sábado, 16 de julho de 2016
O terror interno e o externo
O tema do terror, que hoje assombra o mundo, é um velho conhecido nosso. Não se reveste de teor religioso-fundamentalista ou ideológico – como o que hoje abala o Ocidente.
É impulsionado pela indústria bilionária do narcotráfico, estimulado pela impunidade e pela insânia do politicamente correto. Banditismo mesmo. Os direitos humanos têm aqui mão invertida: direcionam-se aos que os violam – os bandidos -, não às vítimas.
A construção desse ambiente não se deu do dia para a noite. Foi uma lenta e paciente elaboração, que começou no discurso esquerdista, de associar violência à pobreza, serviu-se da crônica morosidade do Judiciário e encontrou ampla receptividade no âmbito legislativo, com a elaboração de leis que atenuam as penas e oferecem aos condenados meios de reduzi-las ainda mais, por meio do sistema progressivo de regime, sempre “aprimorado”.
Dificilmente alguém cumpre a totalidade de sua pena. Há ainda a resistência à redução da maioridade penal para 16 anos, o que leva a que o crime organizado (e o desorganizado) se sirva dessa abundante mão de obra.
Por fim, há a crescente hostilidade dos setores pensantes da sociedade à ação policial, em que seus profissionais, além de mal remunerados e desequipados, deparam-se com restrições operacionais que, por óbvio, não se aplicam à ação dos bandidos.
No topo da pirâmide social, o quadro é ainda mais grave, como o demonstram as operações da Lava Jato. A legislação processual admite um sem-número de recursos, que levam os crimes a prescrever antes que o processo transite em julgado.
E há o absurdo foro privilegiado, que transforma o STF em tribunal penal e enseja intermediações políticas que impulsionam a impunidade e o descrédito do Poder Judiciário.
Não bastasse, o Senado está prestes a votar, por iniciativa de seu presidente, Renan Calheiros, projeto de lei que, a pretexto de conter abusos de autoridade, dificulta as investigações, sobretudo no que diz respeito às delações premiadas.
O projeto, apresentado em caráter terminativo, foi encaminhado a uma comissão especial, criada pelo próprio Renan e presidida por Romero Jucá, ambos citados em delações premiadas da Lava Jato. O recurso ao “caráter terminativo” permite, caso não haja recurso, que o projeto seja aprovado na própria comissão especial, sem passar pelo plenário do Senado. Depois vai para a Câmara.
Não é casual que o projeto venha à tona quando a Lava Jato chega à cúpula da elite política e econômica do país. A Associação dos Juízes Federais (Ajufe) declarou, em nota, que o texto “parece uma tentativa de intimidação de juízes”. Não parece: é.
O que ocorre em cima, na cúpula do poder, estimula quem está embaixo. Há, no mínimo, uma sinalização moral nefasta. No frigir dos ovos, o país oficial construiu um ambiente de falência política e econômica – e, em decorrência, social -, enquanto o país real vive a tragédia de contabilizar o pornográfico número de 70 mil assassinatos por ano – índice de guerra civil, superior ao de países como a Síria ou o Iraque, que a vivem de maneira declarada.
Não bastasse, a proximidade das Olimpíadas, com sede na cidade-síntese do país, o Rio de Janeiro – e, por isso mesmo, o seu mais eloquente retrato -, agrega ao terror interno, ao qual já nos habituamos, o terror externo, que hoje apavora o mundo.
Já há registros, nas redes sociais – e a própria Abin o confirma - da presença de agentes do Estado Islâmico no país, agindo nas periferias, onde há farta mão de obra recrutável. Que diferença faz para quem nasceu em meio às ações do narcotráfico – e se acostumou ao crime como banalidade – revesti-lo de aura fundamentalista e semeá-lo junto a seus companheiros de infortúnio?
O Brasil oferece ao terror vasto manancial a ser explorado. E é espantoso que somente agora as autoridades estabelecidas tenham despertado para o problema. Nessa Olimpíada, já temos, há muito, medalha de ouro.
É impulsionado pela indústria bilionária do narcotráfico, estimulado pela impunidade e pela insânia do politicamente correto. Banditismo mesmo. Os direitos humanos têm aqui mão invertida: direcionam-se aos que os violam – os bandidos -, não às vítimas.
A construção desse ambiente não se deu do dia para a noite. Foi uma lenta e paciente elaboração, que começou no discurso esquerdista, de associar violência à pobreza, serviu-se da crônica morosidade do Judiciário e encontrou ampla receptividade no âmbito legislativo, com a elaboração de leis que atenuam as penas e oferecem aos condenados meios de reduzi-las ainda mais, por meio do sistema progressivo de regime, sempre “aprimorado”.
Dificilmente alguém cumpre a totalidade de sua pena. Há ainda a resistência à redução da maioridade penal para 16 anos, o que leva a que o crime organizado (e o desorganizado) se sirva dessa abundante mão de obra.
Por fim, há a crescente hostilidade dos setores pensantes da sociedade à ação policial, em que seus profissionais, além de mal remunerados e desequipados, deparam-se com restrições operacionais que, por óbvio, não se aplicam à ação dos bandidos.
E há o absurdo foro privilegiado, que transforma o STF em tribunal penal e enseja intermediações políticas que impulsionam a impunidade e o descrédito do Poder Judiciário.
Não bastasse, o Senado está prestes a votar, por iniciativa de seu presidente, Renan Calheiros, projeto de lei que, a pretexto de conter abusos de autoridade, dificulta as investigações, sobretudo no que diz respeito às delações premiadas.
O projeto, apresentado em caráter terminativo, foi encaminhado a uma comissão especial, criada pelo próprio Renan e presidida por Romero Jucá, ambos citados em delações premiadas da Lava Jato. O recurso ao “caráter terminativo” permite, caso não haja recurso, que o projeto seja aprovado na própria comissão especial, sem passar pelo plenário do Senado. Depois vai para a Câmara.
Não é casual que o projeto venha à tona quando a Lava Jato chega à cúpula da elite política e econômica do país. A Associação dos Juízes Federais (Ajufe) declarou, em nota, que o texto “parece uma tentativa de intimidação de juízes”. Não parece: é.
O que ocorre em cima, na cúpula do poder, estimula quem está embaixo. Há, no mínimo, uma sinalização moral nefasta. No frigir dos ovos, o país oficial construiu um ambiente de falência política e econômica – e, em decorrência, social -, enquanto o país real vive a tragédia de contabilizar o pornográfico número de 70 mil assassinatos por ano – índice de guerra civil, superior ao de países como a Síria ou o Iraque, que a vivem de maneira declarada.
Não bastasse, a proximidade das Olimpíadas, com sede na cidade-síntese do país, o Rio de Janeiro – e, por isso mesmo, o seu mais eloquente retrato -, agrega ao terror interno, ao qual já nos habituamos, o terror externo, que hoje apavora o mundo.
Já há registros, nas redes sociais – e a própria Abin o confirma - da presença de agentes do Estado Islâmico no país, agindo nas periferias, onde há farta mão de obra recrutável. Que diferença faz para quem nasceu em meio às ações do narcotráfico – e se acostumou ao crime como banalidade – revesti-lo de aura fundamentalista e semeá-lo junto a seus companheiros de infortúnio?
O Brasil oferece ao terror vasto manancial a ser explorado. E é espantoso que somente agora as autoridades estabelecidas tenham despertado para o problema. Nessa Olimpíada, já temos, há muito, medalha de ouro.
Para onde foi a esperança
Não sei se pela distância, vejo cada vez mais a esfera da política como um obstáculo à recuperação econômica sustentável. Temer ainda luta pela estabilidade. Prometeu não ser candidato em 2018. Ainda assim, a lógica política vai empurrando suas decisões para o sentido oposto de uma contenção de gastos necessária para superar a crise.
O socorro ao Rio e ajustes com os Estados já estavam inscritos como grandes problemas pós-impeachment. E ainda inseguro no cargo, Temer não tem condições de vetar o aumento para o funcionalismo.
O governo é frágil também porque a cúpula do PMDB está implicada na Lava Jato. Aliás, se estivesse só implicada, o problema seria menor. Mas ela mostrou ter como sonho de consumo esvaziar a Lava Jato, até pela via do jogo parlamentar.
A eleição na Câmara dos Deputados apresentou muitos nomes, nenhum com condições de conter o apetite dos grupos fisiológicos. A negociação com o Congresso tende a ser mais cara ainda em ano eleitoral.
Todos esses fatores reunidos me levam a esperar, na melhor das hipóteses, um ajuste fiscal meia-bomba, que nos conduza a 2018 sem que os problemas essenciais tenham sido atacados. A tendência é pensar: em 2018, aí, sim, as coisas podem melhorar. Um presidente eleito tem legitimidade para conduzir um processo de mudanças mais ásperas e profundas.
A grande incógnita, de novo, é o Congresso. Surgirá um tipo de governo de coalizão que escape do fracasso dos outros que o antecederam? Ulysses Guimarães quando se criticava o nível da Câmara, respondia: “Esperem a próxima, será pior ainda”.
Mas Ulysses dizia isso com base na experiência de outra fase da democracia. Ou pelo menos não ousou concluir que, de pior a pior, o Congresso acabaria numa crise profunda e o próprio sistema político se desprenderia da realidade do País.
Para realizar as esperanças de sucesso de um presidente legítimo as eleições teriam a enorme tarefa de renovar o Congresso.
A liderança de Eduardo Cunha lançou a Câmara no seu último estágio: a de um balcão de negócios. Ele produzia e distribuía recursos a seu grupo fisiológico nos períodos eleitorais. Era o maior criador de jabutis da história, com emendas inseridas nas medidas provisórias.
Hoje, o agora ex-presidente da Câmara e o presidente do Senado são os alvos principais da Lava Jato no Congresso. Cunha tem conta na Suíça, faz viagens milionárias, incríveis manobras para não ser julgado. E aparece sempre dizendo que é inocente.
De nada adiantavam as evidências, apenas a sua narrativa. Outro dia, lendo um ensaio de Bruno Latour sobre a democracia, ele tomava como ponto de partida aquela ida do Colin Powell à ONU às vésperas da invasão do Iraque. Todo um espetáculo narrativo para demonstrar as armas de destruição em massa, com imagens, mapas. As armas não existiam.
O cinismo não é um traço só da política brasileira. Os franceses cunharam uma expressão para suas expressões vazias: langue de bois.
Mas o que aconteceu no Brasil nos últimos anos pode abalar a profecia de Ulysses. O choque entre as narrativas e as evidências se dá num momento em que o Brasil tem um fluxo mais abundante e rápido das informações. E são evidências inescapáveis, gravações, cheques, delações premiadas. Está tudo aí, disponível a um toque no smartphone.
Outro momento ainda não avaliado: o impacto da transmissão ao vivo do impeachment de Dilma Rousseff. Muitos observadores – estrangeiros inclusos – previram que aquele espetáculo, no mínimo, levaria a sociedade a refletir sobre seus representantes.
Jogar as esperanças para 2018 não significa uma fuga do áspero cotidiano da transição.
A Lava Jato tem um adversário mais sutil que o PT pela frente. E alguns movimentos da Justiça são ambíguos.
A história da prisão de Carlinhos Cachoeira e Cavendish foi uma dança em torno das tornozeleiras eletrônicas. Foram presos, estavam à espera de uma tornozeleira eletrônica, artigo raro num Rio falido.
Finalmente libertados sem tornozeleiras, a desembargadora quer uma escolta da Polícia Federal para vigiá-los em suas prisões domiciliares. O resultado é que se a proposta for aceita teremos pelo menos quatro policiais presos, no lugar de dois bandidos no xadrez. Ou com tornozeleiras.
Mesmo nas esferas mais altas os sinais são ambíguos. O ministro Celso de Mello negou a prisão de condenados após julgamento em segunda instância. Negou em nome de um principio, o de que ninguém deve ser considerado culpado antes de a sentença transitar em julgado.
O problema é ver como esse princípio abstrato se aplica no Brasil de hoje. O Supremo Tribunal está congestionado. Muitas pessoas, com base nesse dado, empurram seus processos, na esperança da prescrição, da impunidade.
A Lava Jato avança num terreno instável, com as surpresas e os vaivéns na Justiça, com a retirada da urgência nos processos de corrupção. A retirada partiu do governo Temer. É a tática mais suave, melíflua, da cúpula do PMDB.
Exceto Cunha, ela jamais vai bater de frente. Jamais um dos seus ideólogos, se é que os tem, vai dizer que o juiz Sergio Moro foi treinado pelo FBI para entregar o pré-sal às “Seis Irmãs”, empresas de petróleo norte-americanas. Mesmo com um pouco mais de sutileza, o PMDB não se aguenta: seus principais líderes não escaparão da Lava Jato, embora os ritmos e meandros do foro privilegiado possam dar-lhes uma sobrevida.
Se as eleições de 2018 não se fizerem já com uma reforma política, certamente seu resultado servirá para impulsioná-la. Acabou uma fase da democracia no País. Com seus líderes e partidos, na maioria esmagadora, rejeitados pela sociedade, as eleições de 2018 abrem o caminho da renovação ou da aventura.
Tudo vai depender uma sociedade que cada vez sabe mais sobre o universo político. Sabe o bastante para desprezá-lo de vez. Ou tentar algo novo.
O socorro ao Rio e ajustes com os Estados já estavam inscritos como grandes problemas pós-impeachment. E ainda inseguro no cargo, Temer não tem condições de vetar o aumento para o funcionalismo.
O governo é frágil também porque a cúpula do PMDB está implicada na Lava Jato. Aliás, se estivesse só implicada, o problema seria menor. Mas ela mostrou ter como sonho de consumo esvaziar a Lava Jato, até pela via do jogo parlamentar.
A eleição na Câmara dos Deputados apresentou muitos nomes, nenhum com condições de conter o apetite dos grupos fisiológicos. A negociação com o Congresso tende a ser mais cara ainda em ano eleitoral.
Todos esses fatores reunidos me levam a esperar, na melhor das hipóteses, um ajuste fiscal meia-bomba, que nos conduza a 2018 sem que os problemas essenciais tenham sido atacados. A tendência é pensar: em 2018, aí, sim, as coisas podem melhorar. Um presidente eleito tem legitimidade para conduzir um processo de mudanças mais ásperas e profundas.
Mas Ulysses dizia isso com base na experiência de outra fase da democracia. Ou pelo menos não ousou concluir que, de pior a pior, o Congresso acabaria numa crise profunda e o próprio sistema político se desprenderia da realidade do País.
Para realizar as esperanças de sucesso de um presidente legítimo as eleições teriam a enorme tarefa de renovar o Congresso.
A liderança de Eduardo Cunha lançou a Câmara no seu último estágio: a de um balcão de negócios. Ele produzia e distribuía recursos a seu grupo fisiológico nos períodos eleitorais. Era o maior criador de jabutis da história, com emendas inseridas nas medidas provisórias.
Hoje, o agora ex-presidente da Câmara e o presidente do Senado são os alvos principais da Lava Jato no Congresso. Cunha tem conta na Suíça, faz viagens milionárias, incríveis manobras para não ser julgado. E aparece sempre dizendo que é inocente.
De nada adiantavam as evidências, apenas a sua narrativa. Outro dia, lendo um ensaio de Bruno Latour sobre a democracia, ele tomava como ponto de partida aquela ida do Colin Powell à ONU às vésperas da invasão do Iraque. Todo um espetáculo narrativo para demonstrar as armas de destruição em massa, com imagens, mapas. As armas não existiam.
O cinismo não é um traço só da política brasileira. Os franceses cunharam uma expressão para suas expressões vazias: langue de bois.
Mas o que aconteceu no Brasil nos últimos anos pode abalar a profecia de Ulysses. O choque entre as narrativas e as evidências se dá num momento em que o Brasil tem um fluxo mais abundante e rápido das informações. E são evidências inescapáveis, gravações, cheques, delações premiadas. Está tudo aí, disponível a um toque no smartphone.
Outro momento ainda não avaliado: o impacto da transmissão ao vivo do impeachment de Dilma Rousseff. Muitos observadores – estrangeiros inclusos – previram que aquele espetáculo, no mínimo, levaria a sociedade a refletir sobre seus representantes.
Jogar as esperanças para 2018 não significa uma fuga do áspero cotidiano da transição.
A Lava Jato tem um adversário mais sutil que o PT pela frente. E alguns movimentos da Justiça são ambíguos.
A história da prisão de Carlinhos Cachoeira e Cavendish foi uma dança em torno das tornozeleiras eletrônicas. Foram presos, estavam à espera de uma tornozeleira eletrônica, artigo raro num Rio falido.
Finalmente libertados sem tornozeleiras, a desembargadora quer uma escolta da Polícia Federal para vigiá-los em suas prisões domiciliares. O resultado é que se a proposta for aceita teremos pelo menos quatro policiais presos, no lugar de dois bandidos no xadrez. Ou com tornozeleiras.
Mesmo nas esferas mais altas os sinais são ambíguos. O ministro Celso de Mello negou a prisão de condenados após julgamento em segunda instância. Negou em nome de um principio, o de que ninguém deve ser considerado culpado antes de a sentença transitar em julgado.
O problema é ver como esse princípio abstrato se aplica no Brasil de hoje. O Supremo Tribunal está congestionado. Muitas pessoas, com base nesse dado, empurram seus processos, na esperança da prescrição, da impunidade.
A Lava Jato avança num terreno instável, com as surpresas e os vaivéns na Justiça, com a retirada da urgência nos processos de corrupção. A retirada partiu do governo Temer. É a tática mais suave, melíflua, da cúpula do PMDB.
Exceto Cunha, ela jamais vai bater de frente. Jamais um dos seus ideólogos, se é que os tem, vai dizer que o juiz Sergio Moro foi treinado pelo FBI para entregar o pré-sal às “Seis Irmãs”, empresas de petróleo norte-americanas. Mesmo com um pouco mais de sutileza, o PMDB não se aguenta: seus principais líderes não escaparão da Lava Jato, embora os ritmos e meandros do foro privilegiado possam dar-lhes uma sobrevida.
Se as eleições de 2018 não se fizerem já com uma reforma política, certamente seu resultado servirá para impulsioná-la. Acabou uma fase da democracia no País. Com seus líderes e partidos, na maioria esmagadora, rejeitados pela sociedade, as eleições de 2018 abrem o caminho da renovação ou da aventura.
Tudo vai depender uma sociedade que cada vez sabe mais sobre o universo político. Sabe o bastante para desprezá-lo de vez. Ou tentar algo novo.
Os (i)morais
A ressurreição da política
Lula matou a política; Eduardo Cunha tratava de enterrá-la. Um era a exata contrapartida do outro e a remoção do último, na sequência da quase remoção do primeiro, completa a reversão do desvio mortal em que o Brasil entrou. Está reaberto o caminho para a volta da política sem a qual não se vai a lugar nenhum.
Essas mudanças são como as manobras dos grandes navios. O acionamento dos comandos não vence imediatamente a inércia. Está aí, ainda, o cirquinho “silogístico” de escárnio à inteligência nacional do PT sob a batuta de Jose Eduardo Cardoso, Gleisi Hoffmann e cia., par perfeito do “regimentismo” bandalho de Eduardo Cunha; está aí, ainda, aquele STF que solta e arrebenta legalizando para si mesmo, em plena Lava-Jato, o duto das “palestras” para partes nos litígios que julga, como as de Lula à Odebrecht, e garantia de segredo para o valor do mimo recebido. Mas tudo isso, depois da votação de quinta-feira, deslocou-se para mais perto da porta do passado.
Entrou ar. E onde entra ar qualquer infecção volta a ter chance de cura. Ha outro STF dentro daquele STF; ha outra política dentro dessa em que o lulismo transformou a nossa. O Brasil que não se alinha ao crime volta a ter no que se agarrar e isso faz muita diferença.
Sem ilusões, porém.
Ha uma dimensão percebida dos nossos vícios, e outra que já é cultura e nos move por baixo do nível da consciência. Para a primeira tornam-se mais favoráveis as perspectivas. Antes de mais nada porque não ha alternativa para o caminho certo. É agir ou morrer. E logo. Rodrigo Maia tem formação econômica. Sabe que a alternativa fácil não dobra a esquina. É o homem certo no lugar certo para reger esse debate. Michel Temer, que se apruma com essa vitória, também passa a poder, mais que antes, agir certo em vez de apenas falar certo. Assim alterado o clima, o comando da Comissão de Impeachment bem pode, também, passar a olhar antes para o Brasil que se esvai manietado e a resistir com alguma galhardia às manobras espúrias que vem engolindo sem engasgar pois até para o STF será mais complicado, agora, dançar fora da nova batida do bumbo. Se o Brasil deixar claro que é o que quer todo mundo se afina, ao menos no discurso. Ou não foi assim que o país inteiro virou “Lava-Jato desde criancinha” e a votação de quinta-feira deu no que deu?
A outra dimensão é que é mais difícil de lidar. O lulismo foi a chegada do primeiro produto P.O. (“puro de origem”) do peleguismo getulista ao posto mais alto da Nação. Ao fim de quase 80 anos de uso contínuo essa droga de tão potente efeito necrosante não ha brasileiro que, direta ou indiretamente, não tenha sido mutilado por ela. A maioria de nós – o próprio Lula notoriamente – sequer tem consciência de como foi afetado. Simplesmente não sabe como é viver de outro jeito.
É juntar três ou quatro amigos, fundar um “sindicato” que o Estado se encarregará de impor a um dos lotes do condomínio nacional do trabalho onde não se entra sem alvará e fincar na veia o cateter do imposto sindical. Para o resto da vida, tudo que ha a fazer depois disso é não permitir que algum aventureiro o arranque do seu braço, o que é fácil de garantir desde que as “eleições” se deem por “aclamação”, sempre arrancável pela intimidação, seja pela negação de trabalho, seja pela violência física. Daí para a política. É essa a escola.
Para esmagar resistências ao longo do caminho; para garantir esse “Eu sou, mas quem não é?” em que tudo se dissolve sempre no debate político nacional desde o “Mensalão”, acrescentou-se à receita a socialização da corrupção por essa “justiça trabalhista” que sustenta a legião de profissionais do achaque encarregada de moer a consciência da Nação soprando diuturnamente, de ouvido em ouvido, o mantra sinistro: “Minta, traia, falseie que o governo garante”…
E lá se foi o Brasil dessensibilizando-se até admitir que o método fosse estendido a todos os níveis do seu sistema representativo – partidos políticos, associações de classe, ONGs, etc. – e parecesse nada mais que lógico e natural impô-lo, afinal, como o regime político mesmo da Nação à força de decretos presidenciais e remendos judicantes sob a égide do “excesso de democracia” à venezuelana.
É essa a feição “moderna” que assumiu o absolutismo monárquico à brasileira que a Republica nunca superou depois que entregou intactos os poderes do Imperador sem mandato aos novos imperadores com mandato. O abacaxi que Michel Temer e o Congresso de Rodrigo Maia têm de descascar é velho como o Brasil de d. João VI e os miasmas que dele emanam são fortes o bastante para levar até o “dream team”, em questão de semanas, a passar das juras de amor eterno ao controle dos gastos públicos ao namoro com mais um porre de impostos, só que sorvido aos “golinhos”. É que por baixo das diferenças manifestas nos extremos mais distorcidos do “Sistema” derrotados quinta-feira, eles continuam sendo, antes e acima de tudo, “A Côrte”; uma casta para a qual ha leis especiais, tribunais especiais, regimes de trabalho, salários e aposentadorias especiais e até juros bancários especiais extensíveis a quem quer que um de seus “excelentes” pares houver por bem resgatar deste vale de lágrimas. E, de cunhas a grazziotins, “A Côrte” reage sempre com unanimidade monolítica quando o que está em jogo é montar nas nossas costas para aliviar as próprias.
É disso que se trata mais uma vez agora. Tornar as suas prerrogativas um pouco menos “especiais” para que, explorados e exploradores, sigamos todos com os narizes 1 cm acima da linha d’água é o melhor que, em sã consciência, pode-se esperar desses brasileiros dispensados de viver no Brasil que eles próprios criam. Mais, só quando o Brasil se der conta de que é ele quem manda e adotar finalmente a democracia, obrigando-os a viver no mesmo país em que vivemos nós, sujeitos às mesmas leis, aos mesmos ventos e às mesmas tempestades. Aí sim, eles tratarão de consertá-lo.
Fernão Lara Mesquita
Essas mudanças são como as manobras dos grandes navios. O acionamento dos comandos não vence imediatamente a inércia. Está aí, ainda, o cirquinho “silogístico” de escárnio à inteligência nacional do PT sob a batuta de Jose Eduardo Cardoso, Gleisi Hoffmann e cia., par perfeito do “regimentismo” bandalho de Eduardo Cunha; está aí, ainda, aquele STF que solta e arrebenta legalizando para si mesmo, em plena Lava-Jato, o duto das “palestras” para partes nos litígios que julga, como as de Lula à Odebrecht, e garantia de segredo para o valor do mimo recebido. Mas tudo isso, depois da votação de quinta-feira, deslocou-se para mais perto da porta do passado.
Entrou ar. E onde entra ar qualquer infecção volta a ter chance de cura. Ha outro STF dentro daquele STF; ha outra política dentro dessa em que o lulismo transformou a nossa. O Brasil que não se alinha ao crime volta a ter no que se agarrar e isso faz muita diferença.
Ha uma dimensão percebida dos nossos vícios, e outra que já é cultura e nos move por baixo do nível da consciência. Para a primeira tornam-se mais favoráveis as perspectivas. Antes de mais nada porque não ha alternativa para o caminho certo. É agir ou morrer. E logo. Rodrigo Maia tem formação econômica. Sabe que a alternativa fácil não dobra a esquina. É o homem certo no lugar certo para reger esse debate. Michel Temer, que se apruma com essa vitória, também passa a poder, mais que antes, agir certo em vez de apenas falar certo. Assim alterado o clima, o comando da Comissão de Impeachment bem pode, também, passar a olhar antes para o Brasil que se esvai manietado e a resistir com alguma galhardia às manobras espúrias que vem engolindo sem engasgar pois até para o STF será mais complicado, agora, dançar fora da nova batida do bumbo. Se o Brasil deixar claro que é o que quer todo mundo se afina, ao menos no discurso. Ou não foi assim que o país inteiro virou “Lava-Jato desde criancinha” e a votação de quinta-feira deu no que deu?
A outra dimensão é que é mais difícil de lidar. O lulismo foi a chegada do primeiro produto P.O. (“puro de origem”) do peleguismo getulista ao posto mais alto da Nação. Ao fim de quase 80 anos de uso contínuo essa droga de tão potente efeito necrosante não ha brasileiro que, direta ou indiretamente, não tenha sido mutilado por ela. A maioria de nós – o próprio Lula notoriamente – sequer tem consciência de como foi afetado. Simplesmente não sabe como é viver de outro jeito.
É juntar três ou quatro amigos, fundar um “sindicato” que o Estado se encarregará de impor a um dos lotes do condomínio nacional do trabalho onde não se entra sem alvará e fincar na veia o cateter do imposto sindical. Para o resto da vida, tudo que ha a fazer depois disso é não permitir que algum aventureiro o arranque do seu braço, o que é fácil de garantir desde que as “eleições” se deem por “aclamação”, sempre arrancável pela intimidação, seja pela negação de trabalho, seja pela violência física. Daí para a política. É essa a escola.
Para esmagar resistências ao longo do caminho; para garantir esse “Eu sou, mas quem não é?” em que tudo se dissolve sempre no debate político nacional desde o “Mensalão”, acrescentou-se à receita a socialização da corrupção por essa “justiça trabalhista” que sustenta a legião de profissionais do achaque encarregada de moer a consciência da Nação soprando diuturnamente, de ouvido em ouvido, o mantra sinistro: “Minta, traia, falseie que o governo garante”…
E lá se foi o Brasil dessensibilizando-se até admitir que o método fosse estendido a todos os níveis do seu sistema representativo – partidos políticos, associações de classe, ONGs, etc. – e parecesse nada mais que lógico e natural impô-lo, afinal, como o regime político mesmo da Nação à força de decretos presidenciais e remendos judicantes sob a égide do “excesso de democracia” à venezuelana.
É essa a feição “moderna” que assumiu o absolutismo monárquico à brasileira que a Republica nunca superou depois que entregou intactos os poderes do Imperador sem mandato aos novos imperadores com mandato. O abacaxi que Michel Temer e o Congresso de Rodrigo Maia têm de descascar é velho como o Brasil de d. João VI e os miasmas que dele emanam são fortes o bastante para levar até o “dream team”, em questão de semanas, a passar das juras de amor eterno ao controle dos gastos públicos ao namoro com mais um porre de impostos, só que sorvido aos “golinhos”. É que por baixo das diferenças manifestas nos extremos mais distorcidos do “Sistema” derrotados quinta-feira, eles continuam sendo, antes e acima de tudo, “A Côrte”; uma casta para a qual ha leis especiais, tribunais especiais, regimes de trabalho, salários e aposentadorias especiais e até juros bancários especiais extensíveis a quem quer que um de seus “excelentes” pares houver por bem resgatar deste vale de lágrimas. E, de cunhas a grazziotins, “A Côrte” reage sempre com unanimidade monolítica quando o que está em jogo é montar nas nossas costas para aliviar as próprias.
É disso que se trata mais uma vez agora. Tornar as suas prerrogativas um pouco menos “especiais” para que, explorados e exploradores, sigamos todos com os narizes 1 cm acima da linha d’água é o melhor que, em sã consciência, pode-se esperar desses brasileiros dispensados de viver no Brasil que eles próprios criam. Mais, só quando o Brasil se der conta de que é ele quem manda e adotar finalmente a democracia, obrigando-os a viver no mesmo país em que vivemos nós, sujeitos às mesmas leis, aos mesmos ventos e às mesmas tempestades. Aí sim, eles tratarão de consertá-lo.
Fernão Lara Mesquita
Parece loucura, mas tem método
No Brasil, os intelectuais não se criticam mutuamente. Trata-se, ao que parece, de uma decorrência da exiguidade numérica: num grupo tão pequeno, questionamentos mútuos “não pegam bem”. Pode também ser um modus vivendi: como a maioria combina a atividade docente universitária com algum envolvimento político, cada um se sente no direito de fazer proselitismo partidário ou ideológico sem ser “incomodado” pelos demais.
Tal entendimento parece-me até certo ponto razoável, por duas razões: de um lado, nossa vida universitária nunca se pautou pelo estrito ascetismo outrora cultivado em algumas universidades do Primeiro Mundo; do outro, momentos cruciais da construção democrática brasileira exigiram uma defesa enfática da liberdade de cátedra, estreitamente associada à de expressão do pensamento. Fato, seja como for, é que entre nós o debate aberto e por vezes contundente que se observa nos países academicamente adiantados nunca se desenvolveu.
Ao contrário dos Estados Unidos, por exemplo, onde as revistas especializadas e mesmo alguns jornais, como The New York Review of Books, regularmente publicam resenhas sérias dos novos lançamentos editoriais, no Brasil resenhar é quase sinônimo de elogiar. Essa tradição, que remonta à época nada gloriosa dos catedráticos medalhões, afigura-se esdrúxula nos dias de hoje, com o regime democrático em pleno desenvolvimento, tendo os intelectuais um papel sabidamente importante na formação da opinião pública e cada cidadão querendo saber onde vai parar o dinheiro dos impostos que paga.
Fiz as observações acima instigado por declarações da doutora Marilena Chaui, professora titular de Filosofia da Universidade de São Paulo. Farei referência a três episódios: um, de dez anos atrás, associado ao “mensalão”; outro, de 2012, em que ela disse cobras e lagartos sobre a classe média brasileira; e um recente, a respeito da Operação Lava Jato e do juiz Sergio Moro.
Na primeira, contestando a veracidade das acusações referentes à compra de apoio no Congresso pelo PT, a professora Chaui interpretou-as, bem à maneira das chamadas “teorias conspiratórias”, como uma campanha difamatória urdida pela mídia, que se teria comportado como uma elite coesa. Em 2012, num evento organizado, se bem me lembro, por seu partido, num tom inusitadamente exaltado, ela declarou odiar a classe média. “Odeio-a”, especificou, “porque é ignorante e fascista”. Na mais recente, disse que os inquéritos em andamento nada têm que ver com combate à corrupção, tratar-se-ia de uma operação estrangeira (norte-americana, presumo) cujo real objetivo seria “tirar-nos o pré-sal”, hipótese ao ver dela comprovada pelo fato de o juiz Sergio Moro ter sido “treinado pelo FBI”.
A questão, como se vê, é como a comunidade intelectual – cuja segmentação ideológica tive o cuidado de ressaltar acima – reage a tais declarações. Podem elas ser aceitas como expressões normais de um determinado ponto de vista ideológico ou extrapolam tal âmbito, a ponto de merecerem alguma crítica? É óbvio que não tenho procuração para falar por outros integrantes de tal comunidade – e muito menos interesse em fazê-lo. Falo por mim.
Quanto a conspirações de elite, sou forçado a perguntar se a professora Chaui ponderou devidamente as companhias a que se reuniu ao abraçar esse tipo de teoria. Falo, naturalmente, dos Protocolos dos Sábios de Sião, cânone da virulência antissemita, da acusação, também falsa e antissemita, contra o capitão Dreyfus; e mesmo da peça também falsa e antissemita, denominada Plano Cohen, obra do então coronel Olímpio Mourão Filho, produzida na antevéspera do autogolpe getulista de 1937. Quem pensa dessa forma vê conspirações por todo lado, tramadas ora pela mídia, ora pelos judeus, ora pelo imperialismo. Karl Popper discute essa questão em seu celebrado livro A Sociedade Aberta e seus Inimigos: “Não afirmo que conspirações nunca acontecem. Ao contrário, elas são fenômenos sociais comuns. (Mas) tornam-se importantes, por exemplo, quando pessoas que acreditam em teorias conspiratórias – principalmente pessoas que acreditam saber como criar um paraíso na terra – chegam ao poder e se engajam em contraconspirações contra inexistentes conspiradores. Porque precisam explicar seu fracasso em produzir o almejado paraíso”.
Provavelmente por não ter-se debruçado sobre os problemas acima mencionados, Marilena Chaui recai na teoria conspiratória ao falar da Lava Jato, apenas substituindo a elite oculta do mensalão pelo imperialismo e pelo juiz Sergio Moro; e o mais pitoresco é que, no petrolão, houve de fato uma elite conspiratória: um conluio de grandes empreiteiros com altos agentes dos governos Lula e Dilma.
Em sua invectiva contra a classe média, não é mais a uma elite oculta que Marilena Chauí se refere, mas há um elemento comum importante a ressaltar. A ilustre filósofa ter-se-ia expressado melhor, com mais atenção à diversidade do fenômeno de que tratou, se tivesse lido Who Voted for Hitler?, de Richard F. Hamilton, mas esse não é seu método de trabalho. Ela presume, simplesmente, a existência de uma “pequena burguesia”, uma camada social homogeneamente ignorante e fascista.
Apesar de sua brilhante trajetória como professora de Filosofia, ela não vê dificuldade em atribuir determinados traços a esse coletivo abstrato e hipostasiado que é sua “classe média”. O mais curioso é ela ter declarado isso justo quando o governo petista trombeteava a entrada do Brasil no seleto grupo dos países “de classe média”. Graças a suas políticas sociais, mais de 50% da população brasileira teria ascendido ao paraíso dos ignorantes e fascistas.
Tal entendimento parece-me até certo ponto razoável, por duas razões: de um lado, nossa vida universitária nunca se pautou pelo estrito ascetismo outrora cultivado em algumas universidades do Primeiro Mundo; do outro, momentos cruciais da construção democrática brasileira exigiram uma defesa enfática da liberdade de cátedra, estreitamente associada à de expressão do pensamento. Fato, seja como for, é que entre nós o debate aberto e por vezes contundente que se observa nos países academicamente adiantados nunca se desenvolveu.
Ao contrário dos Estados Unidos, por exemplo, onde as revistas especializadas e mesmo alguns jornais, como The New York Review of Books, regularmente publicam resenhas sérias dos novos lançamentos editoriais, no Brasil resenhar é quase sinônimo de elogiar. Essa tradição, que remonta à época nada gloriosa dos catedráticos medalhões, afigura-se esdrúxula nos dias de hoje, com o regime democrático em pleno desenvolvimento, tendo os intelectuais um papel sabidamente importante na formação da opinião pública e cada cidadão querendo saber onde vai parar o dinheiro dos impostos que paga.
Na primeira, contestando a veracidade das acusações referentes à compra de apoio no Congresso pelo PT, a professora Chaui interpretou-as, bem à maneira das chamadas “teorias conspiratórias”, como uma campanha difamatória urdida pela mídia, que se teria comportado como uma elite coesa. Em 2012, num evento organizado, se bem me lembro, por seu partido, num tom inusitadamente exaltado, ela declarou odiar a classe média. “Odeio-a”, especificou, “porque é ignorante e fascista”. Na mais recente, disse que os inquéritos em andamento nada têm que ver com combate à corrupção, tratar-se-ia de uma operação estrangeira (norte-americana, presumo) cujo real objetivo seria “tirar-nos o pré-sal”, hipótese ao ver dela comprovada pelo fato de o juiz Sergio Moro ter sido “treinado pelo FBI”.
A questão, como se vê, é como a comunidade intelectual – cuja segmentação ideológica tive o cuidado de ressaltar acima – reage a tais declarações. Podem elas ser aceitas como expressões normais de um determinado ponto de vista ideológico ou extrapolam tal âmbito, a ponto de merecerem alguma crítica? É óbvio que não tenho procuração para falar por outros integrantes de tal comunidade – e muito menos interesse em fazê-lo. Falo por mim.
Quanto a conspirações de elite, sou forçado a perguntar se a professora Chaui ponderou devidamente as companhias a que se reuniu ao abraçar esse tipo de teoria. Falo, naturalmente, dos Protocolos dos Sábios de Sião, cânone da virulência antissemita, da acusação, também falsa e antissemita, contra o capitão Dreyfus; e mesmo da peça também falsa e antissemita, denominada Plano Cohen, obra do então coronel Olímpio Mourão Filho, produzida na antevéspera do autogolpe getulista de 1937. Quem pensa dessa forma vê conspirações por todo lado, tramadas ora pela mídia, ora pelos judeus, ora pelo imperialismo. Karl Popper discute essa questão em seu celebrado livro A Sociedade Aberta e seus Inimigos: “Não afirmo que conspirações nunca acontecem. Ao contrário, elas são fenômenos sociais comuns. (Mas) tornam-se importantes, por exemplo, quando pessoas que acreditam em teorias conspiratórias – principalmente pessoas que acreditam saber como criar um paraíso na terra – chegam ao poder e se engajam em contraconspirações contra inexistentes conspiradores. Porque precisam explicar seu fracasso em produzir o almejado paraíso”.
Provavelmente por não ter-se debruçado sobre os problemas acima mencionados, Marilena Chaui recai na teoria conspiratória ao falar da Lava Jato, apenas substituindo a elite oculta do mensalão pelo imperialismo e pelo juiz Sergio Moro; e o mais pitoresco é que, no petrolão, houve de fato uma elite conspiratória: um conluio de grandes empreiteiros com altos agentes dos governos Lula e Dilma.
Em sua invectiva contra a classe média, não é mais a uma elite oculta que Marilena Chauí se refere, mas há um elemento comum importante a ressaltar. A ilustre filósofa ter-se-ia expressado melhor, com mais atenção à diversidade do fenômeno de que tratou, se tivesse lido Who Voted for Hitler?, de Richard F. Hamilton, mas esse não é seu método de trabalho. Ela presume, simplesmente, a existência de uma “pequena burguesia”, uma camada social homogeneamente ignorante e fascista.
Apesar de sua brilhante trajetória como professora de Filosofia, ela não vê dificuldade em atribuir determinados traços a esse coletivo abstrato e hipostasiado que é sua “classe média”. O mais curioso é ela ter declarado isso justo quando o governo petista trombeteava a entrada do Brasil no seleto grupo dos países “de classe média”. Graças a suas políticas sociais, mais de 50% da população brasileira teria ascendido ao paraíso dos ignorantes e fascistas.
Ocaso do 'Rei' do Brasil
Ele parece estar meio distante do povo, com um olhar desconfiadoConceissão Pessoa, funcionária pública em Caruaru, na reportagem "O ocaso de Lula: desprestígio, abandono e suspeitas"
PT vai parar o Rio na abertura da Olimpíada em protesto contra o 'golpe'
Na certeza de que a presidente Dilma Rousseff não tem a menor chance de evitar a concretização do impeachment, o PT (leia-se: Lula e o partido) decidiu reforçar a estratégia de buscar apoio no exterior. A próxima iniciativa é a organização de um simulacro de Tribunal Internacional, que se reúne terça e quarta-feira, no Rio de Janeiro, em palco montado no Teatro Casagrande, a pretexto de julgar os golpistas que tentam cassar Dilma Rousseff. Escolhido a dedo entre os mais conhecidos esquerdistas do mundo, o júri terá sete integrantes e o presidente será o argentino Adolfo Pérez Esquivel, Prêmio Nobel da Paz em 1980, que esteve recentemente em Brasília, para denunciar ao Senado o golpe contra Dilma.
O objetivo dos petistas é fazer com que o veredito desse tribunal ideológico seja “oficialmente” encaminhado ao Supremo Tribunal Federal e aos senadores, como se fosse adiantar alguma coisa.
O objetivo dos petistas é fazer com que o veredito desse tribunal ideológico seja “oficialmente” encaminhado ao Supremo Tribunal Federal e aos senadores, como se fosse adiantar alguma coisa.
Mas a apoteose petista será o gigantesco ato público a ser realizado dia 5 de agosto no Rio de Janeiro, exatamente na data de abertura da Olimpíada, para que o protesto possa alcançar massiva repercussão internacional, porque já estarão na cidade cerca de 20 mil jornalistas estrangeiros. A ideia é realizar uma grande marcha, uma espécie de Maratona ideológica, que possa literalmente parar a região central da cidade, nas proximidades do Estádio do Maracanã, palco da cerimônia festiva que dará início aos jogos olímpicos.
Serão distribuídos pela cidade milhões de folhetos didáticos, impressos em vários idiomas, para denunciar que está sendo cometido um golpe de estado com objetivo de derrubar a presidente Dilma Rousseff.
Na sequência, a intenção do PT e de seus aliados é promover a maior greve geral da História do país, para sensibilizar os senadores que a essa altura já estarão prestes a votar o impeachment.
Se for confirmada a cassação do mandato da presidente Dilma no Senado, o PT então vai recorrer ao Supremo para arguir a nulidade da acusação de crime de responsabilidade, com base na perícia feita por funcionários do Senado e no parecer do procurador Ivan Cláudio Marx, que acaba de ser divulgado, opinando que a chefe do governo teria de ser processada por improbidade administrativa, ao invés de sofrer impeachment.
É claro que nada disso vai dar certo, Dilma Rousseff será cassada, e vida que segue, como dizia nosso amigo João Saldanha. Mas não há dúvida de que vai haver muito barulho e tumulto.
As duas justiças do Brasil: uma prende, a outra solta
Quando o contraventor “Carlinhos Cachoeira” (Carlos Augusto de Almeida Ramos) sentou-se ao lado dos policiais federais no camburão e fez aquela cara de deboche, abrindo um sorriso maroto, o Brasil inteiro desconfiou da prisão. Cachoeiro, que já foi condenado a mais de 30 anos e não se sabe porque diabo continua solto, parecia zombar dos policiais e da cara de todo mundo. E estava certo, dias depois a desembargadora Nizete Lobato, do Tribunal Regional da 2º Região, mandou soltar o criminoso. De lambuja ainda deu liberdade para Fernando Cavendish, o todo poderoso dono da Delta, e os empresários Adir Assad, Cláudio Abreu e Marcelo Abbu.
A liberdade desses senhores do crime só evidencia uma coisa: no Brasil de hoje existem duas justiças: a que prende e a que solta. A de Curitiba, liderada pelo juiz Sérgio Moro, que continua tentando botar o país nos eixos, mesmo sob pressão dos políticos e dos empresários poderosos, prende. A outra justiça, que faz vista grossa para os ladrões do dinheiro público, solta. De acordo com a decisão do ministro Nefi Cordeiro, do Superior Tribunal de Justiça, os presos deveriam deixar o presídio de Bangu com tornozeleiras, mas um simples detalhe impediu que isso acontecesse: o Rio de Janeiro, falido, não tem dinheiro para comprar as peças eletrônicas. É o fim da picada.
Os cinco homens, que deixaram o presídio pela porta da frente, foram presos na operação Saqueador da Polícia Federal que investiga o esquema de lavagem de 320 milhões de reais. Isso mesmo, os caras desviaram 320 milhões dos cofres públicos! Com o alvará de soltura nas mãos, Cachoeiro foi deixado em um flat em Copacabana e Cavendish na Avenida Delfim Moreira, no Leblon, bairro nobre do Rio, onde é dono de um apartamento de andar inteiro com vista para o mar.
Na verdade, o prestígio de Cachoeira é que levou a liberdade dos outros presos. Condenado a mais de trinta anos, ele continua livre. Quando esteve preso em outros escândalos não fez por menos. Contratou o advogado Thomáz Bastos, ex-ministro da Justiça, por 30 milhões de reais para cuidar da sua causa. Demitiu-o depois que teve o primeiro habeas-corpus negado. O contraventor, no Brasil, ainda é o criminoso que mais goza da intimidade da Justiça. No Rio, por exemplo, eles vivem dentro e fora do presídio, na verdade, mais fora do que dentro. A jogatina continua solta pela cidade e os bicheiros trabalham em liberdade, muitos supervisionados pela própria polícia. Não é de se admirar, portanto, que ser preso com um contraventor é garantia de liberdade rápida.
A coragem do juiz Sergio Moro e de alguns abnegados procuradores do Ministério Público é um caso isolado na justiça brasileira, porque a prática é a justiça ser benevolente com os acusados de delitos. Lembra da cara que o Marcelo Odebrecht fez quando depôs em Curitiba para alguns deputados de uma CPI fajuta da Câmara dos Deputados? Foi a mesma do Cachoeira. Debochou dos parlamentares e ironizou alguns deles, quando disse que não era da sua índole fazer delações premiadas.
Soube-se depois que que a sua atitude estava respaldada na ajudinha que o ministro Ribeiro Dantas, do STJ, prometera, concedendo-lhe a liberdade em dezembro de 2015. Segundo Delcídio do Amaral, senador cassado, que participou da trama com a Dilma, o ministro foi nomeado para aquele tribunal pela presidente com a finalidade de soltar o empresário. Descoberta a conspiração, Marcelo foi condenado a 19 anos de cadeia e hoje trabalha na delação premiada para amenizar a sua pena. O ministro denunciado pelo senador perdeu apenas a relatoria do processo. Continua trabalhando sem ser incomodado. É o fim da picada.
Isso prova que a justiça do Sergio Moro não é a mesma justiça do resto do Brasil, normalmente submissa ao poder e a conchavos políticos. A do Moro prende e condena; a outra, solta.
A liberdade desses senhores do crime só evidencia uma coisa: no Brasil de hoje existem duas justiças: a que prende e a que solta. A de Curitiba, liderada pelo juiz Sérgio Moro, que continua tentando botar o país nos eixos, mesmo sob pressão dos políticos e dos empresários poderosos, prende. A outra justiça, que faz vista grossa para os ladrões do dinheiro público, solta. De acordo com a decisão do ministro Nefi Cordeiro, do Superior Tribunal de Justiça, os presos deveriam deixar o presídio de Bangu com tornozeleiras, mas um simples detalhe impediu que isso acontecesse: o Rio de Janeiro, falido, não tem dinheiro para comprar as peças eletrônicas. É o fim da picada.
Na verdade, o prestígio de Cachoeira é que levou a liberdade dos outros presos. Condenado a mais de trinta anos, ele continua livre. Quando esteve preso em outros escândalos não fez por menos. Contratou o advogado Thomáz Bastos, ex-ministro da Justiça, por 30 milhões de reais para cuidar da sua causa. Demitiu-o depois que teve o primeiro habeas-corpus negado. O contraventor, no Brasil, ainda é o criminoso que mais goza da intimidade da Justiça. No Rio, por exemplo, eles vivem dentro e fora do presídio, na verdade, mais fora do que dentro. A jogatina continua solta pela cidade e os bicheiros trabalham em liberdade, muitos supervisionados pela própria polícia. Não é de se admirar, portanto, que ser preso com um contraventor é garantia de liberdade rápida.
A coragem do juiz Sergio Moro e de alguns abnegados procuradores do Ministério Público é um caso isolado na justiça brasileira, porque a prática é a justiça ser benevolente com os acusados de delitos. Lembra da cara que o Marcelo Odebrecht fez quando depôs em Curitiba para alguns deputados de uma CPI fajuta da Câmara dos Deputados? Foi a mesma do Cachoeira. Debochou dos parlamentares e ironizou alguns deles, quando disse que não era da sua índole fazer delações premiadas.
Soube-se depois que que a sua atitude estava respaldada na ajudinha que o ministro Ribeiro Dantas, do STJ, prometera, concedendo-lhe a liberdade em dezembro de 2015. Segundo Delcídio do Amaral, senador cassado, que participou da trama com a Dilma, o ministro foi nomeado para aquele tribunal pela presidente com a finalidade de soltar o empresário. Descoberta a conspiração, Marcelo foi condenado a 19 anos de cadeia e hoje trabalha na delação premiada para amenizar a sua pena. O ministro denunciado pelo senador perdeu apenas a relatoria do processo. Continua trabalhando sem ser incomodado. É o fim da picada.
Isso prova que a justiça do Sergio Moro não é a mesma justiça do resto do Brasil, normalmente submissa ao poder e a conchavos políticos. A do Moro prende e condena; a outra, solta.
Parabéns pra você
O ex- senador e minsitro Aloizio Mercadante é o mais novo aposentado do Brasil. Por seus exaustivos nove anos de trabalho para o país nas refrigeradas instalações do Congresso, vai receber proporcionalmente R$ 15.400 por mês, o que deve garantir a sobrevivência da família com um PF diário ad eternum.
Dado novo para a perícia técnica do sinistro petista
Quem poderia imaginar uma eleição para a presidência da Câmara dos Deputados em que PT e PSDB não apresentassem candidato e o PMDB colocasse o seu no freezer? Pois foi isso que aconteceu quarta-feira sob as vistas de todos. Os grandes partidos e as grandes bancadas fizeram olhar de paisagem impressionista, levemente turbada. Preferiram agir nos bastidores, com parelheiros previamente selecionados para cumprir o mandato tampão.
Alguém poderá dizer que esses partidos não se inscreveram na disputa porque uma vitória por seis meses não suscitou interesse. É uma explicação, mas não considero suficiente. Pouco tempo atrás, bastava alguém jogar no ar a pergunta "Quem quer ser...?" e as mãos petistas, tucanas e peemedebistas se ergueriam antes do fim da frase. Fosse para o que fosse.
Para mim, a leitura mais convincente desse curioso episódio tem muito a ver com o esgotamento das principais legendas e reflete mudança em curso no fragmentado caleidoscópio das siglas em nosso país. Ou, numa analogia talvez melhor: bem antes da eleição de 2018, a escassez de frutas boas nas árvores mais visíveis do pomar vai mostrando que a safra, ou virá de fora, ou virá lá do meio do arvoredo. No que se vê por fora, quase tudo é fruto mermado ou bichado, que não vai encontrar comprador naquela feira eleitoral. É provável que esse fenômeno já se faça sentir no pleito municipal de outubro vindouro, apesar das idiossincrasias desse tipo de eleição, movida fortemente por afeições e desafeições locais.
Será mesmo, isso que sentimos, um sinal de mudança na direção dos ventos? O que, exatamente, está mudando? Creio que ainda é prematuro dizer. Em meio a tantos malefícios, percebe-se porém que há coisas boas acontecendo. Foi bom para o jogo político, por exemplo, que as fichas do PT tenham sido postas em Marcelo Castro, um peemedebista mais fajuto do que sua legenda. Foi melhor ainda que, somados seus 70 votos aos 22 de Luiza Erundina (PSOL) e aos 16 de Orlando Silva (PCdoB), esse funesto pacote totalize apenas 108 parlamentares no conjunto de 494 votantes. O nome disso é insignificância, principalmente se lembrarmos que incluindo um ano de Aldo Rebelo (PCdoB), o petismo presidiu a Câmara dos Deputados em oito dos últimos 14 anos. E note-se que nos biênios de 2009 a 2011 (Michel Temer) e 2013 a 2014 (Henrique Eduardo Alves) o PMDB presidiu a Casa com apoio e em acordo de rodízio com o PT.
Sim, o PT amargou no último dia 13 - pura coincidência! - mais do que uma derrota previsível. Colheu mais conteúdos para a perícia técnica de seu sinistro. Que ela sirva à reflexão de todos os partidos e, especialmente, de Sua Excelência, o eleitor.
Percival Puggina
Alguém poderá dizer que esses partidos não se inscreveram na disputa porque uma vitória por seis meses não suscitou interesse. É uma explicação, mas não considero suficiente. Pouco tempo atrás, bastava alguém jogar no ar a pergunta "Quem quer ser...?" e as mãos petistas, tucanas e peemedebistas se ergueriam antes do fim da frase. Fosse para o que fosse.
Para mim, a leitura mais convincente desse curioso episódio tem muito a ver com o esgotamento das principais legendas e reflete mudança em curso no fragmentado caleidoscópio das siglas em nosso país. Ou, numa analogia talvez melhor: bem antes da eleição de 2018, a escassez de frutas boas nas árvores mais visíveis do pomar vai mostrando que a safra, ou virá de fora, ou virá lá do meio do arvoredo. No que se vê por fora, quase tudo é fruto mermado ou bichado, que não vai encontrar comprador naquela feira eleitoral. É provável que esse fenômeno já se faça sentir no pleito municipal de outubro vindouro, apesar das idiossincrasias desse tipo de eleição, movida fortemente por afeições e desafeições locais.
Será mesmo, isso que sentimos, um sinal de mudança na direção dos ventos? O que, exatamente, está mudando? Creio que ainda é prematuro dizer. Em meio a tantos malefícios, percebe-se porém que há coisas boas acontecendo. Foi bom para o jogo político, por exemplo, que as fichas do PT tenham sido postas em Marcelo Castro, um peemedebista mais fajuto do que sua legenda. Foi melhor ainda que, somados seus 70 votos aos 22 de Luiza Erundina (PSOL) e aos 16 de Orlando Silva (PCdoB), esse funesto pacote totalize apenas 108 parlamentares no conjunto de 494 votantes. O nome disso é insignificância, principalmente se lembrarmos que incluindo um ano de Aldo Rebelo (PCdoB), o petismo presidiu a Câmara dos Deputados em oito dos últimos 14 anos. E note-se que nos biênios de 2009 a 2011 (Michel Temer) e 2013 a 2014 (Henrique Eduardo Alves) o PMDB presidiu a Casa com apoio e em acordo de rodízio com o PT.
Sim, o PT amargou no último dia 13 - pura coincidência! - mais do que uma derrota previsível. Colheu mais conteúdos para a perícia técnica de seu sinistro. Que ela sirva à reflexão de todos os partidos e, especialmente, de Sua Excelência, o eleitor.
Percival Puggina
Mandatários, não provoqueis a ira de vossos mandantes!
A maior parte da nação não ignora o estado calamitoso em que esta se encontra após mais 12 anos de domínio lulopetista. Fizeram e desfizeram quanto quiseram. Uma maioria no Congresso, comprada frequentemente, garantiu-lhe o senhorio da nau estatal, que, nesse longo período, em dimensões jamais vistas no Brasil, navegou ao bel-prazer dos que se assenhoraram do poder.
A vigilância do governo, estabelecida pela Constituição do país e confiada ao Parlamento nacional, foi posta a pique, levando de roldão a obrigação de dar contas ao povo da inteireza ou não dos atos governamentais praticados na esfera do Poder Executivo, e naufragou até o afastamento da presidente da República. Daí, iniciativas de comissões parlamentares de inquéritos nunca lograrem resultados durante o reinado lulopetista. Quebraram-se, pois, no plano de fiscalização do Executivo, os elos da mais importante ferramenta constitucional colocada pelos constituintes, em países civilizados, à disposição dos mandantes, em cujas mãos repousa a soberania do próprio Estado democrático.
Daí decorre o ineditismo dos sucessos ocorridos, só há pouco tempo submetidos parcialmente à ação do Judiciário. De um lado, os agraciados com a responsabilidade de representar os titulares do poder delegado; de outro, uma miríade de assaltantes que me lembram os versos de Manuel Bandeira: “Corro à floresta: entre miríades/ De vagalumes, junto aos troncos,/ Gênios caprípedes e broncos/ Estupram virgens hamadríades”.
Quem são os “gênios caprípedes e broncos”? Decerto os que se articularam para estuprar as “virgens hamadríades”, ou seja, os brasileiros à mercê dos “gênios caprípedes e broncos”. Quem são “as miríades de vaga-lumes” operosos? Os investigadores do Ministério Público e da Polícia Federal que abastecem o Judiciário com abundância de elementos informativos para abertura das respectivas ações penais e a aplicação das penas, tudo estritamente conforme a legislação penal, ao contrário do que assacam certos agentes públicos e privados da mais ousada conspiração contra o patrimônio popular acontecida em nosso país.
A nação, quase em uníssono, está cansada, mas não segura a justificada ira. Também, em comunhão com o povo espoliado, se torna integrante e co- titular dessa gigantesca lide, confiando em que, por meio dela, voltará a ter o patrimônio de que foi audaciosamente privada, ao lado de merecida punição.
Enquanto isso, a população, igualmente em maioria, manifesta, com os meios de que possa dispor, a indignação nacional. Leio, a propósito, em “O Globo”, o artigo de José Casado, que se inicia com a narração de um fato sucedido com o presidente do Supremo Tribunal Federal, emblemático do que vai Brasil afora, num restaurante de São Paulo. Narra o autor que, quando atravessava o salão, Sua Excelência ouviu uma voz feminina que o saudou: “Ô, ministro!”. Ele parou, sorriu e estendeu-lhe a mão. “Olá, como vai?” Ela respondeu ao gesto: “Parabéns. A sociedade brasileira congratula Vossa Excelência pelo julgamento do mensalão e por aumentar os próprios benefícios agora, neste momento social tão importante”. Conclui Casado, acrescentando: “Lewandowski percebeu a ironia, manteve o sorriso, e seguiu”.
Para jantar no mesmo restaurante do ministro, devia ser uma senhora de posses. Não obstante, mostrou que, como milhares de outras, ela sabe da disparidade entre a remuneração de outros servidores do setor público e a do Judiciário. E demonstrou que são sabidas e comentadas as gritantes diferenças.
A vigilância do governo, estabelecida pela Constituição do país e confiada ao Parlamento nacional, foi posta a pique, levando de roldão a obrigação de dar contas ao povo da inteireza ou não dos atos governamentais praticados na esfera do Poder Executivo, e naufragou até o afastamento da presidente da República. Daí, iniciativas de comissões parlamentares de inquéritos nunca lograrem resultados durante o reinado lulopetista. Quebraram-se, pois, no plano de fiscalização do Executivo, os elos da mais importante ferramenta constitucional colocada pelos constituintes, em países civilizados, à disposição dos mandantes, em cujas mãos repousa a soberania do próprio Estado democrático.
Daí decorre o ineditismo dos sucessos ocorridos, só há pouco tempo submetidos parcialmente à ação do Judiciário. De um lado, os agraciados com a responsabilidade de representar os titulares do poder delegado; de outro, uma miríade de assaltantes que me lembram os versos de Manuel Bandeira: “Corro à floresta: entre miríades/ De vagalumes, junto aos troncos,/ Gênios caprípedes e broncos/ Estupram virgens hamadríades”.
Quem são os “gênios caprípedes e broncos”? Decerto os que se articularam para estuprar as “virgens hamadríades”, ou seja, os brasileiros à mercê dos “gênios caprípedes e broncos”. Quem são “as miríades de vaga-lumes” operosos? Os investigadores do Ministério Público e da Polícia Federal que abastecem o Judiciário com abundância de elementos informativos para abertura das respectivas ações penais e a aplicação das penas, tudo estritamente conforme a legislação penal, ao contrário do que assacam certos agentes públicos e privados da mais ousada conspiração contra o patrimônio popular acontecida em nosso país.
A nação, quase em uníssono, está cansada, mas não segura a justificada ira. Também, em comunhão com o povo espoliado, se torna integrante e co- titular dessa gigantesca lide, confiando em que, por meio dela, voltará a ter o patrimônio de que foi audaciosamente privada, ao lado de merecida punição.
Enquanto isso, a população, igualmente em maioria, manifesta, com os meios de que possa dispor, a indignação nacional. Leio, a propósito, em “O Globo”, o artigo de José Casado, que se inicia com a narração de um fato sucedido com o presidente do Supremo Tribunal Federal, emblemático do que vai Brasil afora, num restaurante de São Paulo. Narra o autor que, quando atravessava o salão, Sua Excelência ouviu uma voz feminina que o saudou: “Ô, ministro!”. Ele parou, sorriu e estendeu-lhe a mão. “Olá, como vai?” Ela respondeu ao gesto: “Parabéns. A sociedade brasileira congratula Vossa Excelência pelo julgamento do mensalão e por aumentar os próprios benefícios agora, neste momento social tão importante”. Conclui Casado, acrescentando: “Lewandowski percebeu a ironia, manteve o sorriso, e seguiu”.
Para jantar no mesmo restaurante do ministro, devia ser uma senhora de posses. Não obstante, mostrou que, como milhares de outras, ela sabe da disparidade entre a remuneração de outros servidores do setor público e a do Judiciário. E demonstrou que são sabidas e comentadas as gritantes diferenças.
Coronel Saruê vestido de vaqueiro: Lula, de Juazeiro (BA) a Carpina (PE)
Na simbólica cidade de Carpina, na Zona da Mata pernambucana, a 45 quilômetros da capital , mas região de histórica pobreza nordestina, desde os poemas de João Cabral de Melo Neto, apareceu praticamente do nada, nesta singular semana de julho, o ex-presidente da República e fundador do PT, Luiz Inácio Lula da Silva.
De repente, não mais que de repente: trajando camisa vermelha e, na cabeça, um típico chapéu de couro dos vaqueiros do sertão. Estampa demodê e extemporânea que mal consegue disfarçar o ar cansado e o discurso esvaziado de um Quixote que perdeu o rumo, um Brancaleone à frente de exército roto e sem destino certo (salvo um encontro provável com o juiz Sérgio Moro, da Lava Jato, em Curitiba) ou do velho personagem de romance em busca do tempo perdido.
Mais constrangedor e patético impossível.
O cansaço e o abatimento se justificam, talvez, em razão das condições claramente adversas do ex-líder e senhor, quase absoluto, da política e do governo no Brasil, dos últimos 14 anos, nesta mais recente peregrinação ao Nordeste. Quase penúria, se comparada ao conforto, fartura e aconchego que antes recebia, dos grandes da política e dos negócios, onde pisava os pés. E dos afagos no ego que vinham dos pobres e pequenos nas ruas, nos comícios ou nas inaugurações.
Escrevo este artigo da Bahia, quando o viajante petista acaba de passar por Juazeiro, cidade baiana das minhas melhores lembranças de adolescente, à beira do Rio São Francisco. Onde o ex-presidente foi receber o título de cidadão honorário, proposto por um vereador do PT, e entregue sob as expensas da atual administração municipal do PC do B. O governador do Estado, Rui Costa (PT) o acompanha, a título de "inaugurar obras e assinar ordens de serviço". Ainda assim, a visita não passa "de um notável fiasco", na definição de um veterano radialista local, já aposentado da profissão, mas ainda experiente e antenado nas repentinas oscilações dos jogos de poder local, estadual e federal.
Provavelmente movido pela ilusão nostálgica de reviver momentos apoteóticos de outras passagens pelo lugar – por exemplo quando, na manifestação, um garoto carregado nos braços do pai agricultor é levado, por cima da multidão, para abraçar o visitante ilustre no palanque. Imagem que virou peça de propaganda crucial, no Nordeste, na campanha de reeleição ao Palácio do Planalto - o PT, Lula e seus aliados e propagandistas, que restaram, escolheram Juazeiro para abrir o roteiro desta nova viagem ao antigo celeiro seguro de votos.
Ledo e triste engano. Desta vez, os fatos e as imagens da visita, mais parecem o cenário do samba "Notícias de Jornal", de Chico Buarque, ainda fiel seguidor do viajante. "O lar não mais existe/ Ninguém volta ao que acabou/ Joana é mais uma mula triste que errou”. O cerco agora parece se fechar cada vez mais. Amigos ricos, antigos aliados poderosos e fundamentais da política e da propaganda estão na cadeia ou em palpos de aranha, com a polícia e a justiça no encalço. A afilhada Dilma Rousseff, o poste que Lula e o PT colocaram no Palálacio do Planalto, para facilitar o retorno do , está afastada do mando e se perde cada dia mais no labirinto em que se meteu e nas armadilhas que segue construindo para si mesma.
O poder se esfacela e se esvai como a areia fina da praia da Ilha do Fogo, na divisa da ponte entre Juazeiro (BA) e Petrolina (PE), no Velho Chico da novela do coronel Saruê, escorrendo entre os dedos. Para culminar, na madrugada desta quinta-feira, 14, o deputado Rodrigo Maia, do DEM do Rio de Janeiro, foi eleito para o lugar de Eduardo Cunha no comando da Câmara. Portanto, um adversário mais jovem, mais inteligente, mais hábil, com mais jogo de cintura político, inesperado e, provavelmente, mais devastador ainda para os planos futuros de Lula, Dilma e do PT. A conferir.
A notícia apanhou Lula no encerramento do périplo nordestino: Juazeiro, na Bahia, Petrolina, Carpina, Caruaru e Recife, em Pernambuco. "Foram essas as cidades escolhidas pelo ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva para retomar seu caminho de volta ao Palácio do Planalto, em 2018 ou até antes disso, caso a crise política desemboque em eleições antecipadas”, diz um site porta-voz do lulismo e do PT (investigado pela Lava Jato) na reportagem sobre a viagem, ilustrada com a imagem de Lula de camisa vermelha e chapéu de vaqueiro na cabeça. Em Carpina, voz trôpega e ar visível de cansaço, o petista ameaça e manda recado com as forças que lhe restam: "Se eles não sabem governar sem privatizar, eu sei”. Ou: “Se eles quis erem reduzir os direitos do povo brasileiro a pó, afastando de vez a companheira Dilma, eu digo: ”não me provoquem, porque eu posso voltar”.
Inevitável a comparação com o estágio atual da novela “Velho Chico”. O poderoso coronel Saruê, antigo senhor do poder, da política, das coisas e das pessoas, bradeja às tontas e em desespero, à medida que vai ficando cada vez mais só: sem poder mandar como antes nos velhos parceirose antigos aliados, no delegado, no juiz, no prefeito, abandonado pelo filho, pelo neto, atraiçoado pelo genro deputado e sem voz altiva nem mesmo com o jagunço, cão fiel de todas as horas. O desfecho se aproxima e não parece prenunciar boas coisas: para o Saruê e para Lula, a deduzir pelos sinais desta semana, incluindo a viagem do fundador do PT ao Nordeste, a eleição de Rodrigo Maia na Câmara, e a conferência do juiz Sérgio Moro, condutor da Lava Jato, em Washington. Mas isso é outra história, a conferir com o tempo, senhor da razão.
De repente, não mais que de repente: trajando camisa vermelha e, na cabeça, um típico chapéu de couro dos vaqueiros do sertão. Estampa demodê e extemporânea que mal consegue disfarçar o ar cansado e o discurso esvaziado de um Quixote que perdeu o rumo, um Brancaleone à frente de exército roto e sem destino certo (salvo um encontro provável com o juiz Sérgio Moro, da Lava Jato, em Curitiba) ou do velho personagem de romance em busca do tempo perdido.
Mais constrangedor e patético impossível.
O cansaço e o abatimento se justificam, talvez, em razão das condições claramente adversas do ex-líder e senhor, quase absoluto, da política e do governo no Brasil, dos últimos 14 anos, nesta mais recente peregrinação ao Nordeste. Quase penúria, se comparada ao conforto, fartura e aconchego que antes recebia, dos grandes da política e dos negócios, onde pisava os pés. E dos afagos no ego que vinham dos pobres e pequenos nas ruas, nos comícios ou nas inaugurações.
Provavelmente movido pela ilusão nostálgica de reviver momentos apoteóticos de outras passagens pelo lugar – por exemplo quando, na manifestação, um garoto carregado nos braços do pai agricultor é levado, por cima da multidão, para abraçar o visitante ilustre no palanque. Imagem que virou peça de propaganda crucial, no Nordeste, na campanha de reeleição ao Palácio do Planalto - o PT, Lula e seus aliados e propagandistas, que restaram, escolheram Juazeiro para abrir o roteiro desta nova viagem ao antigo celeiro seguro de votos.
Ledo e triste engano. Desta vez, os fatos e as imagens da visita, mais parecem o cenário do samba "Notícias de Jornal", de Chico Buarque, ainda fiel seguidor do viajante. "O lar não mais existe/ Ninguém volta ao que acabou/ Joana é mais uma mula triste que errou”. O cerco agora parece se fechar cada vez mais. Amigos ricos, antigos aliados poderosos e fundamentais da política e da propaganda estão na cadeia ou em palpos de aranha, com a polícia e a justiça no encalço. A afilhada Dilma Rousseff, o poste que Lula e o PT colocaram no Palálacio do Planalto, para facilitar o retorno do , está afastada do mando e se perde cada dia mais no labirinto em que se meteu e nas armadilhas que segue construindo para si mesma.
O poder se esfacela e se esvai como a areia fina da praia da Ilha do Fogo, na divisa da ponte entre Juazeiro (BA) e Petrolina (PE), no Velho Chico da novela do coronel Saruê, escorrendo entre os dedos. Para culminar, na madrugada desta quinta-feira, 14, o deputado Rodrigo Maia, do DEM do Rio de Janeiro, foi eleito para o lugar de Eduardo Cunha no comando da Câmara. Portanto, um adversário mais jovem, mais inteligente, mais hábil, com mais jogo de cintura político, inesperado e, provavelmente, mais devastador ainda para os planos futuros de Lula, Dilma e do PT. A conferir.
A notícia apanhou Lula no encerramento do périplo nordestino: Juazeiro, na Bahia, Petrolina, Carpina, Caruaru e Recife, em Pernambuco. "Foram essas as cidades escolhidas pelo ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva para retomar seu caminho de volta ao Palácio do Planalto, em 2018 ou até antes disso, caso a crise política desemboque em eleições antecipadas”, diz um site porta-voz do lulismo e do PT (investigado pela Lava Jato) na reportagem sobre a viagem, ilustrada com a imagem de Lula de camisa vermelha e chapéu de vaqueiro na cabeça. Em Carpina, voz trôpega e ar visível de cansaço, o petista ameaça e manda recado com as forças que lhe restam: "Se eles não sabem governar sem privatizar, eu sei”. Ou: “Se eles quis erem reduzir os direitos do povo brasileiro a pó, afastando de vez a companheira Dilma, eu digo: ”não me provoquem, porque eu posso voltar”.
Inevitável a comparação com o estágio atual da novela “Velho Chico”. O poderoso coronel Saruê, antigo senhor do poder, da política, das coisas e das pessoas, bradeja às tontas e em desespero, à medida que vai ficando cada vez mais só: sem poder mandar como antes nos velhos parceirose antigos aliados, no delegado, no juiz, no prefeito, abandonado pelo filho, pelo neto, atraiçoado pelo genro deputado e sem voz altiva nem mesmo com o jagunço, cão fiel de todas as horas. O desfecho se aproxima e não parece prenunciar boas coisas: para o Saruê e para Lula, a deduzir pelos sinais desta semana, incluindo a viagem do fundador do PT ao Nordeste, a eleição de Rodrigo Maia na Câmara, e a conferência do juiz Sérgio Moro, condutor da Lava Jato, em Washington. Mas isso é outra história, a conferir com o tempo, senhor da razão.
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