Cândido Portinari |
sábado, 13 de julho de 2019
Os 7 erros na indicação de Eduardo para a embaixada nos EUA
1 — É nepotismo, como avisou o ministro Marco Aurélio Mello, do STF. Há advogados que dizem haver brechas, porque nepotismo seria indicar para cargos em comissão e não para vagas políticas. É uma visão superficial. Favorecer um filho viola o princípio da impessoalidade. Discutir se é o cargo é político ou não é uma minúcia.
A linha adotada agora é ainda pior. A qualificação de diplomata é específica. Para chegar a assumir uma embaixada, o topo da carreira, o diplomata que sai do Instituto Rio Branco tem que atuar como 3º secretário, 2º secretário. Depois de 1º secretário, é conselheiro, ministro-conselheiro, embaixador. Nesse ponto da carreira, o diplomata começa a chefiar embaixadas menos complexas. Há inúmeras sutilezas, leis internacionais, convenções e códigos que precisam ser seguidos.
3 — A embaixada americana é o posto mais importante na estrutura do Itamaraty. O fato de Eduardo conhecer Donald Trump não quer dizer nada. O poder é transitório em democracias. O embaixador representa o país. Uma decisão errada afeta pessoas, setores e o Brasil. Trump não vai abandonar seus interesses porque tem uma proximidade pessoal com o embaixador brasileiro. É um trunfo que não serve para muita coisa.
4 —Algo parecido só aconteceu na Arábia Saudita, como lembrou o jornalista Guga Chacra. O príncipe Mohammed bin Salman, que será o rei e está envolvido na morte do jornalista Jamal Khashoggi, indicou o irmão Khalid para a embaixada americana. Isso é coisa de país que não tem democracia.
5 — Eduardo se ligou politicamente à ultradireita internacional. É um representante dela. Isso restringe a capacidade de circulação dele na sociedade americana. A missão do embaixador não está restrita ao governo. Ele tem que frequentar os diferentes círculos do país. Ouvir, entender e reportar ao Brasil as tendências do país. A ultradireita internacional é um gueto. Um diplomata que ficar restrito não vai representar bem o Brasil.
6 —Diplomatas explicam que só se anuncia a indicação de um embaixador após o chamado “agrément”. Primeiro é preciso consultar o país sobre a intenção de indicar o embaixador. Se o nome for aceito, aí é que se informa o procedimento ao Senado.
7 —A intenção de Bolsonaro é mais uma etapa do desmonte do Itamaraty nesse governo. Uma das nossas mais competentes burocracias agora é comandada por um diplomata que está engajado numa cruzada ideológica, ao invés de representar o país como um todo.
A indicação do filho do presidente é um equívoco enorme. Como repórter, cobri o Itamaraty em uma época de ouro da instituição. A diplomacia é complexa e exige qualificações específicas. Se confirmada, que o Senado pense no país. Esse governo é transitório. É preciso colocar quem tem qualificação para representar o Brasil no posto diplomático mais importante da diplomacia brasileira.
O senhor embaixador
Ao longo da obra fala-se de ditadura, corrupção, desigualdade social, instabilidade política, pressão do mais forte sobre o mais fraco, revolução messiânica, luta ideológica, amizade, até onde vai esse sentimento tão humano e tão universal.
Amizade com os filhos de Donald Trump foi uma das justificativas de Jair Bolsonaro para defender a indicação de seu filho, o deputado Eduardo Bolsonaro(PSL-SP), para a embaixada do Brasil em Washington, durante transmissão anteontem, pelo Facebook, nas já tradicionais lives do presidente. Outros atributos do filho que justificariam sua ida para Washington foram, nas palavras do próprio presidente, o fato de Eduardo falar inglês e espanhol e há muito tempo rodar o mundo todo.
Eduardo Bolsonaro está em seu segundo mandato de deputado federal. Em 2018, foi eleito com a maior votação da história. Acabou de fazer 35 anos. É possível que tenha uma carreira política promissora pela frente. Se vier a entrar para o mundo da diplomacia, para o qual já demonstrou gosto, nada impede que chegue a ser um novo Barão do Rio Branco. Mas a forma como está sendo empurrado pelo pai para se tornar embaixador não pode ser festejada. É polêmica e inoportuna.
Polêmica porque, embora a escolha de embaixadores de fora dos quadros da carreira diplomática não seja incomum, ela quase sempre ocorre por compensação política. Foi assim com as nomeações do ex-presidente Itamar Franco, do ex-deputado Paes de Andrade (CE) e do ex-senador Jorge Bornhausen (SC) para a embaixada do Brasil em Portugal. Os três ganharam a embaixada porque, ou tinham disputado uma eleição e perdido, ou porque, caso de Itamar, tinha deixado a Presidência da República e estava sem emprego. Eduardo Bolsonaro não se encontra nesta situação. Pelo contrário. Está muito bem. É presidente da Comissão de Relações Exteriores da Câmara dos Deputados. Nessa condição viaja o mundo todo em contatos parlamentares e políticos. Ele mesmo se diz um missionário que trabalha em prol da propagação da ideologia da direita. No caso em questão, o que há é nepotismo.
A manifestação de Jair Bolsonaro em favor da nomeação do filho para a embaixada do Brasil em Washington foi também inoportuna porque não há como desvincular o que o presidente diz do processo de votação da reforma da Previdência pela Câmara. O momento é delicado. Qualquer coisa que o presidente disser terá repercussão, dada a sensibilidade do tema. Foi ele falar sobre a embaixada e a Câmara dar uma rateada. Bolsonaro defendeu vantagens para policiais federais, rodoviários, legislativos e agentes penitenciários e, imediatamente, o lobby dessas categorias se fortaleceu. A ponto de conseguirem na reforma da Previdência privilégios que ninguém mais terá. Os homens poderão se aposentar aos 53 anos e as mulheres aos 52.
Bolsonaro demitiu o general Juarez de Paula Cunha da presidência dos Correios porque, segundo o presidente da República, ele agiu como sindicalista. Quando pediu à bancada ruralista que ajudasse os policiais federais e rodoviários, Bolsonaro disse que o governo havia errado ao não dar a essas categorias determinadas vantagens. Agiu como sindicalista. Quando defende a nomeação do filho para uma embaixada, age como pai que deseja dar tudo o que pode para o filho, apesar do nepotismo. Um presidente da República poderia ser apenas um presidente da República. Ele tem uma Nação inteira para cuidar.
Diplomacia do nepotismo
O presidente Jair Bolsonaro anunciou na quinta-feira que pretende indicar um de seus filhos, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), como o novo embaixador do Brasil nos Estados Unidos, posto que está vago desde abril e que nas últimas décadas foi ocupado por diplomatas veteranos do Itamaraty.
Eduardo, que completou 35 anos na quarta-feira, idade mínima para ocupar o posto de embaixador, não tem nenhuma experiência em diplomacia ou formação específica em relações exteriores. Seu currículo inclui cargo de escrivão da Polícia Federal. Ele está em seu segundo mandato como deputado federal.
Ao anunciar a indicação, Bolsonaro admitiu que o fato de Eduardo ser seu filho pesou. Segundo o presidente, isso deve garantir um "tratamento diferente de um embaixador normal", sugerindo que a proximidade vai ajudar a abrir portas em Washington. Bolsonaro ainda destacou que Eduardo é "amigo dos filhos de Trump" e sabe falar inglês e espanhol.
No moderno mundo da diplomacia internacional, a iniciativa por parte de um chefe de Estado ou de governo de entregar uma embaixada para algum parente só encontra paralelos em ditaduras ou pequenos países subdesenvolvidos que aparecem no topo de rankings que medem corrupção. Grupos esses que incluem Arábia Saudita, Chade, Uzbequistão e Armênia.
Nenhuma das principais democracias do mundo registra algum caso parecido na história recente. Há casos de doadores de campanha ou de políticos que ganham postos como parte de acordos, mas nenhum episódio que envolva parentes diretos de um governante. Nos Estados Unidos, o único caso registrado envolve um presidente do final do século 18.
O rei Salman, da Arábia Saudita, que chefia uma monarquia absolutista que mantém seu poder com mão de ferro desde a década de 1930, tomou a iniciativa de indicar em 2017 um de seus filhos para a embaixada do seu país em Washington.
Tal como Eduardo, Khalid bin Salman não tinha nenhuma experiência diplomática quando assumiu a chefia da representação saudita nos EUA, aos 28 anos. Ele acabou deixando o posto em 2019. Foi substituído por uma princesa, também da família Saud e neta de um antigo príncipe herdeiro que nunca assumiu o trono.
O ex-ditador Islam Karimov manteve o poder por 26 anos no Uzbequistão, uma ex-república Soviética da Ásia Central, usando métodos brutais, assassinatos e fraude eleitoral. Durante sua ditadura (1989-2016), Karimov também recompensou regularmente suas duas filhas com cargos diplomáticos.
A mais velha, Gulnara Karimova, foi nomeada representante permanente do Uzbequistão na sede das Nações Unidas em Genebra, na Suíça. Em 2010, ela ainda acumulou o posto de embaixadora de seu país na Espanha. Mensagens de diplomatas americanos vazadas pelo Wikileaks descreveram Gulnara como "uma baronesa ladra" por causa de sua vida de luxo. Sua irmã, Lola, ocupou o cargo de representante permanente na Unesco.
O ditador Idriss Déby tomou o poder no Chade, uma nação miserável do centro-norte da África, por meio de um golpe militar com o apoio da França em 1990. Seu regime é regularmente acusado de desrespeitar os direitos humanos e promover a corrupção generalizada no país. Em 2016, ele foi eleito para um quinto mandato, em um pleito que provocou acusações de fraude por parte da oposição.
Déby também espalhou parentes em embaixadas do Chade pelo mundo. Um genro ocupou a representação do país nos EUA. Outro genro ocupou o cargo na Arábia Saudita e hoje é embaixador na África do Sul. Um sobrinho foi o representante na França. Um irmão, na Líbia. Por fim, em abril de 2018, Déby nomeou seu filho, Zacharia, de 33 anos, como embaixador do Chade nos Emirados Árabes Unidos.
O ex-presidente Serzh Sargsyan governou entre 1998 e 2018 a Armênia, uma pequena nação de cerca de 3 milhões de habitantes do leste da Europa que figura na 105ª posição dos países mais corruptos do mundo – empatado com o Brasil – em ranking da ONG Transparência Internacional (quanto melhor o lugar no ranking, menos o país é considerado corrupto).
Em 2013, Sargsyan nomeou seu próprio genro, Mikayel Minasian, como embaixador da Armênia no Vaticano. Minasian só perdeu o cargo no ano passado, quando seu sogro foi forçado a deixar o poder após uma onda de protestos que varreu o país. Hoje, a família Sargsyan é alvo de uma série de inquéritos por suspeita de corrupção na Armênia.
Nos Estados Unidos, não são incomuns os casos de indicações puramente políticas para cargos de embaixador. Em 2013, Barack Obama indicou doadores da sua campanha à reeleição para postos na Holanda, Dinamarca e Espanha. George W. Bush fez o mesmo com seus doadores e entregou cargos na Alemanha e no Canadá. Assim como no Brasil, as indicações precisam ser referendadas pelo Senado.
Apenas um presidente americano indicou um parente direto para um importante cargo diplomático: John Adams, o segundo ocupante da Casa Branca, que governou os EUA entre 1797 e 1801. Alguns meses após assumir o cargo, Adams nomeou seu filho, John Quincy, como embaixador dos Estados Unidos na antiga Prússia.
Porém, Quincy já era um diplomata veterano, tendo chefiado as representações dos EUA na Holanda e Portugal no governo do antecessor do seu pai, George Washington. Ele ainda seria nomeado como embaixador na Rússia e no Reino Unido mais de uma década depois de o pai deixar a Presidência.
Deutsche Welle
Eduardo, que completou 35 anos na quarta-feira, idade mínima para ocupar o posto de embaixador, não tem nenhuma experiência em diplomacia ou formação específica em relações exteriores. Seu currículo inclui cargo de escrivão da Polícia Federal. Ele está em seu segundo mandato como deputado federal.
Ao anunciar a indicação, Bolsonaro admitiu que o fato de Eduardo ser seu filho pesou. Segundo o presidente, isso deve garantir um "tratamento diferente de um embaixador normal", sugerindo que a proximidade vai ajudar a abrir portas em Washington. Bolsonaro ainda destacou que Eduardo é "amigo dos filhos de Trump" e sabe falar inglês e espanhol.
No moderno mundo da diplomacia internacional, a iniciativa por parte de um chefe de Estado ou de governo de entregar uma embaixada para algum parente só encontra paralelos em ditaduras ou pequenos países subdesenvolvidos que aparecem no topo de rankings que medem corrupção. Grupos esses que incluem Arábia Saudita, Chade, Uzbequistão e Armênia.
Nenhuma das principais democracias do mundo registra algum caso parecido na história recente. Há casos de doadores de campanha ou de políticos que ganham postos como parte de acordos, mas nenhum episódio que envolva parentes diretos de um governante. Nos Estados Unidos, o único caso registrado envolve um presidente do final do século 18.
O rei Salman, da Arábia Saudita, que chefia uma monarquia absolutista que mantém seu poder com mão de ferro desde a década de 1930, tomou a iniciativa de indicar em 2017 um de seus filhos para a embaixada do seu país em Washington.
Tal como Eduardo, Khalid bin Salman não tinha nenhuma experiência diplomática quando assumiu a chefia da representação saudita nos EUA, aos 28 anos. Ele acabou deixando o posto em 2019. Foi substituído por uma princesa, também da família Saud e neta de um antigo príncipe herdeiro que nunca assumiu o trono.
O ex-ditador Islam Karimov manteve o poder por 26 anos no Uzbequistão, uma ex-república Soviética da Ásia Central, usando métodos brutais, assassinatos e fraude eleitoral. Durante sua ditadura (1989-2016), Karimov também recompensou regularmente suas duas filhas com cargos diplomáticos.
A mais velha, Gulnara Karimova, foi nomeada representante permanente do Uzbequistão na sede das Nações Unidas em Genebra, na Suíça. Em 2010, ela ainda acumulou o posto de embaixadora de seu país na Espanha. Mensagens de diplomatas americanos vazadas pelo Wikileaks descreveram Gulnara como "uma baronesa ladra" por causa de sua vida de luxo. Sua irmã, Lola, ocupou o cargo de representante permanente na Unesco.
O ditador Idriss Déby tomou o poder no Chade, uma nação miserável do centro-norte da África, por meio de um golpe militar com o apoio da França em 1990. Seu regime é regularmente acusado de desrespeitar os direitos humanos e promover a corrupção generalizada no país. Em 2016, ele foi eleito para um quinto mandato, em um pleito que provocou acusações de fraude por parte da oposição.
Déby também espalhou parentes em embaixadas do Chade pelo mundo. Um genro ocupou a representação do país nos EUA. Outro genro ocupou o cargo na Arábia Saudita e hoje é embaixador na África do Sul. Um sobrinho foi o representante na França. Um irmão, na Líbia. Por fim, em abril de 2018, Déby nomeou seu filho, Zacharia, de 33 anos, como embaixador do Chade nos Emirados Árabes Unidos.
O ex-presidente Serzh Sargsyan governou entre 1998 e 2018 a Armênia, uma pequena nação de cerca de 3 milhões de habitantes do leste da Europa que figura na 105ª posição dos países mais corruptos do mundo – empatado com o Brasil – em ranking da ONG Transparência Internacional (quanto melhor o lugar no ranking, menos o país é considerado corrupto).
Em 2013, Sargsyan nomeou seu próprio genro, Mikayel Minasian, como embaixador da Armênia no Vaticano. Minasian só perdeu o cargo no ano passado, quando seu sogro foi forçado a deixar o poder após uma onda de protestos que varreu o país. Hoje, a família Sargsyan é alvo de uma série de inquéritos por suspeita de corrupção na Armênia.
Nos Estados Unidos, não são incomuns os casos de indicações puramente políticas para cargos de embaixador. Em 2013, Barack Obama indicou doadores da sua campanha à reeleição para postos na Holanda, Dinamarca e Espanha. George W. Bush fez o mesmo com seus doadores e entregou cargos na Alemanha e no Canadá. Assim como no Brasil, as indicações precisam ser referendadas pelo Senado.
Apenas um presidente americano indicou um parente direto para um importante cargo diplomático: John Adams, o segundo ocupante da Casa Branca, que governou os EUA entre 1797 e 1801. Alguns meses após assumir o cargo, Adams nomeou seu filho, John Quincy, como embaixador dos Estados Unidos na antiga Prússia.
Porém, Quincy já era um diplomata veterano, tendo chefiado as representações dos EUA na Holanda e Portugal no governo do antecessor do seu pai, George Washington. Ele ainda seria nomeado como embaixador na Rússia e no Reino Unido mais de uma década depois de o pai deixar a Presidência.
Deutsche Welle
As ruas e as instituições
Como se vê, a opinião pública está dividida em três partes numericamente semelhantes. Há um equilíbrio entre as avaliações positiva, negativa e neutra. Ou seja, já não existe mais aquela preponderância favorável ao governo de Jair Bolsonaro que se verificou no início do ano, quando 40% avaliavam como bom ou ótimo o governo.
Tal realidade inviabiliza o discurso populista de que o Executivo poderia impor sua agenda e suas posições com base no apoio que tem das ruas. Ele não conta mais com um apoio majoritário. Basta ver que, entre os três grupos, o mais numeroso (35%) é o que considera o governo ruim ou péssimo.
O presidente Jair Bolsonaro gosta de afirmar que o povo é o seu “patrão, a quem devo lealdade”. Se assim é, não lhe cabe ignorar parte relevante do povo – no caso, 35% – que considera seu governo ruim ou péssimo. O povo não é apenas quem aplaude o presidente da República, mas é também quem exige, quem cobra, quem critica. Também essas pessoas são, nas palavras de Jair Bolsonaro, o seu “patrão”.
Na verdade, as avaliações sobre o governo ao longo do primeiro semestre revelam mais do que o esvaziamento da adesão majoritária às propostas do presidente Jair Bolsonaro. Elas indicam que o apoio minguou precisamente porque o governo tentou impor sua agenda. Ou seja, não é apenas que o governo já não tem apoio popular suficiente, por exemplo, para ampliar sozinho a posse e o porte de armas. Suas investidas contra o Congresso – e por que não dizer? – contra o bom senso enfraquecem sua popularidade.
Nesse sentido, as pesquisas de opinião manifestam a fragilidade do argumento de quem tenta colocar uma nota de oposição entre o povo e as instituições. Não encontra respaldo nos fatos, por exemplo, a ideia de que a população, estando completamente fechada com o governo de Jair Bolsonaro, faria frontal oposição à atuação do Legislativo e do Judiciário. A realidade parece ser precisamente o inverso. A pesquisa da XP/Ipespe registrou melhora da imagem do Congresso em relação ao ano passado.
Não há, portanto, sinais de desalinhamento entre a opinião pública e as instituições, como às vezes equivocadamente se propala. Os números são claros. A população não comprou a ideia, por exemplo, de que o presidente Jair Bolsonaro não tem conseguido destravar a economia e o desenvolvimento social em razão de um sistema político corrupto, que inviabilizaria suas propostas para o País.
A pesquisa XP/Ipespe revela que não existe essa desconfiança a respeito do sistema político, como se ele fosse capaz de bloquear as boas disposições do governante. Tanto é assim que 47% dos entrevistados acreditam que o restante do mandato de Bolsonaro será bom ou ótimo. Apenas 29% julgam que os quatro anos de governo de Jair Bolsonaro serão ruins ou péssimos.
Em termos institucionais, o quadro que se revela é muito positivo. Não há razão para o governo se indispor com as ruas. Tampouco há razão para o Executivo se indispor com o Legislativo ou com o Judiciário. Para ser leal ao seu “patrão”, o povo, o presidente Jair Bolsonaro não precisa fazer nada que afronte a separação dos Poderes ou qualquer outro princípio do Estado Democrático de Direito.
A rigor, o que as pesquisas de opinião revelam é um anseio para que o governo trabalhe de fato, isto é, que enfrente seriamente os problemas nacionais, numa atuação coordenada com as outras esferas do Estado. O discurso populista de enfrentamento só interessa mesmo aos populistas. A população quer emprego, inflação controlada, economia crescendo, educação para os filhos, serviço de saúde adequado – ela deseja que as instituições funcionem, não que se digladiem entre si.
A nova velha conhecida
Não se diga que a Nova Política é diferente da Velha. Porque não é. Se ela pretendeu ser, envelheceu precocementeRicardo Noblat
O mel do afeto
Tá difícil escrever ou ser feliz. Essa sensação de luto quase diária, a perda de tudo que já fomos e tivemos um dia: a alegria, a autoestima, a boa imagem que conseguimos lá fora, a certeza de dias melhores, o orgulho da brasilidade que nos mantinha erguida a cabeça. Hoje abro o jornal pressentindo a dor, a vergonha, a derrota diante de tanta injustiça e cinismo impunes. Dizem que somos minoria porque não somos ouvidos. Alguns morrem por causa disso, outros adoecem e há, ainda, os que se alienam (ou migram) para sofrer o mínimo possível. Quem não pode, fica e convive com o país que virou o paraíso dos medíocres, a república da ignorância, o antro de representantes que não nos representam, o reino do poder que se locupleta, manipula informações e se vinga dos opositores. Dei pra sentir náuseas frente a bandeiras, camisetas, esferográficas, chinelos, gestos manuais e tudo o que lembra o que gostaria que nunca existisse. Comecei a pensar na morte com mais frequência, comprando remédios e comida em pequenas quantidades, por não saber se sobrevivo até amanhã. E o corpo reage, inflamando juntas, turvando a visão, irritando a garganta que só faz engolir sapos. Então recorro ao mel do afeto. Sigo com ternura o voo dos pássaros, a elegância dos gatos, o nascimento de uma flor, cerco-me de poesia e música, busco comédias na tevê, brinco de alquimista cozinhando, canto, rezo, visito a família, troco abraços. Diante da partida de tanta gente boa, penso que o lado de lá está bem mais interessante que aqui. Quando chegar minha vez, vou lamentar deixar de ver o mar, ouvir vozes queridas, receber agrados do destino, driblar os desafios do azar. Mas estarei livre deste pesado fardo que é ser diferente entre tantos iguais, manter a lucidez em plena letargia coletiva, e quem sabe me sentirei finalmente em casa e em paz. Uma preocupação secreta tem me atormentado: a possibilidade de, em mais um delírio de vaidade, aquele que se diz ingênuo estampar o rosto em notas e moedas, como fizeram imperadores e ditadores. Será que aguento?…
Madô Martins
Madô Martins
Algumas bolsonarices
O capitão não se manifestou sobre a imensa perda que o Brasil sofreu na semana passada. A imprensa internacional, autoridades de muitos países, enviaram abraços para o nosso povo, numa delicada tentativa de nos consolar pelo falecimento do criador genial, João Gilberto. Já Bolsonaro, nem um pio espontâneo, apenas uma resposta infeliz quando perguntado sobre a notícia!
Temos tido manhãs cada vez mais dramáticas, pois assim são algumas das manchetes dos jornais: “Pai mata filho após disparo de espingarda no MS”; “Um homem matou o pai acidentalmente com um tiro de espingarda em Porto Acre, zona rural de Rio Branco (AC)”; “Um bebê morreu, alvejado pelo próprio pai em Luziânia, no entorno do DF”.
E Bolsonaro ainda sonha em armar mais o nosso povo?
Tantas fez o capitão que conseguiu que a maioria dos médicos cubanos deixassem o Brasil. Mas não tomou, até agora, nenhuma atitude para preencher as vagas que deixaram milhões de brasileiros sem assistência médica. No entanto, hoje já ouvi dizer que se arrependeu. Tomara!
Ele fala em nomear, quando acontecerem as vagas, um ministro “terrivelmente evangélico”, para o STF. Já é um grande absurdo juntar “terrivelmente” a uma “religião”, mas esquecer que nosso país é laico e que por isso não deve e não pode dar mais força a uma religião acima de qualquer outra, é um desaforo sem igual!
Ao admitir que o trabalho infantil enobrece pois o trabalho sempre enobrece e dar como exemplo ele mesmo, impressiona. Quando a criança vai à escola, brinca, come e dorme bem, ajudar os pais, isso pode formar um cidadão mais forte. Mas não é isso que chamamos de trabalho infantil. Esse, um horror, deixa marcas que não são positivas e que estão longe de enobrecer.
Saúde, Educação e Cultura, Segurança, disso somos carentes. Não sei se isso preocupa o capitão. Mas a impressão que dá é que essas áreas são o menor de seus problemas.
E qual seria o maior de seus problemas? Agradar aos três filhotes, os garotos que ele mima o mais que pode. Tenho a impressão, impressão, vejam bem, que o capitão se sente muito devedor dos filhos e que procura, por todo jeito, manter o afeto e a união com eles. Mas será preciso desmoralizar o Brasil para agradar aos meninos?
Eduardo Bolsonaro embaixador do Brasil nos States, foi a grande novidade de ontem. O Senado, alguém duvida?, aprovará a nomeação. Afinal, Eduardo fala inglês e é amigo dos garotos Trump. Precisa mais?
Trump e Bolsonaro, almas gêmeas, com mentes e corações batendo no mesmo ritmo. O agrément será dado sem problemas. O Brasil finalmente oficializado como anexo dos States. Será fantástico ver Bolsonaro ombro a ombro com o grande Trump. Os dois contra o mundo! Na tristeza ou na alegria, como reza um bom casamento.
Brasil, um país terrivelmente engraçado.
Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa
Ele é um presidente muito esquisito. Até agora, seis meses depois da posse, só se manifestou com entusiasmo sobre aquilo que não devia. Por exemplo: a flexibilização do porte de armas, a pior coisa que podia acontecer num país onde o analfabetismo e a ignorância imperam.
Temos tido manhãs cada vez mais dramáticas, pois assim são algumas das manchetes dos jornais: “Pai mata filho após disparo de espingarda no MS”; “Um homem matou o pai acidentalmente com um tiro de espingarda em Porto Acre, zona rural de Rio Branco (AC)”; “Um bebê morreu, alvejado pelo próprio pai em Luziânia, no entorno do DF”.
E Bolsonaro ainda sonha em armar mais o nosso povo?
Tantas fez o capitão que conseguiu que a maioria dos médicos cubanos deixassem o Brasil. Mas não tomou, até agora, nenhuma atitude para preencher as vagas que deixaram milhões de brasileiros sem assistência médica. No entanto, hoje já ouvi dizer que se arrependeu. Tomara!
Ele fala em nomear, quando acontecerem as vagas, um ministro “terrivelmente evangélico”, para o STF. Já é um grande absurdo juntar “terrivelmente” a uma “religião”, mas esquecer que nosso país é laico e que por isso não deve e não pode dar mais força a uma religião acima de qualquer outra, é um desaforo sem igual!
Ao admitir que o trabalho infantil enobrece pois o trabalho sempre enobrece e dar como exemplo ele mesmo, impressiona. Quando a criança vai à escola, brinca, come e dorme bem, ajudar os pais, isso pode formar um cidadão mais forte. Mas não é isso que chamamos de trabalho infantil. Esse, um horror, deixa marcas que não são positivas e que estão longe de enobrecer.
Saúde, Educação e Cultura, Segurança, disso somos carentes. Não sei se isso preocupa o capitão. Mas a impressão que dá é que essas áreas são o menor de seus problemas.
E qual seria o maior de seus problemas? Agradar aos três filhotes, os garotos que ele mima o mais que pode. Tenho a impressão, impressão, vejam bem, que o capitão se sente muito devedor dos filhos e que procura, por todo jeito, manter o afeto e a união com eles. Mas será preciso desmoralizar o Brasil para agradar aos meninos?
Eduardo Bolsonaro embaixador do Brasil nos States, foi a grande novidade de ontem. O Senado, alguém duvida?, aprovará a nomeação. Afinal, Eduardo fala inglês e é amigo dos garotos Trump. Precisa mais?
Trump e Bolsonaro, almas gêmeas, com mentes e corações batendo no mesmo ritmo. O agrément será dado sem problemas. O Brasil finalmente oficializado como anexo dos States. Será fantástico ver Bolsonaro ombro a ombro com o grande Trump. Os dois contra o mundo! Na tristeza ou na alegria, como reza um bom casamento.
Brasil, um país terrivelmente engraçado.
Maria Helena Rubinato Rodrigues de Sousa
Bolsonaro caminha para fazer o pior governo da História e ainda sonha com reeleição
Todos lembram que a confiança anterior em Lula era impressionante. Pela primeira vez em um país importante, chegava à chefia do governo um operário, democraticamente eleito. O único precedente era Lech Walesa na Polônia, mas sua eleição foi apoiada pelos Estados Unidos e pelo Vaticano, numa outra situação, e Walesa era um trabalhador escolarizado, diferente de Lula, que chegou ao poder sem jamais ter lido um livro.
A decepção com Lula e o PT hoje é diretamente proporcional à confiança de outrora, dividindo o país entre os que são contra ou a favor dos petistas. Por isso, ainda há tanta paciência e benevolência em relação aos múltiplos erros de Bolsonaro, que representa o antiPT.
Como se sabe, a crise econômica foi causada pelos governos anteriores, de Fernando Henrique Cardoso, Lula da Silva, Dilma Rousseff e Michel Temer. Diante desse fato, Bolsonaro demonstra não se sentir responsável pela recuperação do país. Parece viver em outro mundo, gosta de fazer piadas, está adorando o Planalto-Alvorada, mas não se preocupa com o governo e só pensa em se reeleger.
Sob a alegação de que nada entende de economia, Bolsonaro delegou poderes ao liberalista Paulo Guedes. É uma postura cômoda, mas desligada da realidade, porque revela uma espécie de autismo administrativo.
Se o mercado não reagir por si só e Guedes der errado, o presidente vai demiti-lo sem o menor remorso e colocará no lugar outro economista, como fez com Joaquim Levy no BNDES, ao forçar a demissão dele para substituí-lo por um playboy amigo dos filhos, conhecido por comemorar aniversário ruidosamente, digamos assim.
A estratégia de Guedes não vai dar certo. Jamais trabalhou em governo, não leva o menor jeito e jogou todas as fichas na reforma da Previdência, uma doce ilusão.
Nesta sexta-feira, pela primeira vez um destacado membro da equipe econômica – o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida – veio a público avisar que a reforma da Previdência não resolverá a crise econômica, fato que desde o início do governo temos repisado aqui na TI.
Em artigo na Folha, Mansueto disse que “o Brasil perdeu a capacidade de investimento”. Recomendou reforma tributária, abertura comercial e leilões de concessão nos projetos de infraestrutura. Em tradução simultânea, maior abertura comercial significa prosseguir a desindustrialização e permitir a entrada de empreiteiras estrangeiras para fazer as obras de infra-estrutura. Ou seja, aumentar a desnacionalização da economia, uma solução genial – ou bestial, como dizem nossos irmãos lusitanos.
Antecipar férias sem votar reforma é um escárnio
Se Deus baixasse na Câmara para intimar seus frequentadores a optar entre a responsabilidade fiscal e o ócio, alguns deputados dariam uma resposta fulminante: "Dane-se o déficit da Previdência". E ficaria claro que, para certos representantes da sociedade, a ociosidade remunerada é o grande objetivo. Só as férias interessam. O resto é hipocrisia.
Nos últimos dias, tudo parecia muito anormal. Num surto de produtividade, os deputados prometiam votar os dois turnos da reforma da Previdência nesta semana. Se necessário, trabalhariam no sábado, quiçá no domingo. De repente, a coisa vai voltando à normalidade. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, admitiu que a votação em segundo turno pode ficar para agosto. Ficará para o dia 6 de agosto.
O Estado brasileiro foi à breca. A reforma previdenciária não é senão uma tentativa de reduzir o tamanho do buraco. Coisa urgente, para ontem. Não há razões objetivas para o adiamento, pois o início do recesso está marcado para 18 de julho. Mas os deputados decidiram adiantar o relógio. Querem enforcar uma semana.
Se o Brasil fosse um país lógico, o recesso parlamentar de julho não existiria, pois deputados e senadores já dispõem de férias hipertrofiadas entre o final de dezembro e o início de fevereiro. Mesmo dando-se de barato que a excrescência é inevitável, o recesso deveria ser cancelado. Não por causa do rombo da Previdência, mas em função da Lei de Diretrizes Orçamentárias, a LDO.
A Constituição determina que Câmara e Senado não podem desligar suas caldeiras antes de votar a LDO. E ela não foi apreciada nem na Comissão de Orçamento. Ou seja: as férias são inconstitucionais. Deputados e senadores dão de ombros. Alega-se que vem aí o "recesso branco". Lavrem-se as atas. E não se fala mais nisso.
"O importante é terminar o primeiro turno hoje", afirma um resignado Rodrigo Maia. "Depois disso, vamos ver se o quórum se mantém para sábado, semana que vem ou agosto."
Excetuando-se o massagista da Paolla Oliveira, nenhum outro trabalhador brasileiro tem um "emprego" melhor do que os parlamentares. O horário é flexível. O dinheiro não é ruim: R$ 33,7 mil, fora os mais de R$ 100 mil para as despesas do mês. Há duas férias por ano. O apartamento é funcional. O plano de saúde cobre desde frieira à internação no Albert Einstein.
Tudo isso mais a prerrogativa de mandar às favas o interesse público achando que não deve nada a ninguém. Muito menos explicações. Sob o regime patrimonialista brasileiro, o Congresso não tem congressistas. Os congressistas é que têm o Congresso. Fazem o que bem entendem. No momento, fizeram uma opção preferencial pelo escárnio.
República de banana
Nos últimos 11 anos, a Arábia Saudita não teve sete filhos da família real como embaixadores nos Estados Unidos? A Arábia Saudita e quem mais? Não. Só a Arábia Saudita, onde também existe uma ditadura. Não temos por aqui o que o ex-presidente Fernando Henrique chama de “nova família imperial brasileira”? Nem presidentes de repúblicas bananeiras ousaram nomear filhos embaixadores. Estamos a um passo de passar por tal vergonha.
O capitão diz que seu filho Eduardo tem todas as credenciais para ocupar o posto vago há quase três meses. Segundo ele, Eduardo fala inglês e espanhol (certamente melhor do que o português), “conhece bem o mundo” e é amigo do presidente Donald Trump e dos seus familiares. Quem estaria mais apto do que ele a defender os interesses do Brasil por lá? De resto, acaba de completar 35 anos. Ninguém pode ser embaixador com menos de 35 anos.
O posto de embaixador do Brasil nos Estados Unidos sempre foi ocupado por diplomatas com larga experiência, sólido conhecimento do seu ofício e prestígio internacional. Eduardo não tem esse perfil. É um escrivão de polícia. Dê-se de barato que foi um bom escrivão – entre suas atribuições, cumprir formalidades processuais, lavrar termos e dirigir veículos da polícia. Mas o país não precisa de um escrivão em Washington. Ainda mais agora.
De resto, Eduardo já desfilou e posou para fotos com o boné da campanha de Trump à reeleição. Pediu votos para Trump em comícios do Partido Republicano no interior do país. Como o Partido Democrata reagirá à sua indicação? E se Trump perder? Eduardo corre o risco de se tornar conhecido no mundo da diplomacia como “o embaixador do boné”. Diplomata não só é inteligente e sofisticado, é também perverso quando quer.
O capitão movido a conflitos parece disposto a arcar com o desgaste político interno e externo de ter premiado o Zero Três com a o cargo mais ambicionado pela diplomacia brasileira. Para os padrões de moralidade do clã Bolsonaro, nada há demais nisso. Pai e filhos vivem há mais de 30 anos sob a rubrica do Estado. Eduardo é deputado federal pela segunda vez. Carlos é vereador há 18 anos. Flávio foi quatro vezes deputado estadual e é senador.
A mãe dos garotos ganhou do ex-marido dois mandatos de vereadora depois que se separou dele. Bolsonaro tomou o que dera forçando Carlos a disputar contra a própria mãe, e a derrotá-la. Está por se fazer um levantamento sobre o número de familiares e de dependentes do clã que ocuparam ou ainda ocupam cargos remunerados pelo poder público. Isso nada tem a ver com fisiologismo. É patrimonialismo na veia.
Assinar:
Postagens (Atom)