última era em muitos sentidos, o tempo que passamos rolando os feeds nos aprisiona na temporalidade vazia das plataformas das redes sociais, tornando-nos cada vez mais incapazes de perceber o que produzimos como sociedade, de ouvir o que Anders chamou de “a voz muda de nossos produtos.” A era da informação se torna a era da ignorância, e nossa situação como “utópicos invertidos”, isto é, incapazes de ver o que já fizemos, é combinada com a perda de nossa capacidade de imaginar o que poderíamos fazer. Para escapar desta situação, devemos primeiro nos perguntar, sem medo da resposta: existe alguma possibilidade de emancipação dentro deste aparato e situação? Ser antiapocalíptico, como afirmava Anders, é cultivar a capacidade de temer as consequências das nossas ações passadas e presentes para as gerações futuras. Conter o avanço desse aparato sobre a sociedade, especialmente no Brasil dos próximos anos, é uma tarefa mais que necessária para barrar a extrema direita que continua firme e forte nessas redes e para conceber uma política que seja algo mais que mercadoria e publicidade.
Por um jornalismo menos ofegante
A regra número um do jornalismo é simples: o jornalista não deve ser notícia! Sabemos que já a desrespeitámos algumas vezes, ao longo deste ano, aqui na VISÃO, mas o assunto é sério – tão sério que o primeiro-ministro falou sobre ele novamente esta terça-feira, 8, numa conferência dedicada ao futuro dos media.
Durante o evento, Luís Montenegro reforçou o papel fundamental do jornalismo para a manutenção da Democracia, e elencou uma série de medidas, que podem ser consultadas na página oficial do Governo, para tentar mitigar um problema que, assumiu novamente o governante, é estrutural. Montenegro lamentou que muitas vezes a comunicação social faça um “jornalismo ofegante”, no sentido de tentar ser mais rápido, ao invés de ter a tranquilidade e a calma necessárias para uma análise profunda da realidade. Não está errado, o chefe do Executivo. Mas a velocidade do mundo tem, inevitavelmente, contagiado os jornalistas, que cada vez chegam a menos pessoas, alimentam mais plataformas, recebem menos e trabalham mais. As empresas de media transformaram-se em máquinas que tentam fazer dinheiro num negócio que poucas vezes o conseguiu – perceber isso era meio caminho andado para abordar o assunto de outra forma.
Pensar em programas de literacia mediática para os alunos do Ensino Secundário parece visionário, mas na Finlândia esse cuidado é tido a partir do Ensino Básico – com crianças de telemóvel e ecrãs na mão desde que nascem, chegar ao Secundário sem saber distinguir a verdade da mentira é uma tragédia para a democracia. A proliferação de canais de informação nas redes sociais, sem fontes fidedignas e com a ajuda de algoritmos que disseminam mentiras como se fossem verdades absolutas, não vai abrandar. A única forma de garantir que a verdade continua a ser vista como tal é dando às pessoas ferramentas para identificar os factos não verificados. E as fontes falsas da informação que recebem.
No mesmo sentido, os incentivos à assinatura de jornais e revistas são de louvar, mas continuam a ser insuficientes: porque, se não há hábitos de consumo de informação desde cedo, eles não vão vingar no futuro. E não chegam para financiar empresas deficitárias (como é o caso da dona da VISÃO). Se os media são um pilar da Democracia, devem ser tratados como tal: com os apoios certos, universais e transversais. Devem ser alvo de políticas públicas sérias, com regulação apertada e com objetivos concretos. Com leis que incentivem o mecenato e o investimento num setor que, se é tão fundamental como se diz, não pode ser deixado ao abandono, nem tratado como outro qualquer.
Os governos têm sempre muito medo de que se diga que estão a interferir nos media. Como se os media não tivessem capacidade para controlar essa pressão – é esse o nosso trabalho. E como se alguns dos mais respeitados meios não fossem totalmente públicos: veja-se o exemplo da RTP, da BBC, da France TV…
Graças a esse medo, os sucessivos executivos nacionais deixaram os media definhar, apontando agora problemas estruturais que existem e foram identificados há anos, e para os quais foram devidamente alertados. É muito bom ver um Governo comprometido, finalmente, com medidas concretas. Mas temo que, se não houver rapidamente um esforço mais musculado, sobrem poucos meios para defender a Democracia daqui a muito pouco tempo.
Durante o evento, Luís Montenegro reforçou o papel fundamental do jornalismo para a manutenção da Democracia, e elencou uma série de medidas, que podem ser consultadas na página oficial do Governo, para tentar mitigar um problema que, assumiu novamente o governante, é estrutural. Montenegro lamentou que muitas vezes a comunicação social faça um “jornalismo ofegante”, no sentido de tentar ser mais rápido, ao invés de ter a tranquilidade e a calma necessárias para uma análise profunda da realidade. Não está errado, o chefe do Executivo. Mas a velocidade do mundo tem, inevitavelmente, contagiado os jornalistas, que cada vez chegam a menos pessoas, alimentam mais plataformas, recebem menos e trabalham mais. As empresas de media transformaram-se em máquinas que tentam fazer dinheiro num negócio que poucas vezes o conseguiu – perceber isso era meio caminho andado para abordar o assunto de outra forma.
Pensar em programas de literacia mediática para os alunos do Ensino Secundário parece visionário, mas na Finlândia esse cuidado é tido a partir do Ensino Básico – com crianças de telemóvel e ecrãs na mão desde que nascem, chegar ao Secundário sem saber distinguir a verdade da mentira é uma tragédia para a democracia. A proliferação de canais de informação nas redes sociais, sem fontes fidedignas e com a ajuda de algoritmos que disseminam mentiras como se fossem verdades absolutas, não vai abrandar. A única forma de garantir que a verdade continua a ser vista como tal é dando às pessoas ferramentas para identificar os factos não verificados. E as fontes falsas da informação que recebem.
No mesmo sentido, os incentivos à assinatura de jornais e revistas são de louvar, mas continuam a ser insuficientes: porque, se não há hábitos de consumo de informação desde cedo, eles não vão vingar no futuro. E não chegam para financiar empresas deficitárias (como é o caso da dona da VISÃO). Se os media são um pilar da Democracia, devem ser tratados como tal: com os apoios certos, universais e transversais. Devem ser alvo de políticas públicas sérias, com regulação apertada e com objetivos concretos. Com leis que incentivem o mecenato e o investimento num setor que, se é tão fundamental como se diz, não pode ser deixado ao abandono, nem tratado como outro qualquer.
Os governos têm sempre muito medo de que se diga que estão a interferir nos media. Como se os media não tivessem capacidade para controlar essa pressão – é esse o nosso trabalho. E como se alguns dos mais respeitados meios não fossem totalmente públicos: veja-se o exemplo da RTP, da BBC, da France TV…
Graças a esse medo, os sucessivos executivos nacionais deixaram os media definhar, apontando agora problemas estruturais que existem e foram identificados há anos, e para os quais foram devidamente alertados. É muito bom ver um Governo comprometido, finalmente, com medidas concretas. Mas temo que, se não houver rapidamente um esforço mais musculado, sobrem poucos meios para defender a Democracia daqui a muito pouco tempo.
Bolsonaro continua impune
O primeiro turno das eleições municipais confirmou que Bolsonaro sobrevive como ator influente e capaz de forjar eleitos pelo país. Não sabemos a exata medida dessa influência antes do resultado do segundo turno, mas a conclusão é incontornável.
Depois do mais radical período de delinquência governamental em muitas gerações, tudo que o sistema de Justiça brasileiro conseguiu realizar, em relação ao líder do movimento, foi declarar sua inelegibilidade por oito anos em razão de ataques à urna em reunião com embaixadores e do uso político das comemorações do Bicentenário. O TSE não se pronunciou sobre outros crimes eleitorais. O PGR nem sequer provocou o STF a julgar crimes comuns.
A falta de responsabilização justa e robusta de agentes que evisceraram as capacidades de o Estado executar políticas públicas e atentaram contra o regime democrático é convite a que essas práticas se repitam. O argumento é tão trivial quanto correto. Está em todas as cartilhas da resistência democrática contra a terceira onda global de autocratização da qual o Brasil não se apartou.
Não é surpresa que, por baixo do alarde sobre "punição exemplar" pelos crimes de 8 de janeiro, nessa simulação teatral de uma heroica "recivilização" dos radicalizados, o STF tem se esmerado mesmo é em punir peixes pequenos. A investigação de militares, políticos e empresários segue na gaveta.
Lambaris vão caindo na rede, tubarões continuam nadando. E o STF se orgulha da corajosa façanha. Não deixa de ser fiel à tradição do Judiciário brasileiro, para quem sempre foi mais fácil punir quem carece de força política, econômica e social; mais difícil punir quem frequenta as suas rodas de convívio real e simbólico, quem pode pagar o arsenal de chicanas advocatícias geradoras de atraso, prescrição e impunidade.
Importante entender que a anistia a Bolsonaro, pelo menos em parte, já aconteceu. O primeiro operador dessa anistia não declarada foi Augusto Aras, por meio de arquivamentos alegando de falta de provas (apesar dos quilos de provas produzidas pela CPI) ou a não tipicidade criminal da conduta (como a ideia de que presidente é agente político "sui generis" e não comete prevaricação).
Gonet, atual PGR, precisaria de vontade, coragem e criatividade jurídica para reabrir e questionar a "coisa julgada" do que Aras trancou. Mas há outra lista de acusações criminais que Aras não pôde arquivar. Envolve peculato, falsidade ideológica, atentado violento contra o Estado de Direito, tentativa de golpe de Estado, organização criminosa. Não é modesta a xepa do fim da feira criminal.
Alexandre de Moraes, em seus inquéritos, acumulou poder cautelar para interferir no extremismo político. E em práticas nem tão extremistas assim. Um poder excessivo, excepcional e perigoso, mas que não inclui o poder de denunciar criminalmente.
Para que o STF possa julgar Bolsonaro, Gonet precisa denunciar. Ele declarou, dia desses, que iria "deixar para depois da eleição". Diz não querer se meter na política. Se bobear, vai também esperar a eleição americana. Não percebeu que, ao desobedecer dever funcional de denunciar um investigado assim que as provas estejam maduras, interfere decisivamente na política e sonega do eleitor informação a que tem direito.
Conrado Hübner Mendes
Depois do mais radical período de delinquência governamental em muitas gerações, tudo que o sistema de Justiça brasileiro conseguiu realizar, em relação ao líder do movimento, foi declarar sua inelegibilidade por oito anos em razão de ataques à urna em reunião com embaixadores e do uso político das comemorações do Bicentenário. O TSE não se pronunciou sobre outros crimes eleitorais. O PGR nem sequer provocou o STF a julgar crimes comuns.
A falta de responsabilização justa e robusta de agentes que evisceraram as capacidades de o Estado executar políticas públicas e atentaram contra o regime democrático é convite a que essas práticas se repitam. O argumento é tão trivial quanto correto. Está em todas as cartilhas da resistência democrática contra a terceira onda global de autocratização da qual o Brasil não se apartou.
Não é surpresa que, por baixo do alarde sobre "punição exemplar" pelos crimes de 8 de janeiro, nessa simulação teatral de uma heroica "recivilização" dos radicalizados, o STF tem se esmerado mesmo é em punir peixes pequenos. A investigação de militares, políticos e empresários segue na gaveta.
Lambaris vão caindo na rede, tubarões continuam nadando. E o STF se orgulha da corajosa façanha. Não deixa de ser fiel à tradição do Judiciário brasileiro, para quem sempre foi mais fácil punir quem carece de força política, econômica e social; mais difícil punir quem frequenta as suas rodas de convívio real e simbólico, quem pode pagar o arsenal de chicanas advocatícias geradoras de atraso, prescrição e impunidade.
Importante entender que a anistia a Bolsonaro, pelo menos em parte, já aconteceu. O primeiro operador dessa anistia não declarada foi Augusto Aras, por meio de arquivamentos alegando de falta de provas (apesar dos quilos de provas produzidas pela CPI) ou a não tipicidade criminal da conduta (como a ideia de que presidente é agente político "sui generis" e não comete prevaricação).
Gonet, atual PGR, precisaria de vontade, coragem e criatividade jurídica para reabrir e questionar a "coisa julgada" do que Aras trancou. Mas há outra lista de acusações criminais que Aras não pôde arquivar. Envolve peculato, falsidade ideológica, atentado violento contra o Estado de Direito, tentativa de golpe de Estado, organização criminosa. Não é modesta a xepa do fim da feira criminal.
Alexandre de Moraes, em seus inquéritos, acumulou poder cautelar para interferir no extremismo político. E em práticas nem tão extremistas assim. Um poder excessivo, excepcional e perigoso, mas que não inclui o poder de denunciar criminalmente.
Para que o STF possa julgar Bolsonaro, Gonet precisa denunciar. Ele declarou, dia desses, que iria "deixar para depois da eleição". Diz não querer se meter na política. Se bobear, vai também esperar a eleição americana. Não percebeu que, ao desobedecer dever funcional de denunciar um investigado assim que as provas estejam maduras, interfere decisivamente na política e sonega do eleitor informação a que tem direito.
Conrado Hübner Mendes
A guerra
A guerra que aflige com os seus esquadrões o Mundo,
É o tipo perfeito do erro da filosofia.
A guerra, como todo humano, quer alterar.
Mas a guerra, mais do que tudo, quer alterar e alterar muito
E alterar depressa.
Mas a guerra inflige a morte.
E a morte é o desprezo do Universo por nós.
Tendo por consequência a morte, a guerra prova que é falsa.
Sendo falsa, prova que é falso todo o querer alterar.
Deixemos o universo exterior e os outros homens onde a Natureza os pôs.
Tudo é orgulho e inconsciência.
Tudo é querer mexer-se, fazer coisas, deixar rasto.
Para o coração e o comandante dos esquadrões
Regressa aos bocados o universo exterior.
A química direta da Natureza
Não deixa lugar vago para o pensamento.
A humanidade é uma revolta de escravos.
A humanidade é um governo usurpado pelo povo.
Existe porque usurpou, mas erra porque usurpar é não ter direito.
Deixai existir o mundo exterior e a humanidade natural!
Paz a todas as coisas pré-humanas, mesmo no homem!
Paz à essência inteiramente exterior do Universo!
Alberto Caeiro (Fernando Pessoa)
Apelo de Netanyahu ao povo libanês cai em ouvidos moucos em Beirute
O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, apelou diretamente ao povo do Líbano em um vídeo publicado na terça-feira, dizendo-lhes para se voltarem contra o grupo xiita Hezbollah, apoiado pelo Irã, ou correrem o risco de uma destruição na mesma escala de Gaza.
Mas nos bairros xiitas, sunitas e cristãos de Beirute, na manhã de quarta-feira, o apelo de Netanyahu estava caindo em grande parte – se não totalmente – em ouvidos moucos.
“Sim, ouvimos o discurso, mas ninguém aqui escuta Netanyahu”, disse Yusuf Habbal, 31, enquanto cortava pedaços do doce tradicional libanês Kunafah em sua loja em Tariq El Jdideh, uma área sunita.
“Ninguém disse a Netanyahu para ocupar a Palestina, ninguém disse a ele para ocupar o Líbano. São os israelenses que estão conduzindo esse conflito.”
“Cristãos, drusos, muçulmanos sunitas e xiitas, todos vocês estão sofrendo por causa da guerra fútil do Hezbollah contra Israel”, ele disse. “Levantem-se e tomem seu país de volta.”
Mas nos bairros xiitas, sunitas e cristãos de Beirute, na manhã de quarta-feira, o apelo de Netanyahu estava caindo em grande parte – se não totalmente – em ouvidos moucos.
“Sim, ouvimos o discurso, mas ninguém aqui escuta Netanyahu”, disse Yusuf Habbal, 31, enquanto cortava pedaços do doce tradicional libanês Kunafah em sua loja em Tariq El Jdideh, uma área sunita.
“Ninguém disse a Netanyahu para ocupar a Palestina, ninguém disse a ele para ocupar o Líbano. São os israelenses que estão conduzindo esse conflito.”
Bombardeio de Israel, sem aviso, no Centro de Beirute |
Mas Habbal e seus companheiros sunitas “também não aceitam o que o Hezbollah está fazendo”, disse ele.
“Antes que Netanyahu falasse sobre o Hezbollah, nós éramos contra eles. O povo de Beirute sabe que o Hezbollah tem sua própria agenda. E agora eles estão nos levando para uma guerra que não queremos.”
“Ninguém aqui escuta Netanyahu”, diz Yusuf Habbal em sua loja em Beirute
O Hezbollah, que é uma força mais bem armada e poderosa no Líbano do que o próprio exército do país, começou a disparar foguetes contra o norte de Israel há um ano, em apoio ao Hamas, no dia seguinte ao brutal ataque de 7 de outubro.
Os foguetes do Hezbollah sinalizaram o início de uma nova fase de seu confronto com Israel. No mês passado, Israel intensificou esse conflito latente quando expandiu sua campanha de bombardeios no Líbano, incluindo Beirute, antes de lançar uma invasão terrestre no sul do país.
“Eles estão atacando muito perto de nós agora e é assustador”, disse Mohammed Khair, 43, enquanto cortava o cabelo em uma barbearia em Tariq El Jdideh.
“Ninguém aqui quer essa guerra, mas ninguém vai se voltar contra o Hezbollah por algo que Netanyahu disse em um vídeo”, disse ele.
Netanyahu estava “sempre falando com os palestinos, com os libaneses”, disse Tarraf Nasser, um aposentado de 76 anos que estava passando pela barbearia. “Ninguém escuta Netanyahu”, ele disse. “Ele não está realmente falando conosco.”
Fadi Ali Kiryani do lado de fora de sua loja em Beirute. "Nós sempre hastearemos a bandeira do Hezbollah", disse ele
Em Achrafieh, o principal bairro cristão de Beirute, havia uma sensação de futilidade quanto à capacidade do povo libanês de seguir os conselhos de Netanyahu, mesmo que quisessem.
Antoine, um aposentado católico de 75 anos, que pediu para ser identificado apenas pelo primeiro nome, estava fumando um cigarro do lado de fora do Brewholic Café do bairro.
“Benjamin Netanyahu é o primeiro-ministro de Israel, não do Líbano. Ele deveria cuidar do seu povo, não do nosso”, disse Antoine.
“Ao mesmo tempo, é verdade que temos que fazer algo para nos libertar da influência do Irã. Mas não temos armas e não temos políticos que possam ser verdadeiramente libaneses. Todos os nossos políticos são afiliados a outros estados ou grupos, principalmente o Irã."
Ninguém no Líbano teria conflito doméstico porque Netanyahu os instruiu, disse Antoine. “Faremos isso por conta própria.”
Do outro lado da rua, em sua sapataria, Maya Habib, 35, deu de ombros cansados ao apelo em vídeo do primeiro-ministro israelense. “Todo mundo aqui sabe que Israel mente”, ela disse. “Mas ouça, talvez ele tenha razão. Ele avisou a todos – não nos ataquem, não cheguem perto de nós, e esta não será sua guerra. Agora é.”
Entre os cristãos de Achrafieh, “as pessoas estão prestando atenção” a Netanyahu, disse Habib. “Mas ninguém pode fazer nada de qualquer maneira”, ela disse, dando de ombros novamente. “Nós nem temos um presidente. Netanyahu está dizendo que todas as armas devem ir para o exército libanês, mas como?”
Ali Srour, 24, dono de uma joalheria. "Ninguém realmente se importa conosco", disse ele
O Hezbollah ainda pode contar com apoio firme nos bairros onde é a força dominante na vida política e social, e entre as comunidades xiitas de áreas mistas. Vários moradores xiitas do bairro Mar Elias disseram que estavam completamente atrás do grupo.
“Somos todos Hezbollah aqui, não importa o que o Hezbollah faça, nós os apoiaremos”, disse Fadi Ali Kiryani, um dono de loja de esquina de 52 anos. Como outras pessoas em Mar Elias, Kiryani disse que não estava preocupado com a ameaça de Netanyahu de que o Líbano sofreria a mesma destruição e sofrimento que Gaza.
“Mesmo que a situação aqui fique pior do que em Gaza, continuaremos a hastear a bandeira”, disse ele.
“Minha casa em Dahieh já foi destruída. Eu preferiria que minha casa desaparecesse do que o sapato no pé de um combatente do Hezbollah fosse danificado.”
Sentada atrás da mesa de sua loja de toalhas e roupas de cama de 40 anos, Fany Sharara, de 75 anos, disse que o Hezbollah era a única força que defendia o povo do Líbano.
“Nada que Netanyahu dissesse poderia mudar minha mente”, ela disse. “Ele é um criminoso, um assassino, ele não pode deixar uma criança viva.”
Israel tinha “toda a Europa e toda a América” do seu lado, Sharara acrescentou. “Estamos com o Hezbollah porque eles são os únicos nos defendendo. Não o governo libanês.”
Algumas portas abaixo, e alguns anos mais jovem, o dono de uma joalheria de 24 anos Ali Shoura estava simplesmente cansado de todos os envolvidos, ele disse. "Ninguém realmente se importa - os políticos, as pessoas no poder, o governo libanês, o Irã, Israel, a América, o Hezbollah também."
Ele balançou a cabeça. “É tudo só teatro”, ele disse. “E nós somos todos as vítimas.”
“Antes que Netanyahu falasse sobre o Hezbollah, nós éramos contra eles. O povo de Beirute sabe que o Hezbollah tem sua própria agenda. E agora eles estão nos levando para uma guerra que não queremos.”
“Ninguém aqui escuta Netanyahu”, diz Yusuf Habbal em sua loja em Beirute
O Hezbollah, que é uma força mais bem armada e poderosa no Líbano do que o próprio exército do país, começou a disparar foguetes contra o norte de Israel há um ano, em apoio ao Hamas, no dia seguinte ao brutal ataque de 7 de outubro.
Os foguetes do Hezbollah sinalizaram o início de uma nova fase de seu confronto com Israel. No mês passado, Israel intensificou esse conflito latente quando expandiu sua campanha de bombardeios no Líbano, incluindo Beirute, antes de lançar uma invasão terrestre no sul do país.
“Eles estão atacando muito perto de nós agora e é assustador”, disse Mohammed Khair, 43, enquanto cortava o cabelo em uma barbearia em Tariq El Jdideh.
“Ninguém aqui quer essa guerra, mas ninguém vai se voltar contra o Hezbollah por algo que Netanyahu disse em um vídeo”, disse ele.
Netanyahu estava “sempre falando com os palestinos, com os libaneses”, disse Tarraf Nasser, um aposentado de 76 anos que estava passando pela barbearia. “Ninguém escuta Netanyahu”, ele disse. “Ele não está realmente falando conosco.”
Fadi Ali Kiryani do lado de fora de sua loja em Beirute. "Nós sempre hastearemos a bandeira do Hezbollah", disse ele
Em Achrafieh, o principal bairro cristão de Beirute, havia uma sensação de futilidade quanto à capacidade do povo libanês de seguir os conselhos de Netanyahu, mesmo que quisessem.
Antoine, um aposentado católico de 75 anos, que pediu para ser identificado apenas pelo primeiro nome, estava fumando um cigarro do lado de fora do Brewholic Café do bairro.
“Benjamin Netanyahu é o primeiro-ministro de Israel, não do Líbano. Ele deveria cuidar do seu povo, não do nosso”, disse Antoine.
“Ao mesmo tempo, é verdade que temos que fazer algo para nos libertar da influência do Irã. Mas não temos armas e não temos políticos que possam ser verdadeiramente libaneses. Todos os nossos políticos são afiliados a outros estados ou grupos, principalmente o Irã."
Ninguém no Líbano teria conflito doméstico porque Netanyahu os instruiu, disse Antoine. “Faremos isso por conta própria.”
Do outro lado da rua, em sua sapataria, Maya Habib, 35, deu de ombros cansados ao apelo em vídeo do primeiro-ministro israelense. “Todo mundo aqui sabe que Israel mente”, ela disse. “Mas ouça, talvez ele tenha razão. Ele avisou a todos – não nos ataquem, não cheguem perto de nós, e esta não será sua guerra. Agora é.”
Entre os cristãos de Achrafieh, “as pessoas estão prestando atenção” a Netanyahu, disse Habib. “Mas ninguém pode fazer nada de qualquer maneira”, ela disse, dando de ombros novamente. “Nós nem temos um presidente. Netanyahu está dizendo que todas as armas devem ir para o exército libanês, mas como?”
Ali Srour, 24, dono de uma joalheria. "Ninguém realmente se importa conosco", disse ele
O Hezbollah ainda pode contar com apoio firme nos bairros onde é a força dominante na vida política e social, e entre as comunidades xiitas de áreas mistas. Vários moradores xiitas do bairro Mar Elias disseram que estavam completamente atrás do grupo.
“Somos todos Hezbollah aqui, não importa o que o Hezbollah faça, nós os apoiaremos”, disse Fadi Ali Kiryani, um dono de loja de esquina de 52 anos. Como outras pessoas em Mar Elias, Kiryani disse que não estava preocupado com a ameaça de Netanyahu de que o Líbano sofreria a mesma destruição e sofrimento que Gaza.
“Mesmo que a situação aqui fique pior do que em Gaza, continuaremos a hastear a bandeira”, disse ele.
“Minha casa em Dahieh já foi destruída. Eu preferiria que minha casa desaparecesse do que o sapato no pé de um combatente do Hezbollah fosse danificado.”
Sentada atrás da mesa de sua loja de toalhas e roupas de cama de 40 anos, Fany Sharara, de 75 anos, disse que o Hezbollah era a única força que defendia o povo do Líbano.
“Nada que Netanyahu dissesse poderia mudar minha mente”, ela disse. “Ele é um criminoso, um assassino, ele não pode deixar uma criança viva.”
Israel tinha “toda a Europa e toda a América” do seu lado, Sharara acrescentou. “Estamos com o Hezbollah porque eles são os únicos nos defendendo. Não o governo libanês.”
Algumas portas abaixo, e alguns anos mais jovem, o dono de uma joalheria de 24 anos Ali Shoura estava simplesmente cansado de todos os envolvidos, ele disse. "Ninguém realmente se importa - os políticos, as pessoas no poder, o governo libanês, o Irã, Israel, a América, o Hezbollah também."
Ele balançou a cabeça. “É tudo só teatro”, ele disse. “E nós somos todos as vítimas.”
Assinar:
Postagens (Atom)