sábado, 11 de abril de 2015

A solidão das multidões

O desafio dos partidos de oposição é o de criar interlocução com as ruas e impedir que, pela falta de respostas, acabe se expandindo e triunfando a postulação extrema
A semana termina na expectativa das ruas. Não se sabe se a manifestação de amanhã reeditará a anterior. Também não se sabe o que ocorrerá na hipótese de retração ou expansão. O que se sabe é que, por não ter vínculos ou compromissos com partidos, tornou-se fator não apenas enigmático, mas assustador para os políticos.

O que fazer com a insatisfação do público? Os movimentos similares da história recente – diretas já e impeachment de Collor – chegaram às ruas por meio de partidos e lideranças políticas. Triunfaram porque ambos, partidos e sociedade, compartilhavam do mesmo sentimento e dos mesmos propósitos.

Hoje – e eis aí um desafio aos cientistas políticos -, o sentimento é outro. Há um claro divórcio entre ambos. E os sinais já eram visíveis nas manifestações de junho de 2013, que a esquerda, acostumada a comandar as ruas, supôs tê-las sob controle. Enganou-se. O público atropelou literalmente um protesto contra aumento nas passagens dos ônibus em São Pulo e no Rio. Protesto artificial, já que o aumento era de vinte centavos e nenhum dos organizadores era usuário de transporte público.

O objetivo era político-eleitoral, para desgastar os governadores de ambos os estados. Eis que a classe média, termômetro político de qualquer sociedade, ocupou as ruas – e não apenas de Rio e São Paulo, mas de diversas capitais do país - e mostrou que sua tolerância com os governantes estava no limite.

Mas a insatisfação era ainda difusa, sem objeto definido. Cada qual trazia seu protesto a tiracolo – uns falavam da (falta de) saúde, outros da educação, outros da corrupção -, sem slogans unificadores, sem a coreografia dos movimentos organizados.

Como não era contra ninguém em especial, mas contra tudo, governo e oposição tentaram tirar proveito. Fracassaram. Ficou, porém, o recado: a sociedade não estava dormindo.

As eleições serviram de catalisador do processo, mas a vitória de Dilma, sob o manto suspeito das urnas eletrônicas, frustrou esse imenso contingente da população. Se a oposição dá hoje por demonstrada a legitimidade da apuração – não obstante o volume de indícios em contrário que podem ser conferidos no Youtube -, a sociedade pensa diferente, e cobra essa acomodação.

As manifestações deste ano já não são difusas. Tendem a se fixar num alvo: o “Fora, Dilma!”. Dentro de um único slogan, estão as queixas pela má gerência dos serviços públicos, o excesso de impostos e a corrupção. O PT, há 13 anos no poder – e ali levado por um discurso messiânico e moralista –, prova do veneno que serviu aos governos que o precederam, confirmando a sentença bíblica de que cada qual será julgado com o mesmo rigor com que julga. O PT, que julgou tudo e todos com rigor fundamentalista, não resiste a essa colheita moral.

O clamor das ruas – “Fora, Dilma!” -, simples, direto e radical, não foi absorvido pela oposição. Também ela não quer a saída de Dilma – e não por estimá-la, mas por não saber o que fazer nessa hipótese. Se visualizasse um líder na multidão, certamente o procuraria para negociar soluções intermediárias.

Ocorre que as manifestações têm grupos organizadores, mas não líderes. E por não tê-los une-se apenas em torno do propósito central, que é a saída da presidente e de seu partido. Mas isso não chega a ser uma proposta de futuro para o país.

A maior parte pede o impeachment ou a renúncia. Mas há uma parcela, embora claramente minoritária, que já não crê nessa alternativa, pois descrê das instituições. Vê o Judiciário aparelhado, o Legislativo comprometido e a linha sucessória inconfiável. Por isso, pede intervenção militar, como recurso cirúrgico, sem cogitar de que tal procedimento pode matar o paciente.

O desafio político dos partidos de oposição é o de criar interlocução com as ruas e impedir que, pela falta de respostas, acabe se expandindo e triunfando a postulação extrema.

Até aqui, o que se tem são duas alternativas: o presente triunvirato Michel Temer- Eduardo Cunha- Renan Calheiros, num parlamentarismo pelo avesso, em que não se sabe quem é o primeiro-ministro (Temer ou Cunha?), ou um parlamentarismo de verdade, por meio de emenda à Constituição.

Mas um parlamentarismo com esse Parlamento? Ou somente a partir de 2018, como propõe o deputado Roberto Freire? As ruas não demonstram paciência para esperar tanto tempo. Como pano de fundo, a economia encolhe, o desemprego aumenta e a Operação Lava-Jato se expande para outras instâncias do Estado, aumentando a clientela da CPI da Petrobras.

São muitos os dilemas e desafios e os agentes políticos não têm demonstrado estar à altura deles – para dizer o mínimo.

Bye Bye Dilma


Domingo é dia. De novo. O governo respondeu mal. Ele joga com o tempo. Sabe que é difícil manter tanta gente na rua quando sem um resultado tangível. É um cálculo válido para período de estabilidade e crescimento. O Brasil em crise é um fio desencapado. As manifestações não conseguiram ainda seu objetivo: Fora Dilma.

No entanto, Dilma já não está tão dentro como antes. A iniciativa política foi arrebatada pelo PMDB. O ajuste econômico é conduzido pelo liberal Joaquim Levy, que o negocia com o Congresso Nacional.

O debate sobre o ajuste tem conteúdo para ser discutido dias seguidos. Quase todos concordam que um ajuste adequado levará o Brasil de novo ao crescimento. Mas poucos se perguntam sobre o crescimento. Será que vamos reunir forças para um novo voo de galinha? Retomar o crescimento significa entupir os lares de eletrodomésticos e carros, exaurir os rios de forma irresponsável?

Mesmo para um voo de galinha as perspectivas não são boas. Teremos energia para o crescimento em 2016? Nossas estradas suportam um aperto econômico - elas que foram devastadas pelo tempo e pela corrupção? Todos se interrogam para onde estamos indo. Marchar para uma euforia consumista e, depois, cair na depressão torna a política econômica uma nova droga.

O escritor Frei Betto usou a imagem do filme Good Bye Lenin! para expressar o espanto de alguns eleitores de Dilma: é como se dormissem com a vitória de sua candidata e acordassem com a de Aécio Neves, seu adversário. Esse filme de Wolfgang Becker é bem lembrado porque conta a história de uma comunista fervorosa de Berlim oriental que ficou oito meses em coma e acordou depois da queda do Muro. E o esforço do seu filho era para mascarar os traços do capitalismo e evitar que ela se chocasse com o movimento da História.

Good Bye Lenin!, na minha opinião, não exprime apenas a perplexidade dos eleitores de Dilma. Ele exprime a perplexidade de toda a esquerda, que deveria estar acordando de um grande sonho e se espantar com o mundo, como a comunista de Berlim ao ver um imenso anúncio publicitário do outro lado da rua. Seria como se um cubano acordasse na Costa Rica ou um venezuelano nos supermercados do Peru, algo tão diferente. Nesses anos em que o Muro de Berlim caiu, muitos continuaram em coma, ou protegidos das mudanças no mundo real.

Isso não teria tanta importância se a esquerda não fosse para o poder com uma parte das ilusões. Ela confundiu partido com Estado e capitalismo de leis implacáveis com seus sonhos socialistas.

Não deveria. Marx estudou muito para explicitar essas leis. Nem sempre acertou, mas as estudou profundamente e jamais apoiaria um enfoque apenas consumista. Não porque Marx fosse da elite branca. Mas porque saberia que a conta seria cobrada na frente.

Hoje a conta está sendo cobrada. Dormiu-se com a promessa do paraíso, acorda-se numa realidade inequívoca: tanto Dilma como Aécio seriam obrigados a algum tipo de ajuste.

A confusão entre governo e poder, entre partido e Estado acabou arruinando uma experiência, finalmente, dinamitada pela corrupção.

Uma esquerda no governo não poderia comprometer-se a fundo com Cuba e Venezuela. Ainda que admirasse os dois modelos, o que é um alto grau de miopia, deveria levar em conta uma posição nacional.

Uma esquerda no governo deveria abster-se de levar o capitalismo a um outro sistema, mas, sim, tirar o melhor proveito de suas potencialidades e reduzir seus impactos negativos. O capitalismo pode alcançar altos níveis de inovação e criatividade, como nos Estados Unidos, ou mesmo uma respeitável rede de proteção, como na Escandinávia.

Não vejo como transitar do capitalismo para outro sistema econômico, exceto através da decadência e destruição de seus alicerces. E isso nem na Venezuela vai acontecer. O sonho bolivariano encarnou num homem que esmaga os opositores e conversa com passarinhos. Quando vão despertar? Quando encontrarem Nicolás Maduro cantando salsas e merengues nas pizzarias do seu bairro?

Bye Bye Dilma não é apenas o acordar de um sonho eleitoral. E um sono de 12 anos - de pouco mais de 25 anos se contarmos da queda do Muro de Berlim. O projeto não se perdeu apenas pela questão ética. Seus passos estão intensamente discutidos no escândalo do petrolão e outros que se espalham como tanques em chamas.

Mas os fins, quais eram mesmo os fins? Para onde é que nos levavam?

Dentro do País vivemos a crise do populismo econômico. Lá fora, nossa importância diplomática foi dramaticamente reduzida.

Não dói somente ver Dilma e o PT se comportarem como se nada de errado tivesse acontecido. Dói também ver a perspectiva de um grande esforço fiscal desaguar numa visão de crescimento de novo insustentável, tanto econômica como ambientalmente.

A Califórnia passou por mil desafios, abrigou a indústria de cinema e da informática, e agora se vê diante da necessidade de se reinventar. E muitos perguntam se conseguirá, como das outras vezes. A crise hídrica é grave por lá. No Brasil nem sequer nos colocamos a ideia de uma primeira reinvenção. E a crise hídrica é grave por aqui.

Toda vez que falam "vamos fazer o ajuste fiscal, voltar a crescer", tenho um calafrio. De novo, um voo de galinha na economia e na política?

Seria necessário rever o caminho. A visão puramente eleitoral é sempre punida pelas leis do capitalismo. Não há espaço para uma esquerda monocrática que confunde suas ideias com o interesse nacional, que julga aproximar-se do socialismo, mas avança para o colapso econômico.

Essa esquerda dormiu abraçada numa bandeira vermelha e acordou com a multidão em cores verde e amarelo. Se acordou, finge que está dormindo.

Fernando Gabeira

Os de hoje como sempre

Ah, os nossos libertários! Bem os conheço, bem os conheço. Querem a própria liberdade! A dos outros, não. Que se dane a liberdade alheia. Berram contra todos os regimes de força, mas cada qual tem no bolso a sua ditadura. 
Nelson Rodrigues

Descoberto: o Dilmês é a língua dos Pachecos!

“English Spoken. On Parle Français. Si Parla Italiano. Coloca-se Dilmês”. Breve nas melhores vitrines do Mercosul.
Somos, e não é de hoje, um berço esplêndido para Pachecos. De janeiro para cá, eles abundam ‘colocando’ coisas inacreditáveis. (Não pergunte colocando ‘onde’. Finja que sempre soube que colocar é sinônimo de falar. Não dê uma de desinformado!).

Vou fazer aqui, para os jovens, um breve resumo de quem é o inolvidável Pacheco mas, por favor, não percam a oportunidade de ler a Carta ao Sr. Mollinett, em ‘A Correspondência de Fradique Mendes’, de Eça de Queiroz.

Pacheco, quando ainda estudante em Coimbra, bradou: "O século XIX era um século de Progresso e de Luz". Desde então, passou a ser considerado um gênio! A lenda cresceu tanto que Pacheco, já um político, nem precisava falar. Seu grande talento ficou sempre bem guardado e ele foi crescendo na carreira: “deputado, director-geral, ministro, governador de bancos, conselheiro de Estado, par, presidente do Conselho”.

Bastava, como diziam seus colegas, olhar aquela testa. Pacheco não precisou dar a Portugal “nem uma obra, nem uma fundação, nem um livro, nem uma ideia. Pacheco era entre nós superior e ilustre unicamente porque tinha um imenso talento”.

Olhe o nosso Brasil e veja quantos Pachecos temos. Como bons Pachecos, sabem administrar seu talento em silêncio. Ninguém nem desconfia...

Começo com dona Dilma. Afinal, hay derecho, ela é a presidente. Ao empossar seu novo ministro da Educação a criadora da Pátria Educadora fez questão de dizer que os ajustes fiscais que navegam sobre nossas cabeças não afetarão os programas “essenciais e estruturantes” do ministério. Seria essa a tal luz à qual o Pacheco original se referia?

E o ministro que vai educar a Pátria? O que ele disse? Ou melhor, ‘colocou’? Muito sofisticado, e desassombrado, ele frisou que não aderiu ao governo. Só aceitou o honroso convite e vai participar do governo no comando de uma pasta cujo objetivo é mastodôntico!

Passo por cima de muitos Pachecos para falar do mais perfeito deles. Vou qualificá-lo rapidinho antes que ele mude de lugar nesta nova partida de Escravos de Jó: ministro Pepe Vargas, novo titular da Secretaria de Direitos Humanos.

Após a cômica coletiva que deu, com versão I e versão II, dom Pepe colocou para o jornal Zero Hora, a respeito de suas relações com a chefe: “A presidente Dilma não fez isso para me sacanear”.

Que alívio!

O gigante acordou em 2013 numa situação complicada. Com toda certeza os Pachecos vão dizer que isso é culpa do FHC. Concordo. Se em 2005 o ex-presidente não tivesse freado o PSDB, nós não estaríamos nesta enrascada.

Fora FHC!

Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa

Quatro mais com Dilma é pena que nem mensaleiros cumpriram!

Quando mentimos para o governo, é um crime. Quando o governo nos mente... é constitucional?
Harvey Gilmore
A presidente Dilma, que alguns ainda defendem como “a proba”, fez todo o circuito da improbidade. Partilhou seu governo entre pessoas cuja reputação não deixava dúvida sobre a que vinham. Fez da mentira estratégia a ser cumprida rigorosamente. Nunca tivemos o país sob uma chefia tão dedicada à refinada arte de mentir. Ela continua mentindo, contra todas as evidências, em cadeia nacional. Mentiu sobre o próprio passado, mente sobre o presente e, agora, mente sobre o futuro. No circuito da improbidade não teve o menor constrangimento em causar dano irreparável à Petrobras e ao setor elétrico para desfilar ante as câmaras dos seus publicitários como a presidente que barateou o custo de vida e conteve a inflação. Mente quando atribui a desgraceira em que jogou a economia nacional a uma circunstância externa (a culpa é sempre dos outros), ou seja, a uma suposta crise internacional que só ela e seus diletos parceiros da Argentina, Venezuela e Cuba experimentam. Mentiu sempre, sem o menor constrangimento para assassinar a reputação de seus adversários imputando-lhes a intenção de adotar medidas impopulares que ela mesma está pondo em prática.

Os governos petistas são exemplo clássico, para constar em livros didáticos, de governos ímprobos. É patético o esforço da mídia amiga em defender a pessoa da presidente. Sustentam a sacralidade de um mandato que ela mesma não respeita. Não o respeita quando mente e quando anuncia que a gente faz o diabo em época de eleição. Se ela não o respeita, por que o respeitaríamos nós?

A estas alturas do segundo mandato, obtido nas trevas de uma inédita apuração secreta de votos (secreto é o voto, jamais sua apuração) nem mesmo os companheiros da presidente, nem mesmo os partidos da base, conseguem arregimentar forças em seu benefício. As extensões petistas nos ditos movimentos sociais perderam prumo e rumo. Já sabem em quem não confiam. Quando os institutos de pesquisa procuram conhecer os motivos do precipício pelo qual despencou o prestígio pessoal e a aprovação do governo Dilma ali estão, bem nítidas, as marcas da perda de credibilidade. Somos prisioneiros desse governo? Cativos por determinação constitucional? Quatro anos disso é pena superior à efetivamente cumprida por todos os políticos réus do mensalão.

Percival Puggina

Reivindico o meu direito de pensar


Queixas-te de teres aí falta de livros. Não interessa a quantidade, mas sim a qualidade: a leitura é proveitosa se for metódica, se apenas for variada torna-se um mero divertimento. Quem deseja chegar à meta que se propôs deve seguir um só caminho, e não vaguear por vários: de outro modo não viaja, deixa-se ir ao acaso. 
(...) Confio, e muito, no pensamento dos grandes homens, mas reivindico o meu direito próprio de pensar. De resto eles não nos legaram verdades acabadas, mas sim sujeitas à investigação; e porventura teriam descoberto o essencial se não tivessem investigado também temas supérfluos. Mas gastaram tempo imenso em jogos de palavras, em discussões capciosas que aguçam inutilmente o engenho. Construímos argumentos tortuosos, empregamos termos de significação ambígua, finalmente desatamos toda a trama. Temos assim tanto tempo livre? Já sabemos como encarar a vida e a morte? O que devemos procurar, com todas as forças, é o modo de nos não deixarmos enganar pelas coisas, e não pelas palavras.
Para que analisar as diferenças entre palavras sinônimas, que não causam dificuldade a ninguém a não ser em discussões de escola? As coisas enganam-nos: aprendamos a observá-las. Tomamos por bens coisas que o não são, desejamos hoje o contrário do que desejamos ontem, os nossos anseios contradizem-se; contradizem-se as nossas decisões. 
Lucius Annaeus Seneca (4 a.C. - 65) 

Nosso Everest é salvar 1 bilhão de crianças


A crise que atravessa a democracia brasileira – descrédito de seus eleitos, caos partidário, alianças espúrias, aparelhamento do Estado pelo partido no poder e corrupção – faz esquecer a crise do próprio conceito de democracia nacional no mundo global: presos a seus eleitores locais e à próxima eleição, os políticos estão estruturalmente despreparados para enfrentar os problemas planetários e de longo prazo. Nos limites nacionais e eleitorais, fica impossível enfrentar questões como aquecimento global, migração, terrorismo, crescimento ou decrescimento, energia, corrupção.

Pensando nisso, com base em uma iniciativa minha e do prêmio Nobel da Paz de 2014, Kailash Satyarthi, parlamentares de diferentes países se reuniram na semana passada no Nepal e criaram o movimento Parlamentares sem Fronteiras (PsF), escolhendo como primeiro tema de ação global os “Direitos da infância no mundo”.

No seu discurso de encerramento do encontro que fundou o movimento, Kailash Satyarthi disse: “Aqui estamos não apenas unindo parlamentares que defendem os direitos das crianças do mundo. Estamos também iniciando uma nova cultura política, adaptada aos tempos globais, para enfrentar problemas globais”.

Não se trata de reunir parlamentares nacionais para representar seus países na discussão de um tema, mas de reunir parlamentares comprometidos com uma questão mundial para, unidos pelo tema, atraírem seus países a uma posição comum no mundo, levando essas ideias para dentro do próprio país.

Ao reunir PsF em torno do tema dos direitos infantis, os parlamentares foram ao Nepal, em primeiro lugar, como defensores dos direitos da infância no mundo, só depois como representantes de seus países. Na verdade, eles vão representar essa bandeira dentro de suas nações.

A ideia é aglutinar o máximo de parlamentares nacionais de diversos países na busca de soluções para problemas globais, quebrando a frase verdadeira de Obama, em Copenhagen, em 2009: “Não há político eleito por eleitores mundiais.” Mas, se cada parlamentar ficar preso apenas aos limites de seus eleitores e da próxima eleição, é possível que as próximas gerações sejam sacrificadas em todos os países.

Nos tempos de hoje, quase todos os problemas de cada país passam por soluções planetárias e de longo prazo. Daí o movimento ter escolhido os direitos da infância como seu primeiro tema, enquanto prepara novas reuniões para outras questões, como energia, terrorismo e pobreza.

Muitas pessoas vão ao Nepal para escalar o monte Everest. Nós não somos tão fortes quanto elas, mas somos mais idealistas. Como eu disse na coletiva internacional de imprensa sobre o encontro, fomos lá para salvar 1 bilhão de crianças sem escola com qualidade, trabalhando no lugar de estudar, sujeitas à exploração sexual, sem atendimento médico e sem comida.

Cristovam Buarque

Um retrato na parede

Entregue o governo a um "neoliberal" na economia e a um pragmático "mordomo" na política, além de hostilizada por sua própria base no Parlamento, a presidente Dilma parece contentar-se em virar um retrato na parede.
Sandro Vaia



PMDB assume o governo sem golpe ou impeachment


A entrega da coordenação política do governo ao vice Michel Temer Lully é a concretização do fim de um ciclo e do início de outro. Sai o neoPT e a banca do cassino passa para as mãos do PMDB. Sem golpe e sem impeachment. Apenas com a rendição final do governo Dilma diante de fatos incontestávels e simbólicos em sua sequência.

Já não bastava a indicação de Joaquim Levy para a condução da proposta macroeconômica. A revelação de Eduardo Cunha como principal líder da oposição, após a forma humilhante como impôs derrota acachapante ao Planalto na disputa da presidência da Câmara, dava a largada no processo.

Veio a seguir a insubordinação do até então incondicional aliado, Renan Calheiros, ao se sentir “traído” em não ser protegido das investigações da Operação Lava Jato. Insubordinação que culminou com a intempestiva adesão à tese de “autonomia” do Banco Central, em artigo de domingo na Folha de S.Paulo. Autonomia do BC que deixou evidente defender em relação ao governo, mas com escandalosos piscar de olhos para os maganos da banca privada – a nova aliança em que se encosta após o longo período de influência empreiteira através do controle da presidência da Transpetro. São eles, como é sabido, os beneficiários de tal astúcia.

É nesse contexto; é nessa lógica de previsíveis movimentos, que deve ser entendida a sagração de Michel Temer Lully. Não apenas para articular aprovação de ajustes fiscais correspondentes ao suicídio político do neoPT. Mas para muito mais; para conduzir o restante do mandato Dilma. Com a reforma política retrógrada que já encontra amplo respaldo na “base aliada”, assim como votação de retrocessos inconstitucionais já aceleradamente encaminhados por Eduardo Cunha, tal como a redução da maioridade penal.

A esquerda na sua integridade conhece agora o preço do transformismo radical que Lula impôs à saudosa legenda do PT. O transformismo por meio de um pacto conservador de grande intensidade, escorado na compensação do assistencialismo de um medíocre reformismo fraco, que desqualificou a grande política.

A tragédia de há muito anunciada começa a chegar ao fim. O fim do sonho da esperança sobre o medo, para a restauração do neoliberalismo deslavado com o qual a cúpula neoPTista apenas finge não gostar de conviver.

Que a esquerda combativa, que não se rendeu nem se vendeu, encontre a força daqueles que sempre se habituaram a ralar no áspero, e se unifique para a recuperação de novos caminhos.

Luta que segue!! (a despeito das traições e covardias)