sábado, 21 de julho de 2018

Gente fora do mapa

 

Políticos bandidos, política podre

Em mais de três décadas em redações de jornais e revistas tive a oportunidade de vivenciar um número enorme de crises que assolaparam o Brasil nos últimos anos. Como jornalista, muitas vezes estive em contato direto com os responsáveis pelas hecatombes que senti na pele como cidadão. Mas, jamais ao longo desses 30 e poucos anos vi o País sucumbir como agora. Houve, é verdade, momentos em que deixamos de crescer, em que o desemprego assombrava as famílias — sobretudo as mais pobres. Momentos em que o dragão da inflação queimava o poder aquisitivo antes mesmo de o salário ser creditado. Momentos em que investimento público era apenas retórica. Agora, é pior do que tudo isso. Muito Pior! Constata-se, com toda a crueldade possível, que estivemos e estamos tutelados por políticos bandidos (de todas as cores), usurpadores dos bens públicos e incompetentes na gestão do Estado.


Se até pouco tempo atrás roubavam sobre o que faziam, a estrada, a escola, o hospital, o carro de polícia… , de aproximadamente 16 anos para cá só roubam e nada constroem. O que está cada vez mais cristalino é o fato de estarmos regredindo. Doenças tidas como extintas voltam e matam os mais simples. O índice de mortalidade infantil aumenta, no momento em que o mundo da medicina avança a passos largos. Isso envergonha mais do que os mergulhos de Neymar! As relações de trabalho se equiparam, em muitos casos, ao período pré-princesa Isabel. O acesso aos serviços públicos é cada vez mais difícil. A educação é chacota e a segurança simplesmente não existe.

Isso tudo se deve duas questões absurdamente cruéis: corrupção e aparelhamento do Estado. Não bastasse os desvios de recursos, nos últimos anos as tarefas fins do Estado foram entregues a incompetentes. Graças a ação política rastaquera, os segundo, terceiro e quatro escalões do governo foram entregues a incapazes.

Políticos bandidos geram uma política podre. Mas, renegar a política como instrumento de transformação pode representar um atraso ainda maior. Já sabemos que devemos, nas urnas, punir corruptos e mentirosos. Mas temos também que dar um basta à palhaçada. Não dá para nesse momento aplaudir trogloditas de plantão que prometem bater até na sombra, mas que durante a vida toda viveram com recursos públicos e nada têm para mostrar à sociedade. Também não se pode levar a sério aqueles que planejam mudar os fatos e criam um discurso próprio para limpar biografias enlameadas. Tá difícil, mas podemos achar um caminho.

Fantasma

A liberdade não passa de vão fantasma quando uma classe de homens pode esfaimar outra impunemente
Joel Silveira, "Guerrilha noturna"

O saber como pode

Nas sociedades simples, há compartilhamento do saber; ou seja, o conhecimento fica ao alcance de todas as pessoas, sem margem para se oprimir alguém por isso. Assim, o mesmo mapa cognitivo está ao alcance de todos, gerando um sistema social homogêneo.

Algumas pessoas assumem, entretanto, papéis especiais pela complexidade da função e repercussão nos destinos do grupo.

Estão, nesse caso, atividades relativas aos fenômenos mágico-religiosos, porque poucos estabelecem contato com divindades, manipulam forças relacionadas à morte e interpretam fenômenos sobrenaturais.


Nas sociedades complexas, surgem especialistas em diferentes setores, obtendo proeminência porque passaram por formação sistemática e receberam autorização do Estado para assistir quem sofre problemas espirituais, físicos e emocionais ou ocupar cargos elevados em áreas estratégicas. Eles concentram seus esforços numa função porque a capacidade humana para produzir conhecimento é infinita; assim, ninguém pode saber tudo, sobre todas as áreas, em todos os lugares.

Os especialistas modernos dependem de outros sábios em muitas outras áreas. Isso pode promover coesão interna, mas preserva o fantasma da opressão, porque existem diferenças no valor atribuído a cada atividade; logo, quem tem o conhecimento inerente às funções consideradas nobres ocupa planos sociais mais elevados, impondo teorias, definindo os rumos de seu grupo e obtendo alto rendimento. Há desqualificação do saber empírico, que ficou aquém daquele próximo à tecnologia avançada.

A sólida formação ocorre, atualmente, na escola, que encerra código de conduta, princípios filosóficos, técnicas pedagógicas, objetivos políticos e pesados custos operacionais, mirando interesses nacionais. Os países desenvolvidos definem, então, cuidadosamente, todo o processo educacional, propiciando aos imaturos os meios indispensáveis para a plena integração à sociedade.

O Brasil tem uma longa história de maus-tratos a essa qualificação para a cidadania, preservando a máxima da colonização portuguesa de que povo instruído é um risco ao domínio da metrópole. Isso fica mais nítido em campanhas eleitorais, como estamos vivendo agora, em que os agentes públicos agem sorrateiramente para manipular os mais desfavorecidos e preservar seu poder. Escamoteiam seus propósitos, fazem promessas vãs e introduzem seus filhos nos novos pleitos para controlar todas as esferas do Estado nos esquemas oligárquicos, que serão sempre o obstáculo maior para o processo de modernização do país.

Parece que os brasileiros jamais terão acesso ao saber que abrange técnicas profissionais de alto rendimento em diferentes áreas, capacidade de distinguir gestores comprometidos com o bem comum, seleção de práticas salutares para viver em comunidade e elaboração de projetos seguros para si e sua descendência. Permanecerão, portanto, sem autonomia para viver com dignidade, segurança e conforto.

Escravidão moderna atinge mais de 40 milhões no mundo

Cerca de 40,3 milhões de pessoas em todo o mundo foram submetidas a atividades análogas à escravidão em 2016, segundo o relatório Índice Global de Escravidão 2018, publicado pela fundação Walk Free e apresentado na ONU nesta semana. No Brasil, são quase 370 mil pessoas.

No contexto do relatório, o conceito de escravidão moderna abrange um conjunto de conceitos jurídicos específicos, incluindo trabalho forçado, servidão por dívida, casamento forçado, tráfico de seres humanos, escravidão e práticas semelhantes à escravidão.


De acordo com o documento, 71% das vítimas são mulheres, enquanto 29% são homens. Das 40,3 milhões de pessoas afetadas, 15,4 milhões estavam em casamentos forçados, enquanto 24,9 milhões se encontravam em condições de trabalho escravo. A Ásia representa 62% da estimativa global de pessoas em regime de escravidão.

A escravidão moderna é mais comum na Coreia do Norte e em outros regimes repressivos, mas as nações desenvolvidas também são responsáveis porque importam 350 bilhões de dólares em mercadoria produzidas em circunstâncias suspeitas, afirmou a fundação Walk Free. Na Coreia do Norte, por exemplo, 104 em cada mil pessoas viviam em tais condições.

Completam o ranking dos países com maior percentual de escravidão moderna em relação à própria população a Eritreia (93 para mil), o Burundi (40 para mil), a República Central Africana (22 para mil), o Afeganistão (22 para mil), a Mauritânia (21 para mil), o Sudão do Sul (20,5 para mil), o Paquistão (17 para mil), o Camboja (17 para mil) e o Irã (16 para mil).

A Venezuela é, junto ao Haiti, o país com a maior incidência proporcional da escravidão moderna na América. Segundo o índice, 174 mil pessoas vivem nessa situação em território venezuelano, uma taxa de 5,6 para cada mil habitantes. Essa proporção é similar à do Haiti, onde 59 mil pessoas seriam vítimas – uma proporção amplamente acima da de outros países da região.

O Brasil registrou uma taxa de apenas 1,8 pessoas em condição de escravidão moderna para cada mil habitantes. Por outro lado, em números absolutos, o Brasil detém a segunda maior quantidade de pessoas em regime escravocrata na região, com 369 mil habitantes. Os EUA registraram 403 mil pessoas (1,3 para mil).

No total, a organização estimou que quase 2 milhões de pessoas em toda a América estavam em 2016 em situação de escravidão – dois terços forçados a trabalhar. O número absoluto representa apenas 5% da estimativa global.

No número absoluto de pessoas consideradas em regimes de escravidão moderna, Índia (7,99 milhões de indivíduos estimados), China (3,86 milhões), Paquistão (3,19 milhões), Coreia do Norte (2,64 milhões), Nigéria (1,39 milhões), Irã (1,29 milhões), Indonésia (1,22 milhões) e República Democrática do Congo (1,05 milhões) são os oito países acima de um milhão de "escravos".

Por outro lado, Mauritânia, Luxemburgo, Suriname e Barbados são os quatro países com um número de casos estimados igual ou inferior a mil.

O Índice Global de Escravidão utiliza pesquisas de referência no mundo para estimar a prevalência da escravidão moderna em mais de 160 países. Pela primeira vez, o relatório se baseia também em dados comerciais sobre produtos em risco de ser produzidos pela escravidão moderna.

Deutsche Welle 

Imagem do Dia


Lula vai se tornando um cabo eleitoral da direita

Nenhum pai faria com um filho o que o pseudo-esquerdista Lula faz com a autoproclamada esquerda brasileira. Preso em Curitiba, Lula transformou sua hipotética candidatura presidencial num cavalho de batalha. Impede o PT de cuidar do Plano B e conspira contra a adesão de aliados ao projeto de Ciro Gomes. Com esses dois movimentos, Lula anima as campanhas da chamada direita.

Os partidos brasileiros, como se sabe, têm muitas cabeças e poucos miolos. O PT sofre da mesma falta de miolos, mas tem uma cabeça só. E Lula, o imperador do petismo, revela-se mais uma vez capaz de tudo, menos de compartilhar o poder e a influência. O imperador do petismo obriga o PT e seus satélites a segui-lo numa procissão que leva à cadeia, não à urna.

Inelegível, Lula aproximaria Ciro Gomes da Presidência se o apoiasse, cedendo-lhe o tempo de propaganda do PT. Em vez disso, conspira para isolar Ciro. As pesquisas indicam que Lula colocaria Fernando Haddad no segundo turno se anunciasse desde logo seu apoio ao poste petista. Mas Lula mantém sua candidatura cenográfica por conveniência penal.

Se esticar essa corda, Lula arrisca-se a assumir em 2018 o papel de cabo eleitoral da direita. Numa eleição imprevisível, já não é absurda a hipótese de um segundo turno disputado entre o tucano Geraldo Alckmin e o capitão Jair Bolsonaro.

Revoltados passivos

É um fenômeno curioso: o país ergue-se indignado, moureja o dia inteiro indignado, come, bebe e diverte-se indignado, mas não passa disto.
 
Falta-lhe o romantismo cívico da agressão. Somos, socialmente, uma coletividade pacífica de revoltados
Miguel Torga, "Diário XIV"

'Até pensava em votar em Bolsonaro, mas agora não'

Nós jornalistas deveríamos falar menos com os políticos e mais com as pessoas comuns, que são o verdadeiro Brasil. E mais nesses momentos de suspense às vésperas de uma das eleições mais confusas e imprevisíveis da democracia do país. Minha experiência me confirma que os que nunca aparecem nos jornais, os mudos, que são 99% da população, são os que melhor conhecem a vida real que precisam conquistar o tempo todo. São eles, os sem privilégios, os que melhor sabem como bate o coração do país. E são eles os que têm em suas mãos o maior número de votos a depositar nas urnas.


Digo isso porque nessa manhã, enquanto pensava no que escrever para minha nova coluna, encontrei um taxista jovem, negro, simpático. Fazia um calor de verão e me surpreendeu ao comentar, bem informado, sobre o drama dos problemas do meio ambiente. De repente, me perguntou em quem eu pensava em votar para presidente. Disse que não votava no Brasil e aproveitei para perguntá-lo em quem ele pensava em votar. “Está difícil. Até pensava em votar em Bolsonaro, mas agora não” e acrescentou: “O problema é que os que teriam de nos dar exemplos de vida são os que mais nos envergonham a cada dia”.

Fiquei sem saber em quem ele votaria, mas entendi uma coisa importante: não era do partido dos derrotistas que acham que todos são iguais. Eu o vi sofrendo para encontrar algum candidato que merecesse seu voto. São esses a verdadeira população, os que sofrem o mal exemplo dos governantes e ao mesmo tempo não renunciam a um Brasil em que eles tenham voz, porque são os que o constroem com seu trabalho.

Os políticos deveriam deixar seus carros blindados na garagem e caminhar a pé pelas ruas e subir nos ônibus. Deveriam escutar as pessoas como anônimos, sem escoltas, para saber o que pensam, porque essa massa que viaja nos transportes públicos poderia ser sua melhor assessora. Dessa forma, tanto a esquerda como a direita poderiam entender por que as pessoas não vão às ruas protestar quando elas querem e por que saem e se manifestam quando elas gostariam que ficassem trancadas em casa. As pessoas não são um robô que se move ao bel-prazer dos políticos. São pessoas que decidem motivadas pela urgência de uma vida com menos dificuldades econômicas e menos perigos para sobreviver.

Um amigo meu muito brincalhão me disse que teve um sonho curioso. De repente, a Brasília política havia desaparecido. Onde hoje estão o Governo e o Congresso era somente um grande parque de diversões para crianças. Os jornalistas, desesperados, tentavam saber onde estava a Brasília do poder. Eles a procuravam nas grandes avenidas de São Paulo e nos bairros ricos do Rio. Nada. Até que em uma rede social alguém contou que viu senadores, deputados e ministros caminhando nos becos de uma favela. Estavam a pé, entravam nos bares, nas escolas. Alguns corriam assustados quando as metralhadoras disparavam.

Contei o sonho de meu amigo ao jovem taxista e ele o levou a sério: “Não sei se Brasília deveria mudar a uma favela, mas os políticos deveriam ir às ruas e falar mais com a gente”, disse. Tentei saber o que ele perguntaria a um desses exilados de Brasília se subissem em seu táxi. E foi rápido na resposta: “Eu perguntaria por que precisam roubar tanto com o que já ganham”.

É essa sabedoria popular que os governantes deveriam escutar de sua própria boca. Eles não são contra a política e contra os partidos. O que faz com que tenham aversão aos governantes é saber que parecem entrar na política não para tentar melhorar o país e sim para enriquecer, eles e suas famílias. Por que cada vez mais os políticos de todos os partidos lutam agora para eleger seus filhos e parentes, começando pelos que estão na cadeia condenados por corrupção? São perguntas que as pessoas que viajam horas em pé nos ônibus também fazem. Alguém se atreve a escutá-las? Ou tem medo delas?

Vampiros no banco de sangue

O diretor de Desenvolvimento Setorial da ANS, Rodrigo Aguiar, não pode ser acusado de esconder o jogo. Em entrevista ao Globo, ele defendeu a cobrança extra aos pacientes e informou que a agência “não é um órgão de defesa do consumidor”. Quem ousaria pensar o contrário?

A fala não revela apenas desprezo pelos clientes, que já penavam para pagar as mensalidades antes da nova regra. Também escancara a captura das agências reguladoras por grandes grupos econômicos. No caso da ANS, quem dá as ordens são os planos de saúde.

A autarquia ANS não é o Procon, mas foi criada para fiscalizar as empresas e impedir que o mercado atropele os consumidores. Não se trata de uma opinião. Basta ler a lei que criou a agência, no governo FH.


O texto afirma que a finalidade institucional do órgão é “promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde”. Entre suas principais atribuições, fixa a de “articular-se com os órgãos de defesa do consumidor visando à eficácia da proteção e à defesa do consumidor de serviços privados”.
Na segunda-feira, a ministra Cármen Lúcia suspendeu a resolução da ANS que permitiu a cobrança extra de até 40% sobre consultas e exames. Na decisão, ela anotou: “Saúde não é mercadoria. Vida não é negócio. Dignidade não é lucro”.

O diretor da agência não entendeu ou não quis entender o recado. Na entrevista a Luciana Casemiro, ele desdenhou de quem questiona a submissão da ANS aos planos. Reduziu as críticas a “fala repetida” e “retórica de falar mal das agências”.
O lobby da saúde sempre foi influente em Brasília. A novidade é que a turma perdeu o pudor e passou a operar às claras. O presidente Michel Temer entregou o ministério a Ricardo Barros, um deputado do PP que teve a campanha patrocinada pelo setor. Ele avisou logo que não fiscalizaria a qualidade dos planos. “Ninguém é obrigado a contratar”, justificou.

A ANS é feudo do MDB. O relatório que avalizou a indicação de Rodrigo Aguiar foi assinado pelo senador Valdir Raupp, réu na Lava-Jato. Um observador do que ocorre na agência diz que seria impreciso falar em raposas cuidando do galinheiro. Neste caso, ele prefere a imagem de vampiros no banco de sangue.