sábado, 5 de maio de 2018
Normalidade da gestão: Temer faz mal ao Brasil
Pense por um instante na rotina de Temer. Ele conversa diariamente com ministros denunciados por corrupção. Dois, Eliseu Padilha e Moreira Franco, são seus amigos e cúmplices. O ministro Blairo Maggi, da Agricultura, acaba de ser denunciado pela Procuradoria. De novo, corrupção. E Temer o manteve no cargo. O aliado Ciro Nogueira, já atolado na Lava Jato, teve a casa varejada pela Polícia Federal. Mas Temer faz questão de manter o partido dele, o PP, no comando de dois ministérios e da Caixa Econômica Federal.
O Brasil é presidido pela anormalidade. Mas o país vai se acostumando com o inaceitável. A economia reduz a marcha, o desemprego recrudesce e Temer finge ser candidato à reeleição. Mas o que se vê ao redor é um Congresso anestesiado, um Judiciário titubeante, uma sucessão com quase duas dúzias de candidatos a estorvo e uma sociedade à espera da Copa do Mundo. Essa normalidade irradiada pelo governo Temer faz mal ao país. O presidente ri do Brasil. Banalizou-se a perversão.
De que serve discutir ideologias?
Para compreendermos o homem e as suas necessidades, para o conhecermos naquilo que ele tem de essencial, não precisamos de pôr em confronto as evidências das nossas verdades. Sim, têm razão. Têm todos razão. A lógica demonstra tudo. Tem razão aquele que rejeita que todas as desgraças do mundo recaiam sobre os corcundas. Se declararmos guerra aos corcundas, aprenderemos rapidamente a exaltar-nos. Vingaremos os crimes dos corcundas. E, sem dúvida, também os corcundas cometem crimes.
A fim de tentarmos separar este essencial, é necessário esquecermos por um instante as divisões que, uma vez admitidas, implicam todo um Corão de verdades inabaláveis e o inerente fanatismo. Podemos classificar os homens em homens de direita e em homens de esquerda, em corcundas e não corcundas, em fascistas e em democratas, e estas distinções são incontestáveis.
Mas sabem que a verdade é aquilo que simplifica o mundo, e não aquilo que cria o caos. A verdade é a linguagem que desencadeia o universal.
Newton não «descobriu» uma lei há muito disfarçada de solução de enigma, Newton efetuou uma operação criativa. Instituiu uma linguagem de homem capaz de exprimir simultaneamente a queda da maçã num prado ou a ascensão do sol. A verdade não é o que se demonstra, mas o que se simplifica.
De que serve discutir as ideologias? Se todas se demonstram, também todas se opõem, e semelhantes discussões fazem duvidar da salvação do homem. Ainda que o homem, por todo o lado, à nossa volta, revele as mesmas necessidades.
Antoine de Saint-Exupéry, "Terra dos Homens"
A fim de tentarmos separar este essencial, é necessário esquecermos por um instante as divisões que, uma vez admitidas, implicam todo um Corão de verdades inabaláveis e o inerente fanatismo. Podemos classificar os homens em homens de direita e em homens de esquerda, em corcundas e não corcundas, em fascistas e em democratas, e estas distinções são incontestáveis.
Mas sabem que a verdade é aquilo que simplifica o mundo, e não aquilo que cria o caos. A verdade é a linguagem que desencadeia o universal.
Newton não «descobriu» uma lei há muito disfarçada de solução de enigma, Newton efetuou uma operação criativa. Instituiu uma linguagem de homem capaz de exprimir simultaneamente a queda da maçã num prado ou a ascensão do sol. A verdade não é o que se demonstra, mas o que se simplifica.
De que serve discutir as ideologias? Se todas se demonstram, também todas se opõem, e semelhantes discussões fazem duvidar da salvação do homem. Ainda que o homem, por todo o lado, à nossa volta, revele as mesmas necessidades.
Antoine de Saint-Exupéry, "Terra dos Homens"
A sobrevida do PT
O Partido dos Trabalhadores (PT) vem se destruindo por dentro, forçado pelas circunstâncias a servir de milícia para seu encalacrado líder máximo, Lula da Silva. O lulismo é hoje a única expressão autorizada do petismo, o que limita drasticamente o raio de atuação do partido. Somando-se ainda todas as vicissitudes petistas nos últimos anos – o impeachment da presidente Dilma Rousseff, os escândalos de corrupção, o legado trágico na economia e a desmoralização das instituições –, nada mais natural do que esperar um profundo desgaste do PT. E no entanto essa legenda surgiu como a detentora da maior bancada da Câmara dos Deputados depois do troca-troca partidário permitido até a primeira semana de abril. Ademais, recente pesquisa de opinião mostrou que o PT, mesmo depois da prisão de seu líder por corrupção e lavagem de dinheiro, continua a ter o maior porcentual de simpatizantes, muito à frente dos demais partidos.
Esse fenômeno pode ser explicado muito menos pelas imaginárias virtudes dos petistas e muito mais pela incapacidade de partidos programáticos, notadamente o PSDB, de ocupar o espaço político que a crise do PT começa a deixar.
O PSDB emprestou hesitante apoio ao governo do presidente Michel Temer no momento em que este mais precisava de suporte para aprovar as reformas de que o País necessitava, e ainda necessita. Além disso, quando Temer foi alvo de uma denúncia inepta da Procuradoria-Geral da República, metade da bancada tucana na Câmara votou contra o presidente. Tal comportamento revelou claramente que faltou aos tucanos naquele momento perspectiva histórica e demonstrou que muitos deles pareciam ter aderido às deletérias práticas do chamado “centrão”, o que decerto prejudicou seu patrimônio eleitoral.
A força institucional de um partido está principalmente em sua capacidade de sustentar uma mensagem, um princípio. No caso do PSDB ou do MDB, não se sabe que mensagem é essa. O MDB, partido do presidente Michel Temer, por exemplo, foi um dos principais responsáveis pelas derrotas mais importantes sofridas pelo governo. Se há uma mensagem aí, é a de que o MDB não é um partido, mas uma federação de interesses privados de seus integrantes, e muitos destes não se sentiram na obrigação de defender Temer e de ajudá-lo a aprovar as reformas. Assim, hoje, o eleitor que escolhe alguma dessas legendas não é capaz de dizer o que espera delas.
Não faz diferença, portanto, votar nesses partidos ou no Partido Progressista (PP), expressão mais bem-sucedida do tal “centrão” fisiológico, e que, por esse motivo, emergiu da janela de infidelidade como o segundo maior partido da Câmara, empatado com o MDB.
Já o eleitor do PT sabe muito bem no que está a votar. A mensagem é direta e cristalina: vota-se hoje no PT para sustentar o lulismo, cuja essência é a promessa do paraíso do consumo de bens e serviços, a que os intelectuais petistas e seu demiurgo chamam, cinicamente, de “justiça social”. Está deliberadamente ausente do discurso lulopetista a necessidade de respeitar as instituições democráticas. Ao contrário: quando estas se interpõem no caminho do lulismo, tolhendo-lhe os movimentos, são imediatamente consideradas “golpistas”.
Ainda assim, a despeito de manter esse vigor militante e de formar a maior bancada da Câmara, o PT diminui a olhos vistos. Na eleição de 2016, o partido caiu de mais de 600 prefeituras para 250, e nenhuma delas é de uma grande cidade. No mesmo ano, foi defenestrado do governo federal. Com a substancial perda de capilaridade municipal e sem a máquina federal, o desempenho petista nas urnas em outubro dependerá basicamente da capacidade de seu chefão, Lula da Silva, de conseguir traduzir em votos o calvário que ora encena na cadeia em Curitiba.
Em condições normais, portanto, seria previsível mais uma acachapante derrota do PT, talvez a definitiva. Mas, em se tratando do atual cenário partidário, em que a mediocridade parece prevalecer, o PT, movido a lulismo, conserva força suficiente para continuar a causar problemas ao País.
Terrorista virtual
Sob a perspectiva do Estado, o cidadão se transformou em um terrorista virtual. Do contrário, não se explica o acúmulo de câmeras que nos vigiam em todas as partes. Somos tratados como criminosos virtuais. O cidadão é um suspeito, numerado, como em Auschwitz, onde cada deportado tinha seu númeroGiorgio Agamben
O caso do morto vivo
O advogado português Álvaro Dias, 56 anos, foi condenado por falsificar sentenças. Em 18/11/2016. Tendo ainda, nas costas, numerosos processos. Tantos que temia passar todos os seus anos restantes na prisão. Para piorar, depois daquela condenação e antes de ser preso, aconteceu-lhe algo muito desagradável. Ele morreu. Na luxuosa quinta que tinha em Benavente (Santarém), a Herdade da Mata do Duque. No dia de Natal! Esmagado por seu Rolls-Royce Silver Shadow III. O jornal regional O Mirante, reconstituindo o acidente, descreve que o carro “começou a descer em marcha-atrás”. Porque o “travão de mão não fora acionado”. Ao perceber que iria se chocar com as árvores, o condutor “tentou voltar a entrar no veículo para o travar, mas embateu numa árvore, depois de ter conseguido abrir a porta e acabou por ser atropelado”.
Ocorre que “um enterro é a procissão algébrica das dúvidas” (Rosa, Os Chapéus Transentes). Dando-se que, pouco depois, uma denúncia anônima chegou ao juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal (Lisboa). A de que Álvaro Dias havia contratado um cadáver substituto.
Nas investigações sobre a denúncia dessa morte que não houve foram encontrados, nas gavetas de seu escritório, “documentos falsos, em número de dezenas”. E muitos indícios suspeitosos: a “agência funerária sita em localidade muito distante dos locais de residência da vítima”; “ligação entre o médico-legista, outrora aluno do advogado e a vítima”; e a “invulgar celeridade na autópsia e na cremação”. As aspas são da Visão portuguesa. Novos exames apontaram 23 outras falhas na comprovação dessa morte. E nosso Álvaro Dias corre o risco de ter tido tanto trabalho pra nada. “Quem fala muito, dá bom dia a cavalo” (Rosa, Minha Gente). Que a polícia está indo à sua procura.
Mas afinal, dirão apressados leitores, que isso tem a ver com nosso Brasil? Duas coisas, meus senhores. Uma, o juiz do feito é o senhor doutor Carlos Alexandre. O Sérgio Moro de Portugal. Responsável por julgar, na Operação Marquês, o ex-primeiro ministro José Sócrates. Num processo do PT de Portugal que envolve Lula, José Dirceu e a Odebrecht. Todos muito conhecidos nossos. Em despacho, ele declarou que “a comprovar-se a veracidade das suspeitas, isso transporta as instituições portuguesas para o nível do absurdo”. Os olhos são, mesmo, “a porta do engano” (Rosa, O Espelho).
A outra razão é o lugar para onde teria fugido, e hoje viveria bem, o tal Álvaro Dias. Quem apostou no Brasil, ganhou fácil. Tanto lugar no mundo e tinha que vir logo para cá. Pobres de nós. Pensando bem, pobre dele. Na ilusão de que, por aqui, ainda se pode ter grandes fazendas, sítios, apartamentos e dinheiro em malas, com a esperança de não ir parar nunca na cadeia. Quando, considerando os últimos acontecimentos, não dá para ter tanta certeza assim.
José Paulo Cavalcanti Filho
Dimensão simbólica da terra
Valdsom Braga |
Transpareceu, naquele momento, a dimensão simbólica da terra para quem vive e trabalha nela. Isso ultrapassa a esfera econômica, constituindo razão para resistir aos apelos do mundo urbano ou à sedução de empréstimos bancários, porque se exige a propriedade como garantia.
O agricultor tradicional manifesta, permanentemente, orgulho por seu terreno, que é a principal referência de sua vida. Há relação afetiva, porque ela proporciona alimentação farta e moradia permanente. Assim, não é apenas instrumento de produção. Ter a propriedade de uma área suficiente para a agricultura de subsistência representa a diferença entre ser cidadão e ser miserável, porque ela confere segurança, dignidade e autonomia. O dono nunca será um zé-ninguém, sempre escorraçado em espaços alheios.
Aquele senhor não iria integrar-se ao mercado, porque o ambiente urbano faz muitas exigências, incluindo qualificação profissional e uso constante da moeda. Preferiu, então, permanecer em sua fazendinha, que seria sempre uma barreira material e simbólica entre ele e a miséria.
Desde meados do século XX, houve intenso fluxo migratório para a cidade, em busca de escola, assistência médica, previdência e trabalho menos penoso. No entanto, a maioria não estava preparada para o espaço urbano, fixando-se em favelas e submetendo-se ao subemprego e à marginalização social.
Os lavradores que resistiram em seu torrão sabiam que não seriam automaticamente integrados ao contexto moderno e perderiam suas sólidas referências como gente do campo. Queriam continuar livres, sem aproximação de quem poderia humilhá-los. Rejeitavam também financiamento bancário, porque se lembravam de amigos que perderam sua terra e se tornaram boias-frias espoliados por “gatos” e pelo agronegócio, enquanto puderam trabalhar. Viraram, depois, mendigos em cidades grandes.
A diferença entre o agricultor tradicional e o empresário rural está não na dimensão da propriedade, mas em seus vínculos com ela. Quem tem, entre outros negócios, uma fazenda não cria afeição por ela, que é apenas um instrumento de produção para propiciar lucro. Enquanto isso, os que vivem em contato direto com a terra desenvolvem atitude diferente, porque perdê-la não é apenas um prejuízo. Trata-se da destruição de seu modo de vida com o rompimento da barreira que os protege da miséria.
Atualmente, os pequenos proprietários rurais têm sofrido ataques violentos de bandidos. Estão também expostos a diversas formas de manipulação política. Alguns agentes podem ensejar imenso potencial de conflito, abrindo caminho para a interferência de grupos extremistas nos dois polos, sem considerar seu futuro, sua dignidade e seu bem-estar.
Gilda de Castro
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