domingo, 15 de novembro de 2015

A velinha no bolo da República

Sinfonia de ladrões

Bilhões roubados da que já foi uma das dez maiores petroleiras do mundo, outros bilhões surrupiados de projetos do setor elétrico; sabe-se lá quantos para favorecer uns e outros amigos do governo. Cifras indecifráveis para a maioria dos brasileiros afanados, os mesmos que pagam as contas dos larápios. E que ainda têm de ouvir explicações esdrúxulas, fantasiosas, e até cômicas dos bandidos, além de pregações diversionistas dos orquestradores da rapinagem.

Nessa seara, o emaranhado de invencionices do presidente da Câmara, Eduardo Cunha, para se safar das contas na Suíça, não se difere das pregações da cartilha do PT, que culpa as investigações da Lava-Jato, Justiça e imprensa pelos dissabores que o Mensalão, e agora, o Petrolão, provocam à legenda.

Ambos – PT e Cunha – apostam no diversionismo, tática que os petistas, a começar pelo chefe-maior Lula, conhecem bem. Cunha domina outras tantas artimanhas, mas nessa só imagina ser bom aprendiz.

Lula é imbatível na técnica. Sabe como ninguém criar fatos, mudar o rumo do noticiário. Na semana passada, depois de ver novamente a si e sua prole metidos em encrencas, revirou sua baqueta para reavivar a ode que silenciara dias atrás contra o ministro Joaquim Levy. 

Um factoide extraordinário. As páginas dos jornais passaram a dedicar espaços generosos a Henrique Meirelles, o preferido de Lula, detestado por Dilma Rousseff. Organizou-se o absurdo Levy versus Meirelles, como se algum deles fosse capaz de imprimir personalidade à correção fiscal em um governo que não pretende e nem quer fazer isso.

Uma celeuma falsa, coisa para boi dormir, ganhar tempo e enganar trouxa. Tal como as mentiras de Cunha e a cartilha do PT.

Todos. Lula, Dilma, PT, gente do mercado e fora dele sabem que Levy e Meirelles rezam o mesmo evangelho. Tanto faz ser um ou outro o responsável pelo aperto que o necessário ajuste fiscal exige.

Mas o safo Lula explora ao máximo o disse-me-disse sobre a substituição de um ministro da Fazenda, especialmente quando a troca é de seis por meia dúzia, não causa tumulto no mercado e lhe rende tempo. Algo precioso. Antes de tudo, desvia – como já vem ocorrendo – o noticiário de pegar no seu pé e puxá-lo (ele e os seus) para o fundo da lama.

Ainda que nem sempre em sintonia, Dilma, Lula, PT e companhia, Cunhas e Renans compartilham a mesma partitura. Unem-se na tentativa de evitar danos. Protegem-se contra cassações de mandato, processos internos e da Justiça. Desprezam o país e cuidam de si com esmero. A ponto de querer que cada brasileiro reponha o cofre que eles arrombaram ou deixaram arrombar.

E não é coisa de pouca monta. Bilhões e bilhões que nem no imaginário encontram guarita. Que superam os números das maquininhas de calcular, que transbordam a piscina do Tio Patinhas.

E se repetem como imitação barata de um Bolero de Ravel.

Só na Petrobras, a Polícia Federal aponta o surrupio de mais de R$ 42 bilhões, R$ 12 bilhões a mais de tudo aquilo que o governo Dilma imagina arrecadar em todo o ano de 2016 caso a CPMF seja aprovada. Ou seja, mais de um terço do que os 0,20% da movimentação financeira de todo o país em um ano. Mais de 600 mil casas populares de dois quartos, 420 vezes o maior prêmio de loteria já pago. Isso, só na Petrobras.

Acredita-se que o mesmo esquema foi reproduzido em outras estatais. Algo que já se comprovou no setor elétrico, mas que, em desafino, o Supremo preferiu desvincular das investigações da Lava-Jato.

Difícil crer que o país suporte a mesma toada de explicações inexplicáveis, acobertamento de corrupção, inépcia e desgoverno até 2018. Mas não basta desautorizar Lula, destituir ou substituir Dilma.

Além de outro maestro, o país reivindica outra sinfonia
.

República imprevidente

A comemoração de mais um aniversário da República Brasileira coloca em evidencia o momento atual e sua imprevidência diante da conjuntura e seus reflexos em todos os campos da vida nacional. Ninguém, em sã consciência, dúvida que perdemos o contato com os países desenvolvidos e hoje, mais do que nunca, os blocos econômicos prevalecem, fazendo acordos de trilhões de dólares, enquanto derrapamos na longa encruzilhada do Mercosul.

Bem mais tenebroso do que isso somente ver a tempestade perfeita que nos carcome, dentre os quais as inaceitáveis taxas de corrupção e falta de planejamento em quase todos os setores. O acidente acontecido recentemente em Minas Gerais, na cidade de Mariana, é um exemplo que não nos permite livrar das costumeiras tragédias, porque a licença ambiental estaria vencida e os órgãos de fiscalização não fizeram absolutamente nada.

Com a moderna tecnologia de satélites e seu monitoramente seria possível observar os deslocamentos, somados ao aumento inadmissível de dejetos jogados na velha estrutura da barreira que se rompeu. Alicerça-se ao triste fato as consequencias ambientais mais deprimentes e danosas. O resultado negativo de quase quatro bilhões da ex maior estatal nacional é preocupante e revoltante para seus acionistas, não fosse a sensação de absoluto desmando e completo estado de insolvabilidade.

A se acreditar na velha ou na nova república instaurada por motivos políticos, e depois de mais de século passado ainda engatinhamos nos verdadeiros conceitos da coisa pública. As instituições do Brasil vivem um total desacerto e descontrole, notadamente executivo e legislativo, acordos e mais acordos, denuncias diárias, corrupção saindo pelo ladrão, ao passo que o Judiciário tenta conter os desastrosos efeitos dessa balburdia por meio de investigações, prisões e decisões condenatórias.

Muito embora seja considerada uma Nação democrática, aqui se vota para tudo, desde o sindico, até o representante do corpo de segurança do prédio no qual se trabalha, até cargo máximo de presidente da república. No entanto, não é formada uma democracia apenas pelo sentimento do direito livre e soberano do voto, mas pela transparência, decência e acima de tudo ética com moralidade dos governantes.

O STF encontra centena de processos em andamento contra políticos e fica a beira de um colapso porque não foi concebido para resolver esse tipo de pendenga - mas sim causas maiores de características constitucionais relevantes. O fato se espalha para o STJ com milhares de processos, e se o juízo de admissibilidade permanecer na corte então a explosão e demora serão proporcionais.

As esperanças de um novo cenário Brasil passam pelo momento de dor e sofrimento para limpar as metástases dos desvios de conduta e comportamento. Algo para se comemorar no festejo de mais um aniversário da República, sim é claro: Ou reformamos tudo que está em descompasso com ela, lançando as razões fundantes de um novo modelo, ou nos encastelamos na mesmice das notícias cotidianas que nos afundam a cada segundo numa republiqueta de bananas - cuja fruta é a mais amarga de todas e rara jabuticaba para ser vista urbi et orbe.

Nosso Guia está fritando a doutora Dilma

A fritura de Joaquim Levy mudou de qualidade. Habitualmente, presidentes fritam ministros, mas, no caso do doutor, um ex-presidente (Lula) está fritando ao mesmo tempo o ministro da Fazenda e a inquilina do Planalto (Dilma Rousseff).

Quando circula a informação de que Nosso Guia sondou Henrique Meirelles para o cargo e que ele pediu carta branca para assumir o cargo, a coisa muda inteiramente de figura. Quem está sendo frita é a doutora Dilma. Neste caso surge uma novidade: seu impeachment pelo PT.


Isso tudo poderia ser fabulação, mas o ex-presidente do Banco Central soprou o fogo ao dizer que não recebeu um convite "concreto". O que vem a ser um convite abstrato, só ele pode explicar.

Certo mesmo é que Levy ainda não chamou o caminhão da mudança, como fez Mário Henrique Simonsen em 1979, porque não quer ser responsável pelo pandemônio que provocaria.

Com Lula convidando ministros e o seu preferido admitindo cripticamente que há algo no ar além aviões de carreira, os escrúpulos de Levy tornam-se despiciendos. O pandemônio já está criado.

Lula disse na Colômbia que sente "um cheiro de retrocesso político na América Latina e na América do Sul" e pediu à plateia que não acreditasse "nas bobagens da imprensa". Nosso Guia tinha ao seu lado o ex-presidente do Uruguai, José Mujica.

Certamente não são as notícias sobre a honorabilidade de Pepe Mujica, um ex-guerrilheiro que presidiu seu país de 2010 até março passado e elegeu seu sucessor. Ele não teve mensalón, nem petrolón. Continuou morando na mesma casa, com o mesmo carro e a mesma cachorra Manuela. Ao assumir, anunciou que doaria 70% de seu salário para a construção de casas para os pobres. Segundo a Transparência Internacional, o Uruguai, junto com o Chile, têm os menores índices de corrupção da América Latina.

Talvez Lula esteja falando das "bobagens da imprensa" em relação à Argentina, que vai eleger seu novo presidente no dia 22. Lá, 14 anos de domínio do casal Nestor e Cristina Kirchner levaram a economia para o buraco e a família da presidente para a fortuna. O país tornou-se conhecido pelos escândalos envolvendo as relações do governo e seus amigos com empreiteiros, petrogatunos e exportadores.

Uma banda da esquerda latino-americana acumula duas marcas sinistras. Tem a mais longeva das ditaduras em Cuba e os dois países mais corruptos do continente: a Venezuela narcobolivariana, seguida pela Nicarágua sandinista da família Ortega. A Bolívia, Equador e Argentina têm índices de corrupção piores que o Brasil.

O que há por aí não é um cheiro de retrocesso político, mas a verificação de que existem países assolados pela corrupção e têm governos que se dizem de esquerda. O Chile e o Uruguai estão na outra ponta.

Bolivarianos, sandinistas e petistas chegaram ao poder com a bandeira da moralidade. O que há no ar não é um cheiro de retrocesso político, mas de repúdio aos pixulecos.

Roubalheira não tem ideologia. O general Augusto Pinochet tinha o apoio de grande parte da população chilena enquanto torturava e matava opositores. Quando se descobriu que ele e sua família tinham US$ 15 milhões em 125 contas secretas, a direita chilena jogou sua memória no mar.

Quando o filho da presidente chilena Michelle Bachelet foi apanhado em traficâncias, ela demitiu-o e disse que enfrentava "momentos difíceis e dolorosos como mãe e presidente". Não culpou a elite nem viu conspiração, muito menos "retrocesso político". Viu apenas realidade: Seu filho metera-se numa roubalheira.

A tragédia mineira

Depois do desastre, de gravidade sem precedentes, que devastou o município de Mariana e todo o Vale do Rio Doce, instala-se naturalmente o processo para se encontrarem as causas e se determinarem responsabilidades.

O descarte de minério descendo em avalanche decretou a morte de dezenas de pessoas, a extinção de povoados históricos, arruinou centenas de famílias, de propriedades rurais, a fauna e a flora que povoavam a região, símbolo dos primórdios de Minas.

O estrago revolta até o olhar mais insensível. Os danos difíceis de se quantificar, a recuperação impossível e irreparável, atingindo diretamente grande parcela da população do Estado, chocaram o mundo inteiro. E a pergunta: como é possível que um Estado de vocação extrativa, que já teve vários desastres decorrentes da mesma causa, volte a protagonizar um espetáculo tão avassalador?


Os dejetos da mineração, acomodados numa bacia de contenção da Samarco, são resultado da produção ininterrupta de minério de ferro, ao longo de 40 anos de extração. A bacia foi estudada inicialmente com segurança para abrigar as sobras não comercializáveis da extração, sofreu seguidas expansões de capacidade determinando a elevação do nível para conter camadas originadas pela crescente produção de pelotas de minérios que são levadas por minerodutos até o mar.

Os últimos anos fizeram da Samarco, controlada pela Vale, a principal fornecedora de pelotas de minério do mundo. Evidentemente, foram subestimados o risco representado pela elevação da cota e a condição em que se estabilizariam milhões de toneladas de resíduos.

Abaixo da barragem não foram erguidas barreiras suplementares de contenção que pudessem atenuar um possível rompimento ou dar vazão a uma emergência. Confiou-se que a barragem fosse sólida e suficiente por si mesma.

Para atenuar responsabilidades, foram apresentadas hipóteses, como a de abalos detectados por sismógrafos em Brasília na hora do rompimento das duas barragens. A região de Mariana, entretanto, é considerada estável e sem terremotos. A informação pode, assim, ser interpretada em duplo sentido. O primeiro deixa entender que um tremor de terra de intensidade de 1,5 grau na escala Richter gerou a quebra da barragem, coincidindo com o horário da falência da encosta. Mas também deixa livre a interpretação de que o movimento de milhões de toneladas provocado pelo estouro da represa se gerou concomitantemente com a avalanche ocorrida no local. A descrição dada pelos sismógrafos certamente pode esclarecer o ponto de origem, se foi proveniente do subsolo ou da avalanche e de sua queda sobre o vale.

A intensidade de 1,5 grau do abalo registrado não representa, via de regra, impacto suficiente para abalar uma estrutura elástica como uma barragem.

A falha mais plausível recai nos projetos de ampliação, que poderiam ter elevado em excesso o nível da sedimentação dos dejetos. Quanto mais alta, mais crítica ficou a barragem, numa cota muito elevada em relação a sua base.

Nos últimos 15 anos a extração se acelerou, ditando novas ampliações para acolher descartes da extração mineral. A Samarco passou do ponto de segurança, entrou numa faixa de risco elevadíssima, com autorização e fiscalização públicas. A responsabilidade não só é de quem executa, mas de quem autoriza e fiscaliza.

Num Estado em que os empreendimentos agrícolas e agroindustriais recebem tratamentos de controle ambiental pontualmente burocráticos e punitivos, apesar da ausência de riscos, eles se arrastam por anos e passam por etapas inconsequentes. Não dá para entender como, ao contrário, as bilionárias mineradoras têm seus projetos aprovados ao arrepio da lei, a toque de caixa, deixando no rastro estragos que se repetem com imperdoável frequência.

Dilmanta

É muito difícil trabalhar quando todos os problemas que você precisa corrigir foram criados por sua chefe
Arminio Fraga 

O Lava Democracia

No rastro dos escândalos da Lava Jato, foi revelado que um ex-deputado teria recebido o auxílio de US$ 120 mil para a sua campanha eleitoral. Através de gravações telefônicas, troca de e-mails, ficou clara a mecânica dessas contribuições. O candidato ao Congresso se queixa ao candidato presidencial de que está sem verba para azeitar a campanha, recebe a promessa de uma ajuda, dias depois o tesoureiro da campanha presidencial discute o "quantum" e estabelece as prestações, fazendo uma única exigência: o destinatário deverá telefonar a um empresário de uma empreiteira agradecendo a colaboração, mas sem entrar em "detalhes".

Tudo foi feito a risca, o candidato agradeceu os dólares e os recebeu a tempo de lubrificar a campanha. Ficou a dúvida: o candidato recebeu apenas US$ 120 mil, mas agradeceu a colaboração "sem entrar em detalhes", onde a suspeita: ele poderia ter agradecido a doação de um milhão de dólares embora só tenha recebido 120 mil.


Mas, de repente, com pequenas variantes de "detalhes", verifica-se que todos os candidatos, de todos os partidos e em todas as épocas assim agiram. Os partidos são pobres: em suas sedes esquálidas, os telefones são desligados por falta de pagamento. Contudo, durante a campanha eleitoral, os candidatos gastam fortunas e precisam gastar cada vez mais.

Sabemos que as eleições presidenciais têm campanhas bem acima das possibilidades das burras partidárias. Já foi dito que todos os regimes políticos são ruins e que a democracia é apenas o menos ruim. O processo eleitoral que forma e formaliza o regime democrático tem um aleijão inamovível.

Ser eleito presidente é façanha que custa muito dinheiro dos outros. E esses "outros", mais cedo ou mais tarde, de uma forma ou outra, exigem pagamento.

Reflexões sobre a mania errônea de rotular pessoas

Ao consideramos que fulano seja “de esquerda” e sicrano “de direita”, estaremos sendo induzidos ao erro, manipulados, pois nos esquecemos da incrível capacidade humana de fingir, conforme o Lula fez durante décadas! As pessoas devem ser rotuladas entre as que nascem para destruir e as que nascem para construir, as que nascem para propiciar sorrisos e as que nascem para produzir lágrimas, as que nascem para distribuir e as que nascem para acumular e saquear.

Se prestarmos atenção, veremos que assim procederam as grandes figuras da História Humana. Independente da ideologia ou da religião, podemos ver esses dois tipos básicos de seres humanos espalhados nos mais distantes rincões do planeta.

Alguns, conscientes do seu pequeno tamanho no universo e da brevidade da vida, usam parte dos seus “cem míseros anos de existência” que terão, antes de virar pó, para ajudar os necessitados.

Outros, se adjetivando “O Grande” e se achando um deus, imortal e melhor do que os outros, usam parte desses mesmos “cem míseros anos de vida” para matar, roubar e distribuir choro e lágrimas antes de virar o mesmo pó.

Hoje todos estão mortos! E o que restou deles? Apenas as obras dos que construíram alguma coisa para o bem da humanidade e que, aos poucos, suplantarão a destruição do outro grupo.

Mas até “aquela parede” que o modesto pedreiro construiu, ainda está lá, substituindo a que fora demolida antes pelo bombardeio ordenado por aquele importante ditador
 Francisco Vieira

O Brasil desarrumado

O Brasil não atravessa apenas uma crise: vivemos uma desarrumação de que, se não cuidarmos, vai nos levar para uma decadência.

Nos últimos 12 meses, a moeda brasileira desvalorizou cerca de 50% em relação ao dólar, e os preços internos cresceram a 10%. A visão técnica chama isso de desvalorização e inflação; na verdade, é uma profunda desarrumação nacional. Desestrutura o sistema de trocas: os empresários aumentam os preços; os salários caem, os trabalhadores fazem greves; a economia entra em uma ciranda caótica, e todo o sistema de relações da economia se desarruma, como véspera do caos.

A economia brasileira está desarrumada pelo tamanho da dívida e os consequentes juros exorbitantes, pela falta de regras jurídicas estáveis, pela escassez de mão de obra qualificada, pela baixa capacidade de inovação, pela falta de perspectiva e planejamento no médio e longo prazos, pelo alto custo derivado da infraestrutura obsoleta e ineficiente, pelo atraso em relação à economia do conhecimento. Uma desarrumação que levará à decadência.

O Estado brasileiro é um exemplo de desarrumação: no caos da política, na generalização e profundidade da corrupção, na desorganização, burocracia, política salarial sem critério, salvo como resposta às pressões corporativas. As finanças públicas de União, estados e municípios, como das estatais, estão totalmente desarrumadas.

A violência domina as ruas de nossas cidades, desarrumando a vida urbana: o número de mortos, o medo de ir às escolas e aos restaurantes, de tomar o ônibus são provas de algo mais profundo do que a simples afirmação de insegurança. As ruas das cidades do Brasil estão desarrumadas também pelo trânsito caótico, a pobreza, o transporte público ineficiente.

A democracia convive com greves. Mas quando elas se sucedem com frequência e se espalham por todos os setores e demoram longamente, o país vive uma desarrumação. O sistema educacional brasileiro, especialmente o público, está desarrumado pelo quadro quase permanente de violência dentro das salas de aula, a desmotivação dos professores, a falta dos equipamentos necessários, a desatenção dos alunos, o descuido dos pais e dos governos.

O sistema de saúde pública do Brasil está desarrumado. Não é uma questão de falta de recursos financeiros, é desordem gerencial, descumprimento de obrigações.

O papel de um novo governo será arrumar o Brasil para criar as bases de seu futuro como nação eficiente e justa no mundo da economia e da sociedade do conhecimento; corrigindo o desajuste fiscal, acabando com a corrupção e criando e respeitando o marco jurídico, montando as infraestruturas física, educacional, cientifica e tecnológica que o futuro exige. Mas o caos da desarrumação não nos permite esperar: desde já é preciso que as lideranças nacionais, independentemente de partido e de cálculos eleitorais, se encontrem, com o propósito de arrumar o Brasil.

Cristovam Buarque

Mariana, a dependência da mina que paga pouco à região que devastou

A tragédia de Mariana trouxe à tona novamente os riscos da mineração para as áreas do entorno das minas ao mesmo tempo que evidenciou a lógica de dependência econômica dessas cidades que contam com a atividade como principal fonte de renda dos municípios. O rompimento das duas barragens da Samarco, que contabiliza ao menos 7 mortos, 18 desaparecidos e causou danos incalculáveis, também deixou claro que o retorno econômico que a mineradora dá a cidades, como Mariana, se torna muito pequeno diante dos estragos gerados pela atividade.

No ano passado, a Samarco, controlada pela Vale e pela australiana BHP, pagou em royalties pela exploração em Minas Gerais cerca de 54 milhões de reais, sendo que desse total 20 milhões ficaram em Mariana. O valor que a cidade recebeu não chega a 1% do lucro líquido da mineradora em 2014, que chegou a 2,8 bilhões de reais. A quantia repassada, no entanto, está dentro da lei. Segundo a legislação atual, as mineradoras são obrigadas a repassar até 2% do seu faturamento líquido de Compensação Financeira pela Exploração de Recursos (CFEM), dos quais 65% fica com o município da mina, 23% com o Estado e 12% vai para a União. A proporção é criticada por prefeitos de cidades mineradoras que cobram uma compensação maior.

"Os valores são muito pequenos, irrisórios quando você avalia os vários problemas que chegam junto com as mineradoras. São cidades bastante castigadas pelo impacto das minas. Por isso queremos tanto que o novo marco legal, discutido há anos, seja aprovado o mais rápido possível no Congresso", explica o presidente da Associação dos Municípios Mineradores de Minas (AMIG) e prefeito de Congonhas, José de Freitas Cordeiro (PSDB), o Zelinho. O projeto prevê que as mineradoras paguem o dobro do percentual atual: os royalties passariam de até 2% para 4%. Em comparação com outros países, os percentuais estão bastante defasados. Na Índia, por exemplo, a alíquota do setor pode chegar a 10%.

Saber zangar-se

O que me parece é que as pessoas, em geral, como que deixaram de saber zangar-se. Deixaram de saber zangar-se com aquilo que consideram errado – e, pior ainda, deixaram de saber dizê-lo na cara umas das outras. A não ser, naturalmente, que haja uma agenda.
Ainda nos zangamos muito, é verdade. Mas zangamo-nos mal. Com a maior das facilidades nos zangamos contra inimigos abstractos, como "o Governo", "o capitalismo selvagem" ou mesmo apenas "a crise". Com a maior das facilidades nos zangamos com aqueles que entendemos como nossos subordinados, no trabalho e na vida em geral (afinal, os nossos «superiores» acabam de pôr-nos a pata em cima. alguém vai ter de pagar a conta). Com aqueles que estão, de alguma forma, em ascendente sobre nós, já não nos zangamos: amuamos, que é a forma mais cobarde de nos zangarmos. Aos nossos iguais simplesmente não dizemos nada: engolimos e tornamos a engolir, convencendo-nos de que do outro lado está, afinal, um pobre diabo, tão pobre que nem sequer merece uma zanga – e, quando enfim nos zangamos, é para dar-lhe um tiro na cabeça, como todos os dias nos mostram os jornais. 

A impressão com que eu fico é que tudo isto vem dessa mania das social skills e do team building e dos demais chavões moderninhos que os gurus dos livros de Economia nos enfiaram pela garganta abaixo, na intenção de nos automatizarem de vez. Resultado: andamos todos a rebentar por dentro, impossibilitados de rebentar para fora – e, quando enfim explodimos, já não há nada a fazer. No essencial, os que nos rodeiam nunca são apenas homens, com valências e lacunas, com cobardias e actos de coragem: ou são anjinhos ou são tremendos filhos da puta (assim mesmo, sem meio termo). «Não respondas», aconselham-nos os sábios. Não dês troco. Não ligues. Não percas a cabeça. Tens de ser superior. E, inevitavelmente, viramos todos uns diplomatazinhos de esquina, sem capacidade para dar um grito e a seguir fazer as pazes. Tornamo-nos ainda mais hipócritas do que aquilo a que a nossa contraditória condição já nos obrigava. E transformamo-nos, claro, em bombas-relógio.

Pois eu prefiro um homem que parte a loiça a um choninhas que sublima tudo e, no final, ainda me passa a mão pelo pêlo. Quem não é capaz de zangar-se também não é capaz de uma gargalhada – e, se nos zangamos com ele, o primeiro argumento racional que utiliza é: "Não sejas assim". Mas que diabo é isso, "não sejas assim"? "Assim" capaz de assistir a um automóvel que se encaminha para uma ravina sem dar um grito a acordar o motorista? "Assim" capaz de ver uma relação pessoal deteriorar-se sem dar um murro na mesa para tentar salvá-la? É "assim" que gostavam que nós fôssemos todos, cheios de competências sociais e. porém, completamente desprovidos de frontalidade, de coragem e de zelo? Não contem comigo. Só isso: não contem comigo.

Joel Neto, cronista português in 'Banda Sonora para um Regresso a Casa'

Sonho ditatorial de Dilma: 'Cala a boca, jornalista!'

A 30 de abril de 2009, sete dos 11 ministros do STF derrubaram a Lei de Imprensa, datada de 1967, por considerá-la um resquício da ditadura.

Que pena: a Lei de Imprensa me ajudou muito. Por quê? Porque apesar de ter uma pegada totalitária, a de impor um direito de resposta, ela ajudava o jornalista.

A finada Lei de Imprensa tinha um período de decadência (tempo que se pode processar o jornalista, após a publicação) de 2 anos. E, digamos assim, impunha “multas” impostas ao jornalista, que não passavam de 200 salários mínimos.


Ninguém usava mais a Lei de Imprensa. Há mais de 14 anos virou moda processar jornalista por dano moral. Não há praticamente limites para se pedir indenização pecuniária nessa categoria. E o período de decadência do processo por dano moral chega a 20 anos. Ou seja: posso te processar após 20 anos da publicação da reportagem.

Sabe-se que, ainda hoje, o número de ações indenizatórias contra os órgãos de imprensa no Brasil é praticamente igual ao número de profissionais que eles empregam em suas redações.

Esse número surgiu pela primeira vez em 2007, levantamento inédito do jornalista Márcio Chaer (http://www.conjur.com.br/2007-mai-31/aumenta_valor_medio_indenizacoes_imprensa?pagina=1)

E uma ONG internacional, com base nele, provou que o Brasil era o país que mais processava jornalista sob dano moral ( http://www.conjur.com.br/2007-out-15/jornalistas_sao_levados_justica_frequencia)

Depois dessa divulgação, as maiores empresas de mídia do Brasil vetaram a veiculação dos números de ações civis que sofriam – sob a alegação que isso poderia prejudicar o valor de suas ações no mercado de capitais.

Pois bem: com uma rapidez armagedônica, o Congresso resolveu trabalhar e realizou um dos sonhos de Dilma: o direto de resposta.

A rapidez se explica: como muita gente em Brasília está envolvida nas investigações da Lava Jato, precisavam de um cala-boca técnico na jornalistada.

O projeto de lei que regulamenta o direito de resposta é um retorno à ditadura.

É um sossega-leão para tentar coibir quem cobre a Lava Jato.

Confira a nota emitida hoje pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (www.abraji.org.br) e que repele o direito de resposta aprovado pelo Congresso:
“O projeto de lei que regulamenta o direito de resposta, aprovado no Congresso na quarta-feira (4.nov.2015), parece ter sido desenhado para garantir que meios de comunicação não possam recorrer de decisões de primeira instância. O texto estabelece prazos exíguos para contestação e permite que o juiz de primeiro grau determine a veiculação da resposta antes mesmo de ouvir a empresa.
Segundo o disposto no artigo 6º, o juiz tem 24 horas após receber a ação para citar a empresa que veiculou a ofensa. O inciso I do mesmo artigo dá as mesmas 24 horas para a empresa apresentar as razões por que não veiculou a resposta extrajudicialmente, e o inciso II dá três dias para a contestação do pedido.
Esses prazos são mais curtos do que o normal: em ações cautelares com pedido de urgência, por exemplo, o prazo para contestação é de 5 dias.

Segue: o art. 7º determina que o juiz conheça do pedido até 24 horas após a citação da empresa e que, a partir daí, possa fixar condições e data (em até 10 dias) para a veiculação da resposta. Ou seja: antes mesmo de a empresa apresentar as razões e formular a contestação, a sentença pode ser proferida e a resposta, publicada.
Para piorar, o projeto torna quase impossível recorrer da decisão. Segundo o artigo 10, apenas a decisão de três desembargadores pode suspender a veiculação da resposta até que seja julgado um recurso em segundo grau. Esta seria a primeira lei a exigir uma decisão colegiada prévia para o efeito suspensivo: normalmente, as liminares são expedidas por apenas um magistrado.
Mais: o art. 4º estabelece que a resposta terá a mesma dimensão ou duração da matéria que a ensejou. Na prática, quem se sentir ofendido por uma linha de uma longa reportagem poderá pleitear o espaço de toda a matéria para responder ou retificar a informação contestada.
A Abraji considera que o projeto de lei põe em risco a liberdade de expressão e nega a empresas de mídia e comunicadores independentes o direito à defesa. Embora seja tarde para corrigir todas as falhas, a supressão de alguns dispositivos pode reduzir o potencial danoso do projeto. A Abraji defende que a presidente Dilma Rousseff vete o inciso I do art. 6º (que dá 24 horas para o veículo oferecer explicação) e o art. 10 (que exige decisão colegiada prévia para concessão de efeito suspensivo).
Os vetos não afastarão, no entanto, o risco de condenação sumária prevista no art. 7º, especialmente para blogueiros independentes e empresas sem estrutura jurídica"”

Pescadores convocam 'Arca de Noé' para salvar peixes


Cerca de 400 famílias de trabalhadores sofrem isoladas às margens do rio Doce, entre Minas Gerais e o Espírito Santo, graças à enxurrada de lama que escoa das duas barragens rompidas em Mariana (MG) na quinta-feira, 5 de novembro.

O empenho destes pescadores em salvar sua única fonte de sustento é tamanho que eles decidiram convocar mutirões para tentar transferir os peixes do rio contaminado para lagoas de água limpa. Batizada como "Operação Arca de Noé", a força-tarefa voluntária operará em locais que ainda não foram atingidos pelo "tsunami de lama" que desce o rio Doce desde o dia 5.

Dourados, surubins, pacus, tucunarés, pintados e outras espécies afetadas pelos resíduos de mineração da Samarco, empresa controlada pela brasileira Vale e pela anglo-australiana BHP, estão escapando da morte dentro de caixas d'água, caçambas e lonas plásticas; tudo "no improviso", segundo moradores.

Analistas ouvidos pela reportagem da BBC Brasil estimam que a passagem da lama e produtos químicos tenha reduzido o oxigênio do rio Doce a níveis próximos a zero, levando milhares de peixes e outros animais aquáticos à morte por asfixia.

Questionada sobre a situação dos pescadores, a Samarco disse, em nota, que "adotará as ações necessárias para identificação e mitigação dos impactos e reportará aos órgãos ambientais competentes".

A mineradora diz ainda que vai "priorizar a assistência à população afetada pelo acidente" e que "está executando um sistema emergencial de monitoramento da qualidade de água no Rio Doce", com "pareceres técnicos imparciais, de equipe multidisciplinar renomada". A empresa não informou, no entanto, quando o estudo estará pronto, nem quem faz parte desta equipe.