quarta-feira, 23 de setembro de 2015

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Dilma mente falando

Às vezes me dá um desânimo... Todo dia é a mesma coisa: vivemos a mesmice do “rebojo”, rodamos junto com o país e ficamos tontos com tanta safadeza e mentiras. E com tudo isso – e muito mais – que está provado na operação Lava Jato, ninguém, a não ser os delatores, assume responsabilidades pelo maior escândalo havido no Brasil desde a escravidão.

Assim, até acredito que Dona Dilma não sabia (e não saiba) de nada, como afirma, e talvez nunca tenha ouvido falar em Pasadena. Dilma ainda está em combate, de metralhadora em punho, tentando derrubar governos para implantação do comunismo que já foi da Rússia. Dilma não mente, simplesmente é a própria mentira. Quando colocou em seu currículo que era mestra e doutora pela Unicamp, ela não mentiu, apenas não sabia o que é isso. Quem pensa, como ela, que a mandioca é uma invenção tecnológica não pode mesmo saber que “impeachment” é matéria de direito constitucional. Nunca pensei em “impeachment” da presidente, sempre pensei em interdição. Dona Dilma é incapaz, mas, convenhamos, aguentar Michel Temer com sua antipatia, falando e gesticulando com cara de pensador, é como tomar bicarbonato só para arrotar. Sei não, mas é preciso mudar esse cardápio antes que o vômito da indigestão nos desidrate.

O povo vai ter de pagar a conta da bebedeira do PT? Eles, governo e petistas, com raríssimas exceções, falam em fazer isso e aquilo para combater a inflação, para pagar o déficit fiscal do país, como se não fossem eles os únicos responsáveis. Eu e outros, que não toleramos mais este governo e o PT, teremos de pagar o que a gatunagem deles provocou? E aqueles que simplesmente não votaram nessa gente? Cara, é o caso de repetir: “Quem pariu Mateus que o embale”.

Recebi de um amigo uma sugestão interessante para resolver o déficit anunciado no Orçamento fiscal do próximo ano, e sem misturar nesse “mexido” quem nada tem com isso: “Pegar o valor do rombo nas contas do governo e dividir pelos eleitores do PT... R$30.000.000.000/ 54.501.118 de eleitores = R$ 550,45. Plano para pagamento em 12 meses; R$ 45,87 direto no boleto; para 24 meses; R$ 22,93 direto no boleto. Vamos lá, ajude quem você elegeu a sair dessa enrascada! Seja verdadeiramente um cidadão petista”. Que tal?

E, para terminar, alguns sinais de metástase na roubalheira e na covardia que imperam no Brasil: dia desses, uma revista de circulação nacional publicou notícia num canto de página, sugerindo que o aumento dos cargos em comissão nas Assembleias Legislativas visa aumentar a remuneração de deputados, já que os agraciados são obrigados a dividir seus vencimentos com quem os nomeou para seus gabinetes. Pensei cá comigo: meu Deus, em que tempo estamos... Estão batendo carteira de cegos... Fiquei mais tranquilo quando me lembrei de que vivemos em Minas Gerais, e deputados mineiros jamais cometeriam tais ignomínias, jamais! Mineiro tem espírito escoteiro, então, “sempre alerta” deve ser o lema...

Vítimas de uma guerra amazônica


Uma das ilhas do Xingu, desmatada e queimada para o enchimento do lago de Belo Monte. Foto: Lilo Clareto
A saga de João e Raimunda tem seu ápice em dois atos de uma guerra amazônica não reconhecida pelo Estado e pela maioria dos brasileiros. Ainda assim, ela está lá. Aqui. Essa história, decidida neste momento no Pará, na região de Altamira e da bacia de um dos rios mais ricos em biodiversidade da Amazônia, o Xingu, é contada por um homem e por uma mulher, apenas dois entre dezenas de milhares de expulsos pela hidrelétrica de Belo Monte, gente que hoje vaga por um território que não reconhece – e no qual não se reconhece. Mas esta não é mais uma entre tantas narrativas dramáticas em um país assinalado pela violação sistemática dos direitos de negros e de indígenas. Raimunda e João trazem inscritos no corpo uma encruzilhada histórica. A de um país que chegou ao presente, depois de tanto ser futuro, e se descobriu atolado no passado. O epílogo de um partido que chegou ao poder com a promessa de dar dignidade aos mais pobres e aos mais desprotegidos e os traiu na porção mais distante do centro do poder político e econômico, a Amazônia. Esta é também a anatomia de uma perversão: a de viver numa democracia formal, mas submetido a forças acima da Lei. O não reconhecimento da violência sofrida inflige a suas vítimas uma dor ainda maior, e uma sensação de irrealidade que as violenta uma segunda vez. É a experiência de viver não fora da lei, mas sem lei que escava a existência de Raimunda e de João – e os faz escolher destinos diferentes diante da aniquilação.

Raimunda decidiu viver, ainda que carregando seus pedaços. João não sabe como viver. Para ele, só há sentido na morte em sacrifício.

Neste momento, João e Raimunda vivem esse impasse.

Enquanto isso, a Norte Energia espera apenas que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA) dê a Licença de Operação da hidrelétrica, mesmo sem que a empresa tenha cumprido as medidas de redução e compensação do impacto, para começar a encher o lago de Belo Monte.

O terceiro ato ainda é uma incerteza.

A devastação do Xingu em imagens

Dilma: Didi Mocó e Dedé no poder, segundo Delfim

Com experiência de professor aposentado da USP, ex-czar da economia na ditadura, ex-constituinte, ex-parlamentar e ex-espírito santo de orelha de dois presidentes nos (até agora) 12 anos e 9 meses de lulopetismo no governo federal, Delfim Netto garantiu, em entrevista a Eliane Cantanhêde, no Estado: “A Dilma é simplesmente uma trapalhona”. Didi Mocó e Dedé no poder. E honesta! Mas definiu sua proposta de Orçamento com déficit primário (mais gastos a pagar do que rendas a arrecadar) como uma “barbeiragem”. E o pacote fiscal para debelar a crise, uma “fraude”.

O papa de uma patota de economistas tidos e havidos como da maior competência (até hoje atuantes), dono de uma inteligência comparável à de Lula da Silva e uma cultura invejável, que o outro não tem, pelo visto perdeu a paciência com madama gerenta incompetenta. Mas o brilho de seu raciocínio não impede que se enxergue a impropriedade dessa mistureba, que seu velho inspirador em lógica, Aristóteles, não aceitaria. Déficit em Orçamento é ilícito, pois viola a Lei de Responsabilidade Fiscal. E fraude não é sinônimo de honestidade nem no mais permissivo dos dicionários.

No fragor da batalha pelo controle da Constituição de 1988, Delfim, que então já se dizia “socialista fabiano”, fez uma profecia que hoje se mostra sábia, mas, ao contrário do que se podia deduzir à época, menos devastadora do que de fato viria a ser. Para ele, convinha dar o poder ao Partido dos Trabalhadores, de seu colega parlamentar Luiz Inácio Lula da Silva, de vez que só assim o País se livraria do mal que o mito de santidade da esquerda fazia. Em 2014, às vésperas de uma eleição que ainda parecia indefinida entre a presidente petista e o líder tucano da oposição, Aécio Neves, Delfim vaticinou a interlocutores mais próximos que ela ganharia a eleição. Mas, em seu segundo mandato, os resultados da “nova política econômica” (conforme a inspiração leninista) produziriam tal crise que o governo chegaria ao fim antes dos quatro anos previstos.

Por incrível que pareça, as duas profecias são coerentes entre si. Embora o profeta tenha aconselhado o padim Lula Romão Batista de Caetés em seus dois mandatos e também tenha sido ouvido pela afilhada e sucessora deste, não há como cobrar de Delfim o fato de tal purgatório ter durado tanto. O bom senso do Macunaíma do ABC, com a economia tutelada por Antônio Palocci e Henrique Meirelles, guiou a nau capitânia por mares sem procelas. E, assim, a navegação continuou beneficiada pelo vento de popa, usando a metáfora náutica que deu título às memórias de outro célebre economista da época do milagre econômico da ditadura militar e ex-colega dos dois no Legislativo, Roberto Campos.

O vento de proa que impulsionou a nau sem rumo para a tempestade a pegou no pior momento: quando ao leme estava uma capitã sem habilidades para comandar uma canoa de pescador e completamente inabilitada para dar rumo ao bote salva-vidas que é a situação de momento. Na crise produzida pelo delírio consumista de seu padroeiro ou pelas próprias convicções intervencionistas, a comandanta faz sua “travessia” sem Moisés nem a bonança da conjuntura internacional favorável. Se ela içar as bujarronas, o temporal destroçará o barco. Se as recolher, o afundará por inércia.


Faltam-lhe perícia, humildade e sensatez. Resta-lhe apelar para a boia à mão: a velha democracia burguesa, que ela sempre odiou, tal como Robespierre e Marat. “Ei, vocês aí da oposição: não venham de borzeguins ao leito. Fui eleita pela maioria dos cidadãos e vocês têm de aceitar a vontade das urnas” – berra, teimosamente, essa meia-verdade. Mas é cada vez menos ouvida, pois a tempestade rugindo e os vagalhões minando a estrutura do barquinho sem rumo tornam sua gritaria, normalmente incompreensível, uma algaravia incapaz de iludir náufragos ameaçados pelo afogamento.

A tarefa dela não é fácil. Enquanto se agarra ao bote repetindo “eu sou a democracia”, bagagens e outros passageiros são jogados ao mar sem dó. Há 15 dias, neste pedaço de página, referi-me a 1 milhão de trabalhadores perdendo o emprego neste primeiro ano de segundo desgoverno. Agora, já se fala em 1,6 milhão – 60% mais!

E como instrumento de navegação ela só dispõe da ilusão de que é A democracia. Pois, favorita dos mortadelas, ela teve mais votos do que o candidato dos coxinhas há dez meses e meio. Mas sua democracia não é a de Danton e Jefferson. Em sua cabeça, entorpecida por Marx, Lenin, Stalin, Lula e devotos do pixuleco, ela a encara como um pôquer disputado a cada quatro anos, com cacife assegurado pelo período intermediário para criar ministérios e outros penduricalhos para a barganha com aliados.

Ela se diz heroína da liberdade, ainda que a ditadura que ela combatia e a que ela almejava fossem siamesas, embora antípodas. A mentira bastaria para desqualificar sua versão do regime, que não é o menos ruim de todos (apud Churchill), mas o melhor para a cupinchada. E há quem reze “diuturnamentee noturnamente” para ela pedir perdão, pagar penitência dividindo o doce e prosseguir!

Até hoje, lendo no tele-prompter patacoadas de seu marqueteiro Patinhas, Dilma garante que arriscou a vida pela liberdade, mas não se sente na obrigação de mostrar nenhum dos muitos documentos de grupos armados contra os milicos que tenha citado uma vez só a palavra “democracia”. Isso já faz tempo e ela está ocupada demais para rememorar inconveniências. Mas quando é que ela vai enfrentar os panelaços num pronunciamento público em cadeia de rádio e televisão para execrar o que Genoino, Dirceu e Delúbio fizeram do PT? E afastar Edinho, Oliva e outros acusados dessa confusão criminosa entre coisa pública e república (hospedaria) de quem aderiu ao capitalismo do propinoduto? Podia até aproveitar e exigir atitude similar dos adversários tucanos com o Aloysio lá deles, ora!

Quando o poder dá as cartas

quando o poder dá as cartas
falta um coringa no baralho
os ases se sentem reis
as rainhas andam com valetes
a sueca vira buraco
onde cada canastrão bate
pega o morto
e sai atrás de ouros
onde sobram copas, paus e espadas
até perder o que era pra ganhar
sem saber o que foi apostado
quando o poder dá as cartas
o baralho está sempre marcado
joga-se a paixão contra a ilusão
e quem tem as cartas na mão
nem sempre tem a sorte
ao seu lado
e trapaceia
por pura falta de opção
quando o poder dá as cartas
o jogo vira trabalho
a carta que cada um tem na manga
é sempre aquele coringa
que falta no baralho

Tavinho Paes

O homem errado

Todos sabemos: se você encontrar um jabuti em cima da árvore, não queira saber como ele subiu até lá –foi alguém que o colocou. E por que alguém colocaria um jabuti em cima da árvore? Para preencher um tempo morto, já que um jabuti em cima da árvore não serve para nada. Ou para manter a árvore ocupada até chegar a hora de tirá-lo.

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Em 2011, Lula colocou Dilma em cima da árvore, contando com que ela lhe devolveria o galho em 2015. Mas Dilma gostou do que viu lá de cima e quis continuar por mais quatro anos. Já aconteceu mil vezes: a criatura apaixona-se por si mesma, descobre que tem vontade própria e dá uma banana para seu criador. É elementar. Espanta que Lula não tenha previsto essa possibilidade.

Há outros espantos. Lula vendeu Dilma como uma grande gerente, uma executiva, uma administradora. Hoje sabemos que é exatamente o que ela não é –seu governo ficará como o mais incompetente da história. Se Lula achava que Dilma fosse aquilo tudo, revelou-se péssimo avaliador de material humano. Se sabia que ela não era, e a bancou assim mesmo, ele deve explicações ao seu pessoal.

Dizem que Lula escalou Dilma como sua sucessora porque Dirceu e Palocci foram abatidos no mensalão. Duvido –Lula os temia porque eram espertos e ambiciosos demais, poderiam crescer e engoli-lo. O ideal para Lula era mesmo Dilma, que o PT não queria, mas teve de digerir. Essa é uma característica do grande líder: quando ele erra, obriga todo mundo a errar com ele. Lula deve ter vendido Dilma como dócil, maternal e obediente. Ela se revelou voluntarista, grossa e incontrolável –além de politicamente desastrosa. Como se pode errar tanto?

Lula pôs o jabuti em cima da árvore. Isso é comum na política. Mas errou de árvore ou errou de jabuti. Em compensação, acertou um tiro no pé.

Entregues à providência divina

O país reclama do governo por uma agenda positiva, ou seja, um elenco de iniciativas capazes de restabelecer a esperança e a confiança em que sairemos da crise. Madame, no entanto, não consegue livrar-se da agenda negativa. Nem ela nem seus adversários. O dólar acaba de romper a barreira dos quatro reais, ao tempo em que o palácio do Planalto busca adiar a rejeição, pelo Congresso, dos vetos presidenciais a projetos aprovados pela maioria de deputados e senadores. Ao mesmo tempo, ignora-se quantos e quais ministérios serão extintos, sob a inquietação dos partidos da base oficial. Enquanto o segundo ajuste fiscal apenas assusta, com a recriação da CPMF, mas não chegou como projeto à Câmara dos Deputados, por medo da derrota, os efeitos do primeiro pacote fazem-se sentir em toda a sociedade: redução de direitos trabalhistas e de salários, aumento de impostos, taxas e tarifas, ascensão do custo de vida e, acima de tudo, desemprego em massa.

Na Esplanada dos Ministérios e na Praça dos Três Poderes, ninguém pensa na formulação de medidas em condições de recuperar a economia. Torna-se tão calamitosa a situação a ponto de o ex-deputado Delfim Neto acusar Madame de trapalhona e de um ícone fundador do PT, Hélio Bicudo, ter dado entrada no pedido de impeachment da presidente da República. Acrescente-se que o Tribunal de Contas da União está próximo de rejeitar as contas do governo em 2014 e de o Tribunal Superior Eleitoral, prestes a anular as eleições do ano passado, de Dilma e Temer, pela utilização de dinheiro podre na campanha. O PMDB abandona a coligação com o PT e os pequenos partidos saltam de banda.


A renúncia da presidente ganha cada vez mais clamores, ainda que não apenas a ela se deva inculpar pela desagregação econômica e institucional. A Justiça continua cumprindo seu papel, em ritmo peculiar, punindo muito menos do que descobrindo novos lances da roubalheira ao patrimônio público.

É esse o retrato do Brasil, jamais escondido no porão, como o de Dorian Gray, mas escancarado à vista de todos. Nem o empresariado nem os sindicalistas conseguem mais do que protestar em defesa de seus interesses. Na bancarrota, os Estados e Municípios enfrentam a inadimplência, assistindo a Federação desfazer-se e a União penalizando-os cada dia mais, sem conseguir livrar-se de dívidas sempre crescentes.

Muita gente acha que com a renúncia ou o impeachment seria possível começar tudo de novo, mera ilusão inviável, pois que grupo, partido ou corporação assumiria o encargo? E com que propostas? A conclusão é de que somos um país em frangalhos, entregue à Divina Providência, se é que Ela existe.

Queimou as caravelas

Quando da conquista do México, o espanhol Hernán Cortés mandou queimar as caravelas para não deixar nenhuma rota de fuga. Só restava a seus soldados seguir em frente, se quisessem sobreviver. A presidente Dilma Rousseff foi mais além, na sua reforma ministerial: mandou queimar as caravelas em pleno mar. E com ela dentro!

Só assim pode ser entendida sua resposta de que não poderia mais voltar atrás, quando aconselhada por Michel Temer a jogar a reforma ministerial para as calendas gregas para não criar quiproquó em sua base e instabilidade ainda maior no Congresso.

A arapuca na qual se meteu foi armada por ela própria, uma jejuna em política, que parte para frente como um touro bravo, sem cuidar da defesa dos seus flancos. A rainha ignora o bê-á-bá dessa arte: político digno desse nome não faz movimentos dos quais não possa recuar, ao menos taticamente. Nessa seara as coisas acontecem assim. O tudo ou nada dá sempre em nada.

Até os contínuos do Palácio do Planalto sabem que medidas de redução de cargos e de ministérios só são factíveis se tomadas por governos extremamente fortes. Em um governo enfraquecido, como o atual, em vez de ser um instrumento de coesão de sua base de sustentação é mais um fator de desagregação, de luta fratricida entre forças aliadas.

A reforma ministerial já seria uma operação de alto risco se executada logo após a acirradíssima disputa presidencial, imaginem dez meses depois, em um quadro de enfraquecimento e de barata voa nas hostes governistas. Um desatino, claro. Mas a presidente viu na reforma ministerial a cenoura que poderia fazer a sociedade, o mercado e o Parlamento engolirem goela a baixo seu pacote de maldades.
De quebra, vislumbrou na jogada a possibilidade de ter um mínimo de votos para evitar um processo de impeachment. Passou ao largo de suas intenções uma verdadeira reforma do Estado, capaz de despatrimonializá-lo.

Ao contrário, seu simulacro de reforma radicaliza o loteamento político, transforma o butim ministerial em mercado persa e aprofunda o escambo na relação com os partidos aliados.

O tiro saiu pela culatra. Em vez de ser a solução a “reforma” virou um problemão. Gerou insatisfações no MST e na ala esquerda do lulopetismo e deixou de cabelos ouriçados aliados hoje aboletados em ministérios.
Brasil afundando (Foto: Arquivo Google)

E, quem diria, a presidente ouviu um sonoro não da cúpula peemedebista, convidada a participar do reparte do bolo já em farelos, um fato cuja gravidade é autoexplicativa.

Nitidamente a espinha dorsal do PMDB, leia-se Temer, seus escudeiros, Renan, Eduardo Cunha, Romero Jucá e outros caciques, aproveitam-se da rateada presidencial para içar velas e abandonar o cais governista. Se alguém tiver alguma dúvida sobre qual rumo seguirão os profissionais da política, poderá dirimi-la por meio da declaração de Moreira Franco, homem de extrema confiança de Michel Temer: “O governo chamou Kassab (Gilberto) e Cid (Gomes) para desidratar o PMDB. Nós sabemos disso”.

Só que os peemedebistas não são dados à imolação. Sua cúpula não vai assistir passivamente Dilma enfiar uma cunha (desculpem o trocadilho) no PMDB, por meio da neopeemedebista Kátia Abreu ou da nomeação, à sua revelia, de algum deputado ou senador para um novo ministério dilmista.

A presidente não apenas queimou as caravelas com tripulação e tudo. Jogou também gasolina em suas vestes e está prestes a acender o fósforo.

O preço da paralisia


A cena foi surreal, simbólica da confusão dominante. Deputados federais gastaram uma tarde inteira, semana passada, discutindo se o Estado quebrado deve ou não cobrar de defunto, durante o velório. O projeto inovava ao adicionar uma certeza à vida na crise das finanças públicas: a tributação depois da morte.

— Defunto rico pagará mais? — ironizou o neossocialista Heráclito Fortes (PSB-PI).

O cristão Marcos Retagui (PSC-AC) foi além:

— O Imposto sobre Serviços (ISS) será cobrado sobre um imóvel, a sepultura, como é que vai ser executado: caso não seja pago, os prefeitos vão fazer o despejo dos ossos?

Tornou-se inevitável a evocação da lógica governamental de Odorico Paraguaçu, personagem de Dias Gomes, que prometia revolucionar o Brasil de 1984, com mais de 100% de inflação mensal, enquanto aguardava um cadáver para inaugurar o cemitério, sua principal obra.

— Promoverei a justiça social, mediante um plano econômico deverasmente revolucionário — anunciava. — A oposição difamista e subversenta fala muito mal da inflação. É bem verdade que a inflação já passou dos cem por cento, mas isso são os pratrasmentes. Prafrentemente é que importa. E eu provo por A mais B e por C menos D, que é justamente a inflação que vai nos salvar.

Prosseguia:

— Os salários até três mínimos são reajustados acima da inflação. Ora, 95% da população do país ganha menos de três mínimos. E se a inflação continua, esses 95% vão melhorando de vida, melhorando, até que se igualarão aos 5% que ganham mais. Então, será feita a redistribuição da riqueza, a igualdade entre as classes, a justiça social. Destarte, se eleito, promoverei o aumento da inflação para 300% até o ano 2000, tempo suficiente para que, pelo encumpridamento dos pequenos salários e achatamento dos grandes, seja feito o nivelamento salarial.

Na semana passada os legisladores acabaram isentando os mortos de tributação pelo Estado semifalido. Do embaraço denfuntício, como diria Paraguaçu, restou exposto de forma crua algo bem mais grave — o clima de paralisia nas instituições brasileiras.

A presidente manteve-se no Palácio do Planalto, sem bússola e refém da teia de interesses patrimonialistas do PT e partidos aliados, que ajudou a reforçar na última década.

No Congresso prosseguiu-se na toada de um possível processo de impeachment de Dilma Rousseff, mesmo sem evidências de prova material e conclusiva de delito constitucional — como observou o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, Ayres Britto. Mesmo se fosse possível abstrair essa realidade, seria previsível uma longa e incerta disputa judicial em torno do mandato presidencial.

O STF continuou indeciso a respeito das investigações criminais sobre os presidentes da Câmara, do Senado e centena e meia de parlamentares, todos interessados no desfecho da crise pelo impeachment.

À margem, o país mergulha na recessão. Se a retração se estender também por 2016, advertem economistas como José Roberto Affonso, será a primeira vez desde os anos 30 a se ter dois anos seguidos de retrocesso econômico.

A paralisia institucional ameaça impor um novo preço à crise brasileira: o risco de depressão. Seria o custo do desatino.
Temos um experimento absolutamente fracassado de populismo econômico
Monica de Bolle

TV por assinatura e economia de mercado à brasileira

Outro dia, querendo confrontar-me, um interlocutor exclamou: "Ah, já vi que o senhor defende o Estado mínimo!". Retruquei: "Não sei de que você está falando. Eu só conheço Estado grande, enorme, mastodôntico. E, cá entre nós, ele não precisa que você o defenda porque faz isso muito bem com sua força, leis, regulações, monopólios e mais uma lista inesgotável de meios através dos quais intervém na nossa liberdade e toma nosso dinheiro. Não se aborreça comigo por tentar defendê-lo desse Estado espremedor".

Diferentemente do que possa estar supondo o leitor destas linhas, não me conto entre os que esperam do mercado todas as soluções e as soluções para tudo. Não, não é isso que penso. Há tarefas que são típicas de Estado e a definição sobre quais sejam é polêmica. Independentemente desse debate necessário, tenho como certo que nós, brasileiros, somos tolerantes com o fato de que o Estado vai à contramão da modernidade, ampliando suas atribuições, seu poder e seus custos. Ele, que deveria estar se retraindo a meia dúzia de funções, se expande sem cessar. Para isso, nos trata como se fôssemos limões a espremer e descartar. Não satisfeito, quando os limões acabam, passa a espremer a safra futura, e a outra, e a outra, garantindo que os limões do porvir já cheguem devidamente amassados.
Tal compreensão da realidade não implica considerar o livre mercado como símbolo da perfeição. Não, o mercado não é perfeito. Frequentemente surgem nele distorções cuja correção, pelo próprio mercado, demanda tempo. Mas afirmo, sem qualquer dúvida, que intromissões reguladoras do Estado sobre o mercado nunca são mais eficientes do que as decisões dos consumidores.

Por exemplo: 90% do serviço de TV por assinatura, no Brasil, está em mãos de duas empresas e ambas adotam, além de preços excessivamente elevados, a respeito dos quais é impossível negociar (o que convenhamos, é uma prática antimercadológica, pois não há motivo pelo qual eu possa negociar na loja o preço de um sofá e não possa negociar o preço dos programas de TV que irei assistir sentado nele). Recentemente, não tendo interesse no "pacote HBO" da NET, solicitei cancelamento. Enquanto conversava com o atendente, tentei compor um menú contendo apenas aquilo que eu realmente gostaria de ter à disposição. Impossível. No cardápio do restaurante da TV por assinatura o consumidor não pode dar palpite. Não é permitido, sequer, trocar arroz à grega por batata suíça. A consequência é que todos, sem exceção, pagamos pelos serviços de TV por assinatura muito mais do que consumimos. Pagamos pelo muito que não vemos e o preço final resulta extorsivo.

Felizmente, a tecnologia que associa TV à internet proporcionou o surgimento da Netflix, serviço no qual, por menos de 20 reais/mês, se dispõe de vasto elenco de filmes e séries à livre escolha do cliente. Viva! O mercado está encontrando uma saída para os abusos das gigantes do setor, que passa a lutar contra esse inesperado intruso em mesa onde davam as cartas e jogavam de mão. A quem apelam, para conservar seus anéis nos dedos? Apelam ao Estado, meu amigo! Querem a ajuda do Estado para coibir a Netflix, forçando-a, por via tributária, a elevar seus custos e preços. Alguém tem dúvidas sobre o que fará a respeito o Estado máximo?

O prejuízo do cidadão

O sistema de Previdência Social começou a ser implantado no Brasil em 1923, portanto há 92 anos. Nesse tempo, ele se desenvolveu gradativamente, alcançando mais segmentos da população e somando, hoje, cerca de 31 milhões de brasileiros.

Graças ao sistema, parte significativa da população é sustentada em patamares dignos de sobrevivência. O volume de recursos pagos aos beneficiários impulsiona a economia de muitos municípios, sendo superiores a outros repasses do governo federal.

A importância do sistema na vida nacional fica evidenciada quando ele entra em crise, como no momento. Há quase 80 dias os servidores do INSS mantém uma greve nacional reivindicando aumento de salários e melhores condições de trabalho.

Por causa dela, está praticamente interrompida a concessão de novos benefícios, como aposentadorias, pensões por morte, auxílio-doença e licença-maternidade, entre outros. Segundo estimativas, quase 1 milhão de pessoas estão sem assistência.

Grande parte é constituída de pessoas humildes, sem outros recursos, precisando urgentemente desse apoio do governo. O órgão recomenda que o interessado agende o procedimento, mas, quando ele comparece à agência do INSS, não é atendido.

Observadores avaliam que o governo está tirando proveito disso, uma vez que não tem de desembolsar mais recursos. Doutro lado, como as perícias estão paralisadas, muitos trabalhadores, aptos para trabalhar, continuam à disposição do INSS.

A situação se agravou no atual governo, que, no bojo de um ajuste fiscal, aprovou uma minirreforma, cortando benefícios, e, posteriormente, propôs o adiamento do reajuste do funcionalismo público e cancelou a realização de concursos públicos.

Como se tornou comum no Brasil, hoje, no embate entre governo e servidores, a população em geral e o cidadão em particular são os maiores prejudicados.