quarta-feira, 20 de novembro de 2019

Gente fora do mapa

Marisqueiras espanholas trabalham sem dia
de descanso para tirar o pão da maré baixa

Nem nem

Você os conhece. São os brasileirinhos que nem estudam nem trabalham. Compõem a chamada geração nem-nem, a quem se acusa de ser passiva, folgada e, às vezes, viver à custa das mães até os 39 anos sem a menor vergonha. Mas por que botar toda a culpa nesses garotos que, no fundo, são só vítimas de anos de políticas econômicas e educacionais desastradas?

Além disso, há muitos, talvez todos nós, com quem dividir a responsabilidade pelo que está acontecendo de ruim no país. Há, por exemplo, os que nem atam nem desatam. Nem vão nem ficam. Nem atacam nem defendem. Nem dão nem descem. Nem fazem nem desfazem. Nem dizem nem desdizem. Nem pedem nem mandam. Nem calam nem consentem. Nem mordem nem sopram. Nem f..... nem saem de cima. Talvez por isso, nem arrisquem nem petisquem. Mas também não desocupam o penico.


É natural. Afinal, o mundo é relativo e aprendemos com os filósofos que há muita coisa que não é nem sim nem não. Nem isso nem aquilo. Nem melhor nem pior. Nem mais nem menos. Nem lá nem cá. Nem assim nem assado. Nem agora nem nunca. Nem pau nem pedra. Nem carne nem peixe. Nem barro nem tijolo. Nem céu nem inferno. Nem tanto ao céu nem tanto à terra. E nem tanto nem tão pouco. Mas pode ser também as duas coisas.

Há no ar uma polarização de contrários que já começa a cansar. Mesmo porque não são nem tão contrários assim --dos dois polos saem os mesmos discursos, as mesmas mentiras, as mesmas bravatas, como se eles se retroalimentassem e já não existisse um sem o outro. Daí que, por não se deixar mais iludir por esse jogo de espelhos com sinal trocado, haja agora quem não queira saber nem de esquerda nem de direita.

São os que não se consideram representados pelas duas faces da mesma moeda. É gente que, hoje, no Brasil - talvez a maioria-, se perguntada, dirá nem Lula nem Bolsonaro.
Ruy Castro

O erro é deles, a conta é nossa

O governo Bolsonaro foi alertado, mas desprezou os alertas. Mais do que isso, ameaçou e constrangeu os cientistas e os servidores dos órgãos de controle que avisaram sobre o aumento do desmatamento. Ontem, o dado anual do Prodes saiu e mostrou um enorme retrocesso: o Brasil desmatou quase 10 mil quilômetros quadrados em um ano. O erro é do presidente e do seu ministro do Meio Ambiente, mas o preço é pago por todos nós, porque é nosso o patrimônio que foi destruído.

As florestas das áreas de conservação, das terras públicas sem destinação, dos territórios indígenas pertencem aos brasileiros. O governo é apenas o síndico. E ele foi irresponsável quando estimulou por atos e palavras as invasões, atacou a credibilidade do Inpe, exonerou o diretor, foi se solidarizar com desmatadores e invasores, constrangeu funcionários do Ibama e ICMBio e paralisou o Fundo Amazônia. Esses sinais foram dados pelo presidente Bolsonaro ainda candidato e ficaram mais explícitos depois da eleição. O ministro escolhido por ele, Ricardo Salles, tem sido insistente no trabalho de desmonte dos órgãos do Ministério do Meio Ambiente.


O Brasil já teve anos de desmatamento maior. Mas o que funcionou foi unir os esforços de pessoas, órgãos e instituições que lutam pela proteção do patrimônio coletivo do bioma amazônico. Foi fundamental, tanto no surto de desmatamento de 1996, no governo Fernando Henrique, quanto no de 2004, no governo Lula, a qualidade da resposta da autoridade pública. FH elevou a área da reserva legal e fez a lei de crimes ambientais.

O governo Lula, coma então ministra Marina Silva, aperfeiçoou os sistemas de controle, pediu ao Inpe um sistema de alerta, o Deter, organizou coma Polícia Federal, o Ibama e depois também o ICMBio operações de repressão aos crimes ambientais, homologou áreas de conservação e criou o Serviço Florestal Brasileiro. O Ministério Público passou a acompanhar de forma ágil todos esses processos.

Quando o Estado foi desafiado, nesses dois casos citados acima, o governo reafirmou que a lei tem que ser cumprida. A resposta dada levou à queda da taxa anual de desmatamento. Dos absurdos 29 mil km2 em 1996, a destruição foi caindo nos anos seguintes até 13 mil em 1998. Voltou a subir e em 2004 atingiu 27 mil km2. A resposta vigorosa da então ministra Marina Silva e seus sucessores levaram ao número de 4,6 mil km2 no ano de 2012.

O governo Dilma deu sinais ambíguos. As grandes hidrelétricas da Amazônia e a redução dos limites de unidades de conservação foram estímulos ao desmatamento. No governo Temer também foi diminuída a área da Floresta de Jamanxim. A destruição anual voltou a crescer e em 2018 chegou a 7,5 mil km2.

O salto agora foi muito maior. Em relação ao ano anterior, pulou 29,5%, levando o número absoluto do desmatamento a 9,7 mil km2. Isso é uma área equivalente a mais de seis vezes o território da cidade de São Paulo, em apenas um ano.

O Brasil assumiu compromissos internacionais de atingir em 2020 a taxa de 3,3 mil km2. Essa meta o país espontaneamente ofereceu porque estava próxima de ser cumprida. E o maior beneficiado seria o próprio Brasil.

A insensatez do atual governo provocou um retrocesso civilizatório. O peso disso cai sobre todo o país, em mais ameaças de mudança climática, em piora da qualidade do ar, em destruição de riqueza coletiva, em riscos para o agronegócio brasileiro.

A ministra Teresa Cristina já disse que é contra a moratória da soja, e o governo dá todos os sinais de que vai atacar também esse instrumento que ajudou a conter o desmatamento. Trata-se de um acordo feito entre exportadores de soja e importadores de produtos brasileiros, com a participação do governo e de ONGs, pelo qual as empresas se comprometem a não comprar soja de área recentemente desmatada. Isso permitiu que o produto brasileiro — que tem concorrentes como a soja da Argentina e Estados Unidos — superasse barreiras que já estavam se formando.

A luta para conter o desmatamento foi resultado de uma longa e trabalhosa tessitura institucional. Os governos Dilma e Temer relaxaram e perderam parte desse esforço. O governo Bolsonaro fez um ataque frontal à proteção e deu o sinal de que o Estado estimula o avanço dos desmatadores. O peso desse desatino recai sobre todos nós.

Brasil tá de morte


Reservas internacionais diminuem US$ 21,9 bilhões desde junho

O Brasil anda torrando suas reservas cambiais. Em 25 de junho, as reservas internacionais do Brasil bateram seu recorde histórico. Atingiram US$ 390 bilhões. Beleza.
Passados 142 dias, ou seja, no dia 14, que é o último dado disponível, as reservas baixaram para US$ 368,5 bilhões. Menos US$ 21,9 bilhões em menos de cinco meses.

Aliás, Paulo Guedes durante a campanha eleitoral já falou sobre o tema. Disse que poderia usar as reservas para diminuir a dívida publica. Disse e depois desmentiu.

A política caolha do Brasil

As democracias contemporâneas enfrentam uma situação paradoxal. De um lado, para garantir o bem-estar da sociedade, elas precisam lidar com vários direitos legítimos e tentar compatibilizá-los. É uma tarefa muito difícil, sem um fim ou uma conciliação completa, mas que é inescapável, se se quer construir uma sociedade justa e equilibrada. Só que, por outro lado, há cada vez mais cidadãos e atores políticos que procuram um caminho único para resolver os dilemas coletivos. Centra-se o foco apenas num aspecto em detrimentos dos demais. Assim, em vez de se basear em múltiplos olhares, esse modelo mental opta pelo modo caolho de se fazer política.

O modo caolho constrói diagnósticos e prognósticos unilaterais, apostando que um aspecto é mais importante e determina os demais. É um jogo da economia versus a política, ou dos políticos contra os tecnocratas, da vitória do mercado sobre o Estado, ou de um governo que prescinde da lógica mercadológica. A essa lista, o bolsonarismo incluiu mais uma dicotomia estéril: a dos direitos em contraposição aos deveres. Neste caso, num país tão desigual como o nosso, temo que apenas mais “deveres” aos que têm menos vai significar mais “direitos” aos que têm mais.

A complexidade das sociedades atuais deveria afastar políticos e gestores governamentais de soluções de tipo caolho. Embora não haja uma causa única para os levantes e crises que têm assolado vários países, pode-se perceber que a população quer desfrutar de múltiplos objetivos. Ela deseja estabilidade econômica, melhor saúde e educação, uma velhice digna, mais segurança, mobilidade urbana, redução de burocracias que atrapalham a vida pessoal ou dos negócios, proteção ao meio ambiente etc.

Responder a tantas demandas, não cansarei de repetir aqui, não é simples; contudo, se políticos e gestores públicos procurarem ver o mundo por mais de uma lente e não forem caolhos, pelo menos haverá maior capacidade de evitar ou reduzir os efeitos de crises sociais. Os governos fracassam quando concentram sua visão em somente um aspecto ou lógica de organizar a vida social


O Brasil apresenta exemplos recentes do modo caolho de se pensar a política. As três PECs enviadas recentemente pelo ministro Paulo Guedes está recheada de excessos de economicismos. Pegue-se o caso da proposta de colocar no texto constitucional um adendo à definição dos direitos sociais dos brasileiros. Junto com os direitos à saúde, educação, alimentação, moradia, transporte, entre os principais, quer se acrescentar que tais temas devam se sujeitar “ao direito ao equilíbrio fiscal intergeracional”.

Num país com várias histórias de descalabro fiscal, ter um modelo de finanças públicas sadio é sempre um avanço. Para isso existem reformas como a da Previdência, a tributária, a administrativa e tudo que possa, ao mesmo tempo, garantir as bases fiscais do Estado e o fornecimento de bons serviços públicos. Todavia, começa-se a se desconfiar dessa sugestão de reforma constitucional quando se vê que, ao lado dela, propõe-se juntar os percentuais de gastos obrigatórios de saúde e educação num mesmo montante.

No fundo, está se tentando inverter a lógica proposta pela Constituição de 1988, com um nítido desequilíbrio em favor dos meios contra os fins. Claro que o Brasil precisa melhorar a eficiência e a efetividade das políticas de saúde e educação, mas, para tanto, é preciso que elas sejam prioridades efetivas, porque as próximas gerações, como as anteriores dos extratos mais pobres, dependem de oportunidades criadas pelos governos para poderem ter alguma chance no mercado.

O temor aqui é que, em nome da crítica aos erros dos últimos 30 anos (e eles ocorreram), voltemos ao mundo pré-redemocratização, quando praticamente não havia atenção primária à saúde e mais de um terço das crianças de 7 a 14 anos estavam fora da escola.

A forma caolha da equipe econômica enxergar o Brasil começa quando Paulo Guedes diz que vai acabar com a modelo social democrata para colocar um paradigma completamente oposto, de perfil liberal, no lugar. O Estado brasileiro tem problemas, precisa ser reformado, mas houve muitos avanços no país. Quando se quer afirmar um liberalismo puro como única saída, o país pode perder as conquistas e aprendizados em troca por algo incerto, o qual, na melhor das hipóteses, poderá resolver alguns erros, mas que, ao jogar a criança fora junto com a água do banho, poderá levar a retrocessos sociais.

Ter um olhar múltiplo é compatibilizar melhor esses objetivos fiscais e sociais, e evidentemente o pacotão Guedes, mesmo propondo algumas coisas corretas, está desbalanceado. Afinal, se é para garantir direitos intergeracionais, expressão que dá um tom mais nobre ao pensamento econômico, porque não colocar numa reforma tão ampla do Estado que qualquer nova política pública econômica ou de infraestrutura deve garantir o direito intergeracional de meus netos poderem ter um meio ambiente protegido e a cultura ancestral dos povos indígenas resguardada?

Pode parecer provocação diversionista essa questão, mas quando o ministro Guedes diz que vai modernizar nosso país, deveria contar ao seu chefe maior que a economia brasileira vai fracassar no futuro se não se ancorar também em preocupações ambientais e de direitos humanos. Isso é o que os principais centros econômicos de pesquisa do mundo estão dizendo. Se não tivermos direitos intergeracionais mais amplos, o modelo bolsonarista de reforma do Estado é atrasado no tempo.

Esse economicismo fora de época aparece ainda na proposta de redução dos municípios com até cinco mil habitantes e arrecadação própria menor que 10% da receita total. Quase um quarto das cidades brasileiras estão nesta situação. É bem verdade que houve um crescimento enorme do contingente de governos municipais pós-1988, fenômeno que diminuiu de intensidade após a aprovação da Emenda Constitucional nº 15, de 1996. Só que o governo só olha a dimensão financeira do problema, que é importante obviamente, sem analisar outras duas esferas essenciais: o efeito na produção de cidadania e na qualidade da prestação de serviços públicos.

Juntar mais de mil municípios com seus vizinhos poderá significar que em muitos deles haverá a redução da possibilidade de participação política dos seus cidadãos. Seria muito mais interessante limitar o pagamento de vereadores em micromunicípios do que extingui-los, pois junto com a morte dessas cidades decretada por Bolsonaro vai para o túmulo o que se conseguiu, mesmo que seja pouco, de democracia em tais localidades historicamente marcadas pelo mandonismo local.

Se o objetivo é melhorar a qualidade dos políticas locais e, ao mesmo tempo, aumentar a eficiência, a solução já existe, sem contraindicações políticas ou administrativas: os governos federal e estaduais deveriam incentivar a cooperação intermunicipal em larga escala, disseminando as experiências bem-sucedidas de consórcios de saúde e de desenvolvimento econômico, bem como os arranjos de desenvolvimento da educação. Isso não precisa de reforma constitucional e junta o útil (o aspecto financeiro) ao agradável e essencial (a prestação de bons serviços públicos). Para tanto, basta deixar de lado o modo caolho do economicismo.

O governo Bolsonaro erra ao traduzir federalismo como descentralização, quando ele é mais do que isso, pois sua essência, sobretudo em países desiguais, está nas relações intergovernamentais. Neste sentido, o maior problema dos governos locais está em sua baixa capacidade estatal de produzir políticas públicas. Acabei de ajudar a organizar, pela Editora da FGV, um livro sobre esse tema nos países ibero-americanos e, a partir dos dados empíricos, posso dizer que sem melhorar as capacidades estatais subnacionais brasileiras, poderemos ter, com a reforma Guedes, municípios saneados com serviços públicos precários e sem efetividade. Aqui, a cooperação com os governos federal e estaduais, assim como dimensões regionais do federalismo, são peças-chave para garantir boas prefeituras e a cidadania no Brasil.

A dificuldade de se abandonar o modo caolho tem como base a busca de identidade grupal e partidária como algo mais importante do que a construção de consensos. Isso gera algo mais do que polarização.

Esse comportamento resulta em um ambiente político nocivo e políticas públicas piores. É bom lembrar que se Fernando Henrique e Lula, durante 16 anos, tiveram mais sucesso do que seus sucessores, uma das principais razões disso está no fato de que procuraram construir coalizões de ideias e interesses maiores do que seu grupo original. De lá para cá, o sectarismo tem vencido, com resultados nefastos.

É preciso dizer que o país só se reconstruirá se superar o modo caolho de se fazer política, adotando um modelo mais incrementalista, plural e negociador de se pensar o país. Bolsonaro, Lula, Dória, Ciro, Huck, quem quer que seja nosso líder maior, só conseguirá governar melhor se conversar com os demais atores e construir uma governança com múltiplos olhares.
Fernando Abrucio

Empresas lançam serviço de reconhecimento facial para igrejas no Brasil

Entre os dias 17 e 20 de outubro de 2019, o Centro de Exposições Anhembi, na zona norte de São Paulo, sediou a 15ª ExpoCristã – maior evento voltado para o público cristão da América Latina. Entre shows de música gospel, simulações virtuais de episódios bíblicos e estandes de editoras evangélicas, duas empresas se destacaram com produtos na área de tecnologia.

Com o slogan “mude a maneira de operar sua igreja”, a Kuzzma, empresa estrangeira de inteligência artificial, lançou seu serviço de reconhecimento facial voltado para igrejas no Brasil. Em um estande luxuoso, revendedores associados apresentaram a tecnologia para pastores interessados. O CEO da empresa, Marcelo Scharan, ainda realizou uma palestra intitulada “Personalização, dados e igreja” no primeiro dia de evento.

O serviço de reconhecimento facial também estava sendo vendido pela brasileira Igreja Mobile durante o evento. “Hoje em dia quem não deseja ter o controle do seu ambiente? De quem entra e quem sai? Nas igrejas nós constatamos que eles queriam muito saber disso e por isso trouxemos essa tecnologia”, explica Luís Henrique Sabatine, diretor de desenvolvimento da empresa, que oferece ainda o serviço de transmissão ao vivo de cultos e eventos religiosos.

Segundo o site da Kuzzma, o reconhecimento facial funciona a partir de uma câmera panorâmica de alta resolução instalada nas igrejas, identificando informações pessoais e assiduidade dos fiéis nos cultos. A partir disso, são gerados relatórios para cada pessoa, incluindo estatísticas sobre seu comportamento e até avisando em casos de atividade considerada anormal. “Dados como sexo, idade, frequência, horário de chegada, motivos prováveis de atraso e muitos outros são analisados e apresentados em relatórios. Conseguimos definir em nossas métricas até mesmo se alguém precisa de uma visita pastoral”, disse o CEO da empresa em entrevista à ExpoCristã.

Representantes da empresa, no entanto, não quiseram dar entrevista para a Agência Pública a fim de esclarecer as dúvidas no serviço. “A Kuzzma optou por não falar publicamente sobre o assunto, por se tratar de um tema delicado”, afirmou por e-mail o vendedor Rafael Melo.

A empresa começou a oferecer o reconhecimento facial no Brasil em outubro e não divulgou clientes ou parcerias. Segundo o site em inglês, o preço do serviço varia conforme o número de eventos em que será utilizado e o número de câmeras, começando com uma mensalidade de US$ 200 para um evento por semana com uma câmera instalada.

No Brasil, a empresa é representada por Marcelo Scharan Augusto, sócio das empresas Eletrica Stillo Ltda., de material elétrico, e Pier Cloud Consultoria Eireli, de serviços de hospedagem em internet e provedor de dados. Não é possível encontrar a representação estrangeira da Kuzzma, e seu site não está registrado no domínio de nenhum país. O endereço https://54.85.50.60 leva o usuário à página da empresa, sem informações para contato.


De maneira parecida, a concorrente oferece o serviço de reconhecimento facial voltado para eventos cristãos há cerca de um ano. A Igreja Mobile utiliza software da TecVoz, empresa de segurança eletrônica, mas com especificidades voltadas para as necessidades das igrejas.

Uma câmera comum captura as imagens e as envia para um computador capaz de reconhecer rostos e mais informações sobre essas pessoas. “Nós conseguimos definir para o cliente a assiduidade do usuário, contagem de pessoas, humor do usuário, se ele está feliz, se está triste, se está angustiado, com medo. Nós conseguimos definir isso tudo”, explica o diretor de desenvolvimento, Luís Henrique Sabatine.

A Igreja Mobile oferece relatórios de quantidade de pessoas presentes, gênero, idade média dos fiéis, assiduidade e análise de sentimento, conforme divulgado no próprio site. Os preços dos pacotes variam e não são divulgados pela empresa.

Segundo Sabatine, cerca de 40% dos clientes da Igreja Mobile – 160 igrejas – utilizam o serviço de reconhecimento facial. O resto utiliza apenas o serviço de transmissão ao vivo dos cultos oferecido pela empresa, que não quis dar nome aos clientes.

A Igreja Mobile pertence a Flávio Carrer Domingues e Rita Cardamone e foi fundada no final de 2018 com o serviço de transmissão ao vivo para igrejas. No início de 2019 começaram a oferecer o reconhecimento facial. Segundo o diretor de desenvolvimento da empresa, “o ponto diferencial é o nicho [cristão], realmente”.

Carrer e Cardamone são evangélicos. Rita é diretora regional da Jethro Internacional, faculdade americana de capelania e inteligência espiritual, no Recreio, bairro da zona oeste do Rio de Janeiro e sócia de uma empresa de venda de cursos. Já ele é sócio da Carrer e Dom Segurança Eletrônica e Automação.

A Igreja Evangélica Projeto Recomeçar, localizada no bairro de Xerém, na zona oeste do Rio de Janeiro, é uma das clientes da Igreja Mobile. O pastor responsável, Cláudio Duarte, fez vídeo promovendo a empresa nas redes sociais. “A Igreja Mobile é um produto que permitirá sua mensagem chegar em lugares que você nunca imaginaria”, diz.

Segundo Sabatine, foi o próprio pastor que trouxe a demanda pela tecnologia de reconhecimento facial. “Nas conversas e trocas de ideia, ele [pastor Cláudio Duarte] tocou nesse assunto e nós gostamos bastante e implementamos”, conta.

O Projeto Recomeçar utiliza a tecnologia desde o início de 2019, sendo um dos primeiros clientes, e avalia o serviço positivamente. “Nós utilizamos [o reconhecimento facial] para dar uma maior assistência aos membros que não estão vindo aos cultos”, conta Caio Duarte, responsável pela área de TI da igreja.

Em São Paulo, a Igreja da Restauração, na zona norte da cidade, começou recentemente a utilizar a tecnologia para controle de público. “A gente fica sabendo em média quantas pessoas vêm em cada culto semanal. Pra gente é bem importante ter esse retorno”, relata Sabrina Marciano, da comunicação da igreja.

Outros clientes da Igreja Mobile disseram não utilizar o reconhecimento facial, mas têm interesse em implementar em breve. É o caso da comunidade evangélica Estrela da Manhã, que por enquanto só realiza as transmissões ao vivo.

“O trabalho que eles nos apresentaram é um trabalho que ajuda bastante porque você tem como saber quantos membros estão [no culto], quantas vezes o membro veio pra igreja, quantas vezes o membro não veio. Isso, para a mensagem da igreja, ajuda muito. E também a possibilidade de conseguir fazer a pessoa ofertar, da pessoa dizimar”, conta Lilian Ietto, representante da Estrela da Manhã.

Segundo o diretor de desenvolvimento da Igreja Mobile, a tecnologia de reconhecimento facial oferecida precisa ser alimentada com dados de fiéis, como nome e foto, para poder gerar os relatórios individuais para cada um. Nesse momento de registro, os fiéis assinam termo consentindo o uso dos dados pela igreja. “A gente leva os membros, eles registram a face no nosso software lá e assinam o termo dizendo que a igreja irá utilizar da imagem dele para o reconhecimento facial, porque o banco de dados não fica com a Igreja Mobile. Isso fica com o cliente”, esclarece.

No entanto, nem a Igreja da Restauração nem o Projeto Recomeçar firmaram termo de uso de dados com os fiéis. “A gente anunciava nos cultos, mas nada de assinatura”, admite Sabrina Marciano, justificando que a igreja se encontra em reforma e que posteriormente isso será implementado.

A reportagem pediu acesso ao contrato citado, mas a Igreja Mobile preferiu não compartilhar.

Para o técnico de TI do projeto Recomeçar, o consentimento dos fiéis fica expresso no momento em que eles fazem cadastro com foto no software da Igreja Mobile. “Creio que isso já seja um termo de que elas aceitam.”

Especialista em uso de dados pessoais, Joana Varon, diretora da organização Coding Rights (Direitos de Código, em tradução livre), explica que esse tipo de consentimento não é suficiente. Para ela, o fiel que já frequenta a igreja pode se sentir coagido a aceitar os termos caso deseje continuar frequentando os cultos. “As pessoas vão deixar de ir ao culto? Elas têm essa opção se elas já fazem parte da igreja? É preciso estar em uma posição em que seu consentimento ou não não limite o seu acesso”, defende.

Além disso, Joana lembra que informações biométricas, como o reconhecimento facial, são consideradas “sensíveis” pela Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPDP). Também merecem atenção especial pela legislação brasileira os dados relacionados à convicção religiosa ou filiação a organização de caráter religioso.

A LGPDP, ou Lei nº 13.709/2018, determina que dados pessoais sensíveis só poderão ser utilizados “quando o titular ou seu responsável legal consentir, de forma específica e destacada, para finalidades específicas”, ou em hipóteses extremas como o cumprimento de obrigações legais.

Dessa forma, o consentimento não formal, como os citados pelas igrejas, não é suficiente. “A gente tem que saber muito claramente para que fins é a coleta de todos esses dados”, explica Joana.

O reconhecimento facial de fiéis não é exclusividade brasileira. Ainda em 2015, uma empresa especializada nessa tecnologia chamada Face-Six, com sede em Israel e em Las Vegas, nos EUA, criou um software especializado para igrejas: o ChurchIX.

A empresa foi fundada por Moshe Greenshpan e a tecnologia já foi instalada em mais de 200 igrejas pelo mundo. No Brasil, o ChurchIX ainda não chegou, mas não por falta de interesse. “Nós temos grande interesse pelo Brasil, mas tivemos obstáculos com o preço do serviço. Agora, oferecemos uma solução com melhor custo-benefício que pode solucionar esse problema”, declarou em nota à Pública.

Em entrevista ao Washington Post, Greenshpan disse que a tecnologia pode ser útil para igrejas controlarem melhor seu público e impacto, além de conseguir retorno financeiro. “Se as igrejas virem que um membro vai frequentemente ao culto, elas vão se sentir mais confortáveis para ligar para ele e pedir doações.”

Segundo a empresa, o ChurchIX é um software bem parecido com o utilizado para fins de segurança, mas possui ferramentas especiais voltadas para monitorar a assiduidade dos fiéis. A tecnologia pode ser aplicada a qualquer câmera, mas funciona melhor com imagens de alta resolução.

Também não é necessária uma base de dados prévia para que o reconhecimento facial seja feito. O software reconhece faces repetidas e cria usuário mesmo sem saber o nome da pessoa, que pode ser incluído pela igreja depois.

A Face-Six ainda admite que na maioria dos casos o reconhecimento facial seja feito sem o consentimento dos fiéis.

Pensamento do Dia


Happy Birthday

O adiamento da data de envio ao Congresso da proposta de reforma do Estado não significa que o governo tenha desistido do seu projeto, seja amplo ou restrito. A formulação de ideias, na instância Paulo Guedes, é uma etapa inicial e, mesmo que fosse levada à tramitação, este mês ou este ano, ficaria para as calendas, quando as eleições municipais permitissem.

Até deputados e senadores aprovarem redução de salário do servidor público, uma das propostas da reforma adiada, já terão rodado naqueles plenários a roleta de três CPMFs e derrubado incontáveis vetos presidenciais. O funcionalismo, da elite das carreiras de Estado ao barnabé, tem a mais forte corporação em condições de, para manter suas vantagens, enfrentar Executivo, Legislativo e Judiciário.

O gesto do presidente Jair Bolsonaro expressa a tensão que há no Planalto, especialmente no Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, com o risco de eclosão de protestos, como os que mobilizam os governos do Chile e da Bolívia. O propósito do presidente é não dar espaço à inclusão de problema novo em sua já extensa lista de fracassos políticos neste primeiro ano de mandato.


É possível que tenham razão aqueles que veem em Bolsonaro o inventor de um tipo de exercício do poder tão desconcentrado que lhe permitiu ganhar por um lado mesmo perdendo por outro. Os governos autônomos de Guedes na Economia e de Rodrigo Maia na Câmara, por exemplo, lhe permitiram apresentar-se vitorioso, quando assim se quis mostrar.

Decepcionaram, porém, os núcleos que ficaram sob sua influência direta: a direita despreparada, as redes sociais, os filhos, os direitos humanos (ministra Damares), as relações exteriores (ministro Ernesto), a Educação (ministro Weintraub), os militares, todos geridos diretamente por Jair Bolsonaro.

Por isso fez questão de evitar o agravamento dos problemas que, no espelho da América do Sul, poderiam levar, no limite, à interrupção do seu mandato. O presidente é pragmático, está atento e, embora não demonstre, sabe reconhecer uma derrota.

No único propósito que anunciou explicitamente, em que se empenhou pessoalmente, ao qual se expôs politicamente, a construção de uma relação fraterna com o presidente americano, Donald Trump, só colheu insucesso. Que culminou com a frustrada nomeação do filho político caçula para representar o País que preside no governo que venera. No caso, a perda correspondeu ao tamanho da pretensão: foi humilhado.

A parceria de adulação mútua deu a Trump a certeza de que tem, no Brasil, um vassalo, e a Bolsonaro, a promessa de que é seu o título do novo “cara”.

A personalidade do presidente não permite, porém, que dê a perceber o travo que lhe atravessa a garganta. Sua autocrítica é descafeinada.

A passividade nas concessões políticas das trocas é um de seus disfarces.

Que vestiu, de novo, em outro fracasso de peso: a libertação de Luiz Inácio Lula da Silva. Comedido na reação, Bolsonaro deixou que seguissem adiante as interpretações livres, como a de que aceitar Lula foi retribuição ao STF por lhe ter poupado o filho mais velho. O mesmo que lhe tirou o discurso de líder do combate à corrupção.

A desmontagem da cidadela militar que construiu à sua volta foi um mau resultado para o qual muito contribuiu outro filho, o do meio, que funcionou neste primeiro ano como alter ego, o terrível.

Bolsonaro fez um governo de quatro neste primeiro ano. Dividiu com Flávio, Carlos e Eduardo o pensamento, palavras e obras. Nada deu certo. Termina a jornada inicial até sem partido para conduzi-lo à caminhada da reeleição. Nesta quinta-feira participa da convenção destinada a lhe dar um partido próprio. Quer deixar de pagar aluguel.

Confissão da burrice nacional


Você não vai acabar com desmatamento nem com queimadas, é cultural
Jair Bolsonaro

O negócio e permanecer vivo

Dia desses, relendo Cervantes, deparei-me com uma singular reflexão: “não há recordação que o tempo não apague, nem dor que a morte não faça cessar”. Bons tempos, aqueles de Cervantes – uma época na qual o mundo fazia mais sentido.

Hoje, é bem verdade, saboreamos incontáveis avanços. Já fomos à Lua, e nos preparamos para ir a Marte. Mas o fato é que o aprimoramento de nossa tecnologia sobrepujou a evolução dos nossos cérebros, arrisco dizer que mesmo das nossas almas. Nossos espíritos, infelizmente, não tem conseguido acompanhar a fascinante velocidade dos avanços tecnológicos – e assim vamos nos tornando, sem que o percebamos, uma sociedade a cada dia mais confusa e perplexa.

Sustento minha tese com a morte. Antigamente, nos sábios dias de Cervantes, era mais simples morrer. Morria-se, e pronto. A morte era permitida em qualquer lugar e a qualquer momento.

Tudo isto mudou. Assim, por exemplo, os habitantes da cidade de Sarpourenx, na França, só podem morrer se dispuserem de uma cova no cemitério local – acredite, esta proibição consta de um decreto municipal.

A sanha invasiva dos burocratas não ficou só na França. Chegou à Espanha, onde, na cidade de Lanjaron, por conta de obras de reforma feitas no cemitério municipal, simplesmente proibiu-se a morte. Transcrevo o texto do decreto: “Está proibido morrer em Lanjaron. Os infratores responderão por seus atos”. Eis aí a prova de que a burocracia tudo pode e tudo supera – até mesmo a morte.


E o bom e velho capitalismo? Antigamente restrito a esta vida, hoje já alcançou o além. Que o diga uma empresa norte-americana que lançou no mercado “ingressos para o Paraíso”. Por uns R$ 30, mais R$ 9 de frete, você recebe em casa o bilhete, pessoal e intransferível, que deverá ser colocado em seu caixão. Detalhe: a empresa avisa que não devolverá o valor pago caso o Paraíso não exista.

Naqueles velhos tempos mortos eram coisa séria. As pessoas tiravam o chapéu à mera passagem de um cortejo fúnebre. O ambiente nos velórios era circunspecto e respeitoso. Mas até isto já começa a mudar, conforme indica a atividade de uma empresa norte-americana especializada em adquirir espaço publicitário em caixões. Ela paga até uns R$ 190 por cada espaço publicitário.

Assim, por exemplo, se o morto era motorista de caminhão, pense em um caixão enfeitado com propagandas de postos de gasolina e óleos lubrificantes. Se veterinário, com adesivos de marcas de ração para cachorros e por aí vamos. Fico a pensar na urna funerária de um profissional do circo – um palhaço ou um domador…

Houve um tempo no qual pessoas morriam e eram sepultadas ou cremadas em paz, sem maiores problemas – e eis aí um sinal de respeito tanto ao morto como aos seus entes queridos. Isto acabou. Hoje não raramente há que se esperar dias até que a burocracia libere os corpos para suas famílias – principalmente se forem miseráveis. E assim, nos confusos tempos atuais, até a paz dos cemitérios depende da eficiência dos burocratas.

Este o tratamento que temos dispensado aos mortos. A partir dele, que tal meditarmos sobre como temos atendido os vivos? A quantas anda, afinal, o espírito cristão por esta humanidade que tanto celebra seus avanços e descobertas?

O fato é que diante de tantos exemplos, todos eles oriundos de países absolutamente civilizados e altamente desenvolvidos, cheguei a uma conclusão: o negócio é nunca precisar de ninguém, ser sempre saudável e jamais morrer!
 Pedro Valls Feu Rosa

Dentro do túnel

Em 1973, o grande economista Albert O. Hirschman publicou artigo intitulado “A mutabilidade da tolerância à desigualdade de renda durante o desenvolvimento econômico”. Nesse artigo, ele elaborou a tese do “efeito túnel” a partir de metáfora prosaica. Imagine que você esteja preso em um engarrafamento dentro de um túnel. De repente, a faixa ao seu lado começa a se mover lentamente enquanto a sua continua absolutamente imóvel. A constatação de que enfim o tráfego começou a se mexer lhe dá esperanças de que eventualmente a sua faixa também passe a andar. Portanto, você haverá de tolerar a injustiça inicial de sua imobilidade pois há a expectativa de que em algum momento a movimentação incipiente lhe beneficie.

Assim descreve Hirschman os primeiros estágios do desenvolvimento econômico. Quando as economias começam a se desenvolver e crescer, algumas faixas de renda serão beneficiadas primeiro, deixando outras para trás. Há, portanto, um aumento da desigualdade.

Contudo, a população tende a tolerar esse aumento da desigualdade porque, como os carros dentro do túnel, têm a esperança de que em breve os benefícios do crescimento econômico acabará lhes trazendo ganhos semelhantes. Nas palavras de Hirschman, enquanto o efeito túnel durar, todos sentem que a qualidade de vida melhorou, ainda que alguns tenham ficado ricos e outros não.

É concebível, portanto, que distribuições desiguais de renda sejam preferíveis a distribuições mais igualitárias, o que torna o aumento da desigualdade politicamente tolerável, ou até desejável. Essa tolerância, obviamente, é apenas eterna enquanto dura. Caso o ciclo de crescimento e desenvolvimento acabe por frustrar as expectativas daqueles que não desfrutam de seus benefícios, a tolerância inicial com a maior desigualdade de renda se transformará rapidamente em ressentimento e intolerância. O efeito túnel é portanto especialmente perigoso para os políticos, que não têm como saber quando a tolerância haverá de se transformar subitamente em intolerância. Embalados pelas expectativas positivas das primeiras etapas do ciclo de crescimento, é provável que se tornem complacentes, ignorando a necessidade de enfrentar as desigualdades criadas. Quando percebem a mudança, já é tarde demais: o povo estará nas ruas ou nas urnas denunciando o mesmo processo que os fez inicialmente acreditar na melhoria de vida, afirmando que os ricos se tornaram mais ricos enquanto o resto ficou para trás.

O efeito túnel de Hirschman é incrivelmente poderoso para explicar o que se passa hoje na América Latina – possivelmente em outras partes do mundo também. Assim como no Brasil em 2013, as manifestações no Chile pegaram o presidente e seu entorno de surpresa.


A indignação aparentemente repentina tomou conta das ruas por uma razão aparentemente singela: um pequeno ajuste nas passagens de metrô. Contudo, não foi o aumento do metrô que levou o povo para a rua, assim como em 2013 não foram os 20 centavos. A frustração derramada, às vezes com violência, é fruto do esgotamento da tolerância, da sensação de que ficar naquela faixa engarrafada que não vai a lugar algum dentro de túnel onde não há saídas é insuportável. A conclusão inevitável é que políticas para retomar o crescimento econômico são desejáveis e toleráveis apenas até um certo ponto. Caso não resultem em redução das desigualdades e melhorias concretas de vida para todos tornar-se-ão politicamente inviáveis.

Penso nisso quando vejo a precariedade dos empregos no Brasil, o aumento da informalidade e da pobreza. Penso nisso quando vejo anúncios de medidas econômicas que podem acabar esgarçando ainda mais a rota rede de proteção social brasileira. Penso nisso quando vejo o ministro da Economia com propostas para criar empregos para os mais jovens financiando-as com tributos sobre o seguro-desemprego. Essas medidas revelam uma surdez cega não apenas dirigidas aos ruídos estrepitosos de uma região que se levanta para reclamar de seus líderes, como também em relação à realidade de um País profundamente desigual – o único na América Latina que viu a pobreza aumentar desde 2014, pouco importa de que governo seja a culpa por isso.

Pode ser que não aconteça nada. Pode ser que o Brasil continue impávido frente aos problemas sociais existentes e ao que acontece ao seu redor. Mas, não custa nada reler Hirschman. Em 1973, o alcance de sua visão era bem maior do que o dos economistas da Universidade de Chicago na época.