Um gênio não convence ninguém, o idiota simNelson Rodrigues |
domingo, 14 de abril de 2024
Mídias sociais produzem geração ansiosa
Acaba de sair nos Estados Unidos o novo livro do psicólogo social Jonathan Haidt, “The anxious generation”, pela editora Penguin. No livro, Haidt argumenta que o uso intensivo de mídias sociais rouba das crianças e dos jovens tempo de experimentação e de convívio, causa imediata da atual epidemia de ansiedade e depressão. Mas as raízes do problema, segundo ele, estão nas mudanças culturais que levaram os pais da Geração X a superproteger os filhos.
O livro de Haidt começou como blog na plataforma Substack. Lá, ele propôs a tese —naquele momento controversa —de que o grande aumento nos indicadores de depressão, ansiedade, automutilação e suicídio entre os jovens nos anos 2010 estava ligado ao uso de mídias sociais.
No blog, Haidt nota que, na literatura anterior correlacionando a incidência de problemas mentais ao uso de telas pelos jovens, as evidências eram fracas e contraditórias. Propõe então que não olhássemos para telas em geral (incluindo televisão, computador e videogame), mas apenas para as mídias sociais. Com o novo recorte, a correlação que surge é muito mais forte, especialmente se os dados forem filtrados por gênero, evidenciando o tamanho do problema entre as meninas.
No livro, Haidt desenvolve o argumento, sugerindo relação causal entre uso de mídias sociais nos smartphones e a epidemia de doenças mentais entre os jovens. Essa causalidade é reforçada pela coincidência temporal entre a difusão do uso de smartphone e a explosão nos indicadores de problemas mentais, pela forte correlação entre uso de mídias sociais e a incidência de depressão e ansiedade e pela ausência de uma explicação alternativa. Para Haidt, o uso intensivo de mídias sociais limita as interações sociais presenciais que produzem laços afetivos fortes e estimula comparações com padrões estéticos inalcançáveis, gerando ansiedade e depressão.
A segunda parte do livro tem como ponto de partida a inquietação explorada noutra obra de Haidt, escrita em parceria com Greg Lukianoff, “The coddling of the American mind” (Penguin, 2018). Nela, Lukianoff observa a consolidação de certa cultura universitária “segurista”. Por um lado, diz ele, a proibição nos campi de literatura acadêmica considerada ofensiva (por ser racista ou machista) e a criação de espaços seguros superprotegem os jovens, que não são mais expostos à diversidade e à pluralidade de pensamento. Além disso, a valorização de pequenas ofensas e microagressões pelos movimentos sociais funciona como uma espécie de terapia reversa — enquanto a função da terapia é minorar o trauma, os movimentos sociais terminam supervalorizando ofensas menores e, com isso, involuntariamente, amplificam traumas. É essa última intuição que instiga Haidt a investigar as raízes mais antigas deste etos superprotetor.
Haidt aponta uma mudança cultural significativa: os pais da Geração X (como o autor desta coluna) criaram seus filhos de maneira diferente daquela como eles mesmos foram educados. Nos anos 1980 e 1990, fomos criados com muita liberdade, brincando livremente, sem supervisão, desde os 7 ou 8 anos. Nossos filhos, porém, são superprotegidos, permanecem sob cuidadosa supervisão adulta praticamente até a adolescência.
Isso faz com que as crianças de hoje não desenvolvam a autonomia e não aprendam a lidar com riscos e perigos — habilidade essencial para enfrentar desafios maiores que surgem na vida adulta. Dados mostram que crianças mais velhas e adolescentes pararam de quebrar braços e pernas — pararam de explorar seus limites, desenvolvendo autonomia e senso de perigo. Qualquer um de nós consegue lembrar como jogávamos bola, brincávamos de pega e saíamos à rua sem a presença de adultos a partir da segunda infância. Nossos filhos, porém, só podem brincar e se locomover sob a supervisão constante de um adulto, ou nos sentimos negligentes.
O tempo que os adultos dedicam ao cuidado das crianças disparou na segunda metade dos anos 1990. Outros dados mostram acentuado declínio desde os anos 1990 na experimentação de atividades adultas pelos adolescentes — coisas como sexo, trabalho, consumo de álcool e direção de veículos. As mídias sociais viciantes que prendem os adolescentes à tela do celular e limitam suas interações sociais e afetivas são, para Haidt, apenas o apogeu da tendência anterior e mais profunda de superproteção e fragilização das crianças.
Ele propõe no final do livro um conjunto de ações ou reformas que poderiam minorar o problema. Por um lado, sugere proibir smartphones nas escolas e proibir o uso de qualquer mídia social até os 16 anos. Talvez sua proposta mais desafiadora seja o convite para que deixemos nossos filhos brincar sem supervisão adulta, exatamente como fazíamos até os anos 1980 e 1990.
O livro de Haidt começou como blog na plataforma Substack. Lá, ele propôs a tese —naquele momento controversa —de que o grande aumento nos indicadores de depressão, ansiedade, automutilação e suicídio entre os jovens nos anos 2010 estava ligado ao uso de mídias sociais.
No blog, Haidt nota que, na literatura anterior correlacionando a incidência de problemas mentais ao uso de telas pelos jovens, as evidências eram fracas e contraditórias. Propõe então que não olhássemos para telas em geral (incluindo televisão, computador e videogame), mas apenas para as mídias sociais. Com o novo recorte, a correlação que surge é muito mais forte, especialmente se os dados forem filtrados por gênero, evidenciando o tamanho do problema entre as meninas.
No livro, Haidt desenvolve o argumento, sugerindo relação causal entre uso de mídias sociais nos smartphones e a epidemia de doenças mentais entre os jovens. Essa causalidade é reforçada pela coincidência temporal entre a difusão do uso de smartphone e a explosão nos indicadores de problemas mentais, pela forte correlação entre uso de mídias sociais e a incidência de depressão e ansiedade e pela ausência de uma explicação alternativa. Para Haidt, o uso intensivo de mídias sociais limita as interações sociais presenciais que produzem laços afetivos fortes e estimula comparações com padrões estéticos inalcançáveis, gerando ansiedade e depressão.
A segunda parte do livro tem como ponto de partida a inquietação explorada noutra obra de Haidt, escrita em parceria com Greg Lukianoff, “The coddling of the American mind” (Penguin, 2018). Nela, Lukianoff observa a consolidação de certa cultura universitária “segurista”. Por um lado, diz ele, a proibição nos campi de literatura acadêmica considerada ofensiva (por ser racista ou machista) e a criação de espaços seguros superprotegem os jovens, que não são mais expostos à diversidade e à pluralidade de pensamento. Além disso, a valorização de pequenas ofensas e microagressões pelos movimentos sociais funciona como uma espécie de terapia reversa — enquanto a função da terapia é minorar o trauma, os movimentos sociais terminam supervalorizando ofensas menores e, com isso, involuntariamente, amplificam traumas. É essa última intuição que instiga Haidt a investigar as raízes mais antigas deste etos superprotetor.
Haidt aponta uma mudança cultural significativa: os pais da Geração X (como o autor desta coluna) criaram seus filhos de maneira diferente daquela como eles mesmos foram educados. Nos anos 1980 e 1990, fomos criados com muita liberdade, brincando livremente, sem supervisão, desde os 7 ou 8 anos. Nossos filhos, porém, são superprotegidos, permanecem sob cuidadosa supervisão adulta praticamente até a adolescência.
Isso faz com que as crianças de hoje não desenvolvam a autonomia e não aprendam a lidar com riscos e perigos — habilidade essencial para enfrentar desafios maiores que surgem na vida adulta. Dados mostram que crianças mais velhas e adolescentes pararam de quebrar braços e pernas — pararam de explorar seus limites, desenvolvendo autonomia e senso de perigo. Qualquer um de nós consegue lembrar como jogávamos bola, brincávamos de pega e saíamos à rua sem a presença de adultos a partir da segunda infância. Nossos filhos, porém, só podem brincar e se locomover sob a supervisão constante de um adulto, ou nos sentimos negligentes.
O tempo que os adultos dedicam ao cuidado das crianças disparou na segunda metade dos anos 1990. Outros dados mostram acentuado declínio desde os anos 1990 na experimentação de atividades adultas pelos adolescentes — coisas como sexo, trabalho, consumo de álcool e direção de veículos. As mídias sociais viciantes que prendem os adolescentes à tela do celular e limitam suas interações sociais e afetivas são, para Haidt, apenas o apogeu da tendência anterior e mais profunda de superproteção e fragilização das crianças.
Ele propõe no final do livro um conjunto de ações ou reformas que poderiam minorar o problema. Por um lado, sugere proibir smartphones nas escolas e proibir o uso de qualquer mídia social até os 16 anos. Talvez sua proposta mais desafiadora seja o convite para que deixemos nossos filhos brincar sem supervisão adulta, exatamente como fazíamos até os anos 1980 e 1990.
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