terça-feira, 12 de setembro de 2017

Lula, o Maluf da esquerda

A confissão de Antonio Palocci acaba com Lula? Bem, acho que dá para dizer que ela não ajuda o ex-presidente, mas me parece precipitado afirmar que encerre a carreira política do líder petista, que já conseguiu livrar-se de situações que pareciam impossíveis.

O primeiro ponto a considerar é que a bomba lançada por Palocci ainda está no terreno das declarações. O que ele diz tem peso por vir de quem vem, mas não chega a ser um "batom na cueca" como o vídeo de Rocha Loures com a mala de dinheiro.


Mais importante, a narrativa que Lula vinha usando para explicar seu envolvimento na Lava Jato —"tudo não passa de perseguição política promovida pelas elites que não querem ver a vida dos pobres melhorar"— pode, sem grandes malabarismos, acomodar a transformação de Palocci: depois de sofrer meses de "tortura psicológica" ao ser mantido injustamente na cadeia, ele desabou e agora acusa o ex-presidente apenas para deixar o cárcere.

Isso basta para que os petistas convictos, determinados a absolver o ex-presidente de qualquer pecado, continuem a crer na inocência de seu líder. A ideologia não precisa de mais do que um fiapinho de verossimilhança para nele agarrar-se até o fim.

A questão é que nem todo o mundo é igualmente ideológico. O grau com que as pessoas se prendem ao discurso de partidos (e religiões) segue uma distribuição normal, sendo que só uma minoria se mostra invulnerável a evidências empíricas contrárias a suas inclinações.

A multiplicação dos delatores que entregam o ex-presidente e das situações que ele próprio não consegue explicar a contento, um processo que teve início em 2005, tende a tornar Lula cada vez mais dependente de uma militância ideológica —exatamente o contrário da guinada para o centro que o elegeu em 2003. Minha impressão é que ele vai se transformando numa espécie de Maluf da esquerda.

Os privilégios do STF

O Supremo Tribunal Federal é o guardião da Constituição (artigo 102). Diz a ministra Cármen Lúcia, no relatório de atividades de 2016, que buscou “racionalizar o gasto de dinheiro público.” Será? Dinheiro não faltou. Em 2016, a Corte recebeu R$ 554.750.410,00. E achou pouco. O pedido inicial era de R$ 624.841.007,00. Desta fortuna, R$ 206.311.277,11 foram reservados ao pagamento do pessoal ativo. E mais R$ 131.300.522,83 para os aposentados e pensionistas. São 1.216 funcionários ativos (554 com função gratificada), 306 estagiários e 959 terceirizados. Há variações nos dados mas o total geral não é inferior a 2.450, o que dá a média de 222 funcionários por ministro. Fica a preocupação de que todos os funcionários não podem comparecer aos locais de trabalho sob pena de colocar em risco as estruturas dos prédios.

Somente entre os funcionários terceirizados (gasto total de R$ 5.761.684,88) é possível encontrar incríveis distorções. É de conhecimento público que algumas sessões são tensas, mas como explicar a existência de 25 bombeiros civis? E as 85 secretárias, média de oito por ministro? Vivemos uma crise de segurança, mas não é exagero a existência de 293 vigilantes? Somos um país cordial mas lá foi levado ao extremo. São necessárias 194 recepcionistas? Divulgar as ações é importante, mas são precisos 19 jornalistas? Com a informatização, como justificar 29 funcionários cuidando da encadernação? Encadernam o quê? Limpar os prédios é importante. Mas será que o TOC também atingiu o STF? É a única conclusão possível tendo em vista constar na folha de pagamentos 116 serventes de limpeza. A boa etiqueta manda receber bem os convidados, mas pagar a 24 copeiros e 27 garçons não é um pouco demais? Para que oito auxiliares em saúde bucal? É um tribunal ou um consultório odontológico? Preocupar-se com a infância é meritório, mas como justificar 12 auxiliares de desenvolvimento infantil? E os 58 motoristas (ao custo anual de R$ 3.853.543,36)? Sem esquecer os sete jardineiros, seis marceneiros e os dez carregadores de bens — bens? Quais? A imagem da Corte anda arranhada. Esta deve ser a razão para pagar a cinco publicitários. Estes são apenas alguns exemplos entre os milhares de funcionários terceirizados ou concursados que nós pagamos todo santo mês.

Imagem relacionada

A casta trabalhadora é muito bem tratada. O programa Viva Bem patrocinou cursos de ioga, massagem laboral e oficina de respiração. Somente com assistência médica e odontológica foram gastos R$ 15.780.404,89. Ao auxílio-moradia, uma espécie de Minha Casa Minha Vida da Corte, foram reservados R$ 1.502.037,00. Para ajuda de custo (ajuda de custo?) R$ 1.040.920,00. Preocupado com a educação pré-escolar, a Suprema Corte destinou R$ 2.162.483,00. Mas, como ninguém é feliz de barriga vazia, não foi esquecida a alimentação: R$ 12.237.874,00. Preocupados com a vida eterna e com o futuro, suas excelências alocaram R$ 204.117,00 para auxílio-funeral e auxílio-natalidade. Com tantas benesses, dá para entender por que o programa “educação para aposentados” teve apenas dois participantes.

Pesquisando no relatório, alguns gastos de manutenção chamam a atenção, como a rubrica no valor de R$ 1.852.355,49 destinada às reformas e manutenção. O transporte não foi esquecido. São 87 veículos (dos quais três caminhões) que representam um custo de manutenção de R$ 5.420.519,10 (só de lavagem foram gastos R$ 109.642,48). Transparência é um dever constitucional, mas reservar R$ 32.236.498,26 para este fim não é um exagero? Em ações de informática foram torrados R$ 10.512.950,00. Em segurança institucional — a expressão é do relatório — foram alocados R$ 40.354.846,00. Nesta rubrica é possível concluir que a senhora ministra quis adotar o pleno emprego: “a meta física prevista era a manutenção de 487 postos de trabalho. Devido às restrições orçamentárias em 2016, houve necessidade de redução de postos de trabalho vinculados a vários contratos, sendo mantidos 404 postos.” Sim, apenas 404 pessoas para cuidar da “segurança institucional”. Poucos?

Mas, devemos reconhecer, o STF tem seu lado ONG. O setor de “responsabilidade social” organizou a exposição “Eu catador”. Segundo o tribunal, a “mostra de fotos produzidas por catadores de lixo que trabalham no aterro da Cidade Estrutural aconteceu no período de 18 a 25 de novembro de 2016 e pretendeu incentivar a reflexão crítica e sensibilizar a toda a Comunidade do Supremo Tribunal quanto ao impacto do lixo que produzimos.” Parabéns! Em tempo: o relatório informa também que a Corte vem reduzindo o consumo de água.

Nota-se também o excesso de viagens dos senhores ministros. Alguns se ausentaram do trabalho por duas semanas consecutivas. Isto pode explicar que somente 3.373 decisões tenham sido tomadas no plenário contra 102.900 monocráticas. Cabe indagar se o STF é formado por 11 ministros ou temos 11 tribunais federados em um mesmo local? Cada magistrado julga, em média, 10.675 processos. Se subtrairmos as férias forenses, os finais de semana, os feriados prolongados, as viagens nacionais e internacionais, é provável que suas excelências tenham realizado, com louvor, cursos de leitura dinâmica.

Porém, o relatório trouxe três boas notícias. Por falta de recursos orçamentários foram adiadas as construções do centro de treinamento e capacitação de servidores, de mais um anexo e da ampliação da garagem do Anexo II. Tudo orçado — inicialmente — em R$ 1.338.640,00. Resta parodiar o belo hino do Santos Futebol Clube: “nascer, viver e no STF morrer, é um privilégio que nem todos podem ter.”

Marco Antonio Villa

Delírios e delícias da casta

Volta e meia vem gente reclamar de que não dá mais para olhar o Brasil na base do “nós contra eles”. Só que essa crítica não considera a desigualdade de oportunidades em uma sociedade de classes como a nossa, com ínfima mobilidade social.

Não há também a percepção de que o comportamento de muitos agentes públicos que repudiam como “artificial” esse conflito contribui para... aprofundá-lo.

O Brasil tem 13 milhões de desempregados, 3 milhões retornando à miséria e 83% dos empregados formais recebendo até três salários mínimos. Acrescente-se a isso a taxa de homicídios de jovens até 29 anos, que aumentou 17,2% entre 2005 e 2015, sendo 71% das vítimas negros (fonte: Atlas da Violência).

Por trás das estatísticas, há pessoas sofrendo e morrendo: uma tragédia social no Brasil profundo, das margens. Brasil excluído e esquecido, anônimo.

Resultado de imagem para casta política charge

Em boa parte das elites, a insensibilidade. Cito exemplos, alguns quase que de coluna social: face a essa realidade, é razoável uma farta comitiva oficial se hospedar em hotéis de altíssimo luxo, quando de viagens ao exterior?

É aceitável ter tantos membros dos Três Poderes da República recebendo, a cada mês, quatro ou cinco vezes o teto constitucional?

É compreensível destacados membros do Legislativo gastarem mais de mil reais em uma gravata de grife ou R$ 350 para aparar os bigodes?

Dirão, com razão, que alguns desses episódios são menores, meros hábitos aristocráticos possibilitados por riqueza familiar ou direitos adquiridos por mérito.

Mas esses procedimentos (ou emolumentos) sinalizam o abismo entre dois mundos, ainda mais quando praticados por agentes públicos: “nós” x “eles”. Guardam mesmo certa relação com os escandalosos R$ 51 milhões de Geddel Vieira Lima, ex-articulador político de FHC, ex-ministro de Lula, ex-diretor jurídico da Caixa Econômica Federal de Dilma, ex-homem-forte do presidente postiço Temer... E com a ascensão do império JBS, proteinado por propinas.

Nesse mundo se esbanja o que falta para as políticas públicas para as maiorias.

Tudo isso se inscreve na nossa cultura de casta, de elitismo patrimonialista, de histórica distância entre os que governam e os que são governados.

Nos palácios do poder, o “costume” é olhar para o próprio espelho, e não para a praça, para a sociedade, razão e sentido da função pública.

Para além de todas as reformas substantivas tão necessárias quanto distantes da agenda atual, é preciso também uma mudança radical de postura de quem está ocupando ou busca ocupar cargos no Estado Brasileiro. Sob pena de cada vez mais os governados não se reconhecerem nos governantes e, assim, os repudirarem.

Nunca é demais relembrar a exortação do papa Francisco, inspirado, como ele mesmo disse, no exemplo despojado de Pepe Mujica, ex-presidente do Uruguai: “quem tem apego demais às coisas materiais, gosta de dinheiro, de banquetes exuberantes, de mansões suntuosas, de trajes refinados, de automóveis de luxo, eu aconselho que reze para que Deus o livre dessas ataduras e, por favor, não se meta em política – nem no seminário!”.

O celular não é barato

Um amigo inglês levou a filha às compras numa famosa loja de "fast fashion" em Londres. Depois de vasculhar a loja inteira, ela entrou no provador com uma pilha imensa de roupas.

Saiu de lá toda satisfeita, mas disse que não ia comprar nada. O pai só foi entender o que aconteceu mais tarde.

A adolescente tinha tirado selfies vestindo todas as roupas de que gostou e publicado as imagens nas suas redes sociais.

Esperou os comentários das amigas para só então decidir a compra. Aí voltou ao pai para pedir o cartão de crédito.

Entrou no site da marca, que tem música e design como os da loja física que estiveram, e comprou as roupas que queria. A mercadoria chegou num embrulho caprichado que tinha a cara e até o cheiro da loja.

Esse é o mundo em que vivemos. As barreiras entre o on e o off-line foram derrubadas faz tempo do nosso dia a dia.

16 Ilustrações chocantes que vão expandir a sua mente na hora | SOS Solteiros

O planeta já tem 5 bilhões de usuários de celular conectados à internet, dos quais cerca de 2 bilhões compram on-line. Até 2025, todos os habitantes da Terra terão acesso à web.

No Brasil, o número de pessoas que compram on-line cresce cerca de 40% ao ano. Dos conectados à web, 80% pesquisam on-line e compram nas lojas físicas, enquanto 62% experimentam os produtos nas lojas e compram on-line.

Para a pessoa física, portanto, não existe divisão entre mundo digital e mundo off-line, existe apenas o mundo em que elas vivem.

Para muitas pessoas jurídicas, porém, existe mundo digital sim, mas só que é um outro mundo —com exceção daquelas empresas que já nasceram digitais, como Mercado Livre, Dafiti, Spotify, Amazon, Uber...

No Brasil da crise, tendo que trocar turbina com o avião voando, o digital muitas vezes aparece como projeto experimental. Ele se torna uma vontade, quando deve ser uma necessidade da empresa.

O digital é uma cultura que a organização tem que abraçar, mas muitas vezes vira um departamento.

É como dizer que no corpo tem um departamento de oxigênio.

Confinado num departamento, o digital tem dono, orçamento, meta e marketing próprios. E o cara que cuida dele geralmente não gosta dos outros chefes e vice-versa. Isso acaba incitando mais competição do que cooperação.

Com a crise impondo foco mais no tático e no curto prazo, esse dilema fica pior, pois implementar cultura nova e mudar hábitos exigem muito investimento.

O digital é complexo. Ele requer disciplina, integração e recursos. São muitas variáveis e decisões em tempo real. E, se já não há dúvida de que o digital funciona, isso não quer dizer que ele seja barato. É aquela área em que nunca se falou tanto do futuro e se praticou tanto o passado.
Investir no digital não deve ser guiado por corte de custo, pela vontade de baratear.


Se o futuro é digital, ele deve ser investimento ou despesa na empresa? Se o futuro é digital, quanto do seu tempo é gasto nele? Se o futuro é digital, quem está pensando nisso na organização?

A teoria todo o mundo já sabe, é só dar um Google. Mas a prática é diferente. Não há formula universal, tipo "one size fits all".

A teoria está aí para todos estudarem. É como na saúde: precisamos cuidar do sono e da alimentação; fazer esporte; moderar o álcool; não fumar; usar protetor solar; largar o celular... Não é o segredo de Fátima. Mas poucos assimilam, praticam e saem à frente.

Vamos cuidar do digital com mais dedicação e dar a ele o seu devido valor.

Ele não só já está presente como é também a chave para o futuro.

Gente fora do mapa

Horror in those eyes

Rio de mediocridade

Enquanto a América do Norte luta para sobreviver a desastres naturais, nos trópicos sofremos, abestalhados, as consequências dos nossos desastres artificiais. Não dá nem para culpar os outros. Se não estimulamos, ao menos permitimos que tudo chegasse ao ponto que chegou.

Existem dúvidas se já batemos no fundo do poço. Quando parece que chega, alguém começa a cavar. Talvez esse poço nem fundo tenha. Mas o fato é que tudo o que assistimos foi construído lentamente. Por desenho, destino ou desejo, a cada passo, houve comemoração. Um país inteiro que decidiu ignorar evidencias, tolerar comportamentos e, sobretudo, abster-se do dever de questionar.

Faz tempo que a gente decidiu não fazer sentido. Não parecia preciso. Bastava embarcar na canoa furada do nacionalismo tacanho e docemente aceitar que se cometessem gigantescas fraudes.


Entre a preservação das instituições e o populismo, preferimos o segundo. Deu no que estamos vendo. E, provavelmente, no que continuaremos vendo. Degradar instituições é trabalho de anos. E recupera-las, requer décadas. Neste filme interminável, o desfecho é sempre previsível. Quem perde são os cidadãos.

É até possível que nem um bom filme estas historias todas vão gerar. Neste enredo indigente, nem os vilões são interessantes. São simplesmente medíocres, sem carisma, sem inteligência, charme ou sutileza. Em qualquer outro tempo ou lugar, seriam apenas coadjuvantes sem importância. Na era da mediocridade, ocupam o centro do palco.

Não existe exercício mais rematado de perda de tempo que procurar nessa gente ângulo que revele contribuição positiva, talento ou mérito. Qualidades relevantes para o sucesso na era da mediocridade são poucas. Ou apenas duas: ausência de escrúpulos e proximidade dos cofres públicos. Inteligência ou talento são opcionais. E raros.

Enquanto já se avista o final da segunda década do século, o país aperta o passo em sua marcha batida em direção ao atraso. E, no caminho, vai confirmando o que de pior se dizia dele. Permanece à deriva, arrastado pela correnteza de um rio de mediocridade.

Direita ou esquerda? Votações indicam posição de partidos no espectro ideológico

Os brasileiros estão insatisfeitos com os partidos políticos. No fim de junho, o instituto de pesquisas Datafolha divulgou o último levantamento sobre preferência partidária: 59% dos respondentes disseram não preferir ou se sentir representados por nenhum partido em particular.

A profusão de notícias sobre investigações de corrupção, que envolveram as principais lideranças de todos os grandes partidos nacionais, é parte da explicação para o mal-estar entre eleitores e agremiações políticas. Ao expor a disseminação de práticas criminosas entre políticos das mais distintas colorações, as investigações ajudaram a sedimentar a impressão de que não existe qualquer diferença ideológica entre as legendas e que todas as suas ações são orientadas pela fisiológica busca de poder.

Nas redes sociais, essas sensações transbordam para reclamações focadas especialmente nos partidos historicamente identificados com um programa ideológico: o PT, que domina o campo da esquerda, tem sido acusado de abandonar pautas da esquerda em favor de uma agenda voltada aos interesses do empresariado, inflexão que a sigla nega.

Já ao PSDB, de centro-direita, foram dirigidas especulações sobre um aumento de seu "esquerdismo" e até de ligações da legenda com o "socialismo fabiano", um movimento da esquerda britânica que preconizava o fim do capitalismo.Image captionCerca de 3,6 mil pessoas reagiram a este meme, postado no dia 30 de junho no Facebook (Foto: Corrupção Brasileira Memes / Reprodução)

Para checar se a impressão sobre a falta de consistência ideológica dos partidos guarda relação com o comportamento das legendas na hora de definir os rumos do país, a BBC Brasil analisou os resultados de dez votações recentes e relevantes na Câmara dos Deputados. Os números mostram que, ao contrário do que possa parecer, há, sim, alguma coerência na atuação da maioria das legendas tanto em temas econômicos quanto em assuntos sociais. Partidos com pensamento econômico mais liberal ou mais socialista ou de cunho mais progressista ou mais conservador em relação a costumes tenderam a manter suas posições na maioria dos casos.


A partir das votações na Câmara, é possível construir um gráfico aproximado da tendência ideológica demonstrada por cada um dos partidos no período das votações, entre 2015 e 2017. A maioria das siglas se comportou de forma liberal quanto à economia, e votou de maneira mais conservadora em temas relacionados a costumes (política penal, questões ambientais etc). No compasso político, os partidos ficariam assim:


Para chegar a este resultado, a reportagem da BBC Brasil calculou o percentual de votos favoráveis ou contrários a projetos de lei considerados chave, como as mudanças nas regras de exploração do pré-sal, a reforma trabalhista ou a redução da maioridade penal, nas bancadas de cada partido. Quanto mais liberal forem os posicionamentos dos deputados do partido, mais à direita a legenda aparecerá no gráfico. Entre os grandes, o PSDB se destaca nessa posição. Da mesma forma, votações mais conservadoras fizeram as legendas aparecer nos quadrantes superiores. As barras que separam os campos ideológicos representam a média geral da votação.

O gráfico é uma aproximação: se outras votações tivessem sido escolhidas, ou se o período de tempo fosse outro, o resultado seria ligeiramente diferente. No entanto, dificilmente algum dos partidos migraria para outro quadrante ideológico.

Além disso, este tipo de gráfico traz distorções no caso de partidos muito pequenos, com menos de três ou quatro deputados: os votos de poucos parlamentares ganham peso desproporcional. É o caso do PRP, do PEN e do PSL, entre outros. No geral, porém, a literatura de ciência política costuma classificar
os partidos brasileiros de forma próxima a esta.

Totalmente P da vida!

Assim estamos. Putos da vida. Com tudo. Causas quase infinitas, inesgotáveis, sequenciais, locais, regionais, nacionais e mundiais. Quando o poço já foi muito pra lá do volume morto eis que aparecem as caixinhas recheadas e mocozadas do Gedelzinho, o miúdo de goela larga da Bahia. E tem nova season dos joesleys and cia, e... e... e...

E não acaba mais nunca?

Não. Pois ontem não veio o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, já planejando calote nos aposentados? “Nós estamos prestes a não poder pagar (a Previdência)...” Oi? Tá boa, santa? É mole? Fala sério!

Pois não é que o Dyogo com ypsilone planeja mais isso pra cima de nós?

Na minha infância em Minas Gerais, quando aparecia alguém feio ou desagradável por perto, soltávamos a expressão: abriram a porta do cemitério.

Agora, abriram foi o portão central do cemitério federal. Vampiros no comando. Almas penadas pra cima de nós e, mais uma vez, vendendo até a Amazônia e o futuro a preço de ocasião. Com o apoio de muitos. E os mesmos surrados argumentos.


O pau come solto no lombo do povo – dos que bateram panela de verde amarelo, dos que, de vermelho, sonharam resistir ao pesadelo que os paneleiros pediam sem saber sabendo onde aquilo iria dar. Achavam que daquele imbróglio sairia Coca-Cola gourmet?

Saiu isso.

Recorrente. Crise política que resulta em golpe que desanda em mais crise que cai nas costas da classe média. Essa mesma velha colegagem que já deu garrafada em Pedro I e exorcizou Jango - terço na mão em contritas marchas da-família-com-Deus-pela-liberdade. Também deu apoio básico à ditadura e picaretada em presidente, de quem dois dias antes era fiscal.

Gente ativa que vestiu verde amarelo pró-Collor e preto no foraCollor. Recente foi pró-Lula pra, de virada, ser foraDilma. Agora é fora o quê mesmo?

Eita prazer de carregar bandeira pra depois apanhar do mastro!

Não tem jeito. Tá no DNA. Somos mesmo um bando sempre disposto a servir ao bando de sempre.

Preferia falar de ipês, mas com eles vem a seca. Sempre. Recorrente como nossa História que agora extrapola nos demônios todos que cevamos bem cevados em 517 anos de descobertos.

Livros e História ajudam a respirar melhor até na seca. Modestamente recomendo:

1 - Prisioneiras, de Dráuzio Varela - retrato de como é e como funciona o poder onde governos e poderes constituídos não chegam.

2 - Tancredo Neves, o príncipe civil, de Plínio Fraga – perfil do personagem e passeio pelo exercício e o oficio de fazer política. Artes de construir consensos, desditas dos dissensos.

3 - A Exposição Fallas do Throno, aberta até outubro, no Salão Negro do Senado Federal, Brasília, DF.

As Fallas do Throno eram os discursos feitos pelos nossos dois Pedros imperadores – o I e o II – e pelos regentes que governaram o país entre a abdicação do I e a maioridade do II. Dois golpes.

Com pompa, circunstância e roupa gala, imperadores e regentes davam seus recados na abertura e no fechamento dos trabalhos da Assembleia Geral Legislativa - já composta de Senado e Câmara, que se reunia de maio a setembro, no Rio de Janeiro. Os parlamentares, representantes das províncias, representavam muito bem, of course and off course, os do andar de cima.

Pedro I, mostram os documentos expostos, era marrento. Seu “imperial coração” – a expressão é dele -, a cada ano de seu governo, ia ao Legislativo e pedia exigindo. Sabe o quê? Leis para as finanças e para Judiciário, principalmente e recorrentemente.

Despacito, rola o arquivo Pedro I em 1827, 28, 29, 30:

“Um sistema de finanças bem organizado deverá ser vosso particular cuidado, pois o atual, como vereis no relatório do Ministro da Fazenda, não só é mau como é péssimo e dá lugar a toda qualidade de delapidações” (...)

(Já nesse tempo, as tais “delapidações” do erário andavam ali pelo jardim do mesmo imperador que pregava contra elas. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa. Como sempre).

“Um ramo principal, e que muito concorrerá para este novo sistema de finanças (que eu espero ver criar e ser executado) é o Poder Judiciário” (...)

“Sem finanças e sem Justiça não pode existir uma Nação.”

Pedro II, já na sagração, em 1841, pediu “uma boa lei de eleições, o melhoramento da legislação criminal e do processo, das finanças” (...)

Dez anos depois, 1851, insistia: “Leis que sabiamente corrijam os defeitos que ainda possa apresentar a lei eleitoral para que nem a liberdade do voto nem a tranquilidade pública sofra na aplicação de um dos mais sagrados princípios da nossa Constituição” (...)

Em 1888, pediu: “leis que melhorem a condição dos juízes e tornem mais efetiva sua responsabilidade. A organização do Ministério Público é de indecrinável, como também a reforma do processo e julgamento delitos sujeitos a penas leves”(...)

Pedro I pediu e repediu mais atenção com a segurança pública e com o combate à violência nas ruas.

Pedro II, mais solene e delicado, culto e antenado, pediu inclusive por leis de proteção às riquezas do solo e do subsolo do país.

Está tudo lá, nas peças originais e preciosas, preservadas no arquivo do Senado. Registram anseios que seguem repetidos e desatendidos. Se atendidos, talvez não fôssemos, hoje, tantos e tão putos da vida. Com tudo.

Paisagem brasileira

Serro , Capela de Santa Rita, Minas Gerais, Brazil                              …
Serro (MG)

República em marcha

A semana da pátria foi decisiva, registrando enormes avanços para os republicanos empenhados na construção da Grande Sociedade Aberta.

A Velha Política tem agora suas vísceras expostas, eagoniza a céu aberto. Suas principais lideranças estão sitiadas pela opinião pública informada.

O depoimento de Palocci anuncia a morte da candidatura presidencial de Lula em 2018.

A delação de Funaro encurrala os senadores e deputados da cúpula do PMDB, apontando também um indicador para Temer.

Ao som das gravações de Joesley e à imagem das malas de Geddel, as prisões de ambos anunciam o fim do mundo para as criaturas do pântano evoluídas nas mais degeneradas práticas políticas.

Janot havia confessado atuar “com medo de errar ou decepcionar” expectativas nele depositadas como procurador-geral.


Pois bem, em tempos extraordinários, mais vale uma atabalhoada busca da coisa certa do que uma competente defesa da coisa errada.

Mais do que a forma jurídica perfeita, o que se quer é o fim da impunidade e da roubalheira.

E não há mais como esconder, mesmo aos olhos do observador ingênuo, a gigantesca máquina de corrupção que se desnuda pelas colaborações premiadas.

O deputado Rocha Loures foi indicado por Temer a Joesley como interlocutor substituto de seu ex-ministro Geddel.

O observador ingênuo se indaga quanto tempo levaria ou quantas malas de dinheiro teria de acumular um Rocha Loures para se credenciar politicamente como um novo Geddel. E conta as décadas de mentoria de um José Sarney nos labirintos da Velha Política para formar quadros como Renan Calheiros, Jader Barbalho e Edison Lobão.

O capitalismo de Estado do regime militar transformou-se em capitalismo de quadrilhas na democracia emergente sob hegemonia social-democrata.

O tráfico de influências decisivas sobre as atividades econômicas corrompeu as múltiplas camadas do aparelho de Estado. A compra de favorecimentos em obras públicas e financiamentos de bancos oficiais, o pagamento para aprovação no Congresso de regulamentação favorável em medidas provisórias para empresas de transportes, operadoras portuárias e de planos de saúde, a encomenda de sentenças favoráveis em tribunais superiores tornaram-se uma avalanche de denúncias que exigem a completa reformulação da engrenagem estatal.
 Paulo Guedes

Porcos de todos os dias

As criaturas de fora olhavam de um porco para um homem, de um homem para um porco e de um porco para um homem outra vez; mas já se tornara impossível distinguir, quem era homem, quem era porco
George Orwell, "A Revolução dos Bichos"

O Relógio do Apocalipse

Há uma nova data para o fim do mundo: 23 de setembro. Pela minha experiência, já bastante vasta em matéria de fins de mundo, estou certo de que será outro imenso fracasso. Nem conheço evento que tenha sido anunciado tantas vezes, desde há milênios, sem jamais se ter cumprido. As atuais previsões asseguram que o planeta explodirá na sequência de uma colisão com um asteroide. O fato de não haver nenhum asteroide a aproximar-se de nós não parece desanimar os profetas. Segundo eles é um asteroide invisível.

Quanto a mim, embora não acredite que o mundo vá acabar a 23 de setembro, destruído por um asteroide, confesso que me sinto um pouco inquieto. Até recentemente, o fim do mundo não dependia de nós, seres humanos. Apenas um terrível desastre cósmico poderia extinguir a vida na Terra. Entretanto, progredimos muito na técnica da matança e da destruição em larga escala. No tempo em que os homens se matavam à espadeirada era até compreensível a expressão “arte da guerra”. Um duelo à espada tinha algo de bailado. Os homens matavam-se olhando-se nos olhos. Com o progresso tecnológico passamos a matar à distância, cada vez mais à distância, no limite, através de drones ou de mísseis telecomandados. Matam-se populações inteiras como quem extermina baratas. Na guerra, todo o progresso é barbárie.

Hoje temos a capacidade de destruir o planeta. Tenho mais medo dos homens do que dos astros. Confio mais em qualquer asteroide do que em Donald Trump ou Kim Jong-Un.
Resultado de imagem para relógio do apocalipse

Em 1947, um grupo de cientistas criou um relógio simbólico, o Relógio do Apocalipse, que tenta alertar para a probabilidade de ocorrência de um cataclismo nuclear. Quando foi criado faltavam sete minutos para a meia-noite — sendo a meia-noite o grande desastre. Depois disso o relógio tem sido atrasado e adiantado, consoante sopram os ventos da estupidez ou do bom senso. Em 1953, ano em que tanto os Estados Unidos quanto a União Soviética realizaram ensaios nucleares, esteve a dois minutos da meia-noite. Nos anos seguintes, afastou-se. Em 1991, depois que a União Soviética e os Estados Unidos assinaram o Tratado para a Redução de Armamentos Estratégicos, o ponteiro recuou até os 17 minutos. Desde então não tem feito outra coisa senão aproximar-se da meia-noite. Está agora, outra vez, muito perto dos dois minutos.

A minha filha Vera, de 13 anos, perguntou-me, após escutar as notícias sobre a explosão experimental de uma bomba de hidrogênio, na Coreia do Norte, o que podemos fazer para evitar uma guerra nuclear. A pergunta apanhou-me de surpresa:

“O que podemos fazer? Quem, nós, ou os políticos?”.

“Nós, as pessoas comuns. Não podemos culpar os políticos se nós ficarmos quietos. Tu, por exemplo, achas que fazes o suficiente?”

Fiquei a pensar naquilo. Hoje em dia já há quem se dedique a conceber estratégias e artefatos para impedir que a Terra possa, um dia, vir a ser destruída por um asteroide. Nada contra. No imediato, contudo, faria muito mais sentido se tentássemos responder à questão da minha filha: “O que estamos fazendo para impedir um conflito nuclear? O que podemos fazer?”.

Ganhar consciência de que é urgente fazer alguma coisa já me parece um bom começo.

Revi, há poucos dias, “Wild river” (“Rio violento”), filme que o diretor grego-americano Elia Kazan rodou em 1960. O filme conta a história de um funcionário de uma agência governamental norte-americana, interpretado por Montgomery Clift, enviado para uma pequena localidade, na margem do rio Tennessee, em vias de ser submersa devido à construção de uma barragem. A missão do funcionário é a de convencer uma velha senhora a abandonar a sua casa, numa ilha, levando consigo os trabalhadores rurais. A senhora recusa-se a sair e um dos trabalhadores permanece ao seu lado. Quase no fim do filme, enquanto as águas do rio sobem, o personagem representado por Montgomery Clift vê o camponês a arar a terra como se nada estivesse acontecendo.

Receio que, no momento atual, aquele camponês sejamos nós: os ponteiros do relógio avançam, e prosseguimos, indiferentes, a rotina de todos os dias. Infelizmente, como lembra um provérbio angolano: a cegueira não salva o cego do ataque do leão.

Sempre que escuto o argumento da dissuasão nuclear — “temos de ter armas nucleares para evitar que o inimigo use armas nucleares” —, sinto que estão insultando a nossa inteligência. Tentar prevenir uma guerra produzindo armamento cada vez mais letal é como pretender prevenir incêndios distribuindo lança-chamas pelos pirômanos. Se as armas existem, então um dia alguém as utilizará.
O mundo não terminará a 23 de setembro. Mas enquanto não conseguirmos desmantelar todo o armamento nuclear estará sempre à beira do fim. 

Por que nos esquecemos das vítimas de catástrofes ambientais da Índia e do continente africano?

As cidades indianas de Mumbai, Bangalore e Chennai; a cidade mais populosa do Paquistão, Karachi; e a capital de Bangladesh, Dakha, somam mais de 1.400 vítimas desde junho e milhões de afetados após as piores chuvas de monção que atingiram o Sudeste Asiático em anos. No Nepal, as chuvas torrenciais deixaram 150 mortos e 90.000 casas devastadas. Na província de Guizhou, na China, os deslizamentos de terra por chuvas torrenciais causaram a morte de mais de 50 pessoas, e em cidades como Donguan, Shenzhen, Zhongshan e Zhuhai, foi declarado alerta vermelho pelas chuvas e 70.000 pessoas foram evacuadas. No total, 41 milhões de pessoas na região sofrerão muito para conseguir alimentos e enfrentarão um aumento de doenças como a malária e o tifo durante os próximos meses.

No continente africano, a capital de Serra Leoa, Freetown, teve um número não oficial de 1.000 mortos, muitos dos quais menores de idade, além de centenas de milhares de afetados por uma das piores inundações da história e um mortífero deslizamento de terras. Em Niamey, capital do Níger, milhares de pessoas precisaram ser evacuadas em poucos dias, pelo medo de que se repetisse uma tragédia humana como a de junho, com a morte de 44 pessoas durante as já frequentes chuvas torrenciais.

Imagem relacionada
Serra Leoa

Nos Estados Unidos, o furacão Harvey deixou 60 vítimas em Houston, Texas. E ainda que a maioria dos leitores e leitoras saiba mais sobre a gestão do desastre em Houston do que em Freetown ou qualquer outra cidade localizada no hemisfério sul, os números de mortos indicam que as inundações do mês de agosto mataram 25 vezes mais pessoas na África do que o furacão Harvey nos Estados Unidos. O apartheid climático se torna evidente na arena midiática, ainda que tenha sido o presidente Donald Trump a se retirar dos acordos climáticos de Paris, e não, por exemplo, o mandatário de Serra Leoa, Ernest Bai Koroma, que reconhece a urgência de se reduzir as emissões de gases de efeito estufa.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde, os desastres naturais exacerbados pela mudança climática provocam 60.000 mortes por ano, com uma incidência maior nos países com índices mais baixos de desenvolvimento. Segundo um índice anual elaborado pela universidade norte-americana Notre Dame, os países mais vulneráveis à mudança climática são a República Centro-africana, Chade, Eritreia, Burundi e Sudão, seguidos pelo Iêmen, Afeganistão e a República Democrática do Congo. E tal como alerta a Iniciativa de Crescimento da África, da Brookings Institution, o continente tem sete dos 10 países mais vulneráveis à mudança climática.

Já falamos do risco que correm as cidades costeiras da África pela mudança climática. Nas capas dos jornais com maior tiragem, entretanto, as vítimas de Houston adquiriram maior importância do que as de Freetown, Karachi, Mumbai e Donguan juntas. Não deveríamos começar a dar mais visibilidade e apoio às castigadas Houston do Sul global, que acumulam muito mais vítimas e afetados, problemas e desafios, do que a cidade texana? Alguém escutou palavras de apoio de Leonardo DiCaprio, ativista contra a mudança climática e protagonista do filme Diamantes de Sangue, sobre o caso dessas pedras em Serra Leoa? Mas DiCaprio fez uma doação de 1 milhão de dólares (3 milhões de reais) aos afetados texanos. Uma referência, por menor que seja, às tragédias climáticas do Sudeste Asiático por parte de Sandra Bullock, Chris Brown, JLo, as Kardashian e Beyoncé, que fizeram doações milionárias a Houston? Alguns acordes em memória das vítimas africanas por parte do Coldplay, que fez uma música em tributo a Houston?

Os que até o momento demonstraram sua solidariedade com Freetown, por exemplo, foram as próprias nações africanas. O presidente togolês, Faure Gnassingbe, e o presidente da Comunidade Econômica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO), Marcel Alain De Souza, doaram 500.000 dólares (1,5 milhão de reais) em agosto para alimentos e assistência médica. Senegal, por sua vez, doou 100.000 dólares (308.000 reais), e Costa do Marfim contribuiu com uma tonelada e meia de produtos médicos. E apesar do presidente Ernest Bai Koroma ter pedido ajuda urgente à comunidade internacional para enfrentar a tragédia de Freetown, a União Europeia se comprometeu a mandar somente 300.000 euros (1,10 milhão de reais) a Serra Leoa. Quantidade que comparada à doada pelo Governo da China, que fez uma contribuição de 1 milhão de dólares (3 milhões de reais) ao país...

Imagem do Dia

Fine white sand and shallow translucent waters in Halkidiki, Greece
Halkidiki (Grécia)

Joesley, depois do porre, a ressaca devastadora

Será que eu entendi bem? O cara toma um porre, liga para o amigo, diz um monte de sandices contra todo mundo e depois pede desculpas. É isso mesmo? E quando esvaziava os cofres dos bancos oficiais também estava embriagado? Ora, Joesley, conta outra, essa não cola. Como é que o senhor, um dos empresários mais ricos do mundo, com faturamento de mais de 150 bilhões de reais, é tão leviano?

Que garantia têm os seus investidores quando sabem que o seu principal acionista fala um monte de besteiras quando bebe, atropela a gramática e mostra-se um cara tão arrogante, aquele manda-chuva que diz comprar tudo e todos (“Janot, nesta sua escola eu fui professor”, diz na gravação). Joesley agora vai para a cadeia onde aprenderá a beber sem dar vexame. E lá dentro, senhor, é o salve-se quem puder. Prepare o bolso.

Dizem alguns entendidos que quando o cara se embriaga fala coisas que sóbrio jamais falaria. O bêbado naquele momento, em devaneio, é autêntico. Talvez, por isso, Joesley teria soltado a língua e falado o que realmente pensa do seu país, dos brasileiros e dos seus governantes. Considera todos uns idiotas, incapacitados, dementes. Tão dementes que caíram na sua conversa de vendedor de bugigangas e o ajudaram a juntar os bilhões de reais. Se você duvida, veja trechos das gravações, onde ele diz que será o último coveiro a botar a tampa do caixão. Ou seja: com toda fortuna lá fora, ele e os comparsas estavam pouco preocupados com a situação do país que ajudou a afundar com os seus amigos petistas. Depois de enterrar o Brasil em cova rasa, Batista tinha planos para se mandar e jamais botar os pés aqui dentro.

Nenhum texto alternativo automático disponível.
Foi assim, de gole em gole, que os irmãos Batista atravessaram a fronteira da ética e da moralidade. Acumpliciados com a petezada, com quem mantinham uma conta-corrente para sustentar seus dirigentes no poder, eles tiveram acesso aos bancos oficiais e dali saíram com bilhões de reais para erguer seu império. Na contramão da história, os petistas consolavam os lesados com umas casinhas fuleiras do “Minha Casa, Minha Vida”, a promessa de um pouco de água do São Francisco, a construção de arenas bilionárias para entreter a moçada do futebol e um aumentozinho do Bolsa Família para agregar à ceia mais um pouquinho de mandioca e feijão para os miseráveis. Enquanto mantinham esse segmento anestesiado com o clientelismo, escancaravam os cofres para os empresários espertos e gulosos se fartarem com o nosso dinheiro.

O depoimento do Palocci ao Sérgio Moro não deixa dúvidas: o PT entregou o país a esses empreiteiros e empresários aventureiros e beberrões. Só quem nega essas evidências hoje são alguns articulistas da seita arrancados de suas redações por Lula para proteger o assalto que o partido fazia aos cofres públicos. E para os jornais, por comprovada cumplicidade com a sujeira, não voltaram mais. Agora, muitos deles deprimidos porque o Palocci detonou a dupla Lula/Dilma como os cabeças da organização criminosa, querem detonar o companheiro.

O Palocci não está inventando nada. Ele era da cozinha do Lula e da Dilma. Foi articulador político e arrecadador principal das campanhas dos dois à presidência. Ele apenas está confirmando o que empresários e executivos de estatais já disseram ao juiz Sérgio Moro. Existia, sim, uma conta-corrente das empreiteiras para financiar as campanhas petistas e manter o partido no poder com dinheiro de popina. Os petistas críticos ao ex-ministro, vão agora à ditadura para desqualificar o seu depoimento. Dizem que ele “virou cachorro”, termo que se usava para identificar um preso político que, sob tortura, denunciava seus companheiros.

Quem espalha isso é o Zé Dirceu na tentativa de passar à história como um cara ideológico, que vai de cadeia em cadeia sem “entregar” ninguém. Espera, com isso, reconhecimento dos companheiros com uma estátua sua erguida em frente à Papuda para que seus seguidores o reverenciem. Até pouco tempo, Palocci era o grande formulador do PT, o cara que redigiu a “Carta ao Povo Brasileiro” para abrir as portas do Centrão para Lula, que tinha acesso aos gabinetes dos mais proeminentes empresários e políticos do país. De um momento para outro, por dizer a verdade, é acusado de dedo-duro. Lula, por exemplo, o descredencia, se diz decepcionado. Mas veja o que disse sobre ele em abril deste ano: “Palocci é meu amigo, uma das maiores inteligências políticas do país. Ele tá trancafiado, mas não tenho nenhuma preocupação com a delação dele”.

É assim mesmo, o cara vai do céu ao inferno quando deixa de comer no cocho da petezada. Quero ver quando o Lula for preso e entrar para o seleto grupo dos colaboradores. O que os seus seguidores vão dizer? O que os articulistas de plantão vão escrever para eufeminizar a sua delação premiada? Não se surpreenda, caro leitor, o Lula vai entregar a Dilma no primeiro interrogatório, como fez com a mulher dele e outros companheiros.

Jorge Oliveira

Temer alinge o vácuo moral ao dar Cade ao PP

O governo de Michel Temer revela-se intelectualmente lento e moralmente ligeiro. E essas duas velocidades são insultuosas. A lentidão intelectual impede o presidente e seus operadores de notar que há uma fome de limpeza no ar. A ligeireza moral leva-os a governar como crianças que brincam no barro depois do banho. Em sua penúltima temeridade, o Planalto acomodou Alexandre Cordeiro Macedo na poltrona de superintendente-geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica, o Cade.

Charge do dia 11/09/2017

Conselheiro do Cade há dois anos, Alexandre traz na testa a marca do Zorro da indicação política. É apadrinhado do Partido Progressista, campeão no ranking de encrencados no petrolão. Conta com o aval do deputado Aguinaldo Ribeiro (PB), um investigado a quem Temer confiou a liderança do governo na Câmara. Dispõe também do apoio de Ciro Nogueira, presidente do PP, outro investigado da Lava Jato que acaba de ser jogado no ventilador da JBS como suposto beneficiário de uma joeslyana de R$ 500 mil.

Alega-se no Planalto e no PP que Alexandre Cordeiro é tecnicamente preparado. Ainda que fosse, o problema é outro. Temer já havia confiado a presidência da Caixa Econômica Federal ao PP. Admita-se que Temer pode conviver com o PP por obrigação protocolar. Qualquer imbecil entenderia isso. Mas ir atrás do PP, cortejar o PP, entregar o Cade ao PP depois de já ter sacrificado a Caixa… Parece demasiado.

Temer ainda não se deu conta. Mas seu governo já tocou o vácuo moral. Nesse estágio, todas as decisões tendem a se converter em matreirice política rasteira, sem qualquer compromisso com o interesse público. A impopularidade do governo é um tributo à sua mediocridade.

Suje-se gordo

O locador era o cunhado. O locatário era Machado de Assis, que sofria ameaças de despejo por atrasar o aluguel.

Sim, o maior escritor brasileiro mudou de residência várias vezes, em busca de um imóvel para morar. Por isso, de vez em quando é encontrado no Rio um lugar onde Machado morou. E ele povoou seus livros de personagens que trabalham demais enquanto seus patrões ou donos passam a vida sem nada fazer, apenas fofocando.

A Abolição e a República, os dois grandes temas da segunda metade do século XIX, viriam somente no fim do século. A Abolição de 1888 proclamou a República de 1889, por assim dizer.

Espelhando um Brasil que demorava a mudar suas estruturas, Machado escreveu romances e narrativas curtas, estas em forma de contos ou crônicas, dando os indícios, com a conhecida sutileza e sofisticação, dos movimentos subterrâneos que anunciavam as mudanças que a outros tantos pareceram abruptas, repentinas. Não eram. Estavam sendo preparadas há muito tempo.

Num conto, intitulado Suje-se gordo, a narração é feita pelo presidente do conselho de um júri. Diz ele: “O primeiro réu que condenei, era um moço limpo, acusado de haver furtado certa quantia, não grande, antes pequena, com falsificação de um papel”.

Um dos jurados, o mais exaltado em condenar, perora nestes termos, dando o título do conto: “O crime está mais que provado. O sujeito nega, porque todo o réu nega, mas o certo é que ele cometeu a falsidade, e que falsidade! Tudo por uma miséria, duzentos mil- éis! Suje-se gordo! Quer Sujar-se? Suje-se gordo!”.



Já o narrador invoca mais de uma vez a recomendação do Evangelho: Não queirais julgar para que não sejais julgados”.

Passa-se o tempo e vem outro júri em que o réu não se sujou por quatro patacas, mas por cento e dez contos, uma enorme quantia para a época. Uma carta de sua lavra torna evidente o crime. Os jurados são doze. Nove deles votam pela absolvição. Apenas dois acompanham o voto do narrador para condená-lo.

O nome do réu é Antônio do Carmo Ribeiro Lopes. A surpresa do desfecho: quando integrante do júri, foi dele o conselho “suje-se gordo”. E agora tornara-se réu.

Talvez o nome do personagem seja ironia adicional de Machado ao latinista Castro Lopes, com quem travou dura polêmica sobre neologismos. Pois Castro Lopes queria chamar abajur de lucivéu, repórter de alvissareiro, reclame de preconício, futebol de ludopédio, e turista de ludâmbulo, entre outras barbaridades.

Pois não é que na semana que findou, o conto de Machado foi levado ao palco do Brasil por outros personagens? Um duro crítico da corrupção, crime em que tantas vezes já incorrera no passado, e, sem ironia nenhuma, o ex-ministro Geddel Vieira Lima, já condenado à prisão, transformada em domiciliar, voltou à cela porque seguiu a recomendação do personagem machadiano e sujou-se gordo. Foram mais de R$ 51 milhões.