O descarte de minério descendo em avalanche decretou a morte de dezenas de pessoas, a extinção de povoados históricos, arruinou centenas de famílias, de propriedades rurais, a fauna e a flora que povoavam a região, símbolo dos primórdios de Minas.
O estrago revolta até o olhar mais insensível. Os danos difíceis de se quantificar, a recuperação impossível e irreparável, atingindo diretamente grande parcela da população do Estado, chocaram o mundo inteiro. E a pergunta: como é possível que um Estado de vocação extrativa, que já teve vários desastres decorrentes da mesma causa, volte a protagonizar um espetáculo tão avassalador?
Os últimos anos fizeram da Samarco, controlada pela Vale, a principal fornecedora de pelotas de minério do mundo. Evidentemente, foram subestimados o risco representado pela elevação da cota e a condição em que se estabilizariam milhões de toneladas de resíduos.
Abaixo da barragem não foram erguidas barreiras suplementares de contenção que pudessem atenuar um possível rompimento ou dar vazão a uma emergência. Confiou-se que a barragem fosse sólida e suficiente por si mesma.
Para atenuar responsabilidades, foram apresentadas hipóteses, como a de abalos detectados por sismógrafos em Brasília na hora do rompimento das duas barragens. A região de Mariana, entretanto, é considerada estável e sem terremotos. A informação pode, assim, ser interpretada em duplo sentido. O primeiro deixa entender que um tremor de terra de intensidade de 1,5 grau na escala Richter gerou a quebra da barragem, coincidindo com o horário da falência da encosta. Mas também deixa livre a interpretação de que o movimento de milhões de toneladas provocado pelo estouro da represa se gerou concomitantemente com a avalanche ocorrida no local. A descrição dada pelos sismógrafos certamente pode esclarecer o ponto de origem, se foi proveniente do subsolo ou da avalanche e de sua queda sobre o vale.
A intensidade de 1,5 grau do abalo registrado não representa, via de regra, impacto suficiente para abalar uma estrutura elástica como uma barragem.
A falha mais plausível recai nos projetos de ampliação, que poderiam ter elevado em excesso o nível da sedimentação dos dejetos. Quanto mais alta, mais crítica ficou a barragem, numa cota muito elevada em relação a sua base.
Nos últimos 15 anos a extração se acelerou, ditando novas ampliações para acolher descartes da extração mineral. A Samarco passou do ponto de segurança, entrou numa faixa de risco elevadíssima, com autorização e fiscalização públicas. A responsabilidade não só é de quem executa, mas de quem autoriza e fiscaliza.
Num Estado em que os empreendimentos agrícolas e agroindustriais recebem tratamentos de controle ambiental pontualmente burocráticos e punitivos, apesar da ausência de riscos, eles se arrastam por anos e passam por etapas inconsequentes. Não dá para entender como, ao contrário, as bilionárias mineradoras têm seus projetos aprovados ao arrepio da lei, a toque de caixa, deixando no rastro estragos que se repetem com imperdoável frequência.
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