segunda-feira, 4 de junho de 2018
Dias de caos
De igual maneira os regimes totalitários utilizam-se da fragilidade e ignorância do povo para instalar-se, mediante promessas de suborno das consciências e de falsa igualdade de direitos, estimulando as classes menos favorecidas para a fidelidade, oferecendo-lhes migalhas, enquanto se locupletam no abuso do poder e da indignidade, mantendo a miséria moral, social e econômica.
A comodidade, fruto inevitável do desconhecimento dos direitos à cidadania, acredita-se feliz com os parcos recursos que lhe são fornecidos pelo Estado delinquente, e homenageia os seus ditadores como sendo salvadores dos seus problemas.
É muito mais fácil oferecer-se pão e circo às massas do que dignidade aos indivíduos.
A situação lamentável em que se encontra a sociedade brasileira neste momento, resulta, sem dúvida, da negligência dos governantes anteriores que estabeleceram leis injustas e inadequadas para manter-se no poder, pensando somente nos seus e nos interesses dos partidos aos quais pertencem.
Esses administradores infiéis contam com o apoio dos enganados que se fanatizam e somente pensam nas miseráveis compensações que recebem, levando a nação ao caos da desordem e do sofrimento. Nesse clima de instabilidade e desconforto encontram-se os vírus das desoladoras revoluções e desastrosas soluções para pior.
Este é um momento muito grave, talvez dos mais difíceis para a nacionalidade brasileira.
Não é momento para humor, mas para a busca de soluções legais, a fim de que se voltem a instalar a serenidade e o respeito aos códigos que vigem em toda sociedade democrática.
Quando, porém, o desprezo pelas leis e a corrupção se instalam nas altas cortes da administração, que deveriam pautar a sua conduta pelos estatutos da dignidade, o problema faz-se mais grave, exigindo que o povo venha às ruas impor o cumprimento dos deveres por aqueles que devem zelar pela honradez da sociedade.
Não foram outros os motivos que derrubaram a Bastilha em 14 de julho de 1789 e deram início à Revolução Francesa, que também derrapou nos tremendos crimes do denominado período do terror.
O Brasil, que possui tradições cristãs arraigadas e que sempre se caracterizou pelos valores da paz, deve repetir neste momento o gesto corajoso de enfrentar os dislates da corrupção e exigir imediata reforma nacional para restabelecer a paz e o progresso.
Divaldo Pereira Franco.(A Tarde)
Ora, o povo
É verdade que momentos de crise tendem a exacerbar os sentimentos contraditórios da população, mas períodos de calmaria política não bastam para tornar sábio o eleitorado.
A literatura sociológica revela que a situação da economia é o fator que mais influi no resultado de pleitos majoritários, mas outras variáveis, incluindo algumas espúrias, como promessas populistas, podem às vezes mostrar-se decisivas.
Até o imponderável tem seu papel. Meu exemplo favorito é o dos ataques de tubarões em Nova Jersey, que provocaram um mau humor que quase custou a Woodrow Wilson sua reeleição presidencial em 1916.
Por que, então, diante de um comportamento coletivo tão incoerente e caprichoso, ainda insistimos em escolher nossos dirigentes pelo voto? Não estou aqui colocando a democracia em questão. Não há muita dúvida de que ela é o melhor sistema à nossa disposição. Virtualmente todas as nações ricas e desenvolvidas do planeta são democráticas.
A explicação é que a democracia funciona, não por causa de uma mítica sabedoria do povo que se materializa no voto, mas por características mais sutis e menos alardeadas, como favorecer liberdades individuais, a alternância no poder e, principalmente, por promover a estabilidade, exigindo sempre respeito a regras pré-definidas.
Isso torna ainda mais estúpidos os apelos por intervenções extraconstitucionais.
Mais uma vitória do atraso
Parente foi responsável pela notável recuperação da Petrobrás, que havia sido destroçada pelos governos lulopetistas. Naquela trevosa época, recorde-se, a estatal foi entregue à mais desbragada rapinagem do PT e de seus cúmplices, resultando no famigerado petrolão. Mas engana-se quem pensa que esse foi o pior legado da dupla Lula da Silva-Dilma Rousseff no que diz respeito à administração da Petrobrás.
A estatal transformou-se na petrolífera mais endividada do mundo, à beira do colapso, quando passou a funcionar como máquina de dinheiro para financiar o populismo do PT, que se manifestou tanto na forma de subsídio para os combustíveis como na participação da Petrobrás em empreendimentos controvertidos e mal planejados. O pressuposto era que o papel da Petrobrás – “estratégico”, como não se cansam de dizer os empulhadores – era servir como motor do desenvolvimento nacional. O tal desenvolvimento não veio – em lugar disso, o que essa política doidivanas gerou foi a ruína da maior empresa do País.
Diante desse quadro, tornou-se óbvio que a única maneira de sanear a Petrobrás era impedir que os interesses políticos continuassem a ditar os rumos de sua administração – e não foi por outro motivo que Parente exigiu total autonomia para aceitar o convite do presidente Michel Temer para assumir a Petrobrás, em junho de 2016, logo após o impeachment de Dilma Rousseff.
Munido dessa liberdade de ação, Pedro Parente pôde implementar uma administração austera e dinâmica, que em pouco tempo reequilibrou as finanças da empresa, por meio da venda de ativos e, principalmente, de uma política de preços que dispensava os subsídios, por respeitar as variações de mercado.
A greve dos caminhoneiros, contudo, colocou essa política na berlinda, pois a principal reivindicação do movimento era o restabelecimento do subsídio. Diante da hesitação do Palácio do Planalto, que tremeu em razão das consequências de uma greve que nem conseguiu prever nem soube conter, Parente ainda fez o que pôde para que o governo ganhasse tempo para negociar um acordo – que, ao final, se revelou uma verdadeira capitulação ao movimento paredista.
Em sua carta de demissão, Parente dá a entender que a decisão do governo de restabelecer o subsídio, sem dar suporte firme para manter a política de preços por ele implementada, foi o fator preponderante para sua saída. “Diante desse quadro, fica claro que a minha permanência na presidência da Petrobrás deixou de ser positiva”, escreveu ele.
Ao aceitar a demissão de Parente, o presidente Michel Temer também deu uma vitória aos petroleiros que haviam deflagrado uma greve política, na qual exigiam justamente a saída do executivo. E nem é preciso dizer que a decisão foi celebrada por todos os que trabalham incansavelmente em favor do subdesenvolvimento travestido de “justiça social”. “Já vai tarde”, disse Guilherme Boulos, candidato a presidente pelo PSOL. “Era o que a sociedade esperava”, declarou o presidente do Senado, Eunício Oliveira (MDB-CE). “Finalmente!”, tuitou o PT.
Enquanto o governo perde quadros de imenso valor como Pedro Parente – e, antes dele, Maria Silvia Bastos Marques, que deixou o BNDES depois que o governo lhe sonegou apoio contra os que sabotavam sua política de reorganização do banco –, personagens notórios mais por escândalos que por capacidade administrativa continuam prestigiados no Palácio do Planalto. Nada disso augura um bom futuro nem para o governo nem para o País.
Bem brasileiro, bom brasileiro
Está ruim: políticos importantes merecidamente presos, outros ainda não. Governo fraco, nas mãos de congressistas que só têm força na hora de buscar vantagens pessoais. Carlos Marun é ministro. Gleisi comanda o PT.
Está ruim, mas pior ainda é essa campanha para culpar os cidadãos pela sem-vergonhice e corrupção nos altos escalões. Coisas do tipo “ah, você é contra o desrespeito às leis mas já estacionou em lugar proibido”, “prestou um serviço e recebeu por fora”, “reclama da falta de educação dos outros mas já jogou embalagem de chocolate na rua”. Ou seja, a bandalheira dos poderosos nasce de sua falta de correção ao pegar um envelopinho a mais de açúcar na hora do cafezinho. Jogar papel de bala na rua e ordenhar as estatais é mais ou menos a mesma coisa. Seríamos malandros incorrigíveis, enquanto japoneses, suecos e coreanos cumpririam seus deveres cívicos.
Só que não. Há tempos, o notável articulista Mauro Chaves perguntou por que o brasileiro, na Suíça, não jogava maço de cigarros vazio no chão, enquanto, no Brasil, os suíços não se davam ao trabalho de procurar a lata de lixo. O motivo era simples: é que lá tem polícia. As altas multas educam o cidadão pelo bolso. O cidadão, aqui e lá, sabe o que lhe é conveniente.
Há brasileiros influentes na política americana de banda larga, na saúde canadense, no comércio libanês, na expansão das exportações chinesas. Sem complexo de vira-latas: ruins são os governantes, não os governados.
Carlos Brickmann
Está ruim, mas pior ainda é essa campanha para culpar os cidadãos pela sem-vergonhice e corrupção nos altos escalões. Coisas do tipo “ah, você é contra o desrespeito às leis mas já estacionou em lugar proibido”, “prestou um serviço e recebeu por fora”, “reclama da falta de educação dos outros mas já jogou embalagem de chocolate na rua”. Ou seja, a bandalheira dos poderosos nasce de sua falta de correção ao pegar um envelopinho a mais de açúcar na hora do cafezinho. Jogar papel de bala na rua e ordenhar as estatais é mais ou menos a mesma coisa. Seríamos malandros incorrigíveis, enquanto japoneses, suecos e coreanos cumpririam seus deveres cívicos.
Só que não. Há tempos, o notável articulista Mauro Chaves perguntou por que o brasileiro, na Suíça, não jogava maço de cigarros vazio no chão, enquanto, no Brasil, os suíços não se davam ao trabalho de procurar a lata de lixo. O motivo era simples: é que lá tem polícia. As altas multas educam o cidadão pelo bolso. O cidadão, aqui e lá, sabe o que lhe é conveniente.
Há brasileiros influentes na política americana de banda larga, na saúde canadense, no comércio libanês, na expansão das exportações chinesas. Sem complexo de vira-latas: ruins são os governantes, não os governados.
Carlos Brickmann
Bom tempo
Bonde em Santa Rosa (Niterói) |
Drummond perdeu
o bonde e a esperança.
Bom tempo para viver
foi esse em que ainda havia
bondes e esperanças
para perder.
Raul Drewnick
Ex-secretária do governo Lula: Minha Casa, Minha Vida piorou cidades e alimentou especulação imobiliária
Maior programa habitacional da história do Brasil e uma das vitrines dos governos do PT, o Minha Casa, Minha Vida (MCMV) piorou as cidades, agravou as dificuldades de acesso a moradia entre os mais pobres e criou bairros especialmente vulneráveis ao crime organizado.
A avaliação é de Ermínia Maricato, uma das mais experientes urbanistas do país e secretária executiva do Ministério das Cidades nos primeiros anos do governo Lula, antes da criação do programa, em 2009.
"Tivemos um movimento imenso de obras, mas quem o comandou e definiu onde se localizariam não foi o governo federal, e sim interesses de proprietários imobiliários, incorporadores e empreiteiras", diz Maricato, que estuda o MCMV desde sua implantação e é professora aposentada da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP).
Em entrevista à BBC Brasil em sua casa na Vila Madalena, em São Paulo, ela afirma que conjuntos residenciais do programa erguidos longe dos centros urbanos levarão várias décadas para se integrar às cidades. "Esse investimento gigantesco, aliado a uma especulação de terras ciclópica, tornou as cidades ainda mais inviáveis no Brasil."
Autora de nove livros sobre habitação e urbanismo, Maricato coordenou a proposta de criação do Ministério das Cidades, executada por Lula após sua ascensão à Presidência, em 2003.
Ela havia se projetado nas décadas anteriores como uma das líderes do movimento pela Reforma Urbana, que pretendia tornar as cidades brasileiras menos desiguais e se organizava nas Comunidades Eclesiais de Base (grupos ligados à Igreja Católica nas periferias e zonas rurais).
Maricato discursou em nome do movimento na Assembleia Constituinte, em 1988, e articulou a inclusão do conceito de função social da propriedade na Constituição. Um dos principais trunfos de movimentos sem-teto e sem-terra, o conceito define que as propriedades devem atender interesses coletivos, e não apenas individuais.
Entre 1989 e 1992, ela atuou como secretária da Habitação e Desenvolvimento Urbano no governo da então petista Luiza Erundina, em São Paulo. A urbanista diz que um de seus objetivos era tornar favelas e periferias menos insalubres, reduzindo a incidência de epidemias e doenças pulmonares por falta de ventilação. Outra prioridade era construir moradias em parceria com movimentos sociais.
Nesse modelo, o governo providencia terrenos e contrata arquitetos e engenheiros para projetar as casas. As unidades são construídas com recursos do governo pelos próprios moradores ou com a ajuda deles. Ela afirma que o programa foi um grande sucesso. O Minha Casa, Minha Vida prevê a possibilidade de construir moradias dessa maneira, mas os gastos com esse modelo representam 2% dos investimentos totais do programa, segundo Maricato.
Maricato diz que, nos anos 1990, iniciativas bem sucedidas em habitação se espalhavam por várias cidades, entre as quais Recife, Salvador, Belém, Goiânia e Porto Alegre.
Os avanços ocorriam apesar dos tempos de vacas magras. "Tínhamos um ciclo virtuoso produzindo políticas inovadoras. Esse ciclo se rompe exatamente no momento em que o Ministério das Cidades é criado."
Não era isso o que Maricato esperava ao batalhar pela criação do órgão, projetado para integrar as políticas de habitação às de transporte, saneamento e regulação do solo urbano.
Para chefiar o órgão recém-criado, Lula escolheu um quadro histórico do PT: o ex-governador gaúcho Olívio Dutra, que nomeou Maricato como secretária executiva. Ela conta que seu objetivo era federalizar as experiências positivas das prefeituras. Os trabalhos, porém, foram interrompidos com o escândalo do mensalão, quando o PT foi acusado de comprar apoio político no Congresso.
Entre outras medidas para acalmar sua base, Lula entregou o Ministério das Cidades ao Partido Progressista (PP). Olívio e Maricato deixaram o órgão.
O governo estava prestes a dar outro rumo às políticas urbanísticas e habitacionais - e justamente quando os cofres do governo estavam mais cheios, graças à arrecadação turbinada pela exportação de matérias-primas e pelo consumo das famílias.
"Enquanto não tínhamos recursos e estávamos sob ajuste fiscal, com dívida pesada, tivemos controle sobre os gastos. Quando apareceram os recursos, os capitais tomaram conta."
A avaliação é de Ermínia Maricato, uma das mais experientes urbanistas do país e secretária executiva do Ministério das Cidades nos primeiros anos do governo Lula, antes da criação do programa, em 2009.
"Tivemos um movimento imenso de obras, mas quem o comandou e definiu onde se localizariam não foi o governo federal, e sim interesses de proprietários imobiliários, incorporadores e empreiteiras", diz Maricato, que estuda o MCMV desde sua implantação e é professora aposentada da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP).
Municípios incluíram fazendas no perímetro urbano para atrair obras do projeto - Condomínio do MCMV em Campina Grande (PB) |
Autora de nove livros sobre habitação e urbanismo, Maricato coordenou a proposta de criação do Ministério das Cidades, executada por Lula após sua ascensão à Presidência, em 2003.
Ela havia se projetado nas décadas anteriores como uma das líderes do movimento pela Reforma Urbana, que pretendia tornar as cidades brasileiras menos desiguais e se organizava nas Comunidades Eclesiais de Base (grupos ligados à Igreja Católica nas periferias e zonas rurais).
Maricato discursou em nome do movimento na Assembleia Constituinte, em 1988, e articulou a inclusão do conceito de função social da propriedade na Constituição. Um dos principais trunfos de movimentos sem-teto e sem-terra, o conceito define que as propriedades devem atender interesses coletivos, e não apenas individuais.
Entre 1989 e 1992, ela atuou como secretária da Habitação e Desenvolvimento Urbano no governo da então petista Luiza Erundina, em São Paulo. A urbanista diz que um de seus objetivos era tornar favelas e periferias menos insalubres, reduzindo a incidência de epidemias e doenças pulmonares por falta de ventilação. Outra prioridade era construir moradias em parceria com movimentos sociais.
Nesse modelo, o governo providencia terrenos e contrata arquitetos e engenheiros para projetar as casas. As unidades são construídas com recursos do governo pelos próprios moradores ou com a ajuda deles. Ela afirma que o programa foi um grande sucesso. O Minha Casa, Minha Vida prevê a possibilidade de construir moradias dessa maneira, mas os gastos com esse modelo representam 2% dos investimentos totais do programa, segundo Maricato.
Maricato diz que, nos anos 1990, iniciativas bem sucedidas em habitação se espalhavam por várias cidades, entre as quais Recife, Salvador, Belém, Goiânia e Porto Alegre.
Os avanços ocorriam apesar dos tempos de vacas magras. "Tínhamos um ciclo virtuoso produzindo políticas inovadoras. Esse ciclo se rompe exatamente no momento em que o Ministério das Cidades é criado."
Não era isso o que Maricato esperava ao batalhar pela criação do órgão, projetado para integrar as políticas de habitação às de transporte, saneamento e regulação do solo urbano.
Para chefiar o órgão recém-criado, Lula escolheu um quadro histórico do PT: o ex-governador gaúcho Olívio Dutra, que nomeou Maricato como secretária executiva. Ela conta que seu objetivo era federalizar as experiências positivas das prefeituras. Os trabalhos, porém, foram interrompidos com o escândalo do mensalão, quando o PT foi acusado de comprar apoio político no Congresso.
Entre outras medidas para acalmar sua base, Lula entregou o Ministério das Cidades ao Partido Progressista (PP). Olívio e Maricato deixaram o órgão.
O governo estava prestes a dar outro rumo às políticas urbanísticas e habitacionais - e justamente quando os cofres do governo estavam mais cheios, graças à arrecadação turbinada pela exportação de matérias-primas e pelo consumo das famílias.
"Enquanto não tínhamos recursos e estávamos sob ajuste fiscal, com dívida pesada, tivemos controle sobre os gastos. Quando apareceram os recursos, os capitais tomaram conta."
'Fake news' versus qualidade
As rápidas e crescentes mudanças no setor da comunicação puseram em xeque os antigos modelos de negócios. A dificuldade de encontrar um caminho seguro para a monetização dos conteúdos multimídia e as novas rotinas criadas a partir das plataformas digitais produzem um complexo cenário de incertezas.
É preciso pensar, refletir duramente sobre a mudança de paradigmas, uma vez que a criatividade e a capacidade de inovação – rápida e de baixo custo – serão fundamentais para a sobrevivência das organizações tradicionais e para o sucesso financeiro das nativas digitais.
Mas é preciso, previamente, fazer uma autocrítica corajosa a respeito do modo como nós, jornalistas e formadores de opinião, vemos o mundo e da maneira como dialogamos com ele.
Antes da era digital, em quase todas as famílias existia um álbum de fotos. Lembram-se disso? Lá estavam as nossas lembranças, os nossos registros afetivos, a nossa saudade. Muitas vezes abríamos o álbum e a imaginação voava. Era bem legal.
Agora fotografamos tudo e arquivamos compulsivamente. Nosso antigo álbum foi substituído pelas galerias de fotos de nossos dispositivos móveis. Temos overdose de fotos, mas falta o mais importante: a memória afetiva, a curtição daqueles momentos. Fica para depois. E continuamos fotografando e arquivando. Pensamos, equivocadamente, que o registro do momento reforça a sua lembrança, mas não é assim. Milhares de fotos são incapazes de superar a vivência de um instante. É importante guardar imagens. Mas é muito mais importante viver cada momento com intensidade. As relações afetivas estão sucumbindo à coletiva solidão digital.
Algo análogo, muito parecido mesmo, se dá com o consumo da informação. Navegamos freneticamente no espaço virtual. Uma enxurrada de estímulos dispersa a inteligência. Ficamos reféns da superficialidade. Perdemos contexto e sensibilidade crítica. A fragmentação dos conteúdos pode transmitir certa sensação de liberdade. Não dependemos, aparentemente, de ninguém. Somos os editores do nosso diário personalizado. Será? Não creio, sinceramente. Penso que há uma crescente nostalgia de conteúdos editados com rigor, critério e qualidade técnica e ética. Há uma demanda reprimida de reportagem. É preciso reinventar o jornalismo e recuperar, num contexto muito mais transparente e interativo, as competências e a magia do jornalismo de sempre.
Jornalismo sem alma e sem rigor. É o diagnóstico de uma perigosa doença que contamina redações, afasta consumidores e escancara as portas para os traficantes da mentira. O leitor não sente o pulsar da vida. As reportagens não têm cheiro do asfalto.
É preciso contar boas histórias. Com transparência e sem filtros ideológicos. O bom jornalista ilumina a cena, o repórter manipulador constrói a história. Na verdade, a batalha da isenção enfrenta a sabotagem da manipulação deliberada, da preguiça profissional e da incompetência arrogante. Todos os manuais de redação consagram a necessidade de ouvir os dois lados de um mesmo assunto. Mas alguns procedimentos, próprios de opções ideológicas invencíveis, transformam um princípio irretocável num jogo de aparência.
A apuração de mentira representa uma das mais graves agressões à ética e à qualidade informativa. Matérias previamente decididas em guetos sectários buscam a cumplicidade da imparcialidade aparente. A decisão de ouvir o outro lado não é honesta, não se apoia na busca da verdade, mas num artifício que transmite um simulacro de isenção, uma ficção de imparcialidade. O assalto à verdade culmina com uma estratégia exemplar: repercussão seletiva. O pluralismo de fachada, hermético e dogmático, convoca pretensos especialistas para declarar o que o repórter quer ouvir. Mata-se a notícia. Cria-se a versão.
Sucumbe-se, frequentemente, ao politicamente correto. Certas matérias, algemadas por chavões inconsistentes que há muito deveriam ter sido banidos das redações, mostram o flagrante descompasso entre essas interpretações e a força eloquente dos números e dos fatos. Resultado: a credibilidade, verdadeiro capital de um veículo, se esvai pelo ralo dos preconceitos.
Politização da informação, distanciamento da realidade e falta de reportagem. Eis o tripé que tisnou a credibilidade dos veículos. A informação não pode ser processada num laboratório sem vida. Falta olhar nos olhos das pessoas, captar suas demandas legítimas. Gostemos ou não delas. A velha e boa reportagem não pode ser substituída por torcida.
A crise do jornalismo – e a proliferação de fake news – está intimamente relacionada com a pobreza e o vazio das nossas pautas, com a perda de qualidade do conteúdo, com o perigoso abandono da nossa vocação pública e com a equivocada transformação de jornais em produto mais próprio para consumo privado. É preciso recuperar o entusiasmo do “velho ofício”. É urgente investir fortemente na formação e qualificação dos profissionais. O jornalismo não é máquina, embora a tecnologia ofereça um suporte importantíssimo. O valor dele se chama informação de alta qualidade, talento, critério, ética.
O jornalismo precisa recuperar a vibração da vida, o cara a cara, o coração e a alma. O consumidor precisa sentir que o jornal é um parceiro relevante na sua aventura cotidiana. Fake news também se combate com qualidade.
O quinto dos infernos
Mais tarde, aprendi o significado da expressão que admite duas hipóteses: vai pra longe, desaparece queimando nas labaredas; e o quinto? O que significa? Não é o quinto círculo do Inferno de Dante. Então, fico com os que defendem a raiva dos contribuintes da colônia portuguesa, imensa, distante e quente, chamada Brasil, sempre que os cobradores do “quinto”, 20% do nosso ouro, vinham arrecadar para matar o apetite insaciável da Coroa Portuguesa. Caso não atingissem cem arrobas, os “homens-bons”, classe privilegiada, estariam sujeitos ao confisco denominado “derrama”.
O passado não nega. Só houve uma derrama. Os ditos homens-bons, sócios do Estado, obtiveram vários “refis coloniais”, além da esperteza dos “descaminhos”, rotas de sonegação, burlando “os caminhos reais”. No período de esgotamento do ciclo do ouro, final do século XVIII, os rumores de uma derrama esquartejou Tiradentes, mártir da Inconfidência Mineira.
Na gestão pública da época, a máquina fiscal já era eficaz. E tome arrocho; e haja espoliação fiscal com asfixia econômica do setor produtivo. Basta: a Revolução Americana triunfara. E na sua raiz estavam o imposto do selo, do chá, do açúcar e a regra de ouro da democracia política: sem representação não há taxação. O colonialismo eurocêntrico começara a desmoronar. Independência ou morte! Brasil independente. Mudou de metrópole: a Corte é Brasília.
Não estou pregando nada disruptivo. Não sou maluco. Mas posso enxergar que o “quinto” colonial transformou-se, hoje, nos dois quintos, 40% do PIB comparados aos 24% da década de 80.
Com efeito, o grave panorama nacional foi compreendido em todas as dimensões. Ouso, tão somente, enfatizar que ficou transparente a natureza da carga tributária de impostos anestesiantes, regressivos porque penaliza o mais pobre e se escondia na composição dos preços. A crise serviu para informar ao consumidor quanto ele paga de impostos pelos derivados do petróleo; a crise serve para demonstrar que a “greve”, o locaute ou o nocaute jogaram na lona o cidadão brasileiro que, com o nosso dinheirinho, vamos pagar a conta de um Estado perdulário e corrompido.
Aos candidatos que fique a lição: ou tiram, responsavelmente, o Estado das costas do cidadão ou não há solução.
Gustavo Krause
Chacoalhada geral
Ainda está aí sentindo o tremor, não é mesmo? Viu? Percebeu o quão tênues e surpreendentes estão as linhas, os limites, os acontecimentos? Não dá para se acomodar, que tem muito pó-de-mico na cadeira. É hora séria, de a gente pensar juntos qual estrada pegaremos sem bloqueios. E sem bloquear a liberdade
Não foi no primeiro dia, mas lá pelo terceiro a coisa começou a ficar bem feia e então todos percebemos que estávamos parados ou parando nas encruzilhadas e nas quebradas, e que as cidades viraram ilhas. O governo demorou mais do que nós, porque lá onde vivem é uma espécie de Olimpo, e só quando baixaram na Terra é que perceberam que aqui estávamos no Inferno, abaixo dela, terra, alguns dedos, se é que me entendem.
Pagamos uma tal de Inteligência, uma agência inteira, a ABIN, que só serve para nos atazanar, porque ajudar que é bom…Mas nem precisava, porque soubemos também que há mais de ano havia essa ameaça de greve exposta em cartinhas dessa categoria carga pesada – ou melhor, de todas as cargas – e os ouvidos continuaram moucos.
E aí juntou tudo, patrões, empregados, gasolina com preço fervendo, diesel com sangue azul. De tudo que reivindicaram, realmente houve uma coisa que chamou a atenção: não vimos ninguém pedindo na listinha que fizessem melhorias no lugar onde andam, e nós também, propriamente, as estradas, que são a bagaceira em forma de asfalto ruim e terra enlameada. Caminhos que gastam mais combustível, energia, vida, os caminhões, treminhões, pneus, levam vidas. Estranho. Muito estranho também não terem listado outro aspecto: segurança. Isso com tantos assaltos e roubos de carga, cotidianos.
Talvez essas cobranças sobrem agora para nós fazermos, ou numa eventual greve geral que já não acho tão impossível, ou na plataforma dos candidatos que estão aí e que ainda parecem flanar sobre nossas cabeças e problemas.
Senão, nada impedirá que novamente sejamos chacoalhados e fiquemos pendurados em alguma brocha como essa que pintou o sete nos hospitais, mercados, linhas de produção.
Foram momentos nos quais não soubemos de tiroteios nem de balas perdidas no Rio de Janeiro; da febre amarela, dengue, e do absurdo das campanhas contra vacinas feitas por ignorantes. Talvez esses e outros tipos de ignorantes estivessem preocupados em sacudir bandeiras desajeitadas pró uma intervenção que eles não têm noção do que é, do que poderia ser, do que foi quando ela aconteceu e nos chacoalhou, bloqueou e feriu por 21 anos.
Aprendemos muito observando esses dias. Vimos o medo, a loucura, a ganância e o egoísmo em suas piores formas, o descontrole e o exagero. O corre-corre desnecessário. Cada um por si, ninguém por todos. Um país inteiro de joelhos, cada um rezando um credo.
Ficamos com o bumbum na janela. E dela avistávamos as ruas vazias, sem trânsito, muita gente andando, muitas bicicletas enfim ocupando as ciclovias, e sentimos o estranho (mas muito bom) silêncio. Poluição pela metade. Incrível como tudo pode ter um lado bom.
Mas mais do que tudo isso, sentimos o tremor e o temor. Externamos nossas preocupações com o futuro, com o que aconteceria, e com o que pode acontecer. Fomos pegos num redemoinho, e ainda estamos bem tontos.
Esperamos soluções, e que não são soluços grandes de um choro que não queremos mais ter. Muito menos por estarmos engasgados com tantas coisas para dizer.
Não foi no primeiro dia, mas lá pelo terceiro a coisa começou a ficar bem feia e então todos percebemos que estávamos parados ou parando nas encruzilhadas e nas quebradas, e que as cidades viraram ilhas. O governo demorou mais do que nós, porque lá onde vivem é uma espécie de Olimpo, e só quando baixaram na Terra é que perceberam que aqui estávamos no Inferno, abaixo dela, terra, alguns dedos, se é que me entendem.
Pagamos uma tal de Inteligência, uma agência inteira, a ABIN, que só serve para nos atazanar, porque ajudar que é bom…Mas nem precisava, porque soubemos também que há mais de ano havia essa ameaça de greve exposta em cartinhas dessa categoria carga pesada – ou melhor, de todas as cargas – e os ouvidos continuaram moucos.
E aí juntou tudo, patrões, empregados, gasolina com preço fervendo, diesel com sangue azul. De tudo que reivindicaram, realmente houve uma coisa que chamou a atenção: não vimos ninguém pedindo na listinha que fizessem melhorias no lugar onde andam, e nós também, propriamente, as estradas, que são a bagaceira em forma de asfalto ruim e terra enlameada. Caminhos que gastam mais combustível, energia, vida, os caminhões, treminhões, pneus, levam vidas. Estranho. Muito estranho também não terem listado outro aspecto: segurança. Isso com tantos assaltos e roubos de carga, cotidianos.
Talvez essas cobranças sobrem agora para nós fazermos, ou numa eventual greve geral que já não acho tão impossível, ou na plataforma dos candidatos que estão aí e que ainda parecem flanar sobre nossas cabeças e problemas.
Assim, precisaremos fazer nossas listas de reivindicações – urgente. Podemos também começar reclamando do absurdo preço da gasolina, mas enquanto maioria devemos nos preocupar muito em exigir transportes públicos de qualidade e vias alternativas de escoagem de produtos de primeira necessidade, como ferrovias. Esses dias todo mundo lembrou do “trem bão”.
Senão, nada impedirá que novamente sejamos chacoalhados e fiquemos pendurados em alguma brocha como essa que pintou o sete nos hospitais, mercados, linhas de produção.
Foram momentos nos quais não soubemos de tiroteios nem de balas perdidas no Rio de Janeiro; da febre amarela, dengue, e do absurdo das campanhas contra vacinas feitas por ignorantes. Talvez esses e outros tipos de ignorantes estivessem preocupados em sacudir bandeiras desajeitadas pró uma intervenção que eles não têm noção do que é, do que poderia ser, do que foi quando ela aconteceu e nos chacoalhou, bloqueou e feriu por 21 anos.
Aprendemos muito observando esses dias. Vimos o medo, a loucura, a ganância e o egoísmo em suas piores formas, o descontrole e o exagero. O corre-corre desnecessário. Cada um por si, ninguém por todos. Um país inteiro de joelhos, cada um rezando um credo.
Ficamos com o bumbum na janela. E dela avistávamos as ruas vazias, sem trânsito, muita gente andando, muitas bicicletas enfim ocupando as ciclovias, e sentimos o estranho (mas muito bom) silêncio. Poluição pela metade. Incrível como tudo pode ter um lado bom.
Mas mais do que tudo isso, sentimos o tremor e o temor. Externamos nossas preocupações com o futuro, com o que aconteceria, e com o que pode acontecer. Fomos pegos num redemoinho, e ainda estamos bem tontos.
Esperamos soluções, e que não são soluços grandes de um choro que não queremos mais ter. Muito menos por estarmos engasgados com tantas coisas para dizer.
A hora da covardia
Não se tem notícia de humilhação similar. Para todos os efeitos práticos, o governo Temer sucumbiu, atropelado por um caminhão. Mas, em meio ao caos, entre as vozes estridentes dos populistas e os ecos secundários dos oportunistas, deve-se registrar o silêncio dos candidatos de centro. Na paisagem de ruínas, ninguém ousou sair em defesa do interesse geral. A covardia será punida nas urnas.
O Planalto sabia que a explosão viria, mas permaneceu inerte. Diante da catástrofe consumada, ensaiou uma valsa de sucessivos rugidos e recuos, até a completa desmoralização. No início, corretamente, identificou a natureza da operação de locaute, que se fantasiava como greve espontânea. Na sequência, renunciou ao exercício da força legítima, oferecendo carta branca aos grandes empresários de transportes e às facções amotinadas dos caminhoneiros. Corte das estradas, abolição do direito de ir e vir, colapso do abastecimento essencial: uma nação sem governo, sem lei, converteu-se em refém da força privada.
Temer capitulou duas vezes, entregando bem mais do que exigiam as milícias invasoras. No meio do percurso, estendeu sua própria humilhação ao STF, que dera amparo à liberação compulsória das estradas, e aos militares, que se preparavam para cumprir a ordem de romper os bloqueios. O presidente e seu círculo de patéticos estrategistas temiam que a aplicação da lei provocasse uma reprodução das “jornadas de junho” de 2013, incendiando as cidades. No altar sacrificial da capitulação, eles imolaram todos os bens públicos que tinham ao alcance. A desoneração da folha das transportadoras, o tabelamento do frete, a contratação de transporte sem licitação, o subsídio ao diesel serão financiados por cortes de gastos sociais, inflação e emissão de dívida. Há, contudo uma perda maior: agora, ninguém mais duvida de que a chantagem compensa, especialmente se for conduzida a seus limites extremos.
O Planalto sabia que a explosão viria, mas permaneceu inerte. Diante da catástrofe consumada, ensaiou uma valsa de sucessivos rugidos e recuos, até a completa desmoralização. No início, corretamente, identificou a natureza da operação de locaute, que se fantasiava como greve espontânea. Na sequência, renunciou ao exercício da força legítima, oferecendo carta branca aos grandes empresários de transportes e às facções amotinadas dos caminhoneiros. Corte das estradas, abolição do direito de ir e vir, colapso do abastecimento essencial: uma nação sem governo, sem lei, converteu-se em refém da força privada.
Temer capitulou duas vezes, entregando bem mais do que exigiam as milícias invasoras. No meio do percurso, estendeu sua própria humilhação ao STF, que dera amparo à liberação compulsória das estradas, e aos militares, que se preparavam para cumprir a ordem de romper os bloqueios. O presidente e seu círculo de patéticos estrategistas temiam que a aplicação da lei provocasse uma reprodução das “jornadas de junho” de 2013, incendiando as cidades. No altar sacrificial da capitulação, eles imolaram todos os bens públicos que tinham ao alcance. A desoneração da folha das transportadoras, o tabelamento do frete, a contratação de transporte sem licitação, o subsídio ao diesel serão financiados por cortes de gastos sociais, inflação e emissão de dívida. Há, contudo uma perda maior: agora, ninguém mais duvida de que a chantagem compensa, especialmente se for conduzida a seus limites extremos.
Soltaram os cachorros loucos. Nos bloqueios e acostamentos, os especuladores do caos desfraldaram as bandeiras da “intervenção militar”. Na arena de campanha, Jair Bolsonaro prometeu apoio integral aos “caminhoneiros”, simulou um pedido de moderação e, finalmente, garantiu que “um futuro presidente honesto/patriota” anistiará qualquer hipotético atingido por penalidades legais. O protagonista inconteste ganhou coadjuvantes, que se aninharam na boleia de uma carreta bitrem. Ciro Gomes avisou que, sem a revogação da lei do teto de gastos públicos, “vai faltar escola e hospital”. Já Álvaro Dias, um inesperado nostálgico da idade de ouro dilmista, clamou pela administração política dos preços de combustíveis.
A falência técnica da Petrobras nada ensinou ao lulopetismo, engajado na repetição farsesca de uma história trágica. Precisamente quando Bolsonaro advertiu para “a hora de acabar” o motim das estradas, a Federação Única dos Petroleiros (FUP), tentáculo sindical do PT, ensaiou um espetáculo alternativo de dupla utilidade. No plano puramente simbólico, a frustrada greve dos petroleiros reivindicava a redução dos preços do gás de cozinha, uma bandeira “popular” de contraponto petista à baderna da direita. No plano prático, exigia a demissão de Pedro Parente, o presidente que resgatou a Petrobras de um poço sem fundo, passo necessário para uma futura restauração do controle partidário sobre a estatal.
Bolsonaro e o PT operaram segundo seus interesses, apostando nas ações do colapso. O visceral oportunismo de Álvaro Dias só surpreendeu os que não o conhecem. Mas é o silêncio tumular de Geraldo Alckmin e Marina Silva, os candidatos viáveis do centro do espectro político, que indica a dimensão da crise nacional. O candidato tucano permaneceu virtualmente calado durante o auge da crise. No epílogo, depois de firmado o tratado de capitulação, produziu uma exigência vazia de retorno à “normalidade”. A candidata da Rede, por sua vez, criticou com justiça a falta de medidas preventivas do governo e a política de variação diária de preços, apenas para ensaiar um raciocínio primitivo — e demagógico — sobre a possibilidade de usar a produção doméstica de petróleo para regular os preços dos combustíveis.
A covardia triunfou. Nem Alckmin, nem Marina exigiram a garantia dos direitos básicos de circulação nas estradas e de abastecimento de bens essenciais. Nenhum dos dois formulou uma nítida condenação dos termos da rendição do Planalto à chantagem
dos promotores do locaute. Nenhum deles teve a audácia de defender a gestão de Pedro Parente, explicando que inexiste almoço grátis — e que, sob o império do lulismo, a Petrobras foi à lona por financiar subsídios de cunho populista.
Segundo constatação do Datafolha, 87% dos brasileiros aprovaram o movimento de paralisação, mas 56% o consideraram prejudicial à população. O instituto registra, ainda, que exatos 87% recusam os aumentos de impostos e cortes de gastos derivados da capitulação governamental. As nações enlouquecem quando o conjunto de suas lideranças políticas entregam-se ao populismo, ao oportunismo e à covardia. Nessa hora, a velha ordem desaba.
Demétrio Magnoli
A falência técnica da Petrobras nada ensinou ao lulopetismo, engajado na repetição farsesca de uma história trágica. Precisamente quando Bolsonaro advertiu para “a hora de acabar” o motim das estradas, a Federação Única dos Petroleiros (FUP), tentáculo sindical do PT, ensaiou um espetáculo alternativo de dupla utilidade. No plano puramente simbólico, a frustrada greve dos petroleiros reivindicava a redução dos preços do gás de cozinha, uma bandeira “popular” de contraponto petista à baderna da direita. No plano prático, exigia a demissão de Pedro Parente, o presidente que resgatou a Petrobras de um poço sem fundo, passo necessário para uma futura restauração do controle partidário sobre a estatal.
Bolsonaro e o PT operaram segundo seus interesses, apostando nas ações do colapso. O visceral oportunismo de Álvaro Dias só surpreendeu os que não o conhecem. Mas é o silêncio tumular de Geraldo Alckmin e Marina Silva, os candidatos viáveis do centro do espectro político, que indica a dimensão da crise nacional. O candidato tucano permaneceu virtualmente calado durante o auge da crise. No epílogo, depois de firmado o tratado de capitulação, produziu uma exigência vazia de retorno à “normalidade”. A candidata da Rede, por sua vez, criticou com justiça a falta de medidas preventivas do governo e a política de variação diária de preços, apenas para ensaiar um raciocínio primitivo — e demagógico — sobre a possibilidade de usar a produção doméstica de petróleo para regular os preços dos combustíveis.
A covardia triunfou. Nem Alckmin, nem Marina exigiram a garantia dos direitos básicos de circulação nas estradas e de abastecimento de bens essenciais. Nenhum dos dois formulou uma nítida condenação dos termos da rendição do Planalto à chantagem
Segundo constatação do Datafolha, 87% dos brasileiros aprovaram o movimento de paralisação, mas 56% o consideraram prejudicial à população. O instituto registra, ainda, que exatos 87% recusam os aumentos de impostos e cortes de gastos derivados da capitulação governamental. As nações enlouquecem quando o conjunto de suas lideranças políticas entregam-se ao populismo, ao oportunismo e à covardia. Nessa hora, a velha ordem desaba.
Demétrio Magnoli
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