quinta-feira, 7 de abril de 2016
É tudo culpa da Lava-Jato
“Isso deve ser coisa daquele juiz brasileiro” — foi o comentário ouvido em rodas de conversas no Panamá, nesta semana, quando estourou o caso dos “Panama Papers”. O tal juiz, claro, só pode ser Sérgio Moro, bastante conhecido no país por causa da Odebrecht. Quer dizer, por causa da prisão de Marcelo Odebrecht, ali reconhecido como o dono da maior companhia da América Latina.
Eu estava por lá, em visita particular, quando da prisão. O pessoal parecia estupefato. Preso em uma cela comum? — espantavam-se desde executivos nacionais e estrangeiros a motoristas de Uber.
A empreiteira tem obras importantes por lá — aliás, discute com o atual governo uma revisão nos planos e custo do aeroporto — e é o “mecenas” número um do principal museu local, um magnífico prédio do arquiteto Frank Gehry.
Tudo isso apanha o Panamá num momento especial. O escritório Mossack Fonseca ganhou muito dinheiro com a condição de paraíso fiscal de que o país desfrutou durante anos a fio. Formou-se, e ainda trabalha por lá, uma expressiva comunidade de executivos financeiros de várias nacionalidades.
De uns tempos para cá, quando os Estados Unidos, a União Europeia e instituições internacionais, como o FMI, iniciaram a guerra contra o dinheiro sujo que alimenta a corrupção, o tráfico de drogas e o terrorismo, o Panamá foi apanhado no contrapé. Aquilo que era vantagem competitiva — o paraíso fiscal — tornou-se um peso, um pecado que passou a espantar empresas e capitais.
Para resumir, o atual governo, do presidente Juan Carlos Varela, aplica um programa de desmonte do paraíso fiscal. Já conseguiu aprovar uma legislação restritiva, chancelada pelo FMI, e faz uma campanha interna alertando que lavagem de dinheiro é crime e deve ser denunciada. A operação não é simples, entretanto. O governo quer banir a lavagem, mas pretende que o Panamá permaneça como um “hub” financeiro para a América Latina, isso incluindo Miami.
Nessa hora, aparece o caso do escritório Mossack Fonseca. O sócio Ramon Fonseca é da mais alta elite panamenha. Além de advogado, é escritor (romances, novelas) e político. Não tem Lava-Jato no Panamá, mas a elite local ligada aos velhos hábitos, digamos assim, entra na alça de mira internacional.
É claro que não foi o juiz Sérgio Moro que deflagrou a operação “Panama Papers”. Mas a Lava-Jato, se não passou, vai passar por esse canal. E isso explica por que o pessoal do Panamá chega a imaginar que era tudo coisa “daquele juiz brasileiro”.
A Lava-Jato, simbolizada em Moro, é parte de um fenômeno mundial — a campanha policial e jurídica em busca das quadrilhas que promovem ou participam da lavagem de dinheiro. Não se trata só de mais uma operação.
Na última segunda, o WhatsApp brasileiro passou a exibir a informação de que as mensagens agora são criptografadas “de ponta a ponta”. Quando tratamos disso na CBN, muitos ouvintes perguntaram: é coisa da Lava-Jato?
Não, claro, mas de certa forma... Trata-se de um reforço na privacidade. Criptografadas, as mensagens não podem ser lidas nem pelo WhatsApp, nem por terceiros. Quer dizer que não podem ser grampeadas?
Não vai demorar muito para termos aqui um caso parecido com o FBI x Apple, quando a agência queria que a companhia quebrasse o código do iPhone de um terrorista. Não é de se esperar que um juiz brasileiro acabe pedindo que o WhatsApp quebre a criptografia para apanhar um suspeito? Ou, se o próprio pessoal da Lava-Jato, com autorização do juiz, quebrar a criptografia e captar conversas suspeitas, essa prova terá validade nos tribunais?
Notem: o uso de uma tecnologia de informação de ponta é parte essencial das operações tipo Lava-Jato no mundo todo. São eficientes e rápidas. Talvez pela primeira vez no Brasil uma operação anticorrupção seja mais capaz do que a própria corrupção. Ou ainda: tem uma capacidade de gerar provas muito mais intensas do que a habilidade dos advogados e seus clientes de oferecer explicações e defesas.
Por isso a Lava-Jato é celebrada — de Curitiba ao Panamá —, mas por isso também assusta um determinado público, nos mesmos lugares. Há movimentos nos meios políticos brasileiros para restringir a legislação anticorrupção, assim como, aqui incluindo os meios jurídicos, tentativas de limitar a capacidade da Lava-Jato de buscar e produzir provas.
Conseguirão?
Talvez consigam atrasar o processo. Mas imaginem a repercussão — mundial — de uma tentativa de cortar os braços de Moro.
E para encerrar com uma ironia: sabem qual o segundo sobrenome de Rafael Fonseca? Mora.
Quase.
Carlos Alberto Sardenberg
Eu estava por lá, em visita particular, quando da prisão. O pessoal parecia estupefato. Preso em uma cela comum? — espantavam-se desde executivos nacionais e estrangeiros a motoristas de Uber.
A empreiteira tem obras importantes por lá — aliás, discute com o atual governo uma revisão nos planos e custo do aeroporto — e é o “mecenas” número um do principal museu local, um magnífico prédio do arquiteto Frank Gehry.
Tudo isso apanha o Panamá num momento especial. O escritório Mossack Fonseca ganhou muito dinheiro com a condição de paraíso fiscal de que o país desfrutou durante anos a fio. Formou-se, e ainda trabalha por lá, uma expressiva comunidade de executivos financeiros de várias nacionalidades.
De uns tempos para cá, quando os Estados Unidos, a União Europeia e instituições internacionais, como o FMI, iniciaram a guerra contra o dinheiro sujo que alimenta a corrupção, o tráfico de drogas e o terrorismo, o Panamá foi apanhado no contrapé. Aquilo que era vantagem competitiva — o paraíso fiscal — tornou-se um peso, um pecado que passou a espantar empresas e capitais.
Para resumir, o atual governo, do presidente Juan Carlos Varela, aplica um programa de desmonte do paraíso fiscal. Já conseguiu aprovar uma legislação restritiva, chancelada pelo FMI, e faz uma campanha interna alertando que lavagem de dinheiro é crime e deve ser denunciada. A operação não é simples, entretanto. O governo quer banir a lavagem, mas pretende que o Panamá permaneça como um “hub” financeiro para a América Latina, isso incluindo Miami.
Nessa hora, aparece o caso do escritório Mossack Fonseca. O sócio Ramon Fonseca é da mais alta elite panamenha. Além de advogado, é escritor (romances, novelas) e político. Não tem Lava-Jato no Panamá, mas a elite local ligada aos velhos hábitos, digamos assim, entra na alça de mira internacional.
É claro que não foi o juiz Sérgio Moro que deflagrou a operação “Panama Papers”. Mas a Lava-Jato, se não passou, vai passar por esse canal. E isso explica por que o pessoal do Panamá chega a imaginar que era tudo coisa “daquele juiz brasileiro”.
A Lava-Jato, simbolizada em Moro, é parte de um fenômeno mundial — a campanha policial e jurídica em busca das quadrilhas que promovem ou participam da lavagem de dinheiro. Não se trata só de mais uma operação.
Na última segunda, o WhatsApp brasileiro passou a exibir a informação de que as mensagens agora são criptografadas “de ponta a ponta”. Quando tratamos disso na CBN, muitos ouvintes perguntaram: é coisa da Lava-Jato?
Não, claro, mas de certa forma... Trata-se de um reforço na privacidade. Criptografadas, as mensagens não podem ser lidas nem pelo WhatsApp, nem por terceiros. Quer dizer que não podem ser grampeadas?
Não vai demorar muito para termos aqui um caso parecido com o FBI x Apple, quando a agência queria que a companhia quebrasse o código do iPhone de um terrorista. Não é de se esperar que um juiz brasileiro acabe pedindo que o WhatsApp quebre a criptografia para apanhar um suspeito? Ou, se o próprio pessoal da Lava-Jato, com autorização do juiz, quebrar a criptografia e captar conversas suspeitas, essa prova terá validade nos tribunais?
Notem: o uso de uma tecnologia de informação de ponta é parte essencial das operações tipo Lava-Jato no mundo todo. São eficientes e rápidas. Talvez pela primeira vez no Brasil uma operação anticorrupção seja mais capaz do que a própria corrupção. Ou ainda: tem uma capacidade de gerar provas muito mais intensas do que a habilidade dos advogados e seus clientes de oferecer explicações e defesas.
Por isso a Lava-Jato é celebrada — de Curitiba ao Panamá —, mas por isso também assusta um determinado público, nos mesmos lugares. Há movimentos nos meios políticos brasileiros para restringir a legislação anticorrupção, assim como, aqui incluindo os meios jurídicos, tentativas de limitar a capacidade da Lava-Jato de buscar e produzir provas.
Conseguirão?
Talvez consigam atrasar o processo. Mas imaginem a repercussão — mundial — de uma tentativa de cortar os braços de Moro.
E para encerrar com uma ironia: sabem qual o segundo sobrenome de Rafael Fonseca? Mora.
Quase.
Carlos Alberto Sardenberg
O fim do hiperpresidencialismo
O relatório do deputado Jovair Arantes favorável ao processo de impeachment da presidente Dilma é surpreendentemente bom. Simplesmente pelo fato de ser sóbrio, bem fundamentado, preciso em suas alegações. A prova de sua relevância está na reação do governo, que recorreu à negação do documento para refutá-lo. A verdade é que, para o Planalto as afirmações de Jovair são uma péssima notícia. Seu texto foi sobretudo convincente, predicado muito importante em política.
O que mais chama a atenção é o fato de que o parecer de Jovair Arantes nos remete a um Brasil que já devia ter acabado. País onde o Poder Executivo abusa de suas prerrogativas. Desvia recursos, girando dinheiro de um lado para o outro. Manipula o Orçamento. Constrange bancos estatais. Abusa na edição de medidas provisórias. Ou seja: um país que o PT prometeu aposentar e a realidade que ao chegar ao poder, turbinou-o.
No Brasil existe um hiperpresidencialismo que, muitas vezes, pratica a delinquência fiscal. O parecer de Jovair Arantes nos revela um país que não deveria mais existir nem na lembrança dos mais velhos. Onde as pedaladas fiscais e os truques contábeis não deveriam mais ocorrer. Independente da morte prematura do atual governo, a irresponsabilidade na gestão das contas públicas pode estar com os dias contados.
No mesmo dia em que se iniciava a discussão do parecer de Jovair sobre o impeachment, o TCU paralisava os programas de reforma agrária por erros grotescos. No ano passado, o mesmo TCU apontou graves desvios no uso das verbas do FUST (Fundo de Universalização das Telecomunicações) pelo ministério das Comunicações.
O dinheiro que deveria ser usado para a expansão das telecomunicações foi desviado para pagar plano de saúde e vale-transporte de funcionários. No dia anterior ao parecer de Jovair, o Banco Central apresentou dados irrefutáveis da ocorrência de pedaladas e mágicas contábeis.
A realidade exposta pelo relator da Comissão do Impeachment na Câmara é um cruel retrato da opacidade no uso dos recursos públicos. Comprovada por outros órgãos. Seu texto deve ser examinado não apenas pelo potencial efeito no impedimento da presidente. Mas, sobretudo, como chamamento para que sepultemos o hiperpresidencialismo ainda remanescente no Brasil.
O que mais chama a atenção é o fato de que o parecer de Jovair Arantes nos remete a um Brasil que já devia ter acabado. País onde o Poder Executivo abusa de suas prerrogativas. Desvia recursos, girando dinheiro de um lado para o outro. Manipula o Orçamento. Constrange bancos estatais. Abusa na edição de medidas provisórias. Ou seja: um país que o PT prometeu aposentar e a realidade que ao chegar ao poder, turbinou-o.
No Brasil existe um hiperpresidencialismo que, muitas vezes, pratica a delinquência fiscal. O parecer de Jovair Arantes nos revela um país que não deveria mais existir nem na lembrança dos mais velhos. Onde as pedaladas fiscais e os truques contábeis não deveriam mais ocorrer. Independente da morte prematura do atual governo, a irresponsabilidade na gestão das contas públicas pode estar com os dias contados.
No mesmo dia em que se iniciava a discussão do parecer de Jovair sobre o impeachment, o TCU paralisava os programas de reforma agrária por erros grotescos. No ano passado, o mesmo TCU apontou graves desvios no uso das verbas do FUST (Fundo de Universalização das Telecomunicações) pelo ministério das Comunicações.
O dinheiro que deveria ser usado para a expansão das telecomunicações foi desviado para pagar plano de saúde e vale-transporte de funcionários. No dia anterior ao parecer de Jovair, o Banco Central apresentou dados irrefutáveis da ocorrência de pedaladas e mágicas contábeis.
A realidade exposta pelo relator da Comissão do Impeachment na Câmara é um cruel retrato da opacidade no uso dos recursos públicos. Comprovada por outros órgãos. Seu texto deve ser examinado não apenas pelo potencial efeito no impedimento da presidente. Mas, sobretudo, como chamamento para que sepultemos o hiperpresidencialismo ainda remanescente no Brasil.
Dies horribilis
Deixemos de lado as más notícias econômicas colhidas, ontem, pelo governo. Do tipo:
* As negociações salariais entre patrões e trabalhadores resultaram em um reajuste médio de 0,23%, em termos reais, em 2015. É o menor desde 2004, quando o reajuste médio havia ficado em 0,61%;
* A caderneta de poupança completou o terceiro mês consecutivo de saques. Isso se deve à inflação elevada, aumento do desemprego, menor crescimento da renda do trabalhador e maiores gastos com tarifas e combustíveis;
* O movimento dos consumidores nas lojas de varejo do país caiu 8,5% no primeiro trimestre deste ano, na comparação com o mesmo período de 2015;
* A produção total de veículos no Brasil no primeiro trimestre do ano chegou a 482,29 mil unidades, uma contração de 27,8% em relação a igual período de 2015.
O de ontem foi particularmente um dia horrível de notícias políticas para o governo. Do tipo:
* O deputado Jovair Arantes (PTB-GO), relator da Comissão Especial da Câmara, deu seu voto favorável ao pedido de impeachment da presidente Dilma;
* A Frente Parlamentar Evangélica da Câmara, que reúne 90 deputados, declarou seu apoio ao impeachment;
* Fechou com o impeachment o Partido Verde, que conta com sete deputados e um senador;
* A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), de forte influência entre deputados e senadores, divulgou nota criticando o governo e recomendando o voto pela saída de Dilma.
À falta do que comemorar, o governo escalou o Ministro-chefe do gabinete da Presidência, Jaques Wagner (PT), para dizer que “as propostas vindas do Congresso de convocação de novas eleições gerais mostram que a proposta de impeachment começa a cair por terra".
As tais propostas de novas eleições, por enquanto, não passam de ideias lançadas ao vento pelo minúsculo partido de Marina Silva (REDE) e parlamentares avulsos. Mesmo que ganhem mais adeptos, em nada influenciarão o resultado da votação do impeachment na Câmara.
Wagner festejou o anúncio feito pelo senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP, de que seu partido continuará apoiando o governo. Ocorre que Nogueira se preparara para anunciar que o PP votaria contra o impeachment. Não o fez porque 22 dos seus deputados votarão a favor do impeachment, e mais alguns ainda poderão votar.
O governo não admite de público, mas sabe que a maioria dos 65 deputados da Comissão Especial aprovará o relatório de Arantes até o início da próxima semana. Em seguida, ele será votado em plenário. Para derrotar o impeachment, o governo só precisa do apoio de 172 deputados de um total de 513. Para aprovar, a oposição precisa do apoio de 342.
Se a votação em plenário fosse hoje, o impeachment não passaria. Haveria mais votos favoráveis a ele do que contrários, mas menos do que os 342 necessários. Dá-se que o impeachment, se aprovado pela Comissão Especial, só será votado em plenário a partir do próximo dia 15. Cada deputado será chamado a declarar seu voto ao microfone.
Com toda certeza, o país vai parar para assistir à votação que será transmitida ao vivo pelo rádio, televisão e redes sociais. O prédio do Congresso deverá estar cercado por cerca de 300 mil pessoas, segundo estimativa conservadora da Polícia Militar do Distrito Federal. Tudo isso conspira contra o que interessa ao governo.
A sorte de Dilma, de fato, será decidida somente nesse dia – o domingo 17 ou a segunda-feira 18. O dia 21 é carregado de simbolismo: celebra-se a Inconfidência Mineira. Foi em 21 de abril de 1985 que morreu sem tomar posse o primeiro presidente civil depois de 21 anos de ditadura militar, o mineiro Tancredo Neves.
Palácio do Planalto puxadinho do PT
No dia 31 de março, convocado pela presidente, um grupo de supostos defensores da democracia e da legalidade se reuniu no Palácio do Planalto. O motivo do evento (um dos tantos em que Dilma e Lula têm aparecido para um público subalterno, escolhido a dedo) era assinar atos de regularização de terras para reforma agrária e comunidades quilombolas. Na prática, comício político em favor da presidente e exaltado chamamento à violência e à luta contra o “golpe”.
O assunto foi fartamente noticiado. A sede da chefia de Estado e governo brasileiros prestou-se para discursos e condutas indignas (assista aqui a fala do representante da Contag). Nesse pronunciamento, como mote para convocar ações violentas, atentatórias à ordem pública, surge o clichê “bancada da bala”. No idioma esquerdista, “bancada da bala” designa um grupo de parlamentares formado por adversários do desarmamento e ruralistas. Eles gostariam que fosse respeitada a decisão tomada pelo povo brasileiro no referendo de 2005. Naquele significativo momento cívico, dois terços da população rejeitaram a proibição, mas o petismo inconformado, ao regulamentar administrativamente a matéria, sepultou a decisão nacional. Quem não sabe perder é o pessoal de estrela no peito.
Evidencia-se, também nisso, uma das muitas diferenças fundamentais entre os verdadeiramente democratas e os militantes petistas. A dita “bancada da bala”, presumivelmente violenta a partir do rótulo, respeita até a desrespeitosa regulamentação determinada pelo governo, que transforma a posse legal de armas numa gincana de dificuldades e custos. Paradoxalmente, a verdadeira bancada da bala ocupava assentos no evento palaciano! Ali estavam os protetores de bandidos como parceiros da luta de classe. Ali rugiam os verdadeiramente violentos, chamando à luta. Um protesto inadequado diante da moradia de certo ministro do STF, virou mote para os companheiros responderem com anúncio de invasão do parlamento, ataques à “bancada da bala” e assaltos a propriedades rurais. Ali sentavam, também, os defensores dos direitos dos criminosos, dos traficantes, donos de arsenais muito mais efetivos e ativos que os da lei e da ordem. Ali estava um governo que não combate o tráfico e mantém relações cordialíssimas com as FARC narcoterroristas. Ali, também, os que permitiram que a bala, hoje, corra solta em tiroteios no meio urbano.
A esquerda militante a serviço da causa serve-se de clichês como quem come amendoim. Vai um atrás do outro. E a mídia amiga é inesgotável no fornecimento para que, por repetição, o clichê se converta em reflexo da realidade. Vai-se, num pulo, da expressão ao fato.
Não surpreende que o Palácio do Planalto esteja convertido em puxadinho do PT. Quem comparece a seus eventos, quem os organiza, quem os mobiliza e quem os dirige não tem a menor noção sobre limites da ação política. A presidente desrespeita cotidianamente a dignidade de seu cargo! Não é por outro motivo que o país chegou à atual situação e que uma organização criminosa (Orcrim) se instalou no coração do poder. Agora, a Orcrim anuncia que vai à luta para não sair. Ao cidadão de bem não é tolerado, sequer, indignar-se com tudo isso. Se expressar sua revolta, lhe jogam por cima os clichês do ódio e da intolerância. Não foi à toa que publiquei um livro cujo título é “A tomada do Brasil (pelos maus brasileiros)”.
Percival Puggina
O assunto foi fartamente noticiado. A sede da chefia de Estado e governo brasileiros prestou-se para discursos e condutas indignas (assista aqui a fala do representante da Contag). Nesse pronunciamento, como mote para convocar ações violentas, atentatórias à ordem pública, surge o clichê “bancada da bala”. No idioma esquerdista, “bancada da bala” designa um grupo de parlamentares formado por adversários do desarmamento e ruralistas. Eles gostariam que fosse respeitada a decisão tomada pelo povo brasileiro no referendo de 2005. Naquele significativo momento cívico, dois terços da população rejeitaram a proibição, mas o petismo inconformado, ao regulamentar administrativamente a matéria, sepultou a decisão nacional. Quem não sabe perder é o pessoal de estrela no peito.
A esquerda militante a serviço da causa serve-se de clichês como quem come amendoim. Vai um atrás do outro. E a mídia amiga é inesgotável no fornecimento para que, por repetição, o clichê se converta em reflexo da realidade. Vai-se, num pulo, da expressão ao fato.
Não surpreende que o Palácio do Planalto esteja convertido em puxadinho do PT. Quem comparece a seus eventos, quem os organiza, quem os mobiliza e quem os dirige não tem a menor noção sobre limites da ação política. A presidente desrespeita cotidianamente a dignidade de seu cargo! Não é por outro motivo que o país chegou à atual situação e que uma organização criminosa (Orcrim) se instalou no coração do poder. Agora, a Orcrim anuncia que vai à luta para não sair. Ao cidadão de bem não é tolerado, sequer, indignar-se com tudo isso. Se expressar sua revolta, lhe jogam por cima os clichês do ódio e da intolerância. Não foi à toa que publiquei um livro cujo título é “A tomada do Brasil (pelos maus brasileiros)”.
Percival Puggina
As margens, o rio, o caminho do meio
O caminho do rio é aquele que suas margens permitem. O rio é um país, a maioria do povo; as margens, as elites políticas – à esquerda ou à direita –, radicalizadas tomando para si o leito do rio. Não se sabe se, ao longo de seu percurso, o rio transbordará, ultrapassando os limites de suas margens; ou se as margens estreitarão ainda mais a passagem do rio, fazendo o fluxo, antes caudaloso, cessar, virar seca. Ninguém sabe se as chuvas trarão novas águas, revitalizando as nascentes. O que se sabe é que o desafio do rio é não se deixar morrer pela opressão das margens.
Numa das curvas do rio, muita coisa para, mas nada mais é de estarrecer: a entrevista de Roberto Jefferson, concedida a Luciana Nunes Leal, no Estadão, é um primor desse realismo hidrográfico: um cotovelo de encanamento, onde as impurezas estacionam. Nela, o ex-deputado revela-escancara a incapacidade de o sistema político atual gerar qualquer fruto saudável. O embate nacional se resume, assim, a um duelo entre “bandidos”. E “o bandido pelo qual mais torço”, diz Jefferson, ”é Eduardo Cunha”.
Ainda sobre o mensalão, quem também voltou aos holofotes neste 1º de abril foi o ex-deputado Roberto Jefferson, “homem-bomba” do esquema que levou a cúpula do PT à prisão. Depois de cumprir sua pena, o político mostra que, em meio à crise que assola o governo, ele tem lado: “Cunha é o bandido que eu mais gosto”. Leia a entrevista completa aqui:
A crise é grave quando se percebe que não há mais mocinhos por quem torcer. A franqueza cortante de Jefferson é reveladora: os “esquemas”, o fisiologismo, o clientelismo e a corrupção esgotaram o rio. O ex-deputado sabe o que diz: vivenciou, negociou e confraternizou; seus amigos e inimigos íntimos, em quase todos os partidos, não são muito diferentes de Eduardo Cunha.
Acontece que, assim como a esperteza, o fisiologismo cresce e come o esperto; a voracidade por cargos, recursos e esquemas nos trouxe a este precipício. E ninguém escapa dessa vertigem. Roberto Jefferson é um desses personagens insólitos: constrangedoramente franco, bruto no revelar e revelar-se – cruel e impávido como Muhammad Ali. O fato é que não cala: rasga o peito, aponta o dedo e indica dá sua lição sobre a realpolitik nacional.
E assim, revela: o esquema cresceu, é gigante; pode-se dizer que não foi criação do PT. O partido apenas ousou se acreditar seu maior beneficiário. Resultou como um operador desastrado: “malando é malandro, mané é mané”. O poder, o poder… O poder que justifica a si mesmo. Até aqui, nenhum capitão de partido veio desmentir Jefferson. O silêncio é revelador.
Quem perde com isso é, antes de tudo, a própria política, desacreditada como um rio que se transformou em esgoto, em que se liquida a vida, numa crise sem fim.
***
Nos últimos dias, usando os instrumentos de que dispõe – cargos e promessas –, o governo voltou a acender as luzes de sua esperança. Mas, também revelou o “lado Jefferson” da situação: o oportunismo, ao contrário dos rios, não conhece limites. Aliado decidiram que decidiriam somente às vésperas da votação. Claro: capta-se antes humor das ruas. Mas, ao mesmo tempo, com o maior o desespero do governo, aumentam os preços. Num momento dramático, tudo que o oportunista quer é ser o voto de desempate.
Dilma insiste no vício que lhe consumiu, sem compreender que essas moedas só conhecem valorização na venda. Raposas espertas esperam pacientemente o cansaço da caça. Ansiosa, Dilma tende a pagar por aquilo que nunca poderá resgatar.
Ao mesmo tempo, o elemento Carbono 14, espécie de superbomba dos elos perdidos. Assim como Jefferson, os implicados da vez não são de ficar de bico fechado – só que ao contrário. Ensaia-se, então, o horror sem fim. Nem bem o Carbono 14 se espalha, o ar é rapidamente consumido por uns tais Papéis do Panamá. Na vertigem da crise, tudo tão rápido, assaz complexo e difícil de controlar.
A sorte de Dilma é que, por enquanto, o impeachment não tenha um rosto aceitável. Sua cara será a face de Michel Temer: seu apelo político pequeno; Renan Calheiros, Eduardo Cunha? Ou do PSDB, aliás, desaparecido? Qual o rosto do impeachment? O processo fica, assim, ainda mais volátil, menos linear e previsível; ziguezagueiam, serpenteiam fantasias e ressentimentos; avanços, retrocessos distribuem surpresas e insegurança.
A incerteza da crise aprofunda a própria crise; o suspense coloca o dedo no gatilho das delações premiadas. A confusão só cresce. E nada leva a crer num “dia depois de amanhã” positivo. A presidente, esqueçam, não retomará o controle do processo politico ou econômico, tampouco Lula voltará ao que era antes.
E Michel Temer, bem, partindo de bases políticas tão oscilantes, terá muita dificuldade para consolidar um governo à altura do desafio. Acresça ao quadro a situação dos bancos, se tiverem que contabilizar a Odebrecht como prejuízo. O Brasil olha para o inferno e o diabo lhe sorri.
Daí manifestações como o Editorial da Folha, do domingo, 03; daí notícias que apontam que no STF, mesmo os ministros simpáticos ao governo já admitem a precariedade da presidente; daí setores do PT vislumbrarem a necessidade do diálogo (Estadão); dai o silêncio do PSDB. Daí a tese de uma nova eleição. Como diz o Gato de Alice, “para quem não sabe onde ir, qualquer caminho é bom. Ninguém sabe a saída do labirinto.
É possível que a linha do impeachment, como solução para o impasse, já tenha sido ultrapassada; que a postura de Lula e Dilma – revivendo fantasmas de “golpes” – tenha mandado a responsabilidade às favas. Que a festa do PMDB aclamando Temer no rompimento com o governo tenha precipitado a prematura reprovação ao seu governo que ainda nem começou – e, realmente, como observou o ministro Barroso à foto do dia seguinte, “meu deus do céu…”
É possível que a irresponsabilidade, a voracidade e o descrédito tenham mesmo fechado as portas das saídas institucionais mais previsíveis. É possível que o rio tenha passado do ponto e, agora, a saída, que e se houver, só poderá vir pelas mão da política.
Ou isto ou o precipício da desagregação, o conflito pelas vias de fato que as duas margens, sem cerimônia, já admitem e que implica no esmagamento do rio. Chamemos a esta hipótese de “a via Voldemort” – “aquele que não deve ser nominado”.
***
Agrava a crise o fato de grande parte da sociedade forjar um embate de surdos, acreditando que o melhor lugar do mundo é a margem do rio em que se acredita estar. Nega-se a politica, a possibilidade de consenso – o que não significa “acordão” — e, aos poucos, as classes médias vestem-se para a guerra. Com qual objetivo? Ao final, não percebem que as pedras que lançam não chegam à outra margem e a quem ferem, de fato, é ao rio.
Psicanalista, Contardo Calligaris acertou na alma da questão quando disse que “em geral, nosso interlocutor só quer saber de que lado nós estamos”. E se não estamos ao seu lado, somos sua negação. Lógica cartesiana: “pensas diferente, logo não deves existir”; não há espaço para nuances ou mediações.
Pior que os riscos econômico e político da crise, este comportamento fere a democracia nas relações mais íntimas, machucando a liberdade na sua essência: no convívio e na tolerância. Sem tolerância, não há liberdade, nem democracia. Sequer haverá justiça.
Quem não dança essa música leva as pedras dos dois lados: (tentar) compreender e explicar o processo é luta vã: “meu chapa, você capitulou ao outro lado”. Que lado? O princípio básico da análise está em Spinoza: “nem o riso, nem a lágrima; apenas o entendimento”. Nada mais estúpido que o pensamento binário, maniqueísta: ou o riso ou a lágrima. Expurgar o entendimento da vida política, com efeito, é mesmo de rir ou de chorar.
Erro tremendo desprezar o rio. Considerá-lo não implica em omissão, mas em perceber que, no fundo, ainda se é rio; e que o rio precisa seguir, num consenso, com menor opressão das margens. Ser margem é escolha; ser rio é condição. Pessoalmente, respondo às margens: “é fácil concordar com o que dizem a respeito uma da outra; o difícil é engolir o que pensam a respeito de si próprias”. Sigo no caminho do meio, transformando as águas do rio e sendo transformado por elas.
Carlos Melo
É dando...
O homem que aspira a alturas deve alcançá-las através dos outros com a ajuda dos outros e, por sua vez, ajudando-osMaguid de Kozhenitz (século XIX)
Um monte de Mandrakes no circo da política
Vamos que as oposições à presidente Dilma consigam na Câmara os 342 votos necessários a que Madame seja afastada do poder por 180 dias e se veja submetida à decisão do Senado, que por maioria de seus integrantes precisará votar o impeachment. São várias as hipóteses. Perder na Câmara e ganhar no Senado, por exemplo. Nesse caso, Dilma voltaria ao palácio do Planalto depois de prolongadas férias, mas durante os 180 dias governaria o vice Michel Temer, podendo mudar o ministério inteiro, só para ver Dilma recolocar no lugar os afastados pelo substituto.
Uma confusão dos diabos que deixaria o governo em frangalhos. A presidente, no retorno triunfal, escolheria novos ministros ou inauguraria outra administração? Como se daria o troca-troca, diante dos partidos? De qualquer forma o vice não teria sido afastado e, reocupando o palácio do Jaburu, que tipo de relações manteria com a titular recuperada?
Outras possibilidades existem, como a de Dilma permanecer sem ser afastada, por falta de 342 deputados favoráveis à sua degola. Há também a opção de seu vice não mudar um só ministro durante o interregno de meio ano. Itamar Franco mudou todo mundo, até os ministros militares, na certeza de que Fernando Collor não voltaria, porque renunciou.
De qualquer forma, as previsões são trágicas para o futuro do país, mesmo a de Dilma não ser afastada nem temporariamente. Enquanto isso, a economia vai despencando em vertiginoso ritmo, tanto faz se terá dois, três ou quatro ministérios.
Vale tudo nessa guerra sem quartel, inclusive ilações sobre a saúde mental da presidente. A mais recente especulação fala da realização de eleições gerais para presidente, vice e para o Congresso já no próximo mês de outubro, mágica a pressupor um monte de Mandrakes, porque exigiria golpes de estado, mudanças constitucionais, renúncias e redução de mandatos.
Em suma, quanto mais se mexe, pior fica. O deserto de homens e de ideias avança a cada dia, para não falar na ausência de partidos políticos capazes de botar ordem no caos. Até o Supremo Tribunal Federal entra na lambança, supondo-se que vá decidir se o parlamentarismo pode ser estabelecido por emenda constitucional, depois de o eleitorado haver votado duas vezes pelo presidencialismo, como dita a Constituição.
Uma confusão dos diabos que deixaria o governo em frangalhos. A presidente, no retorno triunfal, escolheria novos ministros ou inauguraria outra administração? Como se daria o troca-troca, diante dos partidos? De qualquer forma o vice não teria sido afastado e, reocupando o palácio do Jaburu, que tipo de relações manteria com a titular recuperada?
De qualquer forma, as previsões são trágicas para o futuro do país, mesmo a de Dilma não ser afastada nem temporariamente. Enquanto isso, a economia vai despencando em vertiginoso ritmo, tanto faz se terá dois, três ou quatro ministérios.
Vale tudo nessa guerra sem quartel, inclusive ilações sobre a saúde mental da presidente. A mais recente especulação fala da realização de eleições gerais para presidente, vice e para o Congresso já no próximo mês de outubro, mágica a pressupor um monte de Mandrakes, porque exigiria golpes de estado, mudanças constitucionais, renúncias e redução de mandatos.
Em suma, quanto mais se mexe, pior fica. O deserto de homens e de ideias avança a cada dia, para não falar na ausência de partidos políticos capazes de botar ordem no caos. Até o Supremo Tribunal Federal entra na lambança, supondo-se que vá decidir se o parlamentarismo pode ser estabelecido por emenda constitucional, depois de o eleitorado haver votado duas vezes pelo presidencialismo, como dita a Constituição.
Outras tentativas de impeachment e nenhuma foi chamada de 'golpe'
Nas guerras, nas grandes contendas ou, até mesmo, nas simples discussões a dois sobre questões menores, há inúmeras vítimas, mas a maior delas (e a que mais incomoda) é sempre a verdade.
Lembro-me dessa lição porque (alguns) “luminares”, tanto do direito como da política, ou da intelectualidade, em meio à grave crise por que passa o país, põem a boca no mundo – por escrito ou verbalmente, nos jornais, nas emissoras de rádio e televisão, mas, sobretudo, nas redes sociais – para esbofetearem ainda mais a verdade.
A presidente Dilma, ao tentar esconder a verdade do que ocorreu no governo do ex-presidente Lula e está ocorrendo no seu próprio governo, do ponto de vista tanto legal ou constitucional como ético, ressuscitou, no “Palácio dos Comícios” (novo nome do Palácio do Planalto), a palavra “nazismo”. Ao usar e estimular, exaustiva e repetidamente, o uso do slogan “Não vai ter golpe”, como técnica de combate contra um processo legítimo e constitucional, a presidente se traiu e simplesmente adotou, inconscientemente ou não, os mesmos métodos de Joseph Goebbels, ministro da Propaganda de Adolf Hitler. Ou seja: a mentira, repetida mil vezes, acaba se tornando verdade.
O recurso, previsto na Constituição, e há pouco regulamentado pelo Supremo Tribunal Federal, não é mais novidade. O próprio Lula e, antes dele, Fernando Henrique e José Sarney enfrentaram inúmeras tentativas de pedido de impeachment, e nenhuma delas foi chamada de “golpe”.
Desnecessário lembrar, por outro lado, de que o impeachment do ex-presidente Fernando Collor, no qual o PT teve papel de destaque, nunca foi considerado golpe por quem quer que fosse.
Mesmo assim, em resposta ao utópico editorial “Nem Dilma, nem Temer”, da “Folha de S.Paulo”, a presidente, antes de reafirmar que não renunciará, aproveitou-se da chance, em sua página do Facebook, para dizer o seguinte, referindo-se ao jornal: “Antes apoiador do impeachment, agora pede a (sua) renúncia, evitando, assim, o constrangimento de respaldar uma ação indevida, ilegal e criminosa”.
Depois dessa resposta, ficou mais do que evidente que a presidente confunde o seu destino com o destino do país. É muita pretensão, leitor! Ou, então, se trata de grave e preocupante caso de compulsão e, como toda compulsão, difícil de ser tratada. A que acomete a presidente – a pior delas, a compulsão pelo poder, qualquer que seja sua forma –, acomete, igualmente, as pessoas do ex-presidente Lula, do presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha, e do presidente do Senado, Renan Calheiros. Juntos, submetem a grave constrangimento a grande maioria do povo brasileiro. Os quatro, juntinhos, fariam um bem imenso ao Brasil se renunciassem não apenas aos cargos, mas à vida publica. À qual, aliás, não souberam servir com honra e dignidade.
O editorial da “Folha de S.Paulo”, quando propõe a renúncia da presidente e de seu vice e, em seguida, o afastamento, pela Câmara ou pelo STF, “da nefasta figura de Eduardo Cunha”, esquecendo-se, porém, de Renan Calheiros, outra figura nefasta, talvez esteja com a razão, mas como tese. Tem total razão, todavia, quando afirma que “a presidente Dilma perdeu as condições de governar o país”.
Sobra-nos, leitor, o impeachment, para estancar a hemorragia que ameaça afogar o país. Para isso, há que se respeitar a Constituição e a vontade, já expressa, da maior parte do povo brasileiro.
E, enfim, que aceitemos o que ficar decidido.
Lembro-me dessa lição porque (alguns) “luminares”, tanto do direito como da política, ou da intelectualidade, em meio à grave crise por que passa o país, põem a boca no mundo – por escrito ou verbalmente, nos jornais, nas emissoras de rádio e televisão, mas, sobretudo, nas redes sociais – para esbofetearem ainda mais a verdade.
O recurso, previsto na Constituição, e há pouco regulamentado pelo Supremo Tribunal Federal, não é mais novidade. O próprio Lula e, antes dele, Fernando Henrique e José Sarney enfrentaram inúmeras tentativas de pedido de impeachment, e nenhuma delas foi chamada de “golpe”.
Desnecessário lembrar, por outro lado, de que o impeachment do ex-presidente Fernando Collor, no qual o PT teve papel de destaque, nunca foi considerado golpe por quem quer que fosse.
Mesmo assim, em resposta ao utópico editorial “Nem Dilma, nem Temer”, da “Folha de S.Paulo”, a presidente, antes de reafirmar que não renunciará, aproveitou-se da chance, em sua página do Facebook, para dizer o seguinte, referindo-se ao jornal: “Antes apoiador do impeachment, agora pede a (sua) renúncia, evitando, assim, o constrangimento de respaldar uma ação indevida, ilegal e criminosa”.
Depois dessa resposta, ficou mais do que evidente que a presidente confunde o seu destino com o destino do país. É muita pretensão, leitor! Ou, então, se trata de grave e preocupante caso de compulsão e, como toda compulsão, difícil de ser tratada. A que acomete a presidente – a pior delas, a compulsão pelo poder, qualquer que seja sua forma –, acomete, igualmente, as pessoas do ex-presidente Lula, do presidente da Câmara Federal, Eduardo Cunha, e do presidente do Senado, Renan Calheiros. Juntos, submetem a grave constrangimento a grande maioria do povo brasileiro. Os quatro, juntinhos, fariam um bem imenso ao Brasil se renunciassem não apenas aos cargos, mas à vida publica. À qual, aliás, não souberam servir com honra e dignidade.
O editorial da “Folha de S.Paulo”, quando propõe a renúncia da presidente e de seu vice e, em seguida, o afastamento, pela Câmara ou pelo STF, “da nefasta figura de Eduardo Cunha”, esquecendo-se, porém, de Renan Calheiros, outra figura nefasta, talvez esteja com a razão, mas como tese. Tem total razão, todavia, quando afirma que “a presidente Dilma perdeu as condições de governar o país”.
Sobra-nos, leitor, o impeachment, para estancar a hemorragia que ameaça afogar o país. Para isso, há que se respeitar a Constituição e a vontade, já expressa, da maior parte do povo brasileiro.
E, enfim, que aceitemos o que ficar decidido.
Herói sem caráter
Há diversas formas de envelhecer, e talvez a mais pesarosa seja desaparecer em nosso próprio esquecimento. É o que ocorre com aquele avô que você adora, um sujeito admirável, hábil contador de histórias e divertido companheiro de parques e circos, mas que, de repente, torna-se irreconhecível. Começa a provocar situações constrangedoras e deprimentes, muitas vezes feitas de gritarias, xingamentos, agressões físicas ou simples falta de bom senso. Abandonado à demência, descola-se da pessoa que foi para vestir outra identidade.
É dessa forma que prefiro pensar no ex-presidente Lula: um bom avô que o Brasil um dia teve e que inspirou milhões de pessoas, convencidas da possibilidade de reformas estruturais na sociedade. Hoje, no entanto, transformou-se em um homem perdido, de discursos desatinados, de atos obscenos e que não mais reconhecemos. Como um rato (ou seria uma jararaca?) encurralado, com medo de ser preso, assume seus valores degenerados, ataca a sociedade, ofende o bom senso e debocha da decência.
Ao perder a noção da responsabilidade sobre seus atos, o nosso herói com Alzheimer passou a ser vigiado até por netos que, em um passado recente, o admiravam, e que não querem vê-lo cometer mais bobagens. Sei que muitos deles participaram das manifestações do dia 13 de março, o maior protesto já registrado na história nacional, na tentativa de combater toda e qualquer forma de corrupção no país. Porque todos nós, antes de tudo, somos filhos dessa nação. Alguns, ainda contagiados por uma cegueira educacional ou ideológica.
Logo cedo, na escola, conhecemos Macunaíma, personagem da obra-prima do escritor brasileiro Mário de Andrade. Então, entendemos a natureza de um herói sem nenhum caráter: é mentiroso, traidor, briguento, preguiçoso. Demonstra acolher todo mundo, mas também rouba e trapaceia sem remorso. É nisso que penso enquanto acompanho as tentativas de Lula para assumir o comando da Casa Civil, em um golpe desesperado para se manter no poder.
Assim como o avô de quem guardamos apenas as boas lembranças, eu gostaria de, um dia, preservar em minha memória a imagem do homem que produziu esperança para um povo. É certo que gente se alimenta não só de comida e bens de consumo, mas também de educação, cultura e desenvolvimento. Não quero, porém, entrar nesse mérito. Houve uma mudança e, por isso, ele merece seu espaço na história.
Porém, um velho homem acometido pela senilidade indica o fim da vida, seja ele real ou simbólico. E a morte tem um dom: o de expurgar os defeitos e, com poucas exceções, perdoar na Terra aquilo que os homens fizeram. Até que, aos poucos, aquela imagem tão familiar vai desaparecendo de nosso coração e de nossas mentes.
“Escreve na pedra aquilo que lhe fazem de bem, e na areia aquilo que lhe fazem de mal”, como diz o ditado. Porque o que há de mal o vento vem e leva. E o vento há de soprar.
Francisco Balestrin
É dessa forma que prefiro pensar no ex-presidente Lula: um bom avô que o Brasil um dia teve e que inspirou milhões de pessoas, convencidas da possibilidade de reformas estruturais na sociedade. Hoje, no entanto, transformou-se em um homem perdido, de discursos desatinados, de atos obscenos e que não mais reconhecemos. Como um rato (ou seria uma jararaca?) encurralado, com medo de ser preso, assume seus valores degenerados, ataca a sociedade, ofende o bom senso e debocha da decência.
Logo cedo, na escola, conhecemos Macunaíma, personagem da obra-prima do escritor brasileiro Mário de Andrade. Então, entendemos a natureza de um herói sem nenhum caráter: é mentiroso, traidor, briguento, preguiçoso. Demonstra acolher todo mundo, mas também rouba e trapaceia sem remorso. É nisso que penso enquanto acompanho as tentativas de Lula para assumir o comando da Casa Civil, em um golpe desesperado para se manter no poder.
Assim como o avô de quem guardamos apenas as boas lembranças, eu gostaria de, um dia, preservar em minha memória a imagem do homem que produziu esperança para um povo. É certo que gente se alimenta não só de comida e bens de consumo, mas também de educação, cultura e desenvolvimento. Não quero, porém, entrar nesse mérito. Houve uma mudança e, por isso, ele merece seu espaço na história.
Porém, um velho homem acometido pela senilidade indica o fim da vida, seja ele real ou simbólico. E a morte tem um dom: o de expurgar os defeitos e, com poucas exceções, perdoar na Terra aquilo que os homens fizeram. Até que, aos poucos, aquela imagem tão familiar vai desaparecendo de nosso coração e de nossas mentes.
“Escreve na pedra aquilo que lhe fazem de bem, e na areia aquilo que lhe fazem de mal”, como diz o ditado. Porque o que há de mal o vento vem e leva. E o vento há de soprar.
Francisco Balestrin
Marina no seu labirinto
“Nem, nem” – eis a campanha lançada pela Rede, dois dias atrás, em Brasília. Nem Dilma, nem Temer: o impeachment, explicou Marina Silva, “não cumpre a finalidade de resolver a crise”. É que, “ao final dele, a metade que patrocinou a crise estará lá, que é o PMDB”. A solução seria uma nova eleição presidencial, por meio da cassação da chapa no TSE, cujos juízes “devolveriam aos 200 milhões de brasileiros a possibilidade de reparar o erro que foram induzidos a cometer”. Por esse caminho, Marina chega à câmara mais recôndita de seu labirinto. O Minotauro que a habita é o Princípio. Ele se alimenta da negação da política.
A política distingue-se da politicagem quando se submete às balizas dos princípios. Mas, sob o olhar de Marina, a arte da política está sempre contaminada por uma impureza essencial. Para circundá-la, a líder da Rede move-se à frente, numa trajetória de fuga em direção ao Princípio. Ela esquece que suas ações estão inscritas, inevitavelmente, no tabuleiro da política. A campanha do “nem, nem” ilumina essa contradição fatal. O radicalismo principista da rejeição do impeachment apenas aprofunda a crise nacional que se propõe a solucionar.
O diagnóstico geral de Marina é irretocável. A coalizão PT-PMDB produziu uma crise de legitimidade ao enganar os eleitores, prometendo uma estabilidade econômica já destroçada no primeiro mandato de Dilma Rousseff. O golpe eleitoral de 2014 destruiu a governabilidade, que não será restaurada pela transferência do poder ao sócio menor. Juntos, PT e PMDB promoveram o assalto à coisa pública desvendado pela Operação Lava Jato, convertendo a democracia numa caricatura macabra de si mesma. Na manobra da ruptura do PMDB com o governo, entre os ratos que saltam do barco, contam-se diversas figuras envolvidas com o escândalo do petrolão. Para “passar o Brasil a limpo”, na expressão usada por Marina, é preciso bem mais que uma troca de guarda no Planalto.
Um governo Michel Temer não é rima nem solução. Carente da legitimidade eleitoral, enfrentando o bombardeio implacável do PT e da sua tropa disciplinada de sindicatos e “movimentos sociais”, Temer não teria meios para adotar as medidas ousadas exigidas pelo desastre econômico. Cercado pelas máfias de seu próprio partido, Temer ficaria vulnerável às chantagens políticas destinadas a encerrar as investigações da Lava Jato. De fato, para alinhar o poder político ao imperativo de “passar o Brasil a limpo”, é preciso devolver o voto ao povo. Entretanto, no lugar disso, a campanha do “nem, nem” oferece uma oportunidade suplementar ao sócio maior da coalizão governista, que é o PT.
Fora do universo “sonhático” do Princípio, a vida política obedece a ritmos e prazos definidos legalmente. Um julgamento das contas de campanha no TSE ainda demanda alguns meses. Depois, na hipótese de cassação da chapa Dilma-Temer, o governo ingressaria com recurso junto ao STF. A decisão final não sairia antes de 2017, o que transferiria a prerrogativa de eleger presidente e vice para o Congresso Nacional. Na prática, o sucesso da campanha do “nem, nem” provocaria uma eleição indireta, entregando o Executivo aos indicados por um corpo de deputados e senadores largamente comprometidos com os esquemas do petrolão. O Minotauro é um conservador extremado, não uma fonte de ruptura e renovação.
Confrontados com tais impasses, os arautos do “nem, nem” apelam ao expediente do ilusionismo, reivindicando as renúncias simultâneas de Dilma e Temer, o que ensejaria a convocação de eleições diretas. A renúncia é, porém, um ato unilateral de vontade – e Dilma repete sem cessar, noite e dia, que “jamais” renunciará. Opondo-se ao impeachment e solicitando algo que só a presidente pode fazer, Marina converte o Brasil em refém das estratégias de Lula. No fundo, enquanto o ministro ilegal da Casa Civil engaja-se no feirão da corrupção, comprando deputados a preços de mercado spot, a Rede vira as costas ao jogo da política, isolando-se no cubo de cristal do Princípio.
Marina segue prisioneira de uma resistência cujo sentido perdeu-se no passado. A necessidade do impeachment já não decorre do precário argumento original das “pedaladas fiscais”. Hoje, deriva das evidências de que Dilma elegeu-se com recursos desviados da Petrobras e, mais ainda, da urgência de afastar um governo empenhado na sabotagem das investigações da Lava Jato, numa ofensiva contra a autonomia do Ministério Público e da Polícia Federal e na tentativa de obstrução da Justiça. Dilma e Lula precisam ser apeados justamente para resguardar a oportunidade de “passar o Brasil a limpo”. O impeachment é, no momento, o instrumento disponível para alcançar a finalidade explicitamente almejada pela líder da Rede.
Na aliança tática com o PMDB, o Princípio se perde, mas os princípios sobrevivem. Dilma e Lula dispõem de uma máquina política eficaz, que ainda funciona. Temer, por outro lado, seria apenas um presidente circunstancial. Do impeachment, emanaria um governo frágil, confrontado desde a inauguração com uma encruzilhada decisiva. Temer teria a chance de cumprir um papel histórico, semeando a reconstrução econômica e abrindo as comportas para a continuidade das investigações da Lava Jato. Na direção oposta, cedendo à tentação de reduzir seu governo a um polo de reaglutinação de corruptos à deriva, ele afrontaria a vontade da maioria. Nessa hipótese, o grito de “Fora Dilma” seria substituído por um sonoro “Fora Temer”.
A política é, entre outras coisas, a arte de estabelecer uma hierarquia de prioridades. Marina desrespeita suas regras básicas ao refugiar-se na câmara do Princípio. O Minotauro nasceu do castigo de Poseidon ao gesto de desrespeito do rei Minos. Antes de oferecer involuntariamente uma ajuda providencial a Dilma e Lula, sugiro que ela estude a narrativa mitológica do labirinto de Creta.
Demétrio Magnoli
O diagnóstico geral de Marina é irretocável. A coalizão PT-PMDB produziu uma crise de legitimidade ao enganar os eleitores, prometendo uma estabilidade econômica já destroçada no primeiro mandato de Dilma Rousseff. O golpe eleitoral de 2014 destruiu a governabilidade, que não será restaurada pela transferência do poder ao sócio menor. Juntos, PT e PMDB promoveram o assalto à coisa pública desvendado pela Operação Lava Jato, convertendo a democracia numa caricatura macabra de si mesma. Na manobra da ruptura do PMDB com o governo, entre os ratos que saltam do barco, contam-se diversas figuras envolvidas com o escândalo do petrolão. Para “passar o Brasil a limpo”, na expressão usada por Marina, é preciso bem mais que uma troca de guarda no Planalto.
Um governo Michel Temer não é rima nem solução. Carente da legitimidade eleitoral, enfrentando o bombardeio implacável do PT e da sua tropa disciplinada de sindicatos e “movimentos sociais”, Temer não teria meios para adotar as medidas ousadas exigidas pelo desastre econômico. Cercado pelas máfias de seu próprio partido, Temer ficaria vulnerável às chantagens políticas destinadas a encerrar as investigações da Lava Jato. De fato, para alinhar o poder político ao imperativo de “passar o Brasil a limpo”, é preciso devolver o voto ao povo. Entretanto, no lugar disso, a campanha do “nem, nem” oferece uma oportunidade suplementar ao sócio maior da coalizão governista, que é o PT.
Fora do universo “sonhático” do Princípio, a vida política obedece a ritmos e prazos definidos legalmente. Um julgamento das contas de campanha no TSE ainda demanda alguns meses. Depois, na hipótese de cassação da chapa Dilma-Temer, o governo ingressaria com recurso junto ao STF. A decisão final não sairia antes de 2017, o que transferiria a prerrogativa de eleger presidente e vice para o Congresso Nacional. Na prática, o sucesso da campanha do “nem, nem” provocaria uma eleição indireta, entregando o Executivo aos indicados por um corpo de deputados e senadores largamente comprometidos com os esquemas do petrolão. O Minotauro é um conservador extremado, não uma fonte de ruptura e renovação.
Confrontados com tais impasses, os arautos do “nem, nem” apelam ao expediente do ilusionismo, reivindicando as renúncias simultâneas de Dilma e Temer, o que ensejaria a convocação de eleições diretas. A renúncia é, porém, um ato unilateral de vontade – e Dilma repete sem cessar, noite e dia, que “jamais” renunciará. Opondo-se ao impeachment e solicitando algo que só a presidente pode fazer, Marina converte o Brasil em refém das estratégias de Lula. No fundo, enquanto o ministro ilegal da Casa Civil engaja-se no feirão da corrupção, comprando deputados a preços de mercado spot, a Rede vira as costas ao jogo da política, isolando-se no cubo de cristal do Princípio.
Marina segue prisioneira de uma resistência cujo sentido perdeu-se no passado. A necessidade do impeachment já não decorre do precário argumento original das “pedaladas fiscais”. Hoje, deriva das evidências de que Dilma elegeu-se com recursos desviados da Petrobras e, mais ainda, da urgência de afastar um governo empenhado na sabotagem das investigações da Lava Jato, numa ofensiva contra a autonomia do Ministério Público e da Polícia Federal e na tentativa de obstrução da Justiça. Dilma e Lula precisam ser apeados justamente para resguardar a oportunidade de “passar o Brasil a limpo”. O impeachment é, no momento, o instrumento disponível para alcançar a finalidade explicitamente almejada pela líder da Rede.
Na aliança tática com o PMDB, o Princípio se perde, mas os princípios sobrevivem. Dilma e Lula dispõem de uma máquina política eficaz, que ainda funciona. Temer, por outro lado, seria apenas um presidente circunstancial. Do impeachment, emanaria um governo frágil, confrontado desde a inauguração com uma encruzilhada decisiva. Temer teria a chance de cumprir um papel histórico, semeando a reconstrução econômica e abrindo as comportas para a continuidade das investigações da Lava Jato. Na direção oposta, cedendo à tentação de reduzir seu governo a um polo de reaglutinação de corruptos à deriva, ele afrontaria a vontade da maioria. Nessa hipótese, o grito de “Fora Dilma” seria substituído por um sonoro “Fora Temer”.
A política é, entre outras coisas, a arte de estabelecer uma hierarquia de prioridades. Marina desrespeita suas regras básicas ao refugiar-se na câmara do Princípio. O Minotauro nasceu do castigo de Poseidon ao gesto de desrespeito do rei Minos. Antes de oferecer involuntariamente uma ajuda providencial a Dilma e Lula, sugiro que ela estude a narrativa mitológica do labirinto de Creta.
Demétrio Magnoli
Desculpa de combater 'cibercrime' a serviço da censura
Preste atenção no que acabou de acontecer: o Congresso Nacional acabou (dia 31) de divulgar o relatório final da CPI dos Crimes Cibernéticos. O relatório propõe a criação de 8 projetos de lei para controlar a internet. Esses projetos são bombásticos: eles atacam diretamente direitos fundamentais, como a liberdade de expressão, o direito à privacidade e mutilam as partes mais importantes do Marco Civil da Internet, justamente aquelas que protegem os internautas contra a vigilância e a censura.
Dentre as propostas que estão previstas no relatório final da CPI dos Cibercrimes estão:
a) Transformar as redes sociais em órgãos de censura para proteger a honra de políticos. Se alguém falar mal de um político em uma rede social, a rede social será obrigada a remover o conteúdo em no máximo 48 horas. Se não remover, a empresa será co-responsabilizada por aquele conteúdo e terá de indenizar o político ofendido. Em outras palavras, as redes sociais se tornarão agentes de vigilância e censura permanentes dos seus usuários.
b) Mandar para a cadeia por 2 anos quem simplesmente violar os “termos de uso” de um site. Entrou em um site ou aplicativo e desrespeitou alguma cláusula daquele documento enorme que todo mundo clica sem sequer ter lido: cadeia para você por 2 anos.
c) Desviar 10% dos arrecadados pelo Fistel, que têm por objetivo melhorar a qualidade das telecomunicações no Brasil, para financiar a polícia. As telecomunicações que já são caras e precárias no Brasil ficarão ainda piores. O recurso que é arrecadado para fiscalizar a qualidade do acesso à internet, telefonia e outro serviços será desviado para financiar a polícia. É claro que esse financiamento é importante. Mas para isso já pagamos nossos impostos. Não precisa desviar recursos essenciais para isso.
d) Atribuir competência à Polícia Federal para qualquer crime praticado usando um computador ou celular. Em outras palavras, o garoto ou a garota que baixar uma música da internet poderá receber a visita do japonês da federal. Alguém que escrever algo considerado “difamatório” ou “injurioso” contra um político nas redes sociais poderá ter de se explicar à Polícia Federal. Em outras palavras, vários milhões de brasileiros que fazem essas atividades todos os dias poderão ser vigiados e até mesmo presos pela Polícia Federal sob suspeita de de terem cometido “crimes mediante uso de computador”, mesmo que sejam crimes de baixo potencial ofensivo.
e) Obrigar os provedores de internet a revelarem automaticamente quem está por trás de cada endereço de IP na rede, informando para a polícia o nome, filiação e endereço domiciliar da pessoa, sem a necessidade de ordem judicial prévia. Em outras palavras, todos serão presumidamente “culpados” na internet brasileira e poderão ser constantemente vigiados. Se falou mal de um político na internet, na hora será possível saber a sua identidade e a Polícia Federal poderá ser acionada contra você.
f) Estabelecer a censura pura e simples na internet. O projeto de lei altera o Marco Civil, que proíbe a censura, criando um novo artigo que permitirá “determinar aos provedores de conexão bloqueio ao acesso a a aplicações de internet por parte dos usuários” para “coibir serviços que sejam considerados ilegais”. Em outras palavras: qualquer site poderá ser derrubado da internet brasileira. Lembra do bloqueio do WhatsApp? Isso será fichinha perto do que irá acontecer. Qualquer aplicativo, site ou serviço poderá ser bloqueado e censurado diretamente pelos provedores de internet e os brasileiros ficarão privados de acessá-lo sem qualquer defesa, afetando a vida de milhões de pessoas.
O relatório da CPI que propõe essas mudanças abre com a assinatura do deputado Eduardo Cunha, atual presidente da Câmara. A CPI foi presidida pela Deputada Mariana Carvalho (PSDB-RO) e o texto preparado pelo deputado Espiridião Amim (PP-SC) e pelos deputados Sandro Alex (PSD-PR), Rafael Motta (PSB-RN), Daniel Coelho (PSDB-PE) e Rodrigo Martins (PSB-PI).
O que mais pasma nesse relatório da CPI dos cibercrimes é como a internet é vista apenas como se fosse um “antro de perdição” e não como uma fonte de empregos, de inovação, de desenvolvimento, ou um instrumento essencial para o futuro do Brasil.
Em outras palavras, estão criminalizando a internet e colocando a rede sob o controle estrito do Estado. Esse é o mesmo caminho trilhado por países como a Arábia Saudita, Irã, Turquia, Coreia do Norte e Rússia.
É uma lástima que o Brasil, nesse momento em que a liberdade de expressão e a internet são ferramentas essenciais, tenha sua internet ameaçada por iniciativa da CPI dos cibercrimes. É claro que o crime na internet precisa ser combatido. Mas isso deve ser feito respeitando-se direitos fundamentais. O que estamos assistindo agora não é uma tentativa de se combater os cibercrimes, mas sim uma tentativa de controlar a internet, que tanto tem incomodado os políticos corruptos no Brasil.
Se você não quer a que internet seja censurada, compartilhe essas informações e manifeste-se contra a CPI dos Cibercrimes e os oito projetos de lei que ela propõe para controlar a internet. Censura nunca mais.
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