segunda-feira, 27 de março de 2017
De volta para o futuro
“CPI desvenda esquema de corrupção envolvendo empreiteiras e políticos.” A manchete parece resumir o noticiário de hoje, dominado pela cobertura da Lava Jato. Saiu em 2 de dezembro de 1993, na capa do finado “Jornal do Brasil”. Naquele dia, a imprensa apresentou o relatório preliminar da CPI do Orçamento. O documento mostrava como as construtoras se organizaram para corromper parlamentares e superfaturar obras públicas.
Ainda não havia delação premiada, mas planilhas apreendidas pela Polícia Federal citavam deputados e senadores de diversos partidos. A investigação trazia outra conclusão atualíssima: o cartel das empresas era chefiado pela Odebrecht.
A papelada revela a existência de um verdadeiro governo paralelo, tocado pelas grandes empreiteiras”, afirmava a Folha. “O comprometimento se dava em três níveis: pagamento de propinas, ajuda para as campanhas políticas e presentes”, contava o “JB”.
A dimensão do caso assombrou o Congresso, onde a investigação passou a ser tachada de ameaça à democracia. Dois senadores foram ao Planalto dizer ao presidente que temiam um golpe. A CPI consultou os ministros militares e desistiu de divulgar a lista completa dos suspeitos.
O escândalo do Orçamento abalou a República, mas terminou muito aquém do que se esperava. A maior parte da conta foi paga pelos “anões”, deputados de baixa estatura e pouca expressão política. Houve quatro renúncias e seis cassações.
Do outro lado do balcão, tudo continuou como antes. Isso explica por que Emílio Odebrecht diria, 23 anos depois, que o caixa dois “sempre foi o modelo reinante no país”.
O noticiário de 1993 traz outra lembrança curiosa: o PT, que liderava a oposição, escapou invicto da lista de propinas. No ano seguinte, Lula se lançaria em campanha presidencial com um anúncio à praça: “Em princípio, nós não aceitaremos dinheiro da Odebrecht”.
Quatro cachorros
É estranho viver em época com muita noticia e pouca novidade. Os dias chegam como reedições de história velha, interpretada por elenco duvidoso em tramas já conhecidas. A farsa sempre se repete. E cria tragédias.
Falta, enfim, originalidade em um tempo em que todos os responsáveis parecem seguir a mesma estratégia como ferramenta de proteção contra a responsabilização ou culpa. Com menor ou maior grau de competência. Mas os argumentos são os mesmos. Sempre.
Todos seguem a ``Defesa dos Quatro Cachorros`` (``The Four Dog Defense``) na qual o dono de um cachorro metafórico tenta evitar ser responsabilizado quando o animal morde outra pessoa. Para isso, adota quatro argumentos usados em sequência.
``Eu não tenho cachorro``. O primeiro passo, é sempre claro. Negar tudo. Dizer que o problema não existe. Somos exemplos de excelência. Estamos sendo perseguidos. É exagero. Não aconteceu. É mentira, calunia motivada apenas por interesses escusos. A conta não é minha.
``Meu cachorro não morde``. Não há nada como o tempo para passar. Negar a existência dos fatos frequentemente deixa de ser opção. Ai o segundo passo é útil. Aceitar os fatos, mas dizer que não houve prejuízos. Foi um acidente sem consequência. Apenas evento pontual. Ninguém foi prejudicado. Foi em favor de causa maior.
``Meu cachorro não mordeu você``. Na medida em que o problema cresce, tudo vai ficando claro. E as perdas, evidentes. Portanto, confundir é preciso. Daí o terceiro passo. Confirmar que é tudo verdade, mas minimizar as consequências. De fato, alguém foi prejudicado, mas não foi você. O impacto foi sentido apenas em região muito pequena. As consequências são isoladas, contidas, limitadas a um pequeno grupo, área, departamento. Você não foi impactado por isso.
``Você foi mordido, mas a culpa é sua``. Eventualmente, o impacto é sentido. A conexão entre fato e perda fica clara, inegável. É tempo de executar o quarto passo. Nega-se a responsabilidade. Ou melhor, culpa-se outras pessoas. O sistema força a delinquência. Não havia outra opção. Todo mundo faz. O eleitor não sabe votar.
Resta torcer para não inventarem um quinto passo. Precisamos urgentemente virar a página. De preferência, para frente.
Falta, enfim, originalidade em um tempo em que todos os responsáveis parecem seguir a mesma estratégia como ferramenta de proteção contra a responsabilização ou culpa. Com menor ou maior grau de competência. Mas os argumentos são os mesmos. Sempre.
Todos seguem a ``Defesa dos Quatro Cachorros`` (``The Four Dog Defense``) na qual o dono de um cachorro metafórico tenta evitar ser responsabilizado quando o animal morde outra pessoa. Para isso, adota quatro argumentos usados em sequência.
``Eu não tenho cachorro``. O primeiro passo, é sempre claro. Negar tudo. Dizer que o problema não existe. Somos exemplos de excelência. Estamos sendo perseguidos. É exagero. Não aconteceu. É mentira, calunia motivada apenas por interesses escusos. A conta não é minha.
``Meu cachorro não morde``. Não há nada como o tempo para passar. Negar a existência dos fatos frequentemente deixa de ser opção. Ai o segundo passo é útil. Aceitar os fatos, mas dizer que não houve prejuízos. Foi um acidente sem consequência. Apenas evento pontual. Ninguém foi prejudicado. Foi em favor de causa maior.
``Meu cachorro não mordeu você``. Na medida em que o problema cresce, tudo vai ficando claro. E as perdas, evidentes. Portanto, confundir é preciso. Daí o terceiro passo. Confirmar que é tudo verdade, mas minimizar as consequências. De fato, alguém foi prejudicado, mas não foi você. O impacto foi sentido apenas em região muito pequena. As consequências são isoladas, contidas, limitadas a um pequeno grupo, área, departamento. Você não foi impactado por isso.
``Você foi mordido, mas a culpa é sua``. Eventualmente, o impacto é sentido. A conexão entre fato e perda fica clara, inegável. É tempo de executar o quarto passo. Nega-se a responsabilidade. Ou melhor, culpa-se outras pessoas. O sistema força a delinquência. Não havia outra opção. Todo mundo faz. O eleitor não sabe votar.
Resta torcer para não inventarem um quinto passo. Precisamos urgentemente virar a página. De preferência, para frente.
Doenças da carne, doenças da alma
Quando menino, ouvia muito essa frase: ou o Brasil acaba com a saúva ou a saúva acaba com o Brasil. Envelheci, nenhum dos dois acabou, nem a saúva nem o Brasil. Por isso, sou bastante contido ao falar da corrupção no país. Desde a década de 1990, limito-me a afirmar aos amigos que a corrupção iria inviabilizar nosso futuro.
Alguns discordavam. Suas teses enfatizavam a importância das conquistas sociais e afirmavam que, num contexto de grande progresso, a corrupção não seria mais do que uma nota de pé de página na História do Brasil contemporâneo.
Naquele momento, preocupava-me a degradação do sistema político: a perda de credibilidade iria nos jogar numa crise sem precedentes. O século virou. Com o assalto à Petrobras ficou evidente um outro lado da corrupção: seus danos à economia nacional. A crise econômica e o desemprego acabaram demonstrando que as conquistas sociais eram uma nota de pé de página numa gigantesca história de corrupção.
De um ponto de vista técnico, equipamentos e competência, não havia nada de errado na Petrobras. O sistema de produção de carnes no Brasil, referendado por inspeções internacionais, vive um momento dramático de credibilidade aqui e no exterior. A maior empresa do Brasil foi devastada pela corrupção. Agora, o comércio exterior do país sofre um golpe temporário. Para mim, a corrupção reaparece num novo cenário para demonstrar a tese do fim do século XX: se não for atacada de verdade, ela inviabiliza o país moral e economicamente.
As denúncias da PF talvez não tenham sido bem entendidas. Ou melhor, alguns críticos fixaram-se em alguns pontos e fugiram de outros que me parecem decisivos. Em primeiro lugar, mesmo sem papelão, mesmo acreditando que o ácido ascórbico não provoca o câncer, de um ponto de vista sanitário havia de algo muito grave ali. A presença de salmonela na carne deveria nos preocupar. Era uma carne para exportação. Se não fosse evitado esse lance, a credibilidade corria um risco muito maior.
Outro ponto preocupante é o uso de animais não abatidos, isto é, mortos em diferentes circunstâncias. Essa denúncia mencionada pelos federais coincide com depoimentos anônimos na internet de ex-funcionários de frigoríficos. A ingestão de animais mortos foi um grande tema quando se discutiu a doença da vaca louca na Europa.
Tudo isso pode ser esclarecido, mas não é o centro. O problema é o uso político das agências de fiscalização. Segundo os jornais, 19 entre 26 estão aparelhadas pelos partidos. Na primeira intervenção sobre o tema, escrevi, com outras palavras, que Temer ofereceu um churrasco para os embaixadores estrangeiros, e eles entenderam que era uma pizza.
A denúncia principal da PF era de corrupção. Isto preocupa mais os observadores do que a estrutura técnica da produção. Eles precisam confiar nas autoridades locais, porque não há condições de fiscalizar tudo que entra num país. O governo brasileiro não deu uma resposta para isso, exceto a demissão de alguns superintendentes. A resposta adequada é despolitizar todas as agências fiscalizadoras, garantindo eficiência e imparcialidade.
Por não ser capaz de demitir o ministro da Justiça, de questionar o da Agricultura, de ordenar a retirada de afilhados políticos, Temer trilhou o caminho mais difícil, escorando-se nos números para afirmar que o problema era pontual, mas omitindo o aspecto sistêmico: a presença de políticos em cargos onde não deveriam estar.
Um dos principais frigoríficos envolvidos, a JBS invade nossas telas garantindo sua competência técnica e a modernidade de seus processos. Quanto mais afirmam isso, quanto mais gente de uniforme branco imaculado nas telas, mais se escondem de seu verdadeiro problema: as relações incestuosas com os partidos políticos, especialmente com o PT. A JBS deve à Previdência, tomou empréstimos no BNDES, entrou no dinheiro do FGTS. Ela, na verdade, agiu no espaço público com mais desenvoltura do que uma estatal. E entupiu os partidos políticos, PT à frente, com mais de R$ 50 milhões na campanha eleitoral. E foi um caminho rude, passando o trator nos pequenos frigoríficos, impondo aos vendedores de gado condições draconianas.
Se vi bem, Temer usou um chapéu branco de garçom numa selfie de churrascaria. É uma ideia promissora. Se ao lado dele viessem todos de branco, os donos da JBS e BRF e os políticos que controlam as agências poderiam trazer na mão suculentos nacos de carne e dizer:
— Não existe nada de errado com ela. O problema somos nós.
Olhando para trás, acho que, apesar de fraca, a carne resistiu alguns anos. Antes dela desapareceram a decência na política, o respeito aos fatos, tudo engolfado pela corrupção: petróleo, hidrelétricas, nuclear, empreiteiras até joalherias, é a paisagem depois de batalha.
Já escondidos atrás do foro privilegiado, os políticos querem se esconder de novo atrás de listas fechadas, anular provas da delação da Odebrecht, enfim voltar aos velhos tempos.
Não vão acabar com o Brasil. As saúvas não acabaram.
Alguns discordavam. Suas teses enfatizavam a importância das conquistas sociais e afirmavam que, num contexto de grande progresso, a corrupção não seria mais do que uma nota de pé de página na História do Brasil contemporâneo.
De um ponto de vista técnico, equipamentos e competência, não havia nada de errado na Petrobras. O sistema de produção de carnes no Brasil, referendado por inspeções internacionais, vive um momento dramático de credibilidade aqui e no exterior. A maior empresa do Brasil foi devastada pela corrupção. Agora, o comércio exterior do país sofre um golpe temporário. Para mim, a corrupção reaparece num novo cenário para demonstrar a tese do fim do século XX: se não for atacada de verdade, ela inviabiliza o país moral e economicamente.
As denúncias da PF talvez não tenham sido bem entendidas. Ou melhor, alguns críticos fixaram-se em alguns pontos e fugiram de outros que me parecem decisivos. Em primeiro lugar, mesmo sem papelão, mesmo acreditando que o ácido ascórbico não provoca o câncer, de um ponto de vista sanitário havia de algo muito grave ali. A presença de salmonela na carne deveria nos preocupar. Era uma carne para exportação. Se não fosse evitado esse lance, a credibilidade corria um risco muito maior.
Outro ponto preocupante é o uso de animais não abatidos, isto é, mortos em diferentes circunstâncias. Essa denúncia mencionada pelos federais coincide com depoimentos anônimos na internet de ex-funcionários de frigoríficos. A ingestão de animais mortos foi um grande tema quando se discutiu a doença da vaca louca na Europa.
Tudo isso pode ser esclarecido, mas não é o centro. O problema é o uso político das agências de fiscalização. Segundo os jornais, 19 entre 26 estão aparelhadas pelos partidos. Na primeira intervenção sobre o tema, escrevi, com outras palavras, que Temer ofereceu um churrasco para os embaixadores estrangeiros, e eles entenderam que era uma pizza.
A denúncia principal da PF era de corrupção. Isto preocupa mais os observadores do que a estrutura técnica da produção. Eles precisam confiar nas autoridades locais, porque não há condições de fiscalizar tudo que entra num país. O governo brasileiro não deu uma resposta para isso, exceto a demissão de alguns superintendentes. A resposta adequada é despolitizar todas as agências fiscalizadoras, garantindo eficiência e imparcialidade.
Por não ser capaz de demitir o ministro da Justiça, de questionar o da Agricultura, de ordenar a retirada de afilhados políticos, Temer trilhou o caminho mais difícil, escorando-se nos números para afirmar que o problema era pontual, mas omitindo o aspecto sistêmico: a presença de políticos em cargos onde não deveriam estar.
Um dos principais frigoríficos envolvidos, a JBS invade nossas telas garantindo sua competência técnica e a modernidade de seus processos. Quanto mais afirmam isso, quanto mais gente de uniforme branco imaculado nas telas, mais se escondem de seu verdadeiro problema: as relações incestuosas com os partidos políticos, especialmente com o PT. A JBS deve à Previdência, tomou empréstimos no BNDES, entrou no dinheiro do FGTS. Ela, na verdade, agiu no espaço público com mais desenvoltura do que uma estatal. E entupiu os partidos políticos, PT à frente, com mais de R$ 50 milhões na campanha eleitoral. E foi um caminho rude, passando o trator nos pequenos frigoríficos, impondo aos vendedores de gado condições draconianas.
Se vi bem, Temer usou um chapéu branco de garçom numa selfie de churrascaria. É uma ideia promissora. Se ao lado dele viessem todos de branco, os donos da JBS e BRF e os políticos que controlam as agências poderiam trazer na mão suculentos nacos de carne e dizer:
— Não existe nada de errado com ela. O problema somos nós.
Olhando para trás, acho que, apesar de fraca, a carne resistiu alguns anos. Antes dela desapareceram a decência na política, o respeito aos fatos, tudo engolfado pela corrupção: petróleo, hidrelétricas, nuclear, empreiteiras até joalherias, é a paisagem depois de batalha.
Já escondidos atrás do foro privilegiado, os políticos querem se esconder de novo atrás de listas fechadas, anular provas da delação da Odebrecht, enfim voltar aos velhos tempos.
Não vão acabar com o Brasil. As saúvas não acabaram.
Só um expurgo político salvará o país
Governo, Congresso e partidos respiraram aliviados com o fracasso das manifestações marcadas para ontem em defesa da Lava Jato e contra a anistia ao caixa dois, o voto em lista fechada e a anulação de delações que possam comprometer suspeitos de corrupção.
Governo refém do Congresso depende dele para aprovar reformas. Congresso refém de delatores não merece a confiança de ninguém. Vida que segue.
Em duas ocasiões, na semana passada, talvez por descuido, o PT tirou a máscara ao tratar do uso de dinheiro sujo nas eleições.
Relator da reforma política na Câmara, o deputado Vicente Cândido (SP) defendeu que o Congresso enfrente o desgaste de discutir anistia aos alvos da Lava Jato como forma de "distensionar o país".
Em seu site, o partido postou um estudo que justifica o uso do caixa dois.
“O que é melhor para a sociedade nesse momento? Até aprovar uma anistia, seja criminal, financeira, tudo isso é possível, não é novidade no mundo", justificou Cândido.
O estudo da seção mineira da corrente “Construindo um Novo Brasil”, majoritária dentro do PT, pretende “contribuir para o exercício reflexivo” às vésperas do 6º congresso do partido, a ser realizado até junho próximo.
“As eleições brasileiras foram feitas mediante contribuições não contabilizadas. O PT, provavelmente, se utilizou das mesmas regras que os demais usavam. (...) Como o PT poderia disputar eleições sem recursos enquanto todos os partidos neoliberais o tinham de sobra? Seria impossível disputar com chances de vitória sem os instrumentos necessários”, sustenta o estudo.
Nem Cândido nem o estudo se detiveram sobre a verdade universal de que não existe Estado de Direito sem justiça e sem eleições livres e democráticas. E que eleições corrompidas por qualquer meio, sobretudo pelo abuso do poder econômico, podem ser tudo menos democráticas, livres e justas.
Inexiste o bom e o mau ladrão a não ser na cena da morte de Jesus. Mesmo assim por excesso de bondade do Nazareno.
Em 1994, a poucos meses de disputar a segunda eleição que perderia, Lula avisou de público: "Em princípio, nós não aceitaremos dinheiro da Odebrecht".
Por que a princípio? E por que da Odebrecht? Porque a construtora, na época, já estava envolvida em escândalos e Lula queria marcar distância dela. Em 2002, Lula chamou José Dirceu é disse: “Só disputo outra vez se for para ganhar”.
Ganhou - com a ajuda da Odebrecht. O “partido limpo” beijou a cruz e chafurdou na lama como os demais partidos. Se os neoliberais podiam chafurdar por que o partido dos trabalhadores não?
Tudo por uma boa causa, a de melhorar a vida do povo. Melhorou – e também a vida dos que se diziam destinados pela Providência a tirar o povo da miséria, do analfabetismo e das doenças.
O “Estado Odebrecht” foi uma invenção do PT para permanecer no governo por no mínimo 20 anos. Com Lula durante os oito primeiros (deu certo), com Dilma durante quatro (deu certo) e com Lula por mais oito.
Aí Dilma estragou tudo. Quis ficar por mais quatro. E afundou o país na maior recessão econômica de sua história dos anos 30 do século passado para cá. O resto se sabe.
O que não se sabia com detalhes se torna conhecido com as delações de executivos da Odebrecht. É de arrepiar.
Fora da Lava Jato não haverá salvação. Ou melhor: só haverá se promovermos em 2018 um expurgo político extraordinário que limpe governos, Congresso e assembleias legislativas.
Olho no lance
Quando olhamos para trás na história, tendemos a acreditar num certo determinismo -se as coisas aconteceram de tal jeito é porque era assim que tinham de acontecer. Mas Nelson Rodrigues se perguntava como seria se Jesus Cristo tivesse morrido aos quatro anos, de coqueluche. Não teríamos o calvário, nem a cruz e nem a ressurreição e, provavelmente, a história do Ocidente seria diferente.
Várias vezes, a história esteve perto de ser alterada e só por sorte não foi. Em 1942, ao escolher um ator para o papel do aventureiro Rick Blaine num filme em preparo, chamado "Casablanca", a Warner pensou em escalar Ronald Reagan. Ninguém se opôs. E, assim, até perto das filmagens, Reagan foi Rick -até que um ser de luz soprou ao ouvido da Warner que Rick só podia ser Humphrey Bogart. O resto você sabe.
Em 1954, o desconhecido Ferreira Gullar mandou para uma gráfica os originais de um livro de poemas, "A Luta Corporal", para publicá-lo por conta própria. O revisor da gráfica, diante de versos como "Au soflu i luz ta pom-/ pa inova'/ orbita/ FUROR/ tô bicho/ 'scuro fo/ go/ Rra", achou que estava tudo errado e se dispôs a "corrigir" o texto. Gullar só o impediu aos 45 do segundo tempo, e por pouco não teríamos o livro que reinventou a poesia brasileira.
Em fins dos anos 60, no interior da Alemanha, a faxineira do hotelzinho viu um hóspede desabado num sofá da recepção, dormindo e roncando, em pleno dia. A mulher se condoeu das unhas enormes do rapaz. Pegou sua tesourinha e, com cuidado, aparou-as até o sabugo. Quando ele acordou, viu aquilo e quase chorou. Mas, como era o grande Baden Powell, foi em frente e deu o seu show de violão naquela noite do mesmo jeito.
Tudo isso para dizer que precisamos ficar atentos. Há sempre alguém à nossa volta tentando mudar a história - contra nós.
Várias vezes, a história esteve perto de ser alterada e só por sorte não foi. Em 1942, ao escolher um ator para o papel do aventureiro Rick Blaine num filme em preparo, chamado "Casablanca", a Warner pensou em escalar Ronald Reagan. Ninguém se opôs. E, assim, até perto das filmagens, Reagan foi Rick -até que um ser de luz soprou ao ouvido da Warner que Rick só podia ser Humphrey Bogart. O resto você sabe.
Em fins dos anos 60, no interior da Alemanha, a faxineira do hotelzinho viu um hóspede desabado num sofá da recepção, dormindo e roncando, em pleno dia. A mulher se condoeu das unhas enormes do rapaz. Pegou sua tesourinha e, com cuidado, aparou-as até o sabugo. Quando ele acordou, viu aquilo e quase chorou. Mas, como era o grande Baden Powell, foi em frente e deu o seu show de violão naquela noite do mesmo jeito.
Tudo isso para dizer que precisamos ficar atentos. Há sempre alguém à nossa volta tentando mudar a história - contra nós.
Felizes para sempre
Segundo o Relatório Mundial de Felicidade de 2017, a Noruega é o país mais feliz do mundo, seguido por Dinamarca, Islândia, Suíça e Finlândia. Reconhecida pelas Nações Unidas, a lista envolve 155 países e se baseia no PIB per capita e na expectativa de vida saudável de cada população. Os entrevistados também podem atribuir notas de 0 a 10 para apoio social, liberdade e grau de corrupção local.
No Relatório, o Brasil, que já foi o 17º país mais feliz do mundo, este ano caiu para o 22º lugar. Não sei se a ressurreição da seleção brasileira, nas mãos do Tite, pode vir a melhorar nossa classificação nesse boletim de felicidade. Por enquanto, é isso aí.
Não conheço todos eles, mas não me sinto atraído a viver em nenhum desses líderes da lista. Não sei se suportaria verões em que o sol não se põe e invernos em que ele passa ao largo, como se não tivesse nada a ver com isso.
Tenho um amigo, cineasta finlandês, que organiza festivais de cinema num balneário de seu país, em pleno solstício de verão. Ele procura me atrair ao evento me contando que são três dias sem noite, em que ninguém precisa dormir. Por motivos de força maior, nunca fui a esse festival.
Não acredito muito que seja possível medir a taxa de felicidade de alguém. Não existe homem feliz ou infeliz, mas momentos de felicidade e infelicidade na vida de cada um. Cabe a nós esticar as primeiras e fazer passar mais depressa as segundas.
Reconheço que, às vezes, esse saudável exercício de nossa vontade não é possível. Há sempre uma Lava-Jato para nos revelar que gente mais poderosa e mais esperta do que nós tratou de se beneficiar com o que deveria ser de todos, com o que faz falta a um pouco mais de felicidade para todos nós.
Parece que o levantamento do que a turma do ex-governador Sérgio Cabral tomou dos recursos públicos já chega a um bilhão de reais e ainda não se encerrou. O valor do dinheiro da corrupção pública já recuperado pelo pessoal do Sérgio Moro, até março de 2017, é de cerca de US$ 780 milhões; ou seja, uns R$ 2,5 bilhões.
Mesmo que você nunca tenha pensado em ser nada na política, imagine por um momento o que poderia fazer pelos outros, sobretudo pelos mais necessitados, com essa grana toda. E essa grana toda é apenas a ponta de um iceberg gigantesco, enfiado no oceano público do país, que ainda está sendo desvendado.
O horizonte da investigação nos permite multiplicar por muito esses valores, que poderiam produzir muita coisa em benefício da população.
Digamos que o Brasil nunca foi um país feliz, no sentido de um país realizado. Mas sempre vivemos dessa esperança. Ao longo de minha vida, já não muito curta, vivi dois apogeus dela.
O primeiro, de 1955 a 1964, foi o período dos presidentes Juscelino, Jânio e Jango, com a expectativa de que estávamos inventando um mundo diferente e melhor, alguma coisa que nunca existira antes de nós e cuja grandeza fundaria uma nova civilização.
O Brasil era a fonte dessa nova civilização, o extremo-ocidente no futuro mais justo e mais fraterno do planeta.
O outro tempo foi de 1992 a 2010, o período de Itamar, Fernando Henrique e Lula. Não se tratava mais de ensinar o mundo a ser feliz como nós, mas de sermos felizes por nossa própria conta, sem precisar se preocupar com a decadência que rolava lá fora depois da queda do muro e das ilusões ideológicas.
O abraço entre Lula e Fernando Henrique, no funeral de dona Marisa Letícia, foi o sinal retardado de uma aliança que poderia ter sido e que não foi. Ela mudaria o sentido da História do Brasil, realizando, pela primeira vez, o que já fora tentado nos fins melancólicos do Estado Novo e da ditadura militar — a união entre consciência social e amor à liberdade, somando ação e inteligência, um entendimento que nunca havia acontecido entre nós.
Hoje, estamos todos nas ruas, odiando os que mais se parecem uns com os outros, vivendo uma polarização entre os que mais pensam parecido.
Continuaremos tentando ser felizes. Mesmo descontentes, nossos artistas militantes sabem que não há nenhum artista na cadeia ou no exílio, como no passado autoritário. E os muitos que estão nas ruas podem dizer e fazer o que bem entenderem, uma diferença capital em relação a qualquer ditadura.
Quase exatos dois séculos antes do terremoto de Lisboa, em 1º de novembro de 1755, que acabou com dois terços da população da capital portuguesa, em 23 de janeiro de 1556 um terremoto em Shaanxi, na China, matou 800 mil pessoas, o maior desastre natural conhecido na História. Os apocalipses vão sempre existir, em todos os tempos, a qualquer hora. A malandragem é, mesmo assim, estar sempre tentando evitá-los e a melhor forma para isso é a busca da felicidade.
No Relatório, o Brasil, que já foi o 17º país mais feliz do mundo, este ano caiu para o 22º lugar. Não sei se a ressurreição da seleção brasileira, nas mãos do Tite, pode vir a melhorar nossa classificação nesse boletim de felicidade. Por enquanto, é isso aí.
Não conheço todos eles, mas não me sinto atraído a viver em nenhum desses líderes da lista. Não sei se suportaria verões em que o sol não se põe e invernos em que ele passa ao largo, como se não tivesse nada a ver com isso.
Tenho um amigo, cineasta finlandês, que organiza festivais de cinema num balneário de seu país, em pleno solstício de verão. Ele procura me atrair ao evento me contando que são três dias sem noite, em que ninguém precisa dormir. Por motivos de força maior, nunca fui a esse festival.
Não acredito muito que seja possível medir a taxa de felicidade de alguém. Não existe homem feliz ou infeliz, mas momentos de felicidade e infelicidade na vida de cada um. Cabe a nós esticar as primeiras e fazer passar mais depressa as segundas.
Parece que o levantamento do que a turma do ex-governador Sérgio Cabral tomou dos recursos públicos já chega a um bilhão de reais e ainda não se encerrou. O valor do dinheiro da corrupção pública já recuperado pelo pessoal do Sérgio Moro, até março de 2017, é de cerca de US$ 780 milhões; ou seja, uns R$ 2,5 bilhões.
Mesmo que você nunca tenha pensado em ser nada na política, imagine por um momento o que poderia fazer pelos outros, sobretudo pelos mais necessitados, com essa grana toda. E essa grana toda é apenas a ponta de um iceberg gigantesco, enfiado no oceano público do país, que ainda está sendo desvendado.
O horizonte da investigação nos permite multiplicar por muito esses valores, que poderiam produzir muita coisa em benefício da população.
Digamos que o Brasil nunca foi um país feliz, no sentido de um país realizado. Mas sempre vivemos dessa esperança. Ao longo de minha vida, já não muito curta, vivi dois apogeus dela.
O primeiro, de 1955 a 1964, foi o período dos presidentes Juscelino, Jânio e Jango, com a expectativa de que estávamos inventando um mundo diferente e melhor, alguma coisa que nunca existira antes de nós e cuja grandeza fundaria uma nova civilização.
O Brasil era a fonte dessa nova civilização, o extremo-ocidente no futuro mais justo e mais fraterno do planeta.
O outro tempo foi de 1992 a 2010, o período de Itamar, Fernando Henrique e Lula. Não se tratava mais de ensinar o mundo a ser feliz como nós, mas de sermos felizes por nossa própria conta, sem precisar se preocupar com a decadência que rolava lá fora depois da queda do muro e das ilusões ideológicas.
O abraço entre Lula e Fernando Henrique, no funeral de dona Marisa Letícia, foi o sinal retardado de uma aliança que poderia ter sido e que não foi. Ela mudaria o sentido da História do Brasil, realizando, pela primeira vez, o que já fora tentado nos fins melancólicos do Estado Novo e da ditadura militar — a união entre consciência social e amor à liberdade, somando ação e inteligência, um entendimento que nunca havia acontecido entre nós.
Hoje, estamos todos nas ruas, odiando os que mais se parecem uns com os outros, vivendo uma polarização entre os que mais pensam parecido.
Continuaremos tentando ser felizes. Mesmo descontentes, nossos artistas militantes sabem que não há nenhum artista na cadeia ou no exílio, como no passado autoritário. E os muitos que estão nas ruas podem dizer e fazer o que bem entenderem, uma diferença capital em relação a qualquer ditadura.
Quase exatos dois séculos antes do terremoto de Lisboa, em 1º de novembro de 1755, que acabou com dois terços da população da capital portuguesa, em 23 de janeiro de 1556 um terremoto em Shaanxi, na China, matou 800 mil pessoas, o maior desastre natural conhecido na História. Os apocalipses vão sempre existir, em todos os tempos, a qualquer hora. A malandragem é, mesmo assim, estar sempre tentando evitá-los e a melhor forma para isso é a busca da felicidade.
Não tem guerra, mas em compensação...
Excessos da carne
Foram assustadoras as primeiras suspeitas divulgadas com a deflagração da Operação Carne Fraca, da Polícia Federal, sobre cumplicidade entre frigoríficos e fiscais do governo visando à venda ilegal de alimentos no País e no exterior. A Polícia Federal (PF) afirmou que os frigoríficos exerciam influência no Ministério da Agricultura para escolher os servidores que ficariam responsáveis pela fiscalização de suas unidades. Executivos da BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, tinham até acesso a uma senha para entrar no sistema interno dos processos administrativos do órgão, de acordo com a polícia.
A se confirmarem as alegações da PF, trata-se de caso em que as implicações da corrupção vão além da imaginação. Está em risco a própria saúde dos consumidores.
Fechamos aquela semana em clima de pânico. Carne com papelão. Ácido cancerígeno na salsicha. E por aí foi. As redes sociais se encarregaram de amplificar o show de horrores. Mas nós, jornalistas da chamada imprensa de qualidade, não soubemos separar o joio do trigo. Ficamos reféns da narrativa precipitada da PF. Faltaram apuração e edição criteriosa. A Operação Carne Fraca ganhou acordes em lá maior. Foi conduzida com pouco cuidado. Desvios de alguns executivos e funcionários jogaram no lixo a reputação de todas as empresas.
Ex-ministro da Agricultura e presidente da associação que reúne produtores e exportadores de carne suína e de frango, Francisco Sérgio Turra afirmou que a repercussão da Operação Carne Fraca foi exagerada, dando a impressão de que a carne brasileira é toda fraudada. “Foi muito forte esse discurso irresponsável, fruto de um levantamento ainda incompleto da própria operação (da Polícia Federal)”, disse em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo. Segundo ele, os produtores brasileiros mantêm padrões de qualidade elevados e as falhas identificadas pelas autoridades não pegam nem 0,5% do setor.
O estrago econômico potencialmente devastador, porém, está feito. Estão sob ameaça exportações anuais de US$ 14,5 bilhões em produtos com proteína animal. O Brasil levou anos para remover a desconfiança de autoridades sanitárias de outros países e disputar o mercado mundial de carne. Agora, infelizmente, estamos sob suspeita.
Os excessos da PF devem ser condenados. Mas a corrupção, mesmo pontual e minoritária, deve ser exemplarmente punida. É necessário dar um basta a isso. Quando vamos romper esse ciclo? Quando vamos assistir, de fato, à punição dos culpados? A repetição dos escândalos produz um perigoso fatalismo. Quando se banaliza a corrupção se banaliza a culpa. O risco é de que se torne um comportamento epidêmico. Para onde vamos?
Uma das causas dos crimes e dos desvios de comportamento que castigam a sociedade brasileira é, sem dúvida, a certeza da impunidade. O criminoso sabe que a probabilidade de um longo período de reclusão só existe na letra morta da lei. O Brasil, como bem sabemos, não padece de anemia legal. O nosso drama é a falta de eficácia na aplicação da lei.
Há, contudo, estou convencido, causas ideológicas mais profundas para o eclipse da ética e para a explosão das ações criminosas. O relativismo ético, a ausência de limites e a crise da família estão na raiz da patologia social.
De fato, quantas correntes ideológicas, quantos modismos intelectuais vivemos nas últimas décadas? A busca da verdade é frequentemente etiquetada como fundamentalismo, ao passo que o relativismo, isto é, o deixar-se levar ao sabor da última novidade, aparece como a única atitude à altura dos tempos que correm. Vai-se constituindo a intolerância do relativismo que não reconhece nada como definitivo e usa como critério apenas o próprio eu. A renúncia à verdade não soluciona nada, ao contrário, conduz à ditadura da arbitrariedade. O relativismo está, de fato, na origem do enfraquecimento da democracia e nas agressões cada vez mais brutais aos direitos humanos.
Há no cerne da crise uma profunda raiz ideológica. Na verdade, as bases racionais da modernidade foram minadas pelo relativismo. Rompeu-se, dramaticamente, o nexo de união entre vontade e razão. Dessa forma, as pessoas passaram, no seu comportamento prático, a confundir gosto com vontade, sem conseguir captar as profundas diferenças existentes entre ambos. Por isso cada vez mais o gosto, o capricho, o prazer (incluindo as suas manifestações mórbidas e doentias) passaram a impor sua força cega. Um dos traços comportamentais que marcam a decomposição ética da sociedade é, efetivamente, o desaparecimento da noção da existência de relação entre causa e efeito. A responsabilidade, consequência direta e lógica dos atos humanos, simplesmente desapareceu. O fim justifica os meios. Sempre.
Trata-se da consequência lógica do raciocínio construído de costas para a verdade e para a ética. O político não tem limites na busca do poder. O burocrata avança no dinheiro público. E alguns empresários vendem carne estragada para aumentar a lucratividade do negócio. É terrível, mas é assim.
A desestruturação da família está também no miolo do caos social. É no âmbito da família que se desenvolve o cidadão honrado. E é na sua ausência que cresce a sombra da futura delinquência. Não é difícil imaginar em que ambiente familiar terão crescido os integrantes de gangues que se divertem assaltando o Estado, roubando a sociedade e esbofeteando o sofrimento dos cidadãos.
Se não houver uma profunda renovação moral da sociedade, seguiremos arando no mar. As análises dos especialistas esgrimem inúmeros argumentos. Fala-se de tudo. Menos das raízes profundas da crise: o relativismo ético, a ausência de limites, a impunidade e a ruptura da família. Mas o nó está aí. Se não tivermos a coragem e a firmeza de desatá-lo, assistiremos a uma espiral de comportamentos criminosos e antiéticos sem precedentes.
Carlos Alberto Di Franco
A se confirmarem as alegações da PF, trata-se de caso em que as implicações da corrupção vão além da imaginação. Está em risco a própria saúde dos consumidores.
Ex-ministro da Agricultura e presidente da associação que reúne produtores e exportadores de carne suína e de frango, Francisco Sérgio Turra afirmou que a repercussão da Operação Carne Fraca foi exagerada, dando a impressão de que a carne brasileira é toda fraudada. “Foi muito forte esse discurso irresponsável, fruto de um levantamento ainda incompleto da própria operação (da Polícia Federal)”, disse em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo. Segundo ele, os produtores brasileiros mantêm padrões de qualidade elevados e as falhas identificadas pelas autoridades não pegam nem 0,5% do setor.
O estrago econômico potencialmente devastador, porém, está feito. Estão sob ameaça exportações anuais de US$ 14,5 bilhões em produtos com proteína animal. O Brasil levou anos para remover a desconfiança de autoridades sanitárias de outros países e disputar o mercado mundial de carne. Agora, infelizmente, estamos sob suspeita.
Os excessos da PF devem ser condenados. Mas a corrupção, mesmo pontual e minoritária, deve ser exemplarmente punida. É necessário dar um basta a isso. Quando vamos romper esse ciclo? Quando vamos assistir, de fato, à punição dos culpados? A repetição dos escândalos produz um perigoso fatalismo. Quando se banaliza a corrupção se banaliza a culpa. O risco é de que se torne um comportamento epidêmico. Para onde vamos?
Uma das causas dos crimes e dos desvios de comportamento que castigam a sociedade brasileira é, sem dúvida, a certeza da impunidade. O criminoso sabe que a probabilidade de um longo período de reclusão só existe na letra morta da lei. O Brasil, como bem sabemos, não padece de anemia legal. O nosso drama é a falta de eficácia na aplicação da lei.
Há, contudo, estou convencido, causas ideológicas mais profundas para o eclipse da ética e para a explosão das ações criminosas. O relativismo ético, a ausência de limites e a crise da família estão na raiz da patologia social.
De fato, quantas correntes ideológicas, quantos modismos intelectuais vivemos nas últimas décadas? A busca da verdade é frequentemente etiquetada como fundamentalismo, ao passo que o relativismo, isto é, o deixar-se levar ao sabor da última novidade, aparece como a única atitude à altura dos tempos que correm. Vai-se constituindo a intolerância do relativismo que não reconhece nada como definitivo e usa como critério apenas o próprio eu. A renúncia à verdade não soluciona nada, ao contrário, conduz à ditadura da arbitrariedade. O relativismo está, de fato, na origem do enfraquecimento da democracia e nas agressões cada vez mais brutais aos direitos humanos.
Há no cerne da crise uma profunda raiz ideológica. Na verdade, as bases racionais da modernidade foram minadas pelo relativismo. Rompeu-se, dramaticamente, o nexo de união entre vontade e razão. Dessa forma, as pessoas passaram, no seu comportamento prático, a confundir gosto com vontade, sem conseguir captar as profundas diferenças existentes entre ambos. Por isso cada vez mais o gosto, o capricho, o prazer (incluindo as suas manifestações mórbidas e doentias) passaram a impor sua força cega. Um dos traços comportamentais que marcam a decomposição ética da sociedade é, efetivamente, o desaparecimento da noção da existência de relação entre causa e efeito. A responsabilidade, consequência direta e lógica dos atos humanos, simplesmente desapareceu. O fim justifica os meios. Sempre.
Trata-se da consequência lógica do raciocínio construído de costas para a verdade e para a ética. O político não tem limites na busca do poder. O burocrata avança no dinheiro público. E alguns empresários vendem carne estragada para aumentar a lucratividade do negócio. É terrível, mas é assim.
A desestruturação da família está também no miolo do caos social. É no âmbito da família que se desenvolve o cidadão honrado. E é na sua ausência que cresce a sombra da futura delinquência. Não é difícil imaginar em que ambiente familiar terão crescido os integrantes de gangues que se divertem assaltando o Estado, roubando a sociedade e esbofeteando o sofrimento dos cidadãos.
Se não houver uma profunda renovação moral da sociedade, seguiremos arando no mar. As análises dos especialistas esgrimem inúmeros argumentos. Fala-se de tudo. Menos das raízes profundas da crise: o relativismo ético, a ausência de limites, a impunidade e a ruptura da família. Mas o nó está aí. Se não tivermos a coragem e a firmeza de desatá-lo, assistiremos a uma espiral de comportamentos criminosos e antiéticos sem precedentes.
Carlos Alberto Di Franco
Governança distribuída para combater o desmatamento
Era mais um dia normal para o McDonald’s. Até o momento em que galinhas de dois metros de altura invadiram as lojas da rede na Europa e se acorrentaram aos pés das mesas. Os clientes ficaram atônitos. E não foram os únicos. “O presidente do McDonald’s nos ligou e deu o ultimato: ‘Resolvam este problema’”, recorda Mark Murphy, diretor global para sustentabilidade da Cargill. Sob a fantasia de galinhas, ativistas do Greenpeace denunciavam naquele abril de 2006: o gado e o frango usados nos sanduíches da rede de fast-food eram alimentados com soja, e esta última estava deixando um rastro de desmatamento na Amazônia brasileira. A principal fornecedora era a Cargill, multinacional de alimentos e uma das gigantes na comercialização e distribuição de commodities agrícolas, como soja e óleo de palma, com 150 mil funcionários em 70 países, 8 mil só no Brasil.
A ação do Greenpeace estampou jornais no mundo todo. E a denúncia resultou num acordo que ficou conhecido como Moratória da Soja: a partir dali, a indústria se comprometeu voluntariamente a excluir o desmatamento de sua cadeia produtiva. Murphy relembrou a história na sua fala no painel de abertura da Segunda Assembleia Geral da Tropical Forest Alliance 2020 (Aliança da Floresta Tropical), uma iniciativa global que reúne governos, empresas e sociedade civil com o objetivo de acabar com o desmatamento na produção de commodities como soja, carne, madeira e óleo de palma. A reunião ocorreu em Brasília, entre os dias 20 e 22 de março.
“Não parece muito tempo, faz dez anos. Mas no quesito comportamento sustentável, o agronegócio brasileiro não tinha nada a ver com o que temos hoje”, afirma Carlo Lovatelli, presidente da Abiove (Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais), que tem entre os associados multinacionais como a Cargill, a Bunge e a Amaggi. Não foi apenas o agronegócio que mudou. De lá para cá, as estratégias para enfrentar o desmatamento de florestas tropicais passaram a incluir cada vez mais outros atores além de governos. Se as leis e repressão a infrações, o chamado "comando e controle", eram as principais ferramentas usadas nesta luta, hoje é quase impossível falar de combate ao desmatamento sem olhar para o setor privado e sua produção de commodities.
A cada ano, o número de empresas e governos comprometendo-se com o fim do desmatamento em suas cadeias produtivas aumenta. De acordo com o projeto Supply Change, da ONG Forest Trends, hoje já são mais de 400 companhias assumindo globalmente cerca de 700 compromissos deste tipo. Um aumento de 43% em relação ao ano anterior. Quase sempre, essas empresas produzem ou compram commodities de países com vasta cobertura florestal, como Brasil e Indonésia. “Cerca de 12% dos compromissos que monitoramos envolvendo soja e 28% dos relacionados à pecuária estão focados no bioma Amazônia”, afirma Stephen Donofrio, um dos coordenadores do Supply Change.
“As ações de comando e controle chegaram até onde poderiam. A partir de um ponto, elas não conseguem mais avançar muito sem a cooperação de outros setores. É neste momento que começam a surgir as parcerias público-privadas e os mecanismos de mercado para segurar o desmatamento”, diz Isabella Vitali, diretora no Brasil da Proforest, organização que apoia empresas e governos na implementação de compromissos para a produção e compra de commodities livres de desmatamento. Segundo ela, a Moratória da Soja traz um pioneirismo em seu arranjo, ao envolver indústria, governo e sociedade civil. Para além das fronteiras nacionais, até hoje a experiência é encarada como exemplo. “Depois dela surgiu uma moratória semelhante para a Mata Atlântica no Paraguai, e estão tentando fazer algo parecido na Indonésia, para óleo de palma”.
O caminho é sem volta, como mostra a Tropical Forest Alliance 2020. Com cinco anos de estrada, a TFA 2020 veio ao mundo por uma demanda do próprio setor privado. Sinal dos tempos. Em 2010, o Consumer Goods Forum (CGF) – uma rede de grandes empresas globais como McDonald’s, Unilever e Nestlé – aprovou uma resolução em que seus membros assumiram o compromisso voluntário de, até 2020, atingir o desmatamento zero líquido em suas cadeias de suprimento.
Como a tarefa é hercúlea, as mesmas empresas concluíram que sozinhas não chegariam a lugar algum. “Elas, então, demandaram uma plataforma em que pudessem dialogar com outros setores, em especial os governos e as organizações da sociedade civil. E daí nasce a TFA 2020”, explica Fabíola Zerbini, coordenadora regional da rede na América Latina.
Na última semana, o clima era de intercâmbio no evento da TFA2020. Mark Murphy, da Cargill, relembrou a história das galinhas no McDonald’s sentado lado a lado com o ex-diretor do Greenpeace, Marcelo Furtado. Outros tempos: “Numa sociedade global, você tem que entender que um objetivo tão ambicioso como acabar com o desmatamento só pode ser alcançado em parceria”, diz Furtado.
Foi o que aconteceu no caso da Moratória da Soja. E é o que está acontecendo no Acordo da Pecuária: desde 2009, frigoríficos, supermercados e empresas multinacionais que compram carne ou couro de gado criado na Amazônia vêm se comprometendo a eliminar o desmatamento de suas cadeias produtivas.
A ação do Greenpeace estampou jornais no mundo todo. E a denúncia resultou num acordo que ficou conhecido como Moratória da Soja: a partir dali, a indústria se comprometeu voluntariamente a excluir o desmatamento de sua cadeia produtiva. Murphy relembrou a história na sua fala no painel de abertura da Segunda Assembleia Geral da Tropical Forest Alliance 2020 (Aliança da Floresta Tropical), uma iniciativa global que reúne governos, empresas e sociedade civil com o objetivo de acabar com o desmatamento na produção de commodities como soja, carne, madeira e óleo de palma. A reunião ocorreu em Brasília, entre os dias 20 e 22 de março.
“Não parece muito tempo, faz dez anos. Mas no quesito comportamento sustentável, o agronegócio brasileiro não tinha nada a ver com o que temos hoje”, afirma Carlo Lovatelli, presidente da Abiove (Associação Brasileira da Indústria de Óleos Vegetais), que tem entre os associados multinacionais como a Cargill, a Bunge e a Amaggi. Não foi apenas o agronegócio que mudou. De lá para cá, as estratégias para enfrentar o desmatamento de florestas tropicais passaram a incluir cada vez mais outros atores além de governos. Se as leis e repressão a infrações, o chamado "comando e controle", eram as principais ferramentas usadas nesta luta, hoje é quase impossível falar de combate ao desmatamento sem olhar para o setor privado e sua produção de commodities.
A cada ano, o número de empresas e governos comprometendo-se com o fim do desmatamento em suas cadeias produtivas aumenta. De acordo com o projeto Supply Change, da ONG Forest Trends, hoje já são mais de 400 companhias assumindo globalmente cerca de 700 compromissos deste tipo. Um aumento de 43% em relação ao ano anterior. Quase sempre, essas empresas produzem ou compram commodities de países com vasta cobertura florestal, como Brasil e Indonésia. “Cerca de 12% dos compromissos que monitoramos envolvendo soja e 28% dos relacionados à pecuária estão focados no bioma Amazônia”, afirma Stephen Donofrio, um dos coordenadores do Supply Change.
“As ações de comando e controle chegaram até onde poderiam. A partir de um ponto, elas não conseguem mais avançar muito sem a cooperação de outros setores. É neste momento que começam a surgir as parcerias público-privadas e os mecanismos de mercado para segurar o desmatamento”, diz Isabella Vitali, diretora no Brasil da Proforest, organização que apoia empresas e governos na implementação de compromissos para a produção e compra de commodities livres de desmatamento. Segundo ela, a Moratória da Soja traz um pioneirismo em seu arranjo, ao envolver indústria, governo e sociedade civil. Para além das fronteiras nacionais, até hoje a experiência é encarada como exemplo. “Depois dela surgiu uma moratória semelhante para a Mata Atlântica no Paraguai, e estão tentando fazer algo parecido na Indonésia, para óleo de palma”.
O caminho é sem volta, como mostra a Tropical Forest Alliance 2020. Com cinco anos de estrada, a TFA 2020 veio ao mundo por uma demanda do próprio setor privado. Sinal dos tempos. Em 2010, o Consumer Goods Forum (CGF) – uma rede de grandes empresas globais como McDonald’s, Unilever e Nestlé – aprovou uma resolução em que seus membros assumiram o compromisso voluntário de, até 2020, atingir o desmatamento zero líquido em suas cadeias de suprimento.
Como a tarefa é hercúlea, as mesmas empresas concluíram que sozinhas não chegariam a lugar algum. “Elas, então, demandaram uma plataforma em que pudessem dialogar com outros setores, em especial os governos e as organizações da sociedade civil. E daí nasce a TFA 2020”, explica Fabíola Zerbini, coordenadora regional da rede na América Latina.
Na última semana, o clima era de intercâmbio no evento da TFA2020. Mark Murphy, da Cargill, relembrou a história das galinhas no McDonald’s sentado lado a lado com o ex-diretor do Greenpeace, Marcelo Furtado. Outros tempos: “Numa sociedade global, você tem que entender que um objetivo tão ambicioso como acabar com o desmatamento só pode ser alcançado em parceria”, diz Furtado.
Foi o que aconteceu no caso da Moratória da Soja. E é o que está acontecendo no Acordo da Pecuária: desde 2009, frigoríficos, supermercados e empresas multinacionais que compram carne ou couro de gado criado na Amazônia vêm se comprometendo a eliminar o desmatamento de suas cadeias produtivas.
Os dados mostram que a estratégia dá certo. Em um levantamento publicado pela revista Science, pesquisadores americanos e brasileiros chegaram à conclusão: antes da Moratória, 30% da expansão da soja na Amazônia foi em áreas desmatadas. Depois do acordo, esse número caiu para cerca de 1%.
Num outro estudo, da ONG Imazon, as mudanças também aparecem no setor da pecuária. Segundo os dados, a JBS, maior frigorífico que atua na Amazônia brasileira, reduziu as compras de gado de áreas desmatadas ilegalmente. Numa amostragem, os pesquisadores analisaram as plantas frigoríficas da empresa que respondiam por 30% do abate no estado do Pará. O trabalho concluiu que o percentual de fazendas fornecedoras da JBS que haviam desmatado entre 2009 e 2013 caiu de 36%, antes do acordo, para 4% depois dele.
Para Fabíola Zerbini, a mudança no comportamento do setor privado veio com um amadurecimento e uma nova noção de responsabilidade compartilhada: “Há um marco recente que chama para a corresponsabilidade, que pode ser movimentada por um pioneirismo de marketing – quando uma empresa quer agregar valor social e ambiental à sua marca – ou por uma pressão de reputação – quando elas começam a ver seus produtos associados a problemas sociais e ambientais”.
Quando o Greenpeace colocou ativistas vestidos de galinhas nas lojas do McDonald’s, ele sabia bem que estava mexendo com a reputação de todo um setor. As empresas começaram a trazer para a si a responsabilidade sobre o desmatamento da Amazônia. E, neste caso, resolveram se mexer pelo risco de ter sua história associada à destruição das florestas.
Nesta construção, o Estado deixa de ter um papel preponderante, abrindo espaço para caminhos alternativos de solução. “Começam a nascer mecanismos de governança privada, trazendo respostas que o governo, enquanto Estado, não consegue mais trazer, porque as coisas estão mais complexas”, afirma Fabíola. “Criam-se, então, estruturas de governança quase paralelas. São acordos voluntários, mas que estão ali. E a partir deles, acaba-se regulando, legislando sem ser governo".
Num outro estudo, da ONG Imazon, as mudanças também aparecem no setor da pecuária. Segundo os dados, a JBS, maior frigorífico que atua na Amazônia brasileira, reduziu as compras de gado de áreas desmatadas ilegalmente. Numa amostragem, os pesquisadores analisaram as plantas frigoríficas da empresa que respondiam por 30% do abate no estado do Pará. O trabalho concluiu que o percentual de fazendas fornecedoras da JBS que haviam desmatado entre 2009 e 2013 caiu de 36%, antes do acordo, para 4% depois dele.
Para Fabíola Zerbini, a mudança no comportamento do setor privado veio com um amadurecimento e uma nova noção de responsabilidade compartilhada: “Há um marco recente que chama para a corresponsabilidade, que pode ser movimentada por um pioneirismo de marketing – quando uma empresa quer agregar valor social e ambiental à sua marca – ou por uma pressão de reputação – quando elas começam a ver seus produtos associados a problemas sociais e ambientais”.
Quando o Greenpeace colocou ativistas vestidos de galinhas nas lojas do McDonald’s, ele sabia bem que estava mexendo com a reputação de todo um setor. As empresas começaram a trazer para a si a responsabilidade sobre o desmatamento da Amazônia. E, neste caso, resolveram se mexer pelo risco de ter sua história associada à destruição das florestas.
Nesta construção, o Estado deixa de ter um papel preponderante, abrindo espaço para caminhos alternativos de solução. “Começam a nascer mecanismos de governança privada, trazendo respostas que o governo, enquanto Estado, não consegue mais trazer, porque as coisas estão mais complexas”, afirma Fabíola. “Criam-se, então, estruturas de governança quase paralelas. São acordos voluntários, mas que estão ali. E a partir deles, acaba-se regulando, legislando sem ser governo".
Nunca dantes estivemos assim tão...
Desesperançados. Achei a palavra. Passei a semana pensando sobre isso, eu própria meio taciturna, estranha, apreensiva. Sem conseguir ver a tal luz que abre o caminho. Cansada de todo dia a mesma coisa, alguma surpresa ou revelação de como o poço é fundo. Estou falando do Brasil. Estou falando de todos nós, uns mais outros menos, não é mesmo? Mas todos nós.
É tão forte a sensação que saí por aí perguntando, conversando com quem encontrava, puxando assunto, colhendo impressões. Queria saber o estado de espírito dos outros, sem falar diretamente sobre o meu próprio.
Antes de mais nada, entenda, por favor. Sou – pelo menos sempre me considerei – uma otimista quase incorrigível. Tenho bom humor, prezo a felicidade, detesto o baixo astral. Perceba que estou falando de algo mais filosófico, sensível, imaterial. O resultado do que colhi nas ruas explicou o que meu íntimo intuía. Em qualquer classe, se é que ainda há alguma. Nunca dantes estivemos assim tão desesperançados. A desesperança é descrença, desilusão, desânimo, desengano. Decepção.
Isso é um problema. Porque desmobiliza, cria uma legião de egoístas, cada um tentando salvar seu próprio couro. E querendo a pele do outro só para tamborim.
Nunca dantes estivemos assim. Nem durante a ditadura, pelo menos essa última que foi a que vivi – tenho de ressaltar. Quando lutávamos contra ela – e como lutamos! – o sangue corria em nossas veias, com gosto, pelo morrer ou matar em prol da liberdade, da democracia, do orgulho. Enfrentávamos as cavalarias, o medo, burlávamos, abríamos os espaços, conquistávamos centímetros que eram nossa redenção, valiosos. Um jogo bruto. Até “o outro lado” era mais intenso, deu tanto trabalho agarrado ao osso que dilacerava. Mulheres levantavam e abriam os olhos. Era um país em busca de sua identidade, no campo, nas cidades, nas escolas, universidades, palcos, no anonimato, na clandestinidade. Matavam nossos líderes, outros surgiam. Coisa bonita de ver e lembrar. Cantávamos! A luta pelas Diretas foi o ápice.
Hoje, o que temos? O linguajar chulo de coxinhas, mortadelas, palavras sendo distorcidas, ódio entre amigos, óbvios ídolos de barro e lama cobertos por milhões de dólares de corrupção sendo defendidos, literalmente, com unhas e dentes, fantasiosamente em prol de dogmas antiquados e inadequados. Não há política, mas politicagem, se alastrando daninha em todos os poderes da República, cada um puxando a sardinha, a toga, o pato, o quebra-quebra, repartidos entre si como carniça entre urubus.
Alguém aí avista alguma atitude cívica, de amor, de desprendimento? O chão que eles ladrilham pavimenta apenas o caminho de poder. De poder um mais que o outro. Antropofagia, teu nome é Brasil.
Vai falar bem de quem? Vai botar a cara de quem numa camiseta para ir às ruas? Pior, de repente, acredita, e dias depois vai ter de explicar que pensou mesmo que aquele ou aquela poderia servir. Qual o quê! Marina? Nem zumbe mais a mosca. FHC? Agora aparece do alto de um trono criticando, como ele era melhor nisso, aquilo. Dilma? Nos fez rir – e chorar, muito. Lula? Nunca dantes um líder operário deixou tantos órfãos no caminho, sem saber de nada, não ver nada, não se comprometer nem com a sua própria história, quanto mais com a nossa. Instituições? Vacilam.
Verdade. Nunca dantes estivemos é assim tão … desamparados. Quem pode busca outra cidadania. Quem pode faz as malas – embora certo seja também que essa desesperança e muito medo estejam sendo as marcas do século em todo o planeta. De onde mais se espera é de onde não vem nada. Espaço aberto a pestes, misérias, guerras.
Utopias! Quero uma para viver. Enquanto estou por aqui, farei o que puder, procurarei ter ânimo. Eu não os tenho, mas quem tem descendentes deve estar muito chateado com o rumo dessa prosa.
Muito longe de Lenin
Todos podem ir se preparando desde já. Está aí à frente, tão certo quanto a próxima fase da lua, o centenário da Revolução Comunista de Outubro de 1917 — e vai se falar, escrever e discursar sobre o assunto como se o golpe de Estado então comandado por Lenin, com a formação do regime soviético na Rússia, tivesse sido o maior evento da história da humanidade desde que o macaco desceu da árvore para arriscar a sorte na tentativa de levar uma vida inteligente em terra firme. É curioso que o primeiro centenário da Revolução de 1917 venha a ocorrer quando o regime criado por ela já não existe mais — foi demolido, sem o disparo de um único buscapé por parte dos adversários, em consequência de seus fracassos, sua demência interna e suas enfermidades de nascença. É também interessante notar que o regime revolucionário produziu uma ditadura absoluta do primeiro ao último dia de sua existência. Vai se comemorar, nesse caso, a fundação de uma ditadura que já terminou? A abolição do capitalismo no mundo, objetivo final da revolução, transformou-se há longos anos numa piada, por agredir ao mesmo tempo a natureza humana, o progresso, a tecnologia e a razão. O comunismo, enfim, acabou sendo uma das experiências que deram mais errado na história política dos seres vivos. De novo: dá para comemorar uma coisa dessas? Sim, dá. Podem ter certeza de que dá.
É compreensível, levando-se em conta a quantidade cada vez maior de “gente de esquerda” espalhada hoje em dia mundo afora — e “gente de esquerda” tem entre os seus deveres mentais prestar reverência automática a essas assombrações do passado. Bem poucos, aí, sabem o que foi a Revolução Soviética ou mostram a menor vontade de investir uma meia horinha do seu tempo tentando aprender alguma coisa a respeito. Aprender para quê? O que interessa é acreditar — o que, além disso, dá muito menos trabalho. A verdade é que no momento é mais fácil ser de “esquerda” do que não ser; as comodidades para isso são incomparáveis, e nem sempre foi assim. Ao contrário, já foi difícil — e perigoso. Acredite se quiser, mas houve um tempo neste país em que você podia acabar na cadeia por ser de esquerda. Para Lenin, especialmente, sempre foi muito difícil ser Lenin. Até assumir o comando da União Soviética, ou pouco antes, o homem praticamente não tinha onde cair morto. Vivia a dois passos da prisão, exilado, em desconforto material extremo, sem ajuda da mídia, dos formadores de opinião e da classe artística. Ninguém chegava lá, na época, financiado pelo imposto sindical, por comerciais de televisão milionários e pelo caixa dois de empreiteiras de obras públicas. A vida era dura. Para ser de esquerda, o sujeito tinha, realmente, de ser de esquerda.
Hoje ser de esquerda no Brasil é a coisa mais fácil desta vida. Você pode ser ministro do governo de Michel Temer e ser de esquerda. Pode ser um Eike Batista e, ao mesmo tempo, “campeão nacional” dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff. Pode ser o ex-governador Sérgio Cabral, que viveu anos como um herói do PT. Pode receber prêmio literário de 100 000 euros, dos quais o governo brasileiro paga a metade, e discursar contra o “golpe” na hora de pegar o dinheiro. Pode ser ministro do Supremo Tribunal Federal, depois de advogar para o maior partido da esquerda nacional ou para “movimentos sociais” que se dizem “revolucionários”. Pode, como militante, receber verbas do Banco do Brasil, cesta básica e lanche quando é chamado para se manifestar na rua, além de diária e ônibus fretado. Pode estar na cadeia por corrupção. Pode ter emprego no Itamaraty. Pode ser reitor, procurador público, arcebispo. Pode trabalhar na Rede Globo. Não precisa ler um único livro – Marx, então, nem pensar. Não precisa, Deus o livre, exigir a extinção da propriedade privada, sobretudo a sua. Não precisa entrar no PT e pagar contribuição mensal de 10% do que ganha.
É preciso, apenas, ter “posição” sobre uns tantos assuntos – mas quem já teve de tirar do bolso um único real para “ter posição” sobre alguma coisa? Não num país como o Brasil de hoje, onde, além do mais, o risco de aparecer como “progressista” etc. está muito abaixo de zero. E quais são as “posições” que o brasileiro interessado em tirar a sua certidão de “pessoa de esquerda” deve assumir? Alguns exemplos:
– Ser a favor das normas que permitem aos professores da rede estadual de ensino de São Paulo faltar até um dia sim, um dia não ao trabalho, sem desconto nenhum no salário, é claro – incluindo o vale-transporte e o auxílio-alimentação referentes aos dias em que o professor não foi à escola;
– Ser contra o aumento da velocidade de tráfego, para um máximo de 90 quilômetros por hora, nas avenidas marginais de São Paulo. Se possível, noticiar em tom de denúncia que, logo no primeiro dia com os novos limites, ocorreu um acidente de carro numa das marginais. O motorista estava bêbado. Além disso, ninguém se machucou – nem ele;
– Ser contra qualquer mudança na legislação trabalhista. Num momento em que 12 milhões de brasileiros estão desempregados, sustentar que as pessoas não precisam de emprego, e sim de proteção — mesmo que não tenham mais emprego nenhum para ser protegido;
– Ser a favor da aposentadoria das mulheres aos 50 anos, e de todas as regras parecidas com essa — a começar pelas que permitem a aposentados do serviço público ganhar mais de 50 000 reais por mês, ou 100 000, ou seja lá quanto for. Considerar correto que a totalidade da população pague, no fim das contas, a aposentadoria dos funcionários públicos — hoje, na média, cerca de 7 500 reais por mês. É quase o equivalente ao valor médio da aposentadoria dos funcionários públicos franceses, de 2 500 euros mensais. O PIB per capita da França, pela última tabela do Banco Mundial, é de 40 000 dólares por ano, quatro vezes o do Brasil;
– Ser a favor de pichadores ou “grafiteiros” de paredes, muros, viadutos, em prédios particulares e públicos. Considerar que quem não concorda está adotando uma atitude “higienista” — ou seja, a favor da higiene, considerada um hábito de direita;
– Ser contra o “agronegócio” e a favor da “agricultura familiar”. E quanto aos agricultores “familiares” que trabalham junto a grandes empresas agrícolas? Não há resposta para essa questão. Comentários demonstrando que o valor da terra, hoje, é dado pela sua capacidade de produzir, e não pelo seu tamanho nem por outros fatores, são tidos como argumentos a favor do “latifúndio”, do capitalismo na agricultura e do atraso. (A área rural vai pôr 240 bilhões de reais em circulação no interior do Brasil em 2017.)
– Ser contra os defensivos agrícolas de qualquer tipo, descritos como “agrotóxicos”, “venenos” ou “agentes químicos”. Considerar como ato de destruição da natureza a utilização de qualquer área de terra para produção em grande volume de alimentos. Denunciar como delito social o cultivo de pastagens e a criação de animais de corte;
– Acreditar que a única maneira de reduzir a pobreza é tirar dos ricos; a ideia de alcançar esse objetivo por meio da criação de mais riquezas é considerada de direita. Só o Estado, com a arrecadação de impostos — que, idealmente, devem ser sempre maiores —, tem a capacidade de distribuir renda. Cobrar imposto, por esse entendimento, é criar riqueza. Pelo mesmo entendimento, os pobres só existem porque existem os ricos. Na verdade, acredita-se que o 1% mais rico da população mundial tirou a sua fortuna dos demais 99%;
– Assinar manifestos de intelectuais, mesmo que você confunda Kant com Clark Kent.
É o que temos, hoje. Adeus, Lenin.
É compreensível, levando-se em conta a quantidade cada vez maior de “gente de esquerda” espalhada hoje em dia mundo afora — e “gente de esquerda” tem entre os seus deveres mentais prestar reverência automática a essas assombrações do passado. Bem poucos, aí, sabem o que foi a Revolução Soviética ou mostram a menor vontade de investir uma meia horinha do seu tempo tentando aprender alguma coisa a respeito. Aprender para quê? O que interessa é acreditar — o que, além disso, dá muito menos trabalho. A verdade é que no momento é mais fácil ser de “esquerda” do que não ser; as comodidades para isso são incomparáveis, e nem sempre foi assim. Ao contrário, já foi difícil — e perigoso. Acredite se quiser, mas houve um tempo neste país em que você podia acabar na cadeia por ser de esquerda. Para Lenin, especialmente, sempre foi muito difícil ser Lenin. Até assumir o comando da União Soviética, ou pouco antes, o homem praticamente não tinha onde cair morto. Vivia a dois passos da prisão, exilado, em desconforto material extremo, sem ajuda da mídia, dos formadores de opinião e da classe artística. Ninguém chegava lá, na época, financiado pelo imposto sindical, por comerciais de televisão milionários e pelo caixa dois de empreiteiras de obras públicas. A vida era dura. Para ser de esquerda, o sujeito tinha, realmente, de ser de esquerda.
Hoje ser de esquerda no Brasil é a coisa mais fácil desta vida. Você pode ser ministro do governo de Michel Temer e ser de esquerda. Pode ser um Eike Batista e, ao mesmo tempo, “campeão nacional” dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff. Pode ser o ex-governador Sérgio Cabral, que viveu anos como um herói do PT. Pode receber prêmio literário de 100 000 euros, dos quais o governo brasileiro paga a metade, e discursar contra o “golpe” na hora de pegar o dinheiro. Pode ser ministro do Supremo Tribunal Federal, depois de advogar para o maior partido da esquerda nacional ou para “movimentos sociais” que se dizem “revolucionários”. Pode, como militante, receber verbas do Banco do Brasil, cesta básica e lanche quando é chamado para se manifestar na rua, além de diária e ônibus fretado. Pode estar na cadeia por corrupção. Pode ter emprego no Itamaraty. Pode ser reitor, procurador público, arcebispo. Pode trabalhar na Rede Globo. Não precisa ler um único livro – Marx, então, nem pensar. Não precisa, Deus o livre, exigir a extinção da propriedade privada, sobretudo a sua. Não precisa entrar no PT e pagar contribuição mensal de 10% do que ganha.
É preciso, apenas, ter “posição” sobre uns tantos assuntos – mas quem já teve de tirar do bolso um único real para “ter posição” sobre alguma coisa? Não num país como o Brasil de hoje, onde, além do mais, o risco de aparecer como “progressista” etc. está muito abaixo de zero. E quais são as “posições” que o brasileiro interessado em tirar a sua certidão de “pessoa de esquerda” deve assumir? Alguns exemplos:
– Ser a favor das normas que permitem aos professores da rede estadual de ensino de São Paulo faltar até um dia sim, um dia não ao trabalho, sem desconto nenhum no salário, é claro – incluindo o vale-transporte e o auxílio-alimentação referentes aos dias em que o professor não foi à escola;
– Ser contra o aumento da velocidade de tráfego, para um máximo de 90 quilômetros por hora, nas avenidas marginais de São Paulo. Se possível, noticiar em tom de denúncia que, logo no primeiro dia com os novos limites, ocorreu um acidente de carro numa das marginais. O motorista estava bêbado. Além disso, ninguém se machucou – nem ele;
– Ser contra qualquer mudança na legislação trabalhista. Num momento em que 12 milhões de brasileiros estão desempregados, sustentar que as pessoas não precisam de emprego, e sim de proteção — mesmo que não tenham mais emprego nenhum para ser protegido;
– Ser a favor da aposentadoria das mulheres aos 50 anos, e de todas as regras parecidas com essa — a começar pelas que permitem a aposentados do serviço público ganhar mais de 50 000 reais por mês, ou 100 000, ou seja lá quanto for. Considerar correto que a totalidade da população pague, no fim das contas, a aposentadoria dos funcionários públicos — hoje, na média, cerca de 7 500 reais por mês. É quase o equivalente ao valor médio da aposentadoria dos funcionários públicos franceses, de 2 500 euros mensais. O PIB per capita da França, pela última tabela do Banco Mundial, é de 40 000 dólares por ano, quatro vezes o do Brasil;
– Ser a favor de pichadores ou “grafiteiros” de paredes, muros, viadutos, em prédios particulares e públicos. Considerar que quem não concorda está adotando uma atitude “higienista” — ou seja, a favor da higiene, considerada um hábito de direita;
– Ser contra o “agronegócio” e a favor da “agricultura familiar”. E quanto aos agricultores “familiares” que trabalham junto a grandes empresas agrícolas? Não há resposta para essa questão. Comentários demonstrando que o valor da terra, hoje, é dado pela sua capacidade de produzir, e não pelo seu tamanho nem por outros fatores, são tidos como argumentos a favor do “latifúndio”, do capitalismo na agricultura e do atraso. (A área rural vai pôr 240 bilhões de reais em circulação no interior do Brasil em 2017.)
– Ser contra os defensivos agrícolas de qualquer tipo, descritos como “agrotóxicos”, “venenos” ou “agentes químicos”. Considerar como ato de destruição da natureza a utilização de qualquer área de terra para produção em grande volume de alimentos. Denunciar como delito social o cultivo de pastagens e a criação de animais de corte;
– Acreditar que a única maneira de reduzir a pobreza é tirar dos ricos; a ideia de alcançar esse objetivo por meio da criação de mais riquezas é considerada de direita. Só o Estado, com a arrecadação de impostos — que, idealmente, devem ser sempre maiores —, tem a capacidade de distribuir renda. Cobrar imposto, por esse entendimento, é criar riqueza. Pelo mesmo entendimento, os pobres só existem porque existem os ricos. Na verdade, acredita-se que o 1% mais rico da população mundial tirou a sua fortuna dos demais 99%;
– Assinar manifestos de intelectuais, mesmo que você confunda Kant com Clark Kent.
É o que temos, hoje. Adeus, Lenin.
O sentido das coisas
(Crônica antiga que não perdeu a atualidade. Ou o Brasil não mudou)Sempre procurei, tantas vezes em vão, encontrar o significado de tudo. Por exemplo, por que há pessoas boas e más, por que as pessoas boas fazem coisas más e vice-versa, por que entre pessoas que se querem bem pode haver frieza ou até maldade, por que… lista infindável, ainda mais para quem tem um pouco de imaginação. A cada momento reinventamos o mundo, reinventamos a nós mesmos, reinventamos nossos afetos para que seja tudo menos doloroso.
Escrevendo sobre a situação do Brasil um pequeno livro que deve aparecer em breve, observo ainda mais intensamente o que acontece, tanta coisa inacreditável, mas real. Assim reflito quase constantemente sobre todas as loucuras, baixezas, perigos, sustos, desalentos atuais, aqui e ali uma luzinha minúscula que logo bruxuleia. Vai se apagar para sempre? Nada é para sempre. As coisas más, as fases ruins, também hão de passar. Mas, no momento, não sou otimista. Falsidade, mentiras, arzinho superior e palavras fantasiosas sobre questões fundamentais, apontar o dedo para o adversário, tudo é pior do que a dura verdade. Assustam-me discursos com que neste momento dramático alguns negam ou diminuem a gravidade da situação, revelando-se o desvio de inacreditáveis fortunas que deveriam atender o povo mais carente, a maior vítima desse desastre, um povo despossuído, sem as coisas essenciais que lhe têm sido negadas ─ não por uma fatalidade, mas por ganância de quem já tinha uma boa fortuna, mas queria mais, e mais.
A política influenciou e dominou nossa existência nos últimos anos, com gestão incompetente, péssimo planejamento, desorganização nas contas públicas, maquiagem do desastre que foi escondido de um povo mal informado porque mal escolarizado (não é por acaso que negligenciamos tanto a educação). A pátria-mãe desvia o rosto; nós, os filhos, largados na floresta como num conto de fadas sinistro. Os próprios investigadores das gigantescas fraudes, impressionados, admitem estar diante de tramas de dimensão e sofisticação nunca vistas.
A paisagem brasileira está de pernas para o ar: nada faz muito sentido, tamanho o escândalo. Para começar, os salários com que tentamos manter uma vida honrada são patéticos diante das cifras roubadas, apresentadas pelos competentes e corajosos investigadores. Irresponsabilidade e incompetência comandaram as façanhas que esfacelaram o país, agora rebatizadas de “malfeitos”. Espantoso: os desvios não eram efetuados por bandidos oficiais, mas por grandes empresários que admitem, talvez forçados pelo medo, que, se não tivessem entrado no esquema de corrupção e pagado as irreais propinas, suas companhias teriam ficado “de fora” da roda dos mafiosos, prejudicando seus acionistas e trabalhadores. Quase todos afirmam com veemência que de nada sabiam: viviam em outro planeta. Não saber de nada passou a ser um triste refrão.
Os investigados, denunciados e presos continuam protestando contra tamanha maldade: todos vítimas do lobo mau da Justiça. Seus defensores encenam uma ópera-bufa de delirantes explicações: roubalheira mascarada de comportamento legal, nos parâmetros da decência. Se essas ficções patéticas fizessem sentido, nunca teria havido tantos inocentes no mundo: as elites e os estrangeiros seriam os culpados. Essa farsa acabou: não há desculpa perante uma nação ferida.
Lya Luft:
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