Em campanha, Jair Bolsonaro prometera compor um ministério técnico e enxuto. Tudo isso sem toma-lá-dá-cá. Eleito, foi perdendo o nexo aos poucos. Hoje, o critério marcante da composição de sua equipe é a ausência de critério. O time não é 100% técnico. A Esplanada de 15 pastas se encaminha para a marca de duas dezenas. E um pedaço do primeiro escalão foi encostado no balcão do baixo mercado da política.
Quando falava aos eleitores em ministros técnico, Bolsonaro dava a entender que refugaria indicações políticas. Súbito, escolheu três deputados do DEM: Onyx Lorenzoni (Casa Civil), Tereza Cristina (Agricultura) e Luiz Henrique Mandetta (Saúde). Nada a ver com o partido, alegou. Onyx é escolha pessoal. Tereza e Mandetta são apoiados por frentes parlamentares, não partidos. Hummm…
Antes que a plateia conseguisse entender qual é a diferença entre os parlamentares de uma frente e os congressistas de um partido, Bolsonaro entregou a pasta da Cidadania ao deputado Osmar Terra, ex-ministro de Michel Temer, filiado ao velho MDB. E acomodou no Ministério do Turismo o deputado Marcelo Alvaro Antonio, do seu PSL. O mesmo PSL que reclamou do excesso de DEM no time do capitão.
Além de Paulo Guedes (Economia) e Sergio Moro (Justiça), especialistas em suas respectivas áreas, o perfil técnico é mais visível, no fim das contas, na cota militar do ministério. O PFA, “Partido das Forças Armadas”, emplacou cinco ministros. Ocupa um espaço equivalente ao que foi destinado ao PT nos governos de Lula e Dilma. Ou ao MDB na gestão Temer. Com uma vantagem: nenhum dos ministros militares carrega na biografia acusações de assalto ao erário.
Há, de resto, uma outra categoria ministerial que não se encaixa nos critérios pactuados por Bolsonaro com o eleitorado. São os dois ministros da cota do polemista Olavo de Carvalho: Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Ricardo Vélez Rodríguez (Educação).
Assim, pode-se encontrar muita coisa no primeiro escalão do futuro governo de Jair Bolsonaro, exceto a lógica. Os fatos logo confirmarão a sensação de que o capitão, ao revelar o seu lado mais concessivo, aguçou o apetite da banda fisiológica do Congresso. Vem aí a guerra do preenchimento dos cargos do segundo escalão.
O deputado alemão Karsten Hilse, do partido populista de direita Alternativa para a Alemanha (AfD), raramente levanta a voz ou chama a atenção com um tom estridente, com comumente o fazem os líderes de sua legenda – Alice Weidel e Alexander Gauland.
Mas Hilse é não é menos radical. Ele é porta-voz da AfD para política climática – e diz não acreditar no aquecimento global. Seu objetivo é fazer com que a Alemanha deixe o Acordo Climático de Paris. De preferência já na COP24, conferência internacional que começa na próxima semana em Katowice, na Polônia.
Ele apoia as empresas de exploração de carvão que restaram no leste alemão e que em breve serão fechadas porque prejudicam o clima. E ele quer que os alemães parem de pensar sobre como podem combater as mudanças climáticas provocadas pelo Homem. Porque, para ele, os seres humanos não são culpados pelo aumento das temperaturas.
Para o político de 53 anos, partidos políticos tradicionais se uniram à mídia para criar uma religião ambiental irracional que força os cidadãos a pagar, em todo o mundo, por pecados climáticos imaginários.
"Especialmente na TV pública, não passa um dia sem que as pessoas sejam persuadidas de que são responsáveis pela catástrofe que está por vir e que, portanto, precisam ser boazinhas e prestar seu apoio às energias renováveis", disse Hilse à DW.
Da forma como ele vê, as mudanças climáticas se tornaram um substituto de religião. E, nessa visão de mundo, Karsten Hilse e seu partido são os iluministas ateístas e racionais. Em sua tentativa de convencer os outros dessa posição, Hilse desafia não apenas a política e a mídia, mas também a ciência.
A sede do Partido Verde alemão se encontra a poucos minutos de bicicleta do prédio do Bundestag em Berlim. Na coletiva semanal de imprensa, a copresidente dos verdes Annalena Baerbock afirmou que o ceticismo da AfD sobre as mudanças climáticas nada mais é do que uma contestação cínica sobre a ciência.
"A AfD não apoia a liberdade de pesquisa em nosso país. Não aceita que tenhamos resultados científicos em todos os setores climáticos, inclusive no debate sobre o clima empreendido por todos os cientistas do mundo, em vez disso, ela procura questionar a ciência", disse.
A afirmação de Baerbock não corresponde inteiramente à realidade: na verdade, há cientistas que rejeitam o conceito das mudanças climáticas causadas por humanos, mas eles são poucos e não são especialistas climáticos. Como os signatários da Petição do Oregon, de 2007, em que alguns pesquisadores colocam em dúvida as mudanças climáticas e que é considerada duvidosa.
A maior parte dos especialistas defende a ideia de que a humanidade precisa mudar seu modo de vida para evitar as mudanças do clima. No entanto, para Karsten Hilse, da AfD, a ciência "não é uma democracia" determinada por uma "maioria".
"Olhem para o caso de Copérnico, que foi o primeiro a dizer que a Terra não se encontra no centro do nosso Sistema Solar, mas o Sol", afirmou Hilse. "Quantos especialistas não disseram então: 'Você é louco?'", indagou o político populista de direita. "A ciência não tem nada a ver com a democracia."
Na verdade, o argumento de Hilse é falho: a teoria heliocêntrica de Copérnico acabou sendo aceita como correta, porque ele era um cientista mais competente que seus detratores, mas não porque não se deva, em princípio, acreditar em especialistas.
O fato de que até mesmo a Alemanha não deverá alcançar os seus próprios objetivos climáticos até 2020 é, para Hilse, um sinal da fraqueza desses "acordos não vinculativos". A conclusão da AfD é portanto: por que participar? Para os verdes, no entanto, esse é um motivo para persuadir o governo alemão a investir mais na proteção climática, em vez de desperdiçar tempo e energia em discussões com a AfD.
"A AfD quer abolir todo esse debate político, por isso não adianta tentar conversar com eles o tempo todo", disse Baerbock. "Em vez disso, temos que instar o governo alemão, que hoje infelizmente não cumpre as metas de proteção climática do Acordo de Paris, a ir mais adiante."
Embora a AfD seja, em primeira linha, um partido anti-imigração, talvez se pudesse dizer que Hilse é um lobo solitário sem chances, cuja visão de mundo confusa pudesse ser seguramente ignorada. Mas Hilse não está sozinho em seu partido.
Embora o ceticismo da legenda populista de direita sobre as mudanças climáticas tenha recebido pouca atenção até agora, com sua forma de agir, eles estão mudando as regras do jogo político. Hilse argumenta que seu único desejo é representar perspectivas alternativas e "deixar as próprias pessoas formarem uma opinião."
Baerbock, no entanto, vê isso como algo ameaçador: uma destruição dos fundamentos democráticos da ecologia moderna e que isso seria uma dupla vitória para os populistas de direita: "Entre os liberais e partes dos conservadores, diz-se agora subitamente: 'em consideração à AfD, não devemos falar muito sobre a política climática'", afirmou Baerbock à DW." Isso é absolutamente errado. Assim se faz o jogo dos populistas de direita."
E assim o populismo da AfD contribui para o fato de que a política climática alemã, que já perdeu muito em entusiasmo, se enfraqueça ainda mais.
A forma da água depende de seu estado físico. Líquida, conforma-se ao recipiente que a contém. Assim são os governos, dependem dos limites impostos por margens políticas. Sob Jair Bolsonaro, o governo federal vai assumindo a forma imposta pelas circunstâncias, a maior ou menor força do presidente eleito, de sua margem, maior ou menor, para exercer influência mais ou menos decisiva. Seu estilo.
Onde o presidente eleito não tem força — ou admite nada entender do assunto —, não se mete. Delega e outorga; concede aquilo a que tem chamado de “Carta Branca”. Nasce, assim, um “Posto Ipiranga”, onde se vai buscar tudo aquilo a que o presidente não tem resposta. É, de certo modo, anti Dilma, a presidente que sabia de tudo, interferia em tudo, até nos planos de voo dos pilotos do avião presidencial.
A postura de Bolsonaro, a princípio, talvez seja menos nociva, em certo sentido ao menos. A interferência diária, “a marcação em cima”, como se dizia de Dilma, pode criar um caos tanto quanto a falta de coordenação e a omissão. Leigo que dá ordem a médicos mata o paciente, ainda assim, presidente é presidente. E, na cultura brasileira, associa-se a ele toda a responsabilidade, todos os bônus e os ônus pelos resultados.
Pode-se argumentar que, a exemplo do que se dizia de Lula, o presidente não precisa ser um técnico e, talvez, nem deva ser, bastando que tenha sensibilidade política para agir no momento certo. Política é timing; essa habilidade é mesmo um dom, uma arte. Pode-se governar a partir disso. No mais, é saber de quem se cercar. Ouvi os conselheiros certos — o que também não parecia ser o caso de Dilma.
É isso que será testado em Bolsonaro, qualquer veredito a esse respeito, neste momento, será precipitação. Liderança não se dá em tese, a priori, em expectativa; ela se dá sob o fogo dos conflitos, nas batalhas. Liderança é sempre testada. E, como presidente da República, obviamente, Bolsonaro ainda não foi testado.
Mas, já se pode dizer que, em virtude das condições gerais do país e das características pessoais do futuro presidente, seu governo vai tomando contornos mais nítidos. Já se pode vislumbrar a forma de organização, que tende a ser fundada em centros com considerável autonomia, se não independentes. Em outros termos, vislumbra-se um governo organizado em várias unidades de Postos Ipiranga.
São cinco:
1) Posto Ipiranga Econômico”, sob governança de Paulo Guedes: trata-se de um centro feito à imagem e semelhança do futuro ministro; um super ministério da Economia, incorporando várias frentes: Fazenda, Planejamento e Orçamento, Indústria e Comércio Exterior, BNDES, Banco Central, Bancos oficiais. Além de exercer forte influência sob os ministérios da Agricultura, Minas e Energia, e Infraestrutura. Sua lógica é do liberalismo puro, radical e ortodoxo, com vários de seus membros oriundos da Universidade de Chicago. Além da questão fiscal, tende a se voltar para a diminuição do Estado, privatizações e fim de incentivos fiscais, subsídios, protecionismos; se voltará à transformações de longo prazo, com vistas à implantação de uma lógica de mercado nas mais diversas frentes. Com base na filosofia de que não se faz omeletes sem esmagaros ovos, abrirá diversas frentes de conflitos inevitáveis diante de propósitos assumidos já durante a campanha — e, a partir daí, pode mesmo perder os ovos;
2) “Posto Ipiranga do ‘Combate ao Crime’”, sob o julgamento de Sérgio Moro: muito mais que Justiça e Segurança, incorporará a Polícia Federal, o Coaf, a conexão com o Judiciário e o Ministério Público. Uma Lava Jato Turbo. Será a frente que buscará dar conta de desafios tão grandes quanto os econômicos. E foi, sobretudo, com essa pauta que Jair Bolsonaro foi eleito: ações incisivas e efetivas contra a corrupção, o crime organizado e a violência das ruas. Será daí que poderá brotar a mais célere — e cheia de pressão — das fontes de popularidade (ou desgaste) do governo. Moro organiza sua frente à sua imagem e semelhança, locando em cada posto-chave delegados do PF e promotores que devem implantar o clima e o estilo de “Curitiba”, no governo federal;
3)“Posto Ipiranga Militar”, sob o comando do futuro ministro da Defesa, general Fernando Azevedo e Silva: exercerá poder de moderação sob o governo. Note, “poder de moderação” e não “poder moderador” sobre Poderes e instituições. Até aqui, tem servido para conter qualquer tentação de politização sobre as FFAA, restringindo-as ao papel definido pela Constituição Federal, à parte de qualquer intenção de usá-las a outro propósito. Pode-se dizer que, até aqui pelo menos, os militares colocaram os civis para fora dos quartéis, ainda que os civis tenham levado militares ao governo;
4) Posto Ipiranga Ideológico”, sob hegemonia dos filhos do presidente, com influência de seu guru filosófico, além, é claro, da fiscalização e veto da bancada evangélica: está aí o núcleo de propaganda política e ideológica — o que Bolsonaro criticava no PT, com o sinal trocado. A partir do Itamaraty, do ministério da Educação e o futuro ministério da Cidadania, que deve incorporar Cultura, Esportes, Direitos Humanos e Desenvolvimento Social, tende a irradiarem-se os valores e crenças da direita globalistado trumpismo bolsonariano,do pentecostalismo. Evidentemente, abrirá guerrilhas contra valores e costumes do mundo moderno, despertando conflitos na área dos direitos e liberdades civis;
5)“Posto Ipiranga Político”, que deveria estar sob a liderança de Onyx Lorenzoni, futuro ministro-chefe de uma Casa Civil esvaziada que, pelo cheiro, tende a ser tutelada por militares da Reserva, como o futuro ministro do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno Ribeiro Pereira, e o futuro ministro Secretário-Geral da Presidência da República, general Carlos Alberto dos Santos Cruz: o lócusda queda-de-braço do bolsonarismo com o sistema político e os meios de comunicação tradicionais. Não por acaso, a Secretaria de Governo ficou sob comando de um militar, de modo não apenas a endurecer com a negociação fisiológica, como também inibi-la no nascedouro. Há aí muito da influência de Augusto Heleno e do vice, Hamilton Mourão, além de Bolsonaro: a visão disruptiva que o presidente eleito vocalizou durante suas quase três décadas, como parlamentar. Na reação do sistema político e do status quo do Legislativo, pode-se esperar muito barulho e turbulência vindo daí. Algumas derrotas em votações importantes, como, aliás, já tem ocorrido. Apenas ao final do primeiro ano de mandato é que se poderá avaliar quem ganhou e quem perdeu esse inevitável rali.
Resta saber se, com tantos centros, desafios e conflitos, governo será um todo uniforme; se as partes se somarão ou entrarão em disputa e conflito; se haverá coordenação central sob tantos polos de poder — sob a gerência do vice Mourão, com antigas atribuições da Casa-Civil —, a partir da autoridade do presidente da República. Se Jair Bolsonaro terá sensibilidade, habilidade e sagacidade para coibir vaidades, naturais crises de primas-donas,e arbitrar conflitos de verdade tanto no interior da equipe, quanto fora do governo. Resta saber se terá sucesso. Só o tempo dirá.
Há um lote pior no Brasil: é o dos que não querem ficar honestos nem daqui pra frente e gostariam que tudo continuasse a ser como sempre foi
Luís Roberto Barroso, ministro do STF
Pode parecer teoria conspiratória, mas vamos juntar algumas pontas, na base do livre pensar, para mostrar que tem muita gente em Brasília tentando armar conta a Lava Jato.
Primeira ponta: muitos políticos estabelecidos foram derrotados nas urnas. É chato, mas a categoria sempre teve um modo de acomodação: a nomeação para cargos públicos diversos, especialmente nas tão numerosas estatais e, mais recentemente, nas agências reguladoras. Aliás, dá para entender por que são necessárias tantas empresas ditas públicas.
De 2016 para cá, entretanto, surgiu um grande obstáculo, a Lei de Responsabilidade das Estatais. A norma proíbe que dirigentes partidários e parentes de políticos com mandato sejam nomeados para a presidência, diretorias e cargos em conselhos das estatais.
A lei havia sido uma reação à Lava Jato, que flagrou justamente o escândalo das nomeações políticas. E mais recentemente, houve um avanço, um projeto de lei, apresentado na Câmara, que estende a proibição para as agências reguladoras.
Pois então, na tramitação desse projeto, deputados conseguiram uma proeza. Com uma manobra de bastidor, inverteram os termos, de proibição para permissão, e ainda incluíram as estatais. Ou seja, aprovaram um texto que simplesmente libera total as indicações políticas para qualquer empresa ou agência.
A jogada ainda não está concluída, pois o projeto ainda tem que passar pelo Senado. Mas sobram informações mostrando que a Casa, onde foi maior o número de parlamentares derrotados, está, digamos, muito propensa a seguir a manobra da Câmara.
Argumentam que a lei não é razoável, é muito severa, exagerada, pois o político ou seu parente podem ser um bom gestor. Podem, e a lei é mesmo exagerada.
Mas isso porque a corrupção foi muito mais exagerada.
A segunda ponta: de nada adiantará liberar as indicações políticas se as estatais forem privatizadas. Claro, não?
Vai daí, acumulam-se as restrições administrativas e legais às privatizações. O ministro Ricardo Lewandowski, por exemplo, com uma liminar, derrubou pontos de uma lei que regula a gestão e, pois, a venda de estatais. Para o ministro, para cada estatal a ser privatizada, é preciso uma lei específica votada pelo Congresso.
Não basta, portanto, uma lei geral de desestatização, como era a norma. Mesmo pequenas subsidiárias precisam de lei específica.
Trata-se de liminar, decisão provisória de um ministro. Ainda precisa ser debatida e votada no plenário do STF. A liminar é de junho último e não há o menor sinal de que será incluída na pauta do tribunal.
O ministro Lewandowski justificou seu voto dizendo que era preciso conter a “crescente vaga de desestatizações”.
Não há propriamente uma onda de privatizações, mas o tema está na pauta nacional por uma razão simples: governos estão quebrados, estatais em crise, de modo que vender ativos não é uma opção ideológica, mas uma necessidade econômica.
Por toda parte, porém, vão surgindo obstáculos. A Eletrobras tem ainda duas subsidiárias que são um poço de prejuízos, as do Amazonas e de Alagoas. Não consegue privatizar e assim vai passando a conta para os contribuintes. Mas se mantêm os cargos.
Terceira ponta da armação contra a Lava Jato: o indulto de Natal concedido pelo presidente Temer em 2017. Generoso, tira da cadeia condenados por corrupção que tenham cumprido pequena parte da pena. Nomes ilustres que seriam beneficiados: Eduardo Cunha e Antonio Palocci.
Partes dessa lei do indulto foram suspensas por liminar do ministro Luís Roberto Barroso – e o caso agora está no plenário do STF.
Esta coluna foi fechada antes da conclusão do julgamento, mas o que está em debate vai além. A questão é: pode o presidente, que tem a prerrogativa de indultar, conceder o benefício aos criminosos de colarinho branco?
Eles podem não ser violentos no sentido de que não mataram ninguém. Mas roubar dinheiro público não seria uma violência social ainda mais grave?
E, resumindo, é ou não é uma armação?
Em 1988, durante a Assembleia Constituinte, de repente encontrei no Salão Verde da Câmara o lendário jornalista Barbosa Lima Sobrinho, presidente da Associação Brasileira de Imprensa. Ele disse que precisava encontrar com o senador Jarbas Passarinho (PDS-PA) e me convidou para ir junto. Durante a conversa, o parlamentar paraense fez uma curiosa revelação pessoal. Afirmou que um dos maiores problemas do político é a própria família, cujos integrantes sempre pressionam pedindo emprego ou favores para eles mesmos ou para parentes e amigos. “É um inferno”, desabafou. E realmente a família pode ser um problema para os políticos, como está acontecendo agora com o presidente eleito Jair Bolsonaro.
Os filhos dele – Eduardo, Flávio e Carlos – Bolsonaro são muito mal educados. Comportam-se como se fossem porta-vozes do governo. É uma esculhambação familiar inaceitável num país em que nepotismo é proibido.
Os rebentos do primeiro casamento de Bolsonaro, que está no terceiro matrimônio e tem mais dois filhos, Jair Renan e Laura, precisam ser contidos a qualquer custo, porque estão causando problemas ao futuro governo, que tem de se acertar internamente para conquistar respeito externo.
Depois de o presidente Bolsonaro ter recuado no caso da embaixada em Jerusalém, chutando a decisão para janeiro, e depois de o vice-presidente, general Mourão, ter dito que o assunto precisa ser repensado, porque o Brasil não pode se arriscar a fazer parte da rota do terrorismo islâmico, um dos filhos de Bolsonaro volta a atiçar o tema.
Nesta terça-feira, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), durante visita aos EUA, fez questão de declarar que a transferência da embaixada para Jerusalém é uma decisão tomada. “Não se sabe ao certo a data, quando ocorre, mas temos a intenção… A questão não é perguntar se vai, é perguntar quando vai”, disse Eduardo Bolsonaro, cheio de certezas.
Afinal, quem manda nesse governo? É uma pergunta importante e que precisa de resposta. O presidente eleito Jair Bolsonaro recebeu nesta quarta-feira, a visita do embaixador de Israel, Yossi Shelley, na Granja do Torto, mas não informou o assunto do encontro. Ou seja, mantém reserva sobre o polêmico assunto da mudança da embaixada, mas seu filho Eduardo tem outra visão do problema.
É claro que se trata de nuvem passageira, porque Eduardo Bolsonaro é deputado federal e deverá passar a cuidar do próprio mandato, espera-se. Da mesma forma, aguarda-se que Flávio tome posse como senador e arranje o que fazer, enquanto o terceiro filho Carlos é vereador no Rio de Janeiro e também precisa fazer jus à generosa remuneração que o povo lhe paga.