Não, meu senhor,
Tenha paciência,
Diga coisa que preste.
Não eram os cavaleiros do Apocalipse
que assaltavam diligências
no Velho Oeste.Raul Drewnick
sexta-feira, 29 de junho de 2018
Uma janela para o mundo
Para quem está fora, mesmo por um curto período, o tema não é tão marginal assim. Impossível ignorar o drama dos refugiados. Só se fala nisso, crise nos Estados Unidos por causa da decisão de Trump, arestas entre Franca e Itália, crianças separadas da família, ciganos na mira da expulsão na Itália. É o tipo de problema sem solução em curto prazo, com viés de agravamento.
Se consideramos nossa fronteira setentrional, lá também essa questão se vem complicando ao longo dos três últimos três anos. Apesar de a Colômbia ser ainda o destino preferido, por causa do idioma comum, os refugiados da Venezuela entram em massa por Roraima. Essa presença já produziu alguns atritos entre o governo local e Brasília. Forçou a elaboração de um plano e jogou as Forças Armadas em parte de sua execução.
Nos Estados Unidos, mais precisamente na fronteira mexicana, vivemos um problema inverso, no momento em que Trump decide adotar normas mais rígidas para conter o processo migratório. Na verdade, talvez seja essa a contradição mais importante no mundo contemporâneo: a fluidez dos capitais e mercadorias ante as barreiras crescentes ao movimento da força de trabalho.
Todo país deve ter sua política sobre o tema. Mas é preciso admitir que soluções mais amplas dependem de muitos atores internacionais. Minha hipótese para uma política de longo prazo é de que países como Brasil e Canadá, por suas dimensões, poderiam representar um alívio para o tenso clima associado ao tema dos refugiados.
São países com condições diferentes. O Brasil vive uma crise econômica, tem quase 14 milhões de desempregados, na verdade, mal consegue cuidar dos seus, quanto mais receber gente de fora. No entanto, embora os países do norte já tenham esgotado sua capacidade de administrar o problema, não esgotaram seus recursos financeiros. Uma grande troca, escalonada no tempo, poderia liberar volumosos recursos para o Brasil receber refugiados.
Imagino que isso possa causar reações, até essa hipótese ser descartada por absurda, descabida, fora da realidade. Mas, no caso presente dos refugiados venezuelanos, o Brasil já está sobrecarregado e deveria pedir ajuda internacional. A partir dessa experiência, talvez fosse possível formular um plano estratégico de maior alcance, que atraísse grande volume de capitais e um novo impulso para o desenvolvimento.
Outro ponto que me levou a pensar no papel do Brasil foi ver imagens da população haitiana celebrando a vitória da seleção brasileira na Copa. Nos vídeos, a pequena multidão desfilava as cores verde e amarela, hasteou uma bandeira do Brasil e cantou o hino do Haiti.
Naturalmente, essa proximidade foi estimulada pela presença brasileira nas tropas de paz da ONU. Mas deixa bem claro que o futebol, não só nessa região do mundo, é um componente válido do chamado soft power que o Brasil, potencialmente, pode projetar no mundo.
Encontrei em Moscou um maestro que vivia na Sibéria, ouviu Manhã de Carnaval e, depois, algumas composições de Tom Jobim. Tornou-se um grande admirador da música brasileira e já gravou numerosos trabalhos inspirados nela para o público russo. Apesar da confusão e mesmo da desgraça que às vezes nos atinge no Brasil, não deixa de ser animador ser recebido com um sorriso de simpatia quando revelamos nosso país de origem.
Mesmo que minhas ideias sejam descartadas, a tese básica é de que precisamos voltar a discutir nosso papel no mundo: achar um pequeno espaço da campanha eleitoral para tratar do tema. Numa campanha americana é bem maior, porque o tamanho corresponde aos interesses e à presença deles no mundo. Numa dimensão mais modesta, seria interessante que os candidatos avaliassem os principais problemas internacionais, alinhassem nossas vantagens e desvantagens e formulassem um roteiro para o papel do Brasil no mundo.
Não há condições para tratar o País na campanha como uma ilha de prosperidade ou mesmo de decadência. Estamos ligados ao mundo e como a campanha começa logo depois da Copa, vale a pena introduzir essa dimensão no debate.
Na verdade, ela existe, sim, de forma fragmentária. Bolsonaro apoiou a saída dos Estados Unidos da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas. Ficaremos com a visão de Trump ou com a do conjunto de países que insistem no diálogo e na conciliação, mas dentro da ONU?
Ciro Gomes afirmou no programa Roda Viva que a oposição na Venezuela é fascista. Será isso mesmo? Como a vemos? Como vemos o governo Maduro, tão distante da democracia? Esses temas não definem quem ganha ou perde a eleição. Mas alguns votinhos, como o meu, pedem definições bem claras.
Pelo que vejo daqui, da Rússia, os debates entre candidatos serão mais raros no primeiro turno. A saída talvez seja consultar os programas, se é que já estão completos. Assim, ao lado de saúde, educação, segurança, talvez possamos incluir política externa.
A ausência de clareza sobre o tema não indica que os candidatos a deixarão de lado. Ao contrário, tendem a fazê-la de forma autocrática. Como acho que foi realizada, ao longo do tempo, a política do PT, focada nos países vizinhos com tendência bolivariana, gastando milhões com a ideia de projetar seu líder na América Latina e na África. E levando algum das empreiteiras.
São tópicos que fazem sentido na política da esquerda, no entanto, não foram discutidos amplamente. Os investimentos eram semi-clandestinos e só vieram à tona com a eclosão da Lava Jato. Só há um perdedor com o silêncio sobre o tema: a sociedade.
Eleitorado brasileiro perdeu a devoção pelo voto
A redemocratização brasileira é uma conquista relativamente recente. Eu mesmo, com minha barba branca, votei pela primeira vez em 1989, já na bica de completar 28 anos. Gostaria de ter votado antes, mas a ditadura militar não deixou. Ainda me lembro da solenidade que envolvia o ritual do voto. O eleitor era movido pela suposição de que sua preocupação era útil. Isso acabou.
No momento, o eleitor se vê numa encruzilhada. Entre opções lamentáveis e impensáveis, ele prefere o exílio do voto inválido. Em três décadas de redemocratização, a devoção ao voto virou ceticismo, converteu-se em nojo e já vai se consolidando como um transtorno. Nunca foi tão fácil como agora, a apenas quatro meses da eleição, compreender a tese de Churchill —aquela segundo a qual a democracia é a pior forma de governo salvo todas as demais. Quase metade do eleitorado cogita jogar o voto pela janela. Trata-se de um direito. Viva a democracia!
A resiliência do atraso
Um bom exemplo é a extinção da contribuição sindical obrigatória. Durante três quartos de século, uma legislação fascista, criada na ditadura Vargas sob inequívoca inspiração da Carta del Lavoro de Benito Mussolini, obrigou indivíduos e empresas a contribuir compulsoriamente para o sustento de uma estrutura sindical artificial e hipertrofiada, em grande parte tomada por pelegos de todo tipo, que pouco ou nada faziam pelos interesses dos trabalhadores e das empresas que supostamente deveriam representar.
Em conjunto com a unicidade sindical, peça complementar do ferrolho fascista encrustado na legislação trabalhista, a contribuição sindical obrigatória vinha sendo o principal esteio do nefasto corporativismo brasileiro. Foi um grande avanço, portanto, ter o Congresso decidido, afinal, no ano passado, extinguir a contribuição sindical obrigatória.
Menos de um ano depois, contudo, os interesses contrariados, alinhados em emblemática coalizão de entidades laborais e patronais, estão agora mobilizados para tentar reverter na Justiça a extinção do imposto sindical. Querem que o Supremo Tribunal Federal declare que a medida aprovada pelo Congresso é inconstitucional.
Diante do pedido de medida cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade que lhe coube apreciar, o ministro Edson Fachin entendeu que, tendo em vista a importância do tema, seria mais prudente abrir mão de uma decisão monocrática e encaminhar a questão ao colegiado pleno do Supremo Tribunal Federal, para julgamento agendado para ontem, 28 de junho.
No ínterim, o ministro Edson Fachin deu a público um despacho, datado de 30 de maio de 2018, em que, ao longo de 35 páginas, socorre-se da opinião de doutrinadores eminentes e externa suas próprias considerações sobre a questão em pauta.
Tendo de finalizar este artigo ainda sem saber o desfecho do julgamento agendado para ontem, me atenho à análise do despacho do ministro relator. O que chama a atenção no documento, antes de mais nada, é quão arraigada, entre boa parte dos doutrinadores citados, é a percepção de que a contribuição sindical obrigatória e a unicidade sindical são peças indissociáveis e cruciais do arranjo legado pelo Estado Novo. E de que não há como evoluir para um sistema baseado em contribuições facultativas sem desestruturar todo o sistema sindical do país.
Setenta e cinco anos depois de ter sido imposto à sociedade brasileira o arranjo sindical mussoliniano, parte importante da elite intelectual do país continua presa à mentalidade forjada pelo lado fascista do varguismo, incapaz de pensar fora da caixa e de perceber quão perversa tem sido a disfuncionalidade desse arranjo e a importância de desmontá-lo com urgência. Não se percebe que basta a extinção da contribuição sindical obrigatória para destravar o ferrolho que vem impedindo a modernização do regime sindical brasileiro. E que é o acirramento de contradições deflagrado por tal destravamento que deverá engendrar essa modernização.
Não chega a ser surpreendente que, em meio a essa incapacidade de percepção, o próprio ministro Fachin externe seu temor de que a extinção possa implicar “desfiguração do regime sindical constituído em 1988” e “frustração de toda uma gama de direitos fundamentais sociais, os quais de forma direta ou indireta, nele estão sustentados”.
Não há como ter ilusões. Nessa questão, a batalha contra o atraso promete ser dura e longa.
Rogério Furquim Werneck
Marginalidade suprema
(Gilmar Mendes) não tem mais nenhum pudor em defender corruptos. É uma pessoa absolutamente marginal que nós temos dentro no Supremo Tribunal Federal. Ele é um marginalModesto Carvalhosa
Troco uma centena de corruptos
Faríamos bom negócio se trocássemos cem corruptos por um STF novo. Com um Supremo formado por juristas de alto nível, juízes de verdade, conscientes de seus deveres e responsabilidades, ficaríamos livre desse flagelo que mantém a nação em sobressalto. E os corruptos acertariam suas contas com a sociedade porque é isso que acontece quando as instituições funcionam.
Não estou sendo sarcástico. É incalculável o montante dos prejuízos que esse STF vem causando à política, à moral do povo, à credibilidade das instituições, à segurança jurídica e à estabilidade necessária ao funcionamento regular da economia.
Não há adjetivo polido para a conduta do ministro Dias Toffoli na sessão de terça-feira da Segunda Turma do STF. A finalidade da sessão era abrir as portas da liberdade a um grupo de condenados da Lava Jato com culpa confirmada pelo TRF-4. No lote, para disfarçar, o ex-chefe José Dirceu. A ideia do trio Toffoli, Lewandowski e Gilmar era romper o entendimento colegiado da corte sobre a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância.
abem todos os ministros, sabem os advogados dos presos, sabem os condenados, sabe o Brasil que prisão após o trânsito em julgado de sentença condenatória é sinônimo de liberdade eterna para quem roubou muito. E um tanto mais breve para quem roubou pouco. É uma liberdade alugada com dinheiro das vítimas. É, também, outro nome que se pode atribuir à impunidade, benefício mais importante para o criminoso do que o produto de sua atividade.
Na imagem e possibilidade mais remota e positiva, o STF é um conjunto de 11 pessoas que, segundo maiorias instáveis e seus bestuntos individuais, impõem ao país o convívio com o intolerável. Na imagem mais provável, a coisa fica muito pior. Só para lembrar: em 10 de março de 2015, o ministro que coordenou a operação no dia de ontem enviou ofício ao colega Lewandowski, que presidia o STF, manifestando interesse em ser transferido da Primeira para a Segunda Turma da Corte, ocupando a vaga aberta pela morte de Teori Zavaski. Com essa mudança, o grupo que, por mera coincidência, tinha a seu encargo os processos da Lava Jato ganhava a atual configuração.
Para quem não sabe, ou já esqueceu, quando José Dirceu era chefe da Casa Civil da Presidência da República, Dias Toffoli foi seu subchefe da área de Assuntos Jurídicos. Em junho de 2005, acusado por Roberto Jefferson de ser o mentor do mensalão, Dirceu foi obrigado a demitir-se do cargo, sendo substituído por Dilma Rousseff, a quem Toffoli, imediatamente, solicitou a própria demissão. O fato confirma a estreita ligação entre os dois. Quem disse que gratidão é sempre uma virtude?
Não é de hoje que o STF vem cuidando bem da criminalidade de jatinho. Em fevereiro de 2014, esse Supremo, com voto decisivo do recém-nomeado e gratíssimo ministro Roberto Barroso, decidiu que não houve formação de quadrilha no mensalão. Ela não só houve como jamais interrompeu suas atividades e agora tem tratamento VIP nesse STF que não nega os fatos, mas soluça com os condenados falando em “sanha punitivista”. Percival Puggina
Não estou sendo sarcástico. É incalculável o montante dos prejuízos que esse STF vem causando à política, à moral do povo, à credibilidade das instituições, à segurança jurídica e à estabilidade necessária ao funcionamento regular da economia.
Não há adjetivo polido para a conduta do ministro Dias Toffoli na sessão de terça-feira da Segunda Turma do STF. A finalidade da sessão era abrir as portas da liberdade a um grupo de condenados da Lava Jato com culpa confirmada pelo TRF-4. No lote, para disfarçar, o ex-chefe José Dirceu. A ideia do trio Toffoli, Lewandowski e Gilmar era romper o entendimento colegiado da corte sobre a possibilidade de prisão após condenação em segunda instância.
abem todos os ministros, sabem os advogados dos presos, sabem os condenados, sabe o Brasil que prisão após o trânsito em julgado de sentença condenatória é sinônimo de liberdade eterna para quem roubou muito. E um tanto mais breve para quem roubou pouco. É uma liberdade alugada com dinheiro das vítimas. É, também, outro nome que se pode atribuir à impunidade, benefício mais importante para o criminoso do que o produto de sua atividade.
Na imagem e possibilidade mais remota e positiva, o STF é um conjunto de 11 pessoas que, segundo maiorias instáveis e seus bestuntos individuais, impõem ao país o convívio com o intolerável. Na imagem mais provável, a coisa fica muito pior. Só para lembrar: em 10 de março de 2015, o ministro que coordenou a operação no dia de ontem enviou ofício ao colega Lewandowski, que presidia o STF, manifestando interesse em ser transferido da Primeira para a Segunda Turma da Corte, ocupando a vaga aberta pela morte de Teori Zavaski. Com essa mudança, o grupo que, por mera coincidência, tinha a seu encargo os processos da Lava Jato ganhava a atual configuração.
Para quem não sabe, ou já esqueceu, quando José Dirceu era chefe da Casa Civil da Presidência da República, Dias Toffoli foi seu subchefe da área de Assuntos Jurídicos. Em junho de 2005, acusado por Roberto Jefferson de ser o mentor do mensalão, Dirceu foi obrigado a demitir-se do cargo, sendo substituído por Dilma Rousseff, a quem Toffoli, imediatamente, solicitou a própria demissão. O fato confirma a estreita ligação entre os dois. Quem disse que gratidão é sempre uma virtude?
Não é de hoje que o STF vem cuidando bem da criminalidade de jatinho. Em fevereiro de 2014, esse Supremo, com voto decisivo do recém-nomeado e gratíssimo ministro Roberto Barroso, decidiu que não houve formação de quadrilha no mensalão. Ela não só houve como jamais interrompeu suas atividades e agora tem tratamento VIP nesse STF que não nega os fatos, mas soluça com os condenados falando em “sanha punitivista”. Percival Puggina
Goooooool....é dos planos de saúde!
As mudanças foram publicadas ontem no “Diário Oficial”. Com a canetada, os planos ganharam aval para tomar mais dinheiro dos clientes. Quem ficar doente poderá ser obrigado a pagar 40% do valor dos procedimentos médicos. Além da mensalidade e dos remédios, é claro.
“Essas regras são tão abusivas que dá vontade de chorar”, desabafa Ligia Bahia, professora da UFRJ e doutora em Saúde Pública pela Fiocruz. “A agência reguladora deveria garantir que quem está doente seja atendido. O que estão fazendo é o contrário, e sem base legal”, afirma.
A ANS alega que protegeu os segurados ao estabelecer que a regra não valerá para tratamentos crônicos, como quimioterapia e hemodiálise. É uma meia verdade. Um doente com câncer não pagará a mais pela químio, mas poderá ser sobretaxado a cada vez que precisar de exames, fisioterapia ou apoio nutricional.
O mês da Copa tem sido lucrativo para os planos de saúde. No dia 5, o Senado aprovou a indicação de Rogério Scarabel Barbosa para o cargo de diretor da ANS. Ele era advogado de seguradoras antes de ganhar uma vaga na agência que deveria fiscalizá-las. O senador Randolfe Rodrigues comparou a nomeação à escolha de uma raposa para cuidar do galinheiro.
Na semana seguinte, a mesma ANS autorizou um reajuste de 10% nos planos individuais, uma goleada sobre a inflação oficial de 2,76%. O aumento chegou a ser barrado na Justiça. O desembargador Neilton dos Santos cassou a liminar na última sexta-feira, dia de Brasil x Costa Rica.
Em 2017, deputados ligados aos planos de saúde tentaram mudar a legislação para aumentar os lucros das empresas. As entidades de defesa do consumidor reagiram, e a proposta não chegou a ser votada.
Com o pacote de ontem, o governo encontrou um atalho para presentear as seguradoras sem depender da Câmara. Por mais que o lobby dos planos seja forte, os parlamentares ainda precisam do voto dos pacientes para se reeleger. Não é o caso do presidente da República.
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