O artigo 7º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, repetido em termos gerais na Constituição de 1988, reza que "todos são iguais perante à lei, sem distinção de qualquer natureza". No Brasil, entretanto, vale a máxima atribuída a diferentes personalidades, mas normalmente relacionada ao presidente Getúlio Vargas: aos amigos, tudo; aos inimigos, a lei. Acreditar que os juízes agem com independência e neutralidade é acreditar que nossos políticos legislam visando o bem comum.
No dia 31 de agosto do ano passado, a presidente Dilma Rousseff teve seu mandato cassado, sob a alegação de que ela cometeu crime de responsabilidade ao editar três decretos de créditos suplementares sem autorização do Congresso e ao atrasar o repasse de recursos do Tesouro a bancos públicos para pagamento de programas sociais, no que ficou conhecido como "pedaladas fiscais". Campanhas histéricas acusavam seu governo de corrupção, e, no entanto, Dilma perdeu o mandato por questiúnculas técnicas que ninguém até hoje conseguiu me explicar direito.
Tão confusa mostrou-se aquela votação que, embora os senadores entendessem que a presidente Dilma Rousseff cometeu um crime – o que ocasionou a punição com sua destituição do cargo -, eles recusaram a aplicar-lhe a pena, que a tornaria inelegível para cargos públicos por oito anos. Numa espetacular amostra de como funciona o jeitinho brasileiro, cassaram seu mandato ao mesmo tempo em que preservavam os direitos políticos.
Assim como é impossível aceitar que o Congresso tomou sua resolução contra Dilma Rousseff baseado em rigorosa documentação contábil – e não em inconfessáveis interesses escusos -, é impossível entender que a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tenha se escorado em critérios objetivos e não em razões políticas. Dizendo-se preocupado com nossa democracia, o ministro do Supremo Tribunal Federal, e presidente do TSE, Gilmar Mendes, alertou para o fato de que, aos olhos estrangeiros, temos produzido mais cassações agora que durante o período da ditadura...
Aceitando as considerações dos advogados de defesa, tanto de Dilma Rousseff quanto de seu vice, de não arrolar na acusação documentos e depoimentos que mostravam à exaustão a existência de um sistema de pagamento de propinas para a abastecer a chapa vencedora das eleições de 2014, os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, capitaneados por Gilmar Mendes, livraram Michel Temer da cassação e, ironicamente, mantiveram a presidente cassada elegível nas próximas eleições.
Antes, no dia 25 de maio, o juiz Sergio Moro havia inocentado a mulher do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Claudia Cruz, da acusação de crime de lavagem de dinheiro e evasão de divisas na Operação Lava Jato. De acordo com o Ministério Público Federal, Claudia Cruz teria recebido em uma conta secreta na Suíça mais de US$ 1 milhão proveniente de propina recebida por seu marido. Esse dinheiro teria sido usado na compra de artigos de luxo e despesas em viagens internacionais.
Em seu despacho, Moro considerou a atitude de Claudia Cruz "altamente reprovável", seus gastos "extravagantes" e "inconsistentes" com a renda de um agente público, no caso, Eduardo Cunha, mas não viu dolo em sua atitude. O juiz acatou o argumento de Claudia Cruz de que, embora jornalista, em casa conservava-se apenas como "esposa e mãe": "é bastante plausível a sua alegação de que a gestão financeira da família era de responsabilidade do marido", escreveu.
A ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Maria Thereza de Assis Moura, já havia, em março, autorizado a advogada Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, a cumprir prisão domiciliar, sob o argumento de que ela tem que se manter ao lado dos filhos menores (de 11 e 14 anos). Adriana Ancelmo tem 45 acusações por lavagem de dinheiro desviado dos cofres públicos – Cabral é réu em 10 processos por corrupção.
No Brasil é assim: a Justiça é para quem pode...
O jantar oferecido por Michel Temer a 16 governadortes e quatro vice-governadores marcou o início de um espetáculo novo em Brasília. Nele, a austeridade fiscal do governo subiu no telhado. O presidente tem uma prioridade mais urgente do que zelar pelo equilíbrio das contas. Seu objetivo estratégico é não cair. E Temer deixa claro que, para barrar na Câmara a denúncia por corrupção que a Procuradoria fará contra ele, lançará mão de todos os estratagemas —inclusive abrir os cofres do bom e velho BNDES para os governos estaduais, renegociando R$ 50 bilhões em dívidas.
A movimentação de Temer deixa de cabelo em pé parte da equipe econômica. A turma da Fazenda e do Banco Central já olha de rabo de olho para o Planalto. Há, claramente, o receio de que saiam da caixa de mágicas de Temer providências com potencial para comprometer a gestão da economia num instante em que investidores nacionais e estrangeiros desconfiam das intenções de Brasília. Para um país que tenta sair da recessão, desconfiança é sinônimo de veneno.
Não se sabe o que Temer disse ao ministro Henrique Meirelles para convencê-lo de que ainda não jogou a austeridade pela janela. Sabe-se, porém, o que o ministro da Fazenda prometeu à plateia: fechar o ano de 2017 com um déficit de R$ 139 bilhões nas contas públicas. E a inclusão do BNDES na fogueira da política não orna com esse compromisso. Hoje, a calmaria precária do mercado financeiro é atribuído à equipe econômica. Desacreditado, o presidente não tem um ministro da Fazenda. É Meirelles quem tem o presidente. Temer ainda não se deu conta. Mas pode estar comprando um problema novo.
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O Brasil pode expandir sua economia em até R$ 382 bilhões ao longo de oito anos se aumentar a inserção das mulheres no mercado de trabalho em um quarto até 2025, estima a Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Diminuir em 25% a desigualdade de gênero no mercado de trabalho até 2025 é um compromisso dos países-membros do G20, do qual o país faz parte. Segundo a OIT, isso traria um incremento acumulado de 3,3% ao Produto Interno Bruto brasileiro ao longo do período.
As estimativas apontam que se a participação feminina crescesse 5,5 pontos percentuais, o mercado de trabalho brasileiro ganharia uma mão de obra de 5,1 milhões de mulheres.
Os dados foram divulgados junto ao relatório global sobre a participação feminina no mercado de trabalho, publicado nesta quarta-feira.
A inserção das mulheres na economia levaria ao aumento no poder de consumo de bens e serviços das famílias, bem como ao aumento de recolhimentos de tributos sobre renda. A OIT estima que a injeção de capital resultante da inserção feminina na economia possa acrescentar R$ 131 bilhões em receita tributária à União brasileira ao longo dos oito anos em questão.
Em entrevista à BBC Brasil, a técnica da OIT em princípios e direitos fundamentais do trabalho,Thaís Dumêt Faria, afirmou que o estudo atesta que é possível gerar riqueza por meio de inclusão social. "Um país consegue se desenvolver numa situação de igualdade e justiça social e ganha também em relação a produtividade e PIB", afirmou.
Faria diz que é possível incluir as mulheres no mercado de trabalho por meio de iniciativas públicas e privadas. "É importante focar na escolaridade, porque sabemos que muitas meninas abandonam a escola por questão de gravidez ou problemas familiares. Isso ainda é uma realidade. É importante também ter projetos, como fóruns de empresas. São iniciativas empresariais que buscam fazer um diagnóstico no seu quadro de funcionários e identificar onde estão as maiores disparidades."
Mais do que números
Para ela, "não é só uma questão numérica, (mas sim) de inclusão realmente na sua forma integral. É possível que haja 50% de homens e 50% de mulheres em uma empresa, mas que as mulheres ocupem cargos menores, sem acesso aos cargos de direção. Isso não é uma situação de igualdade", exemplifica.
O documento da OIT avaliou que apenas 56% das mulheres em idade economicamente ativa estão empregadas no Brasil. Em contraste, por exemplo, 78,2% dos homens estão trabalhando. No resto do mundo a participação feminina é de 49,4% e a masculina de 79,1%. A diferença entre gêneros em pontos percentuais arredondados é menor no Brasil (22) do que no mundo (26).
Para conseguir o incremento de renda, Faria e a OIT recomendam adotar políticas que garantam maior segurança social e acesso à educação para mulheres e seus dependentes. "Elas não têm nenhum tipo de proteção social. Se adoecem, elas não têm nenhum benefício, porque não contribuem, então - como são chefes de família - a família inteira fica desamparada e você acaba fortalecendo um ciclo de pobreza".
"São exatamente essas mulheres que deveriam estar inseridas no mercado de trabalho formal, com todas as garantias trabalhistas: em caso doença, de acidente, de morte. Enfim, elas têm os filhos para cuidar, se considerarmos que 41,5% delas são chefes de família", conclui.
No Brasil, o grupo de mulheres que enfrenta maior vulnerabilidade é o das trabalhadoras domésticas. "Temos dados de 2014 que mostram que 92% dos trabalhadores domésticos são mulheres, dessas 60% são negras e 41,5% são chefes de família e 40% são diaristas, ou seja, o nível de informalidade dessas mulheres dos grupos mais pobres é muito maior".
"Existe um recorte racial muito grande, que reforça a pobreza de um grupo social", prossegue ela, explicando que, nesse ciclo de pobreza, filhos de trabalhadores em situação precária precisam trabalhar para ajudar no sustento da família e, sem estudo, veem-se sem opções de ascensão social.
Na região das Américas o estudo afirma que, entre 1997 e 2017, a inclusão se deu pelo viés do desemprego. Não foram gerados muitos novos empregos para mulheres - elas simplesmente foram menos demitidas do que os homens. Especialmente na última década, 2007-2017, as taxas de desemprego masculino subiram mais rapidamente do que o feminino, afirma a OIT.
O que desanima no Brasil é que a unica discussão que interessa nunca chega a começar. Dos promotores de Curitiba ao ultimo dos indignados das ruas todo mundo age como se pensasse que o estado é uma instituição naturalmente benfazeja, o que o torna mau é apenas o fato dele não estar nas “minhas” mãos.
Podem roubar a Petrobras e todas as brases até o ultimo tostão, entra partido, sai partido, e ninguém pronuncia, jamais, a palavra privatização. Querem que você acredite que o fim ultimo de toda essa roubalheira por meio de interpostas pessoas (Odecrechts e ésleys) criadas pelo pai de todos os ladrões que levou a coisa às proporções de hoje, ou mesmo só a dos modestos “indicados” de cada polítiquinho de bairro de sempre a partir das quais ele projetou os seus delírios de grandeza, é só a acumulação de dinheiro; a “ganância dos capitalistas”.
O estado, portanto, não precisa de reforma, precisa apenas de “limpeza”. É assim que a Lava Jato, de meio vira fim, e nós continuamos fora da discussão que, ha 241 anos, abriu as portas da modernidade.
Teve um discurso de Julio Mesquita Flho quando voltou do exílio e recebeu o jornal O Estado de S. Paulo, que tinha sido ocupado militarmente por Getulio Vargas de volta, em que, na ressaca da 1a e da 2a Guerra Mundiais e para reafirmar o “repudio a toda afirmação categórica … ao apriorismo político e às concepções tendentes a deformar as sociedades segundo modelos pré-concebidos”, ele partia da negação de Rousseau, para quem o homem é naturalmente bom e a sociedade (ou a propriedade) é que o corrompe para chegar a Freud, para quem a verdade é o contrário, o homem é fera e a civilização é que o domestica.
Pois eu vou logo para Darwin.
O que faz o poder político valer tão ilimitadamente tanto no Brasil? A resposta está implícita na pergunta: o fato de, para quem, como nós, continua se pondo fora da modernidade, ele ser absolutamente ilimitado. Existe o poderzinho de receber um privilégio, zinho ou zão, que apenas corrompe. E existe o poder ilimitado de outorgar esses privilégios, zinhos ou zões, que corrompe absolutamente.
É experimentar e morrer.
Enquanto existir dentro do território nacional uma área onde pondo um pé uma vez o sujeito não precisa nunca mais entregar resultados, nem temer perder o emprego, nem mesmo ter medo da lei, o Brasil não terá salvação. Será apenas e tão somente o país dos concurseiros, de um lado, e de quem faz o concursismo continuar tendo sentido, do outro.
E o resto seguirá sendo pasto para ser pastado.
A instigante pergunta que está implícita no título acima foi feita pelo jornalista Fernando Gabeira, logo no início de sua coluna, no último domingo, no jornal “O Globo”. Ao lê-la, imaginei logo esta outra, personalizada, que diz respeito a cada um dos brasileiros: qual seria o impacto psicológico de anos de notícias negativas na vida de quem, como eu, por exemplo, já dobrou faz algum tempo o cabo da Boa Esperança?
Uma pergunta, sem dúvida, para psiquiatra, mas a resposta não é nem um pouco difícil. Por ora, quero dizer que dobrar o cabo da Boa Esperança não é para qualquer um nem é fruto de decisão pessoal. A medicina põe a nossa disposição alguns truques, que podem tornar essa viagem desafiante – que é a vida – mais fácil. A receita para quem não deseja vencê-la é simples, mas sofrível: basta morrer jovem...
Imagino, também, o elevadíssimo nível de ansiedade no qual devem estar os que, sobretudo por dever de ofício, tratam desse inenarrável “psicodrama político-policial”. É um sofrimento terrível e diário. Padecem desse mesmo sofrimento os leitores que o acompanham em cada cena, em cada lance, em cada busca do equilíbrio. São eles, além de incentivadores, grandes patriotas. Nunca perdem a fé no país.
Outro dia, um amigo, que já dobrou o cabo da Boa Esperança antes de mim, dono de saúde física, mental e intelectual invejável, me revelou que, ultimamente, anda fazendo algumas difíceis avaliações sobre nosso país. Elas soam, disse ele, pessimistas na maior parte das pessoas, sobretudo da família. E continuou, me perguntando, depois de muitas outras considerações, em espontâneo desabafo: “Será que vale a pena viver muito, mesmo sendo consumido aos poucos pela preocupação com o que poderá acontecer de péssimo a nossos descendentes? Talvez o melhor seja ficar por aqui, encerrar de vez a caminhada e jamais insistir para esticá-la mais um pouco”, afirmou ele.
“Ouvi do meu pai, quando menino”, finalizou meu amigo, “a afirmação de que o Brasil, um dia, seria grandioso. Confesso que já fiz a mesma afirmação aos meus filhos. E hoje constato, tristemente, que meus filhos têm dito aos meus netos o que eu disse a eles, embora talvez menos convencidos de que isso um dia de fato ocorrerá. De lá até aqui já se passaram mais de cem anos! E esse dia não chega!”
Claro que não é bem assim, e ele sabe muito bem disso. O otimista considera que um processo civilizatório não dura menos do que cem anos, podendo, a partir dos 50 anos, vislumbrar-se a linha tênue do futuro. O pessimista acha que leva séculos. Para mim e meu amigo, que vivemos outros tempos, tão ou mais brabos do que o atual, o Brasil ainda comemorará esse dia. E a educação será sua mola mestra.
E não adianta jogar a culpa na política, pois sem ela não haverá salvação nem futuro. As estúpidas agressões sofridas pela jornalista Míriam Leitão, que cumpre sua missão com admirável competência e dedicação, em voo entre Brasília e Rio de Janeiro, perpetradas por um grupo de delegados e militantes do PT, são provas insofismáveis de que o mal está incrustado na sociedade brasileira como um todo. Os políticos são apenas reflexos dessa sociedade. Não será por meio da divisão dos brasileiros que melhoraremos o país. Nossa salvação está no respeito que cada um de nós deve a seu semelhante.
Só o consenso nos levará a bom termo. Chegou a hora de pensarmos, com despojamento, no futuro de nosso país. Nesse jogo, que é a política, ninguém é totalmente inocente nem totalmente culpado.