sábado, 19 de maio de 2018

Quero ufanar-me de meu país

Quero, mas está difícil. Baseando-se em dados do IBGE relativos ao primeiro trimestre do ano, o Estadão de ontem informou que “27,7 milhões de pessoas estavam desempregadas ou trabalhando menos do que poderiam ou gostariam, e 4,6 milhões de desalentados desistiram de procurar emprego, um recorde”. A recuperação econômica ainda é precária. As mazelas sociais permanecem. Nas ruas, muita insegurança; nas almas, muito rancor.

Contra esse pano de fundo sombrio, podemos afirmar sem temor de erro que o quadro eleitoral para outubro é um dos mais nebulosos de nossa História. Sem uma mudança expressiva, cujos contornos por enquanto ninguém vê, o pleito certamente realimentará as incertezas que rondam a economia. Essa afirmação pode ser esmiuçada em três níveis: o perfil dos candidatos, o formato da disputa que deles se pode esperar e, menos perceptíveis, certas características de nossa estrutura social – das “elites”, especialmente – que dificultam a articulação de uma saída mais consistente. 


No que toca aos candidatos, o ponto de partida só pode ser Jair Bolsonaro, que no momento mantém folgada dianteira nas pesquisas. O que sabemos sobre sua candidatura é muito pouco, mas suficiente para sustentar alguns juízos preliminares. Ex-militar, tendo passado para a reserva no posto de capitão, está para completar 30 discretíssimos anos na Câmara dos Deputados. Tenta capitalizar o sentimento de insegurança que grassa na sociedade – com muito sucesso, a julgar pelos 28% de intenções de voto que as pesquisas lhe têm atribuído. Nada em sua biografia sugere que tenha desenvolvido um pensamento econômico coerente. Um vago intervencionismo nacionalista, semelhante ao da maioria dos políticos. Um pensamento liberal ele com certeza nunca desenvolveu, mas o coordenador de seu programa, Paulo Guedes, é um dos economistas mais consistentemente liberais do País. A esse bico de pena é preciso acrescentar que Bolsonaro é apoiado por um partido inexpressivo, o que desde logo autoriza a premonição de graves dificuldades no Congresso, com o nosso famigerado “presidencialismo de coalizão”. Mas isso não é tudo. Bolsonaro também oferece ao distinto público a curiosa proposta de colocar um general no Ministério da Educação, como se um militar, só por ser militar, pudesse dar andamento adequado aos problemas educacionais brasileiros. Sua retórica política não é menos tortuosa. Poucos dias atrás, quando se divulgou que o general Geisel, na condição de presidente da República, autorizara pessoalmente a execução de integrantes da luta armada, Bolsonaro comentou: “Mas quem um dia não deu uma palmada no bumbum de uma criança?”.

Dado esse perfil, o que se discute é se Bolsonaro já está no segundo turno ou, ao contrário, se sua candidatura é autoincinerável. Não me arrisco a responder. Os adeptos mais afirmativos de sua candidatura, como antes sugeri, são os que cultivam o mito de um governo “forte”, capaz de acabar com a criminalidade num abrir e fechar de olhos, e outros, ideologicamente orientados, que o veem, finalmente, como o messias “de direita” pelo qual tanto ansiaram.

No polo oposto, que seria a “esquerda”, não sabemos quem será o candidato, nem mesmo se haverá alguma candidatura. Lula, inelegível, carreará votos para algum candidato nessa faixa, mas a quantidade de votos com certeza dependerá do candidato adotado pelo PT. O ex-prefeito Haddad não me parece ser o beneficiário ideal da transferência dos votos de Lula, em parte por seu perfil pessoal e em parte por não encarnar o radicalismo dos setores à esquerda do partido e dos chamados “movimentos sociais”.

O espaço deste artigo não me permite percorrer todos os nomes, mas dois – Marina e Ciro Gomes – me parecem merecer um comentário. Se é verdade que a situação tumultuária em que o País se encontra favorece uma candidatura “carismática”, eu, no lugar de Marina, já mudaria meus planos. Não a vejo com a autoridade, a habilidade e a energia necessárias para enfrentar nosso serpentário legislativo. Seu lugar, e aí ela poderia desempenhar um papel importante, é o Senado. Por questões totalmente distintas, digo mesmo opostas, penso que esse deveria ser também o objetivo de Ciro. Ele foi governador do Ceará e esteve ministro da Fazenda durante alguns meses, e não há dúvida de que tem “energia”. Mas sua energia beira o destempero e mesmo a truculência. Teria muito a ganhar com o convívio legislativo, mormente em nosso plácido ambiente senatorial.

O segundo nível de análise que sugeri no início é o formato da disputa. Estamos caminhando para uma eleição radicalizada ou para uma convergência de centro? Do que acima foi dito, é difícil extrair um cenário radicalizado, seja no sentido clássico de esquerda x direita como no de uma logorreia virulenta, daquelas que geram muito calor e pouca luz. O cenário de centro, inegavelmente mais conveniente à recuperação econômica, depende do crescimento de Geraldo Alckmin, outra incógnita.

Meu terceiro ponto diz respeito à estrutura das “elites” brasileiras. O PT passou anos e anos vituperando-as, pintando-as como um pequeno círculo de conspiradores, sem se dar conta de que o problema brasileiro é exatamente o oposto. É a inexistência de um ou mais grupos que mantenham sequer uma remota semelhança com o que os livros de sociologia designam como elites. Temos, isso sim, corporações, grupos de interesse, setores aguerridamente engalfinhados, cada um querendo sua parte no erário. Um naco da riqueza geral do País. Mas perde seu tempo quem imagina que tais grupos, mesmo percebendo o risco enorme a que o País está exposto, tenham disposição ou coragem para dialogar em busca de uma convergência. Estamos em maio. Eles têm pouco mais de quatro meses para me desmentir. Rezo para que o façam.

O rombo e os roubos da Previdência

Procuradores, contadores, advogados e até um juiz. Havia de tudo na famosa quadrilha que saqueou a Previdência nos anos 80 e 90. O bando inflava indenizações e usava nomes de pessoas mortas para desviar dinheiro do INSS. O prejuízo foi estimado em US$ 600 milhões — uma cifra superior a R$ 2,2 bilhões em valores atuais.

O escândalo teve direito a uma fuga cinematográfica. A fraudadora Jorgina de Freitas usou um jatinho para escapar da polícia e se esconder no exterior. Ela chegou a mudar a fisionomia com uma série de cirurgias plásticas. Depois de cinco anos foragida, foi localizada na Costa Rica e extraditada para o Brasil.


Jorgina perdeu a liberdade, as joias e os 60 imóveis que comprou com o dinheiro desviado. Mesmo assim, fez escola. Depois de sua derrocada, outras quadrilhas se organizaram para aplicar golpes e roubar os aposentados.

Na segunda-feira, o Ministério Público Federal denunciou 16 pessoas acusadas de pilhar a Previdência desde 2004. O esquema era parecido com o do século passado: também se baseava no uso de “fantasmas” para liberar benefícios indevidos. Entre as diferenças, estava o uso de telefones celulares, que não estavam ao alcance do bando de Jorgina.

Um dia depois de a Procuradoria denunciar os 16, os repórteres Patrik Camporez e Robson Bonin revelaram outra história suspeita no INSS. A autarquia ignorou um parecer técnico para contratar, por R$ 8,8 milhões, uma empresa com apenas dois funcionários. Até a semana passada, a sede da firma era usada como depósito de bebidas. Depois da visita do GLOBO, foi reformada às pressas para ganhar a aparência de um escritório.

A maquiagem não foi capaz de abafar o escândalo. Ontem o governo anunciou a demissão do presidente do INSS, Francisco Lopes. Ele foi o responsável pelo contrato com a RSX Informática.

O caso veio à tona no momento em que o Planalto tenta ressuscitar o debate sobre a Reforma da Previdência. O assunto é importante, mas quem não combate o roubo não deveria pedir sacrifícios para tapar o rombo. A gestão de Michel Temer entregou o comando do INSS ao PSC, o partido do Pastor Everaldo e do deputado André Moura.

Imagem do Dia


Tecnicamente, o PT virou organização criminosa

A prisão de José Dirceu pede uma avaliação técnica, não política. Tecnicamente, a volta do ex-chefão da Casa Civil para o xadrez consolida um quadro penal que faz do PT uma organização criminosa. Os petistas e seus devotos não gostam que se diga, mas isso não é uma opinião de repórter ou uma provocação dos inimigos da legenda. É o que diz a lei.


O parágrafo 1º do primeiro artigo da lei 12.850, de 2013, anota o seguinte: “Considera-se organização criminosa a associação de quatro ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a quatro anos…”

Além de Dirceu, estão em cana Lula, Antonio Palocci e o ex-tesoureiro petista João Vaccari. Todos colecionam condenações que, individualmente, ultrapassam em muito os quatro anos de cadeia. Não há muito o que discutir. Considerando-se a letra fria da lei, trata-se de uma organização criminosa. O PT não está só. Outras organizações partidárias bandidas estão sendo desmascadas. Um detalhe injeta ironia na conjutura: a lei 12.850, essa que traz a definição de organização criminosa, foi sancionada por Dilma Rousseff.

Estado assassino

Jair Bolsonaro é um apologista da tortura e nunca fez segredo disso. As barbaridades que ele diz são esperadas, ninguém deveria se surpreender quando – comentando as revelações da CIA sobre o Geisel – ele compara assassinato de Estado com palmadas no bumbum de um filho. Não se sabe se sua candidatura sobreviverá às barbaridades, mas, por enquanto, seus apoiadores e eleitores declarados podem sustentar que seu candidato, digam o que disserem, é sincero como nenhum outro.

O Bolsonaro folclórico é sua própria explicação. O que explica tanta gente disposta a elegê-lo, segundo as pesquisas de intenção de voto, sabendo o que sabe ou não querendo nem saber? Ninguém se incomoda que fomos um Estado assassino? Ninguém se importa que até hoje nenhum torturador foi condenado em primeira, segunda ou terceira instância no Brasil? A falta de memória ou de idade justifica a ignorância de muita gente sobre o que foram os anos da ditadura, mas a culpa disso é do silêncio dos militares sobre seu passado e seus crimes. Não se ouviu nem um “Desculpe, gente”.

Quantos se lembram ou ouviram falar do quase massacre no Riocentro, no governo Figueiredo, o último dos generais presidentes? Só não morreram centenas de pessoas no show que aconteceria no local porque a bomba que deflagraria a tragédia explodiu no colo do capitão que a acionaria. Qual foi a consequência do atentado, que seria atribuído aos comunistas? Nenhuma. Pelo resto do seu governo, Figueiredo teve que conviver com aquele elefante na sala, tendo que responder “Que elefante?” sempre que lhe pediam explicações. O Figueiredo já morreu, o capitão não sei, mas o elefante continua na sala, sem nunca ter sido explicado. E o elefante continua em silêncio. 

Hipocrisia da justiça suprema

Os supostos crimes são graves, não apenas em abstrato, mas em concreto, tendo em vista as circunstâncias de sua execução. Muito embora graves, esses fatos são consideravelmente distantes no tempo da decretação da prisão
Gilmar Mendes, ministro do STF


Um campo de joio com algum trigo

Nós, brasileiros, estamos, sim, com complexo de vira-lata. Claro que há luz no fim do túnel e recentemente a esperança aumentou, mas daí a acreditar que vamos mudar profundamente a política já é um passo largo demais… Mais do que nunca o eleitor desiludido se sente desarmado para usar seu voto para transformar os rumos do nosso país.

Convenhamos que esta é a primeira vez que estamos à beira de uma eleição decisiva e você nem sabe direito quem é candidato; imagina, então, saber quem deveria ganhar? Por outro lado, também é a primeira vez que você se deu conta da importância de acertar na escolha de quem vai decidir nosso destino nos próximos anos. E não estamos falando de destino de forma genérica e sim se você continuará a ter emprego, se sua empresa continuará a existir, se haverá um hospital para atender uma emergência ou se o tráfico de drogas continuará a dar cartas… 


Você agora sabe o que custa entregar seu dinheiro e seu futuro nas mãos de qualquer um que contrate uma boa campanha de marketing.

Outro dia você foi ao supermercado. Era uma comprinha de nada e custou R$ 41,12. No finalzinho da nota viu que mais de um terço da conta é puro imposto. Para onde vai esse dinheiro todo? Para a saúde, educação e segurança é que não é mesmo! Isso dá uma raiva danada!

E pensar que você também assinou o cheque em branco para esses governantes fazerem escolhas em seu nome, inclusive a de arrancar mais dinheiro do seu bolso! Você se sente traído de todas as formas. Não só uma vez, mas inúmeras vezes. Traído pelo Lula e pelo Aécio… Traído pelo Congresso que deu aval para tudo…

Às vezes a gente esquece que os deputados e senadores tem procuração nossa para criarem regras de conduta, autorizar orçamento e gastos em nosso nome. O pior é que você nem lembra mais quem nem por que você escolheu para deputado e senador.

A verdade é que a gente dá muita importância à escolha do Presidente e do Governador e pouca ou nenhuma para a escolha do legislativo. O Congresso deixou de ser o local de debate de ideias que refletem o pensamento da sociedade e passou a ser o palco do toma-lá-dá-cá para o Executivo aprovar o que bem entende, sempre em troca de cargos, poder e dinheiro. A triste conclusão é que demos carta branca para verdadeiros lobos em pele de cordeiro!

E agora, como separar o joio do trigo?

Houve um tempo em que, no campo de trigo, havia algum joio misturado. Hoje, há um campo de joio, onde você tem que procurar muito para encontrar algum trigo que ainda resiste… Este ano há um novo risco do Legislativo piorar.

No ano passado o TSE já havia alertado para a necessidade de se monitorar a atuação do crime organizado nas eleições, pois os bandidos dispõem de dinheiro ilícito e podem facilmente comprar votos para conquistar vagas de deputados. O Rio de Janeiro é um exemplo do risco grave que isso representa. A cidade que é o cartão de visitas do País permitiu a criação de um governo paralelo que penetrou as instituições e levou o crime para o coração do Estado.

Perto de um milhão de pessoas ali vivem em 850 comunidades sob o controle do tráfico, com o apoio e cobertura de uma parcela dos poderes executivo, legislativo e até do judiciário. O fuzilamento da vereadora Marielle é um exemplo de como o crime organizado e as milícias dominam a sociedade carioca, tornando o Rio de Janeiro a versão atual da cidade de Medellín, na Colômbia.

E como mudar essa rota com destino certo para o desastre? Separando o joio do trigo, porque ainda há trigo a ser salvo!

Você talvez não saiba como um deputado é eleito. Na maioria dos casos ele ganha um mandato muito menos pelo que ele pensa e muito mais pelo dinheiro que ele tem para comprar votos por meio dos cabos eleitorais e da venda de facilidades.

O momento mais crítico na escolha de candidatos é a última semana das eleições. O melhor é você tomar distância de quem oferece favores, emprego e principalmente dinheiro. Saiba identificar os cabos eleitorais que falam em nome do candidato. Muitas vezes são inocentes úteis que sequer sabem para quem estão trabalhando. Hoje o Google é um grande aliado do eleitor.

— Mas é só isso?

Você, eu e Brasil inteiro estamos em busca de pessoas que nos inspirem confiança e tragam um fio de esperança de que nosso país tem solução, ainda que esteja tão difícil encontrar o trigo nesse campo tomado pelo joio.