terça-feira, 5 de julho de 2016
Os brasileiros já sabem o que não querem
É possível que muitos brasileiros, em meio à crise que vivem, ainda não saibam claramente o que desejam para o futuro de seu país, mas, certamente, sabem o que não querem. E essa consciência do que rejeitam já é um início de recuperação.
A advogada Alba de Oliveira Castro definia isso na minha página do Facebook com uma frase expressiva e incisiva: “Estamos exumando os cadáveres escondidos do passado”, escreveu.
Por algum tempo, a sociedade viveu anestesiada, sem saber que nos porões do poder existiam tantos cadáveres escondidos. Desde as primeiras manifestações populares de 2013, o país se conscientizou da necessidade de se libertar do que o impede de sair do atraso para empreender o caminho da modernidade. Ousaria dizer, da normalidade.
As pessoas sabem hoje, com maior clareza, o que não aceitam, embora nem sempre saibam o que estão dispostas a aceitar. Mas, como dizia o Nobel de Literatura português José Saramago, uma sociedade livre e madura é construída, muitas vezes, “mais com o não do que com o sim”. Ele se referia ao não do protesto contra o sim da resignação.
Hoje, o Brasil, em meio à convulsão política e social que o abala, e que é tangível na efervescência das redes sociais, conhece bem um punhado de coisas que não quer.
Não quer, por exemplo, esse vulcão da corrupção em erupção, tanto na classe política (estima-se cerca de 500 políticos envolvidos) quanto no mundo dos negócios. O não à corrupção é quase um hino nacional.
Como consequência, o Brasil não quer hoje nenhuma tentativa de amordaçar os juízes. Certos excessos poderão, às vezes, ser criticados, mas a Operação Lava Jato já é sagrada.
O Brasil não aceita mais a lei eleitoral vigente. Terá que mudar se não quiser que a maioria abandone as urnas.
Ninguém aceita mais os privilégios dos políticos que ferem a sensibilidade até mesmo dos mais distraídos. Ninguém quer um foro privilegiado que permite a uma casta ser julgada pelo Supremo, em vez de passar pelos juízes de primeira instância, como todos os mortais. Hoje, apenas três ou quatro países mantêm esse sistema, e, nos Estados Unidos, quando o ex-presidente Bill Clinton foi levado à justiça, teve que ser julgado por um tribunal de primeira instância. No Brasil, 22.000 pessoas têm foro privilegiado.
A sociedade não aceita que, se para ser porteiro de um edifício seja necessário um mínimo currículo escolar, isso não seja exigido para ser político.
Rejeita que a política, a serviço da sociedade, tenha se tornado um grande negócio para o enriquecimento. Como disse José Mujica, ex-presidente do Uruguai: “Por que um político não pode ganhar como um professor?”
Os brasileiros não admitem que no Congresso possam estar representados mais de 30 partidos, a maioria sem ideologia ou programa próprio. Puros fantasmas.
É possível que, nas próximas eleições, o Brasil ainda não saiba em quem votar, mas saberá em quem não votar. Desta vez, será mais difícil distrair ou comprar eleitores na hora de ir às urnas.
Por algum tempo, a sociedade viveu anestesiada, sem saber que nos porões do poder existiam tantos cadáveres escondidos
Segundo pesquisas, a grande maioria dos brasileiros rejeita tanto Dilma quanto Temer. Mais uma vez, sabem o que não querem, embora talvez não tenham claro os possíveis novos candidatos.
A sociedade, ainda fortemente racista, começa a rejeitar como nunca a violência contra a mulher, a discriminação sexista e as desigualdades sociais.
Os jovens, mais do que os idosos, estão agora na vanguarda da oposição às velhas formas de política e de exercer o poder.
Ainda estão confusos e revoltados, mas já apontam soluções. Não querem, por exemplo, viver em cidades que os desintegram, desumanas, com guetos, sem espaços para respirar em liberdade, dominadas pela violência.
E todos, grandes e pequenos, rejeitam o ensino sem qualidade, as escolas que políticos e ricos nunca levariam seus filhos, como também a saúde pública, onde para os pobres é mais fácil morrer do que se curar.
Entre as coisas que os brasileiros com certeza querem é uma sociedade mais igualitária, sem tantas castas, com as mesmas oportunidades.
Talvez ainda não seja tudo, mas não é pouco.
Que isso não seja esquecido pelo poder, que até ontem caminhava tranquilo e confiante de que os brasileiros engoliam tudo. Já não.
A advogada Alba de Oliveira Castro definia isso na minha página do Facebook com uma frase expressiva e incisiva: “Estamos exumando os cadáveres escondidos do passado”, escreveu.
Por algum tempo, a sociedade viveu anestesiada, sem saber que nos porões do poder existiam tantos cadáveres escondidos. Desde as primeiras manifestações populares de 2013, o país se conscientizou da necessidade de se libertar do que o impede de sair do atraso para empreender o caminho da modernidade. Ousaria dizer, da normalidade.
As pessoas sabem hoje, com maior clareza, o que não aceitam, embora nem sempre saibam o que estão dispostas a aceitar. Mas, como dizia o Nobel de Literatura português José Saramago, uma sociedade livre e madura é construída, muitas vezes, “mais com o não do que com o sim”. Ele se referia ao não do protesto contra o sim da resignação.
Não quer, por exemplo, esse vulcão da corrupção em erupção, tanto na classe política (estima-se cerca de 500 políticos envolvidos) quanto no mundo dos negócios. O não à corrupção é quase um hino nacional.
Como consequência, o Brasil não quer hoje nenhuma tentativa de amordaçar os juízes. Certos excessos poderão, às vezes, ser criticados, mas a Operação Lava Jato já é sagrada.
O Brasil não aceita mais a lei eleitoral vigente. Terá que mudar se não quiser que a maioria abandone as urnas.
Ninguém aceita mais os privilégios dos políticos que ferem a sensibilidade até mesmo dos mais distraídos. Ninguém quer um foro privilegiado que permite a uma casta ser julgada pelo Supremo, em vez de passar pelos juízes de primeira instância, como todos os mortais. Hoje, apenas três ou quatro países mantêm esse sistema, e, nos Estados Unidos, quando o ex-presidente Bill Clinton foi levado à justiça, teve que ser julgado por um tribunal de primeira instância. No Brasil, 22.000 pessoas têm foro privilegiado.
A sociedade não aceita que, se para ser porteiro de um edifício seja necessário um mínimo currículo escolar, isso não seja exigido para ser político.
Rejeita que a política, a serviço da sociedade, tenha se tornado um grande negócio para o enriquecimento. Como disse José Mujica, ex-presidente do Uruguai: “Por que um político não pode ganhar como um professor?”
Os brasileiros não admitem que no Congresso possam estar representados mais de 30 partidos, a maioria sem ideologia ou programa próprio. Puros fantasmas.
É possível que, nas próximas eleições, o Brasil ainda não saiba em quem votar, mas saberá em quem não votar. Desta vez, será mais difícil distrair ou comprar eleitores na hora de ir às urnas.
Por algum tempo, a sociedade viveu anestesiada, sem saber que nos porões do poder existiam tantos cadáveres escondidos
Segundo pesquisas, a grande maioria dos brasileiros rejeita tanto Dilma quanto Temer. Mais uma vez, sabem o que não querem, embora talvez não tenham claro os possíveis novos candidatos.
A sociedade, ainda fortemente racista, começa a rejeitar como nunca a violência contra a mulher, a discriminação sexista e as desigualdades sociais.
Os jovens, mais do que os idosos, estão agora na vanguarda da oposição às velhas formas de política e de exercer o poder.
Ainda estão confusos e revoltados, mas já apontam soluções. Não querem, por exemplo, viver em cidades que os desintegram, desumanas, com guetos, sem espaços para respirar em liberdade, dominadas pela violência.
E todos, grandes e pequenos, rejeitam o ensino sem qualidade, as escolas que políticos e ricos nunca levariam seus filhos, como também a saúde pública, onde para os pobres é mais fácil morrer do que se curar.
Entre as coisas que os brasileiros com certeza querem é uma sociedade mais igualitária, sem tantas castas, com as mesmas oportunidades.
Talvez ainda não seja tudo, mas não é pouco.
Que isso não seja esquecido pelo poder, que até ontem caminhava tranquilo e confiante de que os brasileiros engoliam tudo. Já não.
O golpe, o golpe, o golpe
Dilma e o PT continuam a bradar que está em curso um golpe contra eles. Vão berrar isso nas Olimpíadas, vão continuar até 2018, quando esperam eleger o Lula. Mas creio que esse demagogo narcisista encontrará seu destino antes disso.
É espantoso ver o ardor com que a “Barbie” de esquerda Gleisi Hoffmanh e o Lindberg Farias, bem conhecido em Nova Iguaçu, defendem Dilma. Por que será? Para mostrar força, já que ambos são investigados na Lava Jato? E o José Eduardo Cardozo? Ele parece estar lutando pela própria vida. Sua fidelidade canina é emocionante. O que será que ele quer? Algum sonho de poder ou é só amor?
Todos se aferram à tecnicalidade das chamadas “pedaladas fiscais”, questionando-as, periciando-as, como se esse detalhe fosse a única razão para o impedimento.
Sem dúvida, foram o irrefutável crime contábil de seu governo. Mas não só as malandragens da administração são crimes; também foram espantosos os desastres econômicos e políticos que essas práticas provocaram. Foi golpe, sim, quando deram as pedaladas, desrespeitando a Lei de Responsabilidade Fiscal, para fingir que as contas estavam sob controle. Mais do que aumentar o endividamento, o governo recorreu a manobras para fechar as contas públicas. A chamada “contabilidade criativa” incluiu, por exemplo, repasses do Tesouro ao BNDES, que não aparecem como aumento de dívida.
O verdadeiro golpista foi o PT, esse partido que nos desmanchou. O golpe começou desde o governo Lula, que abriu para o PT e aliados as portas para o presidencialismo de corrupção.
Foram muitos os golpes que Dilma e sua turma cometeram.
Foi golpe quando mentiram espetacularmente na campanha eleitoral dizendo que o país estava bem, quando desde 2014 já rondava a falência. A presidente assumiu o segundo mandato já sabendo que dificilmente poderia cumprir as promessas de campanha.
Foi golpe quando, em decorrência da transgressão da Lei de Responsabilidade Fiscal, os gastos públicos disfarçados provocaram o desemprego de mais de 12 milhões de trabalhadores, com a inflação subindo para mais de 10%. O endividamento do setor público disparou no governo Dilma. Em 2014, o setor público gastou R$ 32,5 bilhões a mais do que arrecadou com tributos – o equivalente a 0,63% do Produto Interno Bruto (PIB), o primeiro déficit desde 2002. A dívida pública líquida subiu pela primeira vez desde 2009, de 33,6% do PIB, em 2013, para 70% agora. Sua herança maldita faz a dívida pública crescer quase R$ 2 bilhões por dia.
Foi um golpe quando permitiram que nosso rombo fiscal chegasse a R$ 170 bilhões.
Foi um golpe, sim, quando Dilma comprou a refinaria de Pasadena por US$ 1,5 bilhão, 300 vezes o preço original, de US$ 43 milhões. É assustador ouvir de Dilma que ela não sabia de nada (nunca sabem nada) e que o caolhinho Cerveró a teria enrolado.
Isso já poderia ser motivo para impedimento: ou ela fez vista grossa para as roubalheiras da Petrobras (“oh... malfeitos toleráveis para a ‘revolução’ petista...”), ou por incompetência e negligência criminosa mesmo, ao não examinar direito, como “presidenta” do Conselho de Administração, a caríssima compra de uma refinaria lata-velha. Só isso já era motivo. Aliás, o Cerveró reagiu às explicações de Dilma: “Ela sabia de tudo... Ela mentiu e me sacaneou”. A chanchada está cada vez mais vulgar.
Foi imenso o crime da destruição de nosso maior orgulho, a Petrobras, que virou um ferro-velho endividado, vendendo ativos. Foi golpe.
E vêm aí mais coisas horrendas na Eletrobras do Lobão, nos fundos de pensão, nas empresas públicas. São golpes de morte.
Foi um golpe o aparelhamento do Estado pelos petistas. Foi golpe nomear mais de 50 mil elementos para lotear o governo.
Os gargalos na infraestrutura brasileira foram ignorados e encareceram os custos da indústria. Foi golpe o atraso em obras de infraestrutura do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e também demora nas licitações de ferrovias, rodovias e portos. Foi golpe também financiar portos e pontes na Venezuela e em Cuba.
Mantega foi um “golpe”, denunciado por todos os economistas sérios do mundo. Dilma abandonou de vez o chamado “tripé macroeconômico” de FHC em favor de uma “nova matriz”, que quebrou tudo. Não demitiram Mantega porque seria admitir um fracasso, inadmissível para uma velha comuna.
Foi golpe o termo de posse que Dilma enviou para Lula em segredo, para livrá-lo da Justiça comum.
Golpes pouco lembrados são os gigantescos gastos para fazer propaganda. Uma prática vexaminosa sempre foi o dinheiro que se gastou em propaganda dos órgãos públicos para enganar a população sobre fracassos inconfessáveis.
Só em 2014, Dilma gastou mais de R$ 2,5 bilhões em propaganda. Em 2015, R$ 2,3 bilhões. Total: R$ 6 bilhões para engambelar a opinião pública em dois anos. E mais: desde o início do governo do PT foram gastos mais de R$ 16 bilhões em publicidade. Não é um golpe?
E o pior golpe é o inconcebível desrespeito às instituições do país. Dilma acusa o Supremo Tribunal, a Procuradoria Geral, o Congresso, milhões de pessoas nas ruas, de tramar o golpe contra ela.
E mais ainda:
É um golpe feio a arrogante “presidenta” pedir sanções contra o Brasil a países vagabundos do Unasul bolivariano... A presidenta do Brasil fala mal do Brasil no mundo todo. Pode?
Isso poderia até ser o caso de infração à lei de Segurança Nacional. Lei 7.170/1983.
O que Lula diz não se escreve
No dia em que o jornal inglês The Guardian publicou entrevista com Lula onde ele diz, nem um pouco modesto, que foi “o melhor presidente da história do Brasil” e que “as conquistas dos últimos 13 anos” de governos do PT jamais se perderão, por aqui o jornal Valor destacou em sua capa reportagem de Rodrigo Carro sob o título “Renda per capita terá segunda maior queda em 116 anos”.
A megalomania de Lula está por inteiro na entrevista concedida ao jornalista Jonathan Watts. Seu desconhecimento da realidade brasileira causa espanto quando se confronta o que ele disse a Watts com o que apurou Carro. A Lula se aplicaria à perfeição a frase que o dramaturgo grego Sófocles pôs na boca de Antígona, filha de Édipo e Jocasta: “Posso estar errada, mas continuo sendo eu”.
No triênio 2014-2016, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita acumulará uma retração de 9,4%, estima o Instituto Brasileiro de Economia (IbreFGV). Na série iniciada em 1900, apenas o triênio 1981-1983 teve diminuição mais forte na renda: 12,3%. A situação só não é pior, avaliam economistas, por conta de benefícios e programas sociais instituídos nas últimas décadas.
A projeção do Ibre para 2017 é que o PIB recue 0,1%, o que levaria à perda acumulada na renda per capita de mais de 10% em quatro anos. O efeito da crise atual sobre a renda per capita do brasileiro é mais forte do que no triênio 1929¬1931, quando o país perdeu 7,9% do PIB per capita. As camadas de menor renda pagam o preço da atual recessão via aumento do desemprego e aceleração da inflação.
Carro debruçou-se sobre outro estudo, esse da Tendências Consultoria. Se ele se confirmar, entre 2014 e 2018, 5,21 milhões de famílias brasileiras deverão deixar a classe C rumo à base da pirâmide social devido, “principalmente, ao quadro desfavorável aos trabalhadores de baixa qualificação, revertendo a expansão da nova classe média ocorrida em anos recentes”.
"A classe C voltará a ser destaque?” – pergunta Adriano Pitoli, diretor de análise setorial e inteligência de mercado da Tendências, e autor do estudo. E ele mesmo responde: “Achamos que não no médio prazo". O encolhimento da nova classe média está destinado a reverter o processo de mobilidade social que durou até recentemente.
“Entre 2006 e 2013”, diz o estudo, “3,87 milhões de famílias deixaram as classes D e E rumo à nova classe média na esteira do boom de consumo e renda”. Pitoli atribui o declínio da classe C não só ao agravamento do desemprego, mas também a uma mudança na dinâmica econômica.
- O reajuste do salário mínimo e o impacto do Bolsa Família foram importantes, mas o principal fator foi a dinâmica econômica dos setores de serviços e consumo puxando o PIB. São setores que empregam mão de obra de menor qualificação. Com a crise aguda, há setores sofrendo proporcionalmente mais que o PIB. A crise está afetando mais os trabalhadores de baixa qualificação.
De volta à entrevista de Lula ao The Guardian. Ele afirmou que não se arrepende de ter indicado Dilma para sucedê-lo. E garantiu que ela não cometeu crime algum.
A megalomania de Lula está por inteiro na entrevista concedida ao jornalista Jonathan Watts. Seu desconhecimento da realidade brasileira causa espanto quando se confronta o que ele disse a Watts com o que apurou Carro. A Lula se aplicaria à perfeição a frase que o dramaturgo grego Sófocles pôs na boca de Antígona, filha de Édipo e Jocasta: “Posso estar errada, mas continuo sendo eu”.
No triênio 2014-2016, o Produto Interno Bruto (PIB) per capita acumulará uma retração de 9,4%, estima o Instituto Brasileiro de Economia (IbreFGV). Na série iniciada em 1900, apenas o triênio 1981-1983 teve diminuição mais forte na renda: 12,3%. A situação só não é pior, avaliam economistas, por conta de benefícios e programas sociais instituídos nas últimas décadas.
A projeção do Ibre para 2017 é que o PIB recue 0,1%, o que levaria à perda acumulada na renda per capita de mais de 10% em quatro anos. O efeito da crise atual sobre a renda per capita do brasileiro é mais forte do que no triênio 1929¬1931, quando o país perdeu 7,9% do PIB per capita. As camadas de menor renda pagam o preço da atual recessão via aumento do desemprego e aceleração da inflação.
Carro debruçou-se sobre outro estudo, esse da Tendências Consultoria. Se ele se confirmar, entre 2014 e 2018, 5,21 milhões de famílias brasileiras deverão deixar a classe C rumo à base da pirâmide social devido, “principalmente, ao quadro desfavorável aos trabalhadores de baixa qualificação, revertendo a expansão da nova classe média ocorrida em anos recentes”.
"A classe C voltará a ser destaque?” – pergunta Adriano Pitoli, diretor de análise setorial e inteligência de mercado da Tendências, e autor do estudo. E ele mesmo responde: “Achamos que não no médio prazo". O encolhimento da nova classe média está destinado a reverter o processo de mobilidade social que durou até recentemente.
“Entre 2006 e 2013”, diz o estudo, “3,87 milhões de famílias deixaram as classes D e E rumo à nova classe média na esteira do boom de consumo e renda”. Pitoli atribui o declínio da classe C não só ao agravamento do desemprego, mas também a uma mudança na dinâmica econômica.
- O reajuste do salário mínimo e o impacto do Bolsa Família foram importantes, mas o principal fator foi a dinâmica econômica dos setores de serviços e consumo puxando o PIB. São setores que empregam mão de obra de menor qualificação. Com a crise aguda, há setores sofrendo proporcionalmente mais que o PIB. A crise está afetando mais os trabalhadores de baixa qualificação.
De volta à entrevista de Lula ao The Guardian. Ele afirmou que não se arrepende de ter indicado Dilma para sucedê-lo. E garantiu que ela não cometeu crime algum.
Discordar é uma arte
Venho sofrendo alguns reveses na vida simplesmente por exercitar a arte de discordar. Discordar é muito bom quando todo mundo concorda com a sua discordância. Já quando há controvérsias a coisa muda de figura. Peguemos, por exemplo, dois episódios da vida nacional recente, representados pelo senhor Demóstenes e pela senadora Kátia. Até hoje quero saber quem era o ghost writer dela. Ou como passou batido pelos jornalistas o verdadeiro caráter do paladino que só fazia os incautos de besta com seus trinados elegantes.
Minha introdução é pra discordar de um certo conjunto da obra que vê, por exemplo, correção na atitude do presidente do Senado ao tirar da cartola a tal lei que pune os excessos cometidos por autoridades, sem no entanto acomodar no mesmo texto a legalização dos jogos de azar. Resta evidente que faz um bom tempo que a “classe política” procura um jeitinho maroto de “esquentar” o dinheiro roubado ultimamente – via “craudefundes e afins” – para poder dele dispor nas próximas eleições.
É tão evidente que chega a ser enfadonho. Não custa lembrar que o juiz Sérgio Moro sabia da “suposta ilegalidade” – eu adoro essa expressão – da divulgação dos áudios que envolviam a tramoia Lula-Dilma, mas o fez assim mesmo, num ato de rara coragem, escancarando do que é feita a nossa república de bananas de procedência pra lá de duvidosa. Moro virou um herói nacional pela coragem – coragem que falta a boa parte da imprensa para traçar o quadro negro como ele efetivamente é.
É claro que concordo com a boa democracia. Concordo inclusive em discordar de Bolsonaro, mas defendo seu direito de dizer tantas abobrinhas quantas lhe cabem no saco. A patrulha do “politicamente correto” é coisa de um bando de idiotinhas úteis a serviço de uma causa que não para em pé. Tudo isso nós já sabemos. O que não sabemos – e fica difícil adivinhar – é o que querem nossos atuais mandatários, emitindo esses sinais estranhos que ora se alinham com a correção parlamentar, ora querem regulamentar a propina que vai abastecer os próximos caixas de campanha.
O discurso de “oposição meia boca” nós já entendemos perfeitamente. Ele serve como uma luva a cretinos que também se abasteceram de caixas dois e ideologias calhordas para uma sentada naquele plenário. Se gritar “pega ladrão”, não fica um, meu irmão. Justamente por isso que nas próximas eleições precisaremos de um mapa. Um aplicativo. Um folder ricamente ilustrado. Um template. Um infográfico. Qualquer coisa que nos mostre claramente quem é quem nessa selva amazônica de nossa política, onde todo mundo se disfarça de Rambo para tungar seu voto impunemente.
Nessa gente que aí está eu não voto nem amarrado, especialmente a mezzo esquerda, mezzo mozzarella. Eu quero que esses senhores se danem. Simples assim.
Minha introdução é pra discordar de um certo conjunto da obra que vê, por exemplo, correção na atitude do presidente do Senado ao tirar da cartola a tal lei que pune os excessos cometidos por autoridades, sem no entanto acomodar no mesmo texto a legalização dos jogos de azar. Resta evidente que faz um bom tempo que a “classe política” procura um jeitinho maroto de “esquentar” o dinheiro roubado ultimamente – via “craudefundes e afins” – para poder dele dispor nas próximas eleições.
É claro que concordo com a boa democracia. Concordo inclusive em discordar de Bolsonaro, mas defendo seu direito de dizer tantas abobrinhas quantas lhe cabem no saco. A patrulha do “politicamente correto” é coisa de um bando de idiotinhas úteis a serviço de uma causa que não para em pé. Tudo isso nós já sabemos. O que não sabemos – e fica difícil adivinhar – é o que querem nossos atuais mandatários, emitindo esses sinais estranhos que ora se alinham com a correção parlamentar, ora querem regulamentar a propina que vai abastecer os próximos caixas de campanha.
O discurso de “oposição meia boca” nós já entendemos perfeitamente. Ele serve como uma luva a cretinos que também se abasteceram de caixas dois e ideologias calhordas para uma sentada naquele plenário. Se gritar “pega ladrão”, não fica um, meu irmão. Justamente por isso que nas próximas eleições precisaremos de um mapa. Um aplicativo. Um folder ricamente ilustrado. Um template. Um infográfico. Qualquer coisa que nos mostre claramente quem é quem nessa selva amazônica de nossa política, onde todo mundo se disfarça de Rambo para tungar seu voto impunemente.
Nessa gente que aí está eu não voto nem amarrado, especialmente a mezzo esquerda, mezzo mozzarella. Eu quero que esses senhores se danem. Simples assim.
Lava Jato sob ameaça
A Operação Lava Jato e o que ela simboliza, o combate implacável à corrupção, estão ameaçados. As investigações que se intensificaram nos últimos dois anos e pouco, e resultaram na condenação de políticos, funcionários de estatais, dirigentes de empresas privadas e operadores financeiros, agora começam a expor importantes figurões da política, personagens que até pouco tempo atrás eram considerados intocáveis. Como a toda ação corresponde uma reação oposta da mesma intensidade, na medida em que as investigações os atingiram em cheio os políticos sob suspeição tornaram-se os principais adversários da Lava Jato. Sua reação está em pleno curso. Com a circunstância agravante de que são eles que têm poder para impor restrições legais à atuação da Lava Jato.
Até como consequência da crescente abrangência de suas investigações, a Lava Jato está cada vez mais sujeita a controvérsias resultantes de procedimentos passíveis de contestação e eventuais falhas operacionais cometidas por seus agentes: policiais, procuradores e juízes federais. Essas controvérsias se concentram em duas questões principais: o instituto da delação premiada e as denúncias de abuso de autoridade. É a partir daí que surgem os pretextos para acabar com a “sangria” nos negócios políticos que provocam a indignação do notório senador Romero Jucá (PMDB-RR). Muitos políticos defendem também a revisão, pelo STF, da decisão que determinou a obrigatoriedade do cumprimento das penas de prisão a partir de sentença de segunda instância.
Tanto a delação premiada, responsável em grande parte pelo sucesso da Lava Jato em suas investigações, quanto o abuso de poder por juízes, procuradores e policiais são questões que precisam ser levadas a sério e corrigidas sempre que for o caso. É claro que o poder de magistrados e investigadores não se pode sobrepor à lei. Mas é óbvio também que essas questões são frequentemente mero pretexto para proteger corruptos ou preservar interesses corporativos.
O fato é que, como ficou sobejamente demonstrado pelas escutas telefônicas feitas pelo delator Sérgio Machado, ex-senador e ex-presidente da Transpetro, importantes líderes políticos – no caso, peemedebistas, como o delator – não se conformam com a possibilidade cada vez mais próxima de virem a ser julgados por corrupção e estão de alguma maneira se articulando para promover um “acordão” que os livre da cadeia.
Além de restrições à delação premiada e a imposição de controle mais rígido sobre o poder dos juízes criminais de primeira instância e investigadores, circula nos meios políticos a ideia extravagante da criação do acordo de leniência – em moldes similares ao que já existe para as empresas – também para os partidos. Muitos consideram um acordo dessa natureza indispensável à sobrevivência dos partidos políticos, pois julgam inevitável que as legendas venham a ser obrigadas a restituir valores altíssimos aos cofres públicos, como já aconteceu com o PT, multado em R$ 23 milhões, pelo TSE, no caso do mensalão.
De acordo com o que apurou o jornalista Raymundo Costa, em matéria publicada pelo Valor, cresce em Brasília a disposição das lideranças partidárias de estabelecer um “acordão”, respaldado por uma regulamentação legal adequada, que a partir de determinado momento estabeleça um divisor de águas entre o passado e o futuro, respeitando as condenações judiciais até então tomadas ou na iminência de sê-lo e deixando o resto como está, mais ou menos na base do “o que passou passou”. Esse é um entendimento que, em princípio, atende aos interesses de todas as legendas partidárias, principalmente as maiores e, de modo especial, o PT, cujas lideranças estão ávidas pela oportunidade de zerar seu enorme déficit político e começar tudo de novo.
Um arranjo dessa natureza dependeria de os políticos se entenderem a respeito. Uma coisa seria capaz de evitá-lo: a justa indignação das pessoas de bem do País expressa num clamor popular contra essa obscenidade.
Até como consequência da crescente abrangência de suas investigações, a Lava Jato está cada vez mais sujeita a controvérsias resultantes de procedimentos passíveis de contestação e eventuais falhas operacionais cometidas por seus agentes: policiais, procuradores e juízes federais. Essas controvérsias se concentram em duas questões principais: o instituto da delação premiada e as denúncias de abuso de autoridade. É a partir daí que surgem os pretextos para acabar com a “sangria” nos negócios políticos que provocam a indignação do notório senador Romero Jucá (PMDB-RR). Muitos políticos defendem também a revisão, pelo STF, da decisão que determinou a obrigatoriedade do cumprimento das penas de prisão a partir de sentença de segunda instância.
Tanto a delação premiada, responsável em grande parte pelo sucesso da Lava Jato em suas investigações, quanto o abuso de poder por juízes, procuradores e policiais são questões que precisam ser levadas a sério e corrigidas sempre que for o caso. É claro que o poder de magistrados e investigadores não se pode sobrepor à lei. Mas é óbvio também que essas questões são frequentemente mero pretexto para proteger corruptos ou preservar interesses corporativos.
O fato é que, como ficou sobejamente demonstrado pelas escutas telefônicas feitas pelo delator Sérgio Machado, ex-senador e ex-presidente da Transpetro, importantes líderes políticos – no caso, peemedebistas, como o delator – não se conformam com a possibilidade cada vez mais próxima de virem a ser julgados por corrupção e estão de alguma maneira se articulando para promover um “acordão” que os livre da cadeia.
Além de restrições à delação premiada e a imposição de controle mais rígido sobre o poder dos juízes criminais de primeira instância e investigadores, circula nos meios políticos a ideia extravagante da criação do acordo de leniência – em moldes similares ao que já existe para as empresas – também para os partidos. Muitos consideram um acordo dessa natureza indispensável à sobrevivência dos partidos políticos, pois julgam inevitável que as legendas venham a ser obrigadas a restituir valores altíssimos aos cofres públicos, como já aconteceu com o PT, multado em R$ 23 milhões, pelo TSE, no caso do mensalão.
De acordo com o que apurou o jornalista Raymundo Costa, em matéria publicada pelo Valor, cresce em Brasília a disposição das lideranças partidárias de estabelecer um “acordão”, respaldado por uma regulamentação legal adequada, que a partir de determinado momento estabeleça um divisor de águas entre o passado e o futuro, respeitando as condenações judiciais até então tomadas ou na iminência de sê-lo e deixando o resto como está, mais ou menos na base do “o que passou passou”. Esse é um entendimento que, em princípio, atende aos interesses de todas as legendas partidárias, principalmente as maiores e, de modo especial, o PT, cujas lideranças estão ávidas pela oportunidade de zerar seu enorme déficit político e começar tudo de novo.
Um arranjo dessa natureza dependeria de os políticos se entenderem a respeito. Uma coisa seria capaz de evitá-lo: a justa indignação das pessoas de bem do País expressa num clamor popular contra essa obscenidade.
Os grandes e os pequenos
A imprensa noticiou, na última semana, a fusão de dois dos maiores grupos de ensino privado, que, se concretizada, os fará responder por mais de 1,5 milhões de estudantes e por cerca de 12 mil cursos de graduação, aproximadamente 30% do total dos cursos oferecidos no país.
Tais operações financeiras trazem vantagens aos acionistas desses grupos, pois resultam, de imediato, na alta das ações nas bolsas. Do ponto de vista acadêmico, penso que é muito importante assegurar o cumprimento de certos princípios que devem nortear a nossa educação superior, onde as dimensões, vocações e peculiaridades regionais são parâmetros que não podem ser esquecidos. Assim, as operações de fusão e aquisição deverão garantir os padrões de qualidade na oferta de cursos, sempre preservadas as necessidades e identidades regionais.
Por outro lado, “instituições menores”, com algumas centenas de estudantes, ou até poucos milhares, poderão ter papel muito importante na educação superior, na medida em que temos hoje mais de 60% dos municípios onde as grandes instituições e universidades não chegam. Os “pequenos” não devem, portanto, ser esquecidos.
No início do século XX, quando os norte-americanos começaram a entender a importância de um curso superior de qualidade para o mercado de trabalho e para o desenvolvimento, foram implantados os “junior colleges”, que depois foram denominados de “community colleges”. Eles surgiram pela pressão por mais vagas nos cursos superiores, quase sempre de candidatos ainda sem o necessário preparo para o ingresso nas universidades, na época marcadas por uma forte tradição e pela formação nas profissões clássicas (direito, medicina e engenharia, entre outros).
Quais são os nossos problemas?
Em primeiro lugar, a má distribuição geográfica dos cursos superiores, que não alcançam muitos municípios.
Em segundo, não estamos dando efetiva importância aos cursos superiores de tecnologia, que sequer são reconhecidos por muitas empresas.
Em terceiro lugar, insistimos no modelo hierarquizado, onde faculdades isoladas aspiram a se transformar em centros universitários e depois em universidades, em busca de uma autonomia para abrir novos cursos, que poderia ser concedida facilmente àquelas instituições com bom desempenho, independentemente de sua forma de organização.
Gosto sempre de lembrar que o MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets) e o Caltech (Instituto de Tecnologia da California), ambos com respeitáveis quadros de prêmios Nobel, não são universidades.
Finalmente, pela inexistência de um diploma superior de estudos gerais, como ocorre em vários países da união européia. Cursos com disciplinas de formação geral e algumas disciplinas de formação profissional específica poderiam muito bem ser oferecidos em milhares de municípios, contribuindo para a melhor preparação dos quadros das empresas e dos professores de ensino médio.
Dessa forma, torna-se imperioso que o Ministério da Educação se volte, também, para os "pequenos", assegurando-lhes os meios para atender, com qualidade, às necessidades do desenvolvimento local. Aliás, está na hora de redefinirmos um novo modelo de organização para o nosso ensino superior.
Tais operações financeiras trazem vantagens aos acionistas desses grupos, pois resultam, de imediato, na alta das ações nas bolsas. Do ponto de vista acadêmico, penso que é muito importante assegurar o cumprimento de certos princípios que devem nortear a nossa educação superior, onde as dimensões, vocações e peculiaridades regionais são parâmetros que não podem ser esquecidos. Assim, as operações de fusão e aquisição deverão garantir os padrões de qualidade na oferta de cursos, sempre preservadas as necessidades e identidades regionais.
Por outro lado, “instituições menores”, com algumas centenas de estudantes, ou até poucos milhares, poderão ter papel muito importante na educação superior, na medida em que temos hoje mais de 60% dos municípios onde as grandes instituições e universidades não chegam. Os “pequenos” não devem, portanto, ser esquecidos.
No início do século XX, quando os norte-americanos começaram a entender a importância de um curso superior de qualidade para o mercado de trabalho e para o desenvolvimento, foram implantados os “junior colleges”, que depois foram denominados de “community colleges”. Eles surgiram pela pressão por mais vagas nos cursos superiores, quase sempre de candidatos ainda sem o necessário preparo para o ingresso nas universidades, na época marcadas por uma forte tradição e pela formação nas profissões clássicas (direito, medicina e engenharia, entre outros).
Os cursos dos colleges, mais profissionalizantes, são similares aos atuais cursos superiores de tecnologia, oferecidos no Brasil. Os colleges foram responsáveis pela democratização do acesso na educação superior norte-americana. Atualmente, eles respondem por mais de 50% dos ingressantes no nível superior. Suas vantagens são grandes pois custam menos e são mais flexíveis. Li recentemente que, hoje, é possível a um cidadão norte-americano encontrar uma instituição de ensino superior num raio de até 50 km de sua moradia.
Em resumo, a rede de educação superior na América do Norte inclui unidades destinadas ao atendimento daqueles que tenham interesse em estudar na cidade onde vivem e, provavelmente, onde poderão trabalhar.
Quais são os nossos problemas?
Em primeiro lugar, a má distribuição geográfica dos cursos superiores, que não alcançam muitos municípios.
Em segundo, não estamos dando efetiva importância aos cursos superiores de tecnologia, que sequer são reconhecidos por muitas empresas.
Em terceiro lugar, insistimos no modelo hierarquizado, onde faculdades isoladas aspiram a se transformar em centros universitários e depois em universidades, em busca de uma autonomia para abrir novos cursos, que poderia ser concedida facilmente àquelas instituições com bom desempenho, independentemente de sua forma de organização.
Gosto sempre de lembrar que o MIT (Instituto de Tecnologia de Massachussets) e o Caltech (Instituto de Tecnologia da California), ambos com respeitáveis quadros de prêmios Nobel, não são universidades.
Finalmente, pela inexistência de um diploma superior de estudos gerais, como ocorre em vários países da união européia. Cursos com disciplinas de formação geral e algumas disciplinas de formação profissional específica poderiam muito bem ser oferecidos em milhares de municípios, contribuindo para a melhor preparação dos quadros das empresas e dos professores de ensino médio.
Dessa forma, torna-se imperioso que o Ministério da Educação se volte, também, para os "pequenos", assegurando-lhes os meios para atender, com qualidade, às necessidades do desenvolvimento local. Aliás, está na hora de redefinirmos um novo modelo de organização para o nosso ensino superior.
Vida medíocre
Ouço com frequência jovens me perguntarem o que fazer para não terem uma vida medíocre. A angústia deles é verdadeira. Os jovens hoje, por detrás de toda essa "fúria" de acharem que são uma "evolução" das gerações anteriores, morrem de medo.
Esse é o sentimento básico da chamada geração Y: o medo. O mundo é mais competitivo, as pessoas, mais egoístas, as opções de escolha, maiores (o que os faz viver como se a vida estivesse na prateleira de uma promoção do freeshop), e, por isso mesmo, a chance de fracassar, muito maior. A ansiedade de errar entre tantas opções os esmaga.
Por detrás desse blablablá de que os jovens de hoje são mais corajosos para seguir seus sonhos, está a boa e velha publicidade vendendo vidas que não existem.
Sei que alguns afirmam que viver segundo o desejo é a solução. Concordo em teoria, mas o problema é que viver segundo o desejo (seja lá o que isso for) é sempre um risco porque, como nos ensinou Arthur Schopenhauer (1788-1860), o desejo pode nos humilhar de duas formas básicas: negando-nos a realização de nosso desejo ou, pior, deixando que realizemos nosso desejo, porque assim perceberemos que, ao realizarmos nosso desejo, perdemos o tesão por ele, um pouco como o velho personagem Dom Juan e seu desespero diante da perda do desejo pela mulher seduzida.
Alguns acham que para escapar da vida medíocre devemos viver uma vida estética, como se diz em filosofia. Uma vida estética é uma vida vivida pelas sensações, como dizia Soren Kierkegaard (1813-1855). Uma vida estética é bastante sedutora: sexo, bebida, jogos, comida, viagens. Mas fracassa pela mesma razão que dizia Schopenhauer: uma hora o tesão pela sensação acaba.
O dinamarquês Kierkegaard levanta outra hipótese, que é a da vida ética. Essa proposta centra o sentido da vida numa busca de vida honesta. Cuidar da família, ser fiel no casamento, ser trabalhador, pagar impostos, investir em previdência privada. O fracasso será, entretanto, muito provável: famílias traem, um dia você pode ser trocado ou trocada por alguém mais jovem e belo, empregadores demitem, injustiças abundam, impostos só aumentam e pouco se ganha em troca. A aposta na vida ética é ainda mais frustrante porque você se sentirá um pouco ingênuo ao perceber que o mundo não leva em conta os esforços para termos uma vida "reta".
Outra opção, segundo nosso dinamarquês, é aderir a uma vida religiosa numa igreja. De nada adiantará porque igrejas são poços de repressão, mentiras e hipocrisias. De volta a estaca zero.
Para Kierkegaard, toda essa busca se dá porque somos um poço de angústia. Tememos uma vida inundada em angústia, e, por isso mesmo, tentamos toda forma de fuga, para ao final tombarmos na mesma constatação: medo, desespero e angústia.
O existencialista Kierkegaard aposta num "salto na fé", livre de instituições religiosas, tipo "você e Deus". Mas, ao mesmo tempo esse "salto" implica um ato de coragem que é apostar numa vida sem medo da angústia. Toda vez que tentamos escapar dela e fracassamos, mergulhamos no desespero: perdemos a esperança de que possamos viver uma vida sem angústia e pautada por alguma garantia contra nossos medos.
Friedrich Nietzsche (1844-1900) apostava numa vida vivida a partir "dos seus próprios valores", longe do espírito de rebanho que assola a humanidade, principalmente na modernidade, essa era dos rebanhos e manadas. Richard Rorty (1931-2007) traduzia essa ideia assim: "Buscar uma vida autoral". Isso significa o seguinte: viver de forma tal que sua vida seja sua obra de arte.
De volta a questão dos jovens: como não ter uma vida medíocre? Acho difícil não ter uma vida medíocre, porque, principalmente, você acaba tendo uma vida medíocre porque quer ter uma vida segura (o que é normal querer, afinal de contas). A modernidade é um parque de mediocridade regado a busca de segurança e garantias.
Creio que a receita para termos uma vida medíocre é termos muito medo. A proposta de Nietzsche e Rorty me parece bastante sedutora. Mas, quem está preparado para não ter medo de sofrer?
Esse é o sentimento básico da chamada geração Y: o medo. O mundo é mais competitivo, as pessoas, mais egoístas, as opções de escolha, maiores (o que os faz viver como se a vida estivesse na prateleira de uma promoção do freeshop), e, por isso mesmo, a chance de fracassar, muito maior. A ansiedade de errar entre tantas opções os esmaga.
Por detrás desse blablablá de que os jovens de hoje são mais corajosos para seguir seus sonhos, está a boa e velha publicidade vendendo vidas que não existem.
Alguns acham que para escapar da vida medíocre devemos viver uma vida estética, como se diz em filosofia. Uma vida estética é uma vida vivida pelas sensações, como dizia Soren Kierkegaard (1813-1855). Uma vida estética é bastante sedutora: sexo, bebida, jogos, comida, viagens. Mas fracassa pela mesma razão que dizia Schopenhauer: uma hora o tesão pela sensação acaba.
O dinamarquês Kierkegaard levanta outra hipótese, que é a da vida ética. Essa proposta centra o sentido da vida numa busca de vida honesta. Cuidar da família, ser fiel no casamento, ser trabalhador, pagar impostos, investir em previdência privada. O fracasso será, entretanto, muito provável: famílias traem, um dia você pode ser trocado ou trocada por alguém mais jovem e belo, empregadores demitem, injustiças abundam, impostos só aumentam e pouco se ganha em troca. A aposta na vida ética é ainda mais frustrante porque você se sentirá um pouco ingênuo ao perceber que o mundo não leva em conta os esforços para termos uma vida "reta".
Outra opção, segundo nosso dinamarquês, é aderir a uma vida religiosa numa igreja. De nada adiantará porque igrejas são poços de repressão, mentiras e hipocrisias. De volta a estaca zero.
Para Kierkegaard, toda essa busca se dá porque somos um poço de angústia. Tememos uma vida inundada em angústia, e, por isso mesmo, tentamos toda forma de fuga, para ao final tombarmos na mesma constatação: medo, desespero e angústia.
O existencialista Kierkegaard aposta num "salto na fé", livre de instituições religiosas, tipo "você e Deus". Mas, ao mesmo tempo esse "salto" implica um ato de coragem que é apostar numa vida sem medo da angústia. Toda vez que tentamos escapar dela e fracassamos, mergulhamos no desespero: perdemos a esperança de que possamos viver uma vida sem angústia e pautada por alguma garantia contra nossos medos.
Friedrich Nietzsche (1844-1900) apostava numa vida vivida a partir "dos seus próprios valores", longe do espírito de rebanho que assola a humanidade, principalmente na modernidade, essa era dos rebanhos e manadas. Richard Rorty (1931-2007) traduzia essa ideia assim: "Buscar uma vida autoral". Isso significa o seguinte: viver de forma tal que sua vida seja sua obra de arte.
De volta a questão dos jovens: como não ter uma vida medíocre? Acho difícil não ter uma vida medíocre, porque, principalmente, você acaba tendo uma vida medíocre porque quer ter uma vida segura (o que é normal querer, afinal de contas). A modernidade é um parque de mediocridade regado a busca de segurança e garantias.
Creio que a receita para termos uma vida medíocre é termos muito medo. A proposta de Nietzsche e Rorty me parece bastante sedutora. Mas, quem está preparado para não ter medo de sofrer?
Fica, SUS
A troca do soldado israelense Gilad Shalit por 1.027 prisioneiros, a maioria palestinos, e mesmo o sacrifício de um gorila de espécie ameaçada de extinção para salvar a vida de uma criança foram ações institucionais polêmicas. Parentes de vítimas manifestaram-se contra o acordo com o Hamas. A manutenção de animais em cativeiro e os perigos de interações artificiais com humanos também mobilizaram posicionamentos extremados. No âmbito das bravuras individuais, o elevado valor da vida humana impulsionou gestos para proteger desconhecidos como os do sargento Silvio Holenbach, que retirou um menino de um poço de ariranhas, e do músico Marcelo Yuka, tentando evitar um assalto. Em circunstâncias completamente distintas, os desempates se orientaram pelo provérbio do Talmud: quem salva uma vida, salva o mundo inteiro. Por outro lado, os atos suicidas terroristas, como o recente atentado no aeroporto de Istambul, foram movidos pela vingança e imolação individual em nome de um suposto bem comum.
Sistemas públicos de saúde pressupõem que o valor da vida de cada um é exatamente igual à dos outros, são projeções da coragem coletiva, todos salvam e são igualmente protegidos. Assim, organizam e atualizam a histórica experiência humana e as decisões políticas envolvidas com a prevenção de doenças e cuidados aos enfermos. Caracterizam-se pela preservação de valores solidários e investimentos crescentes das sociedades que os constituíram. No mundo, os gastos com saúde, especialmente os públicos, vêm aumentando, passaram de 3% do PIB em 1948 para 10% em 2013. Mas, no Brasil, os gastos federais com saúde como proporção do PIB mantiveram-se estáveis, enquanto a população crescia e envelhecia. Entre 2014 e 2015, houve retração porque os orçamentos da Saúde são vinculados à arrecadação e, portanto, ao crescimento econômico.
O SUS ficou no meio do caminho, a saúde é direito de todos, o acesso da população aumentou, mas persistiram problemas básicos de qualidade. Valores de igualdade e solidariedade misturaram-se com antigas e renovadas discriminações. Abriu-se uma cissura que pode ser compreendida como consequência de um processo de conflitos de interesses, no qual o público ainda se subordina ao privado, ou como defeito de fabricação.
Alguns economistas brasileiros julgam que o SUS está errado, justificam mais e definitivos cortes em função do mau uso que se faz das verbas para a saúde. Propõem que os que podem paguem, quem não o conseguir tenha uma assistência financiada pelos impostos e que o atendimento no SUS seja cobrado. Numa mesma frase expõem propostas diferentes, preveem ora o desmonte, ora a preservação dos centros de alta complexidade públicos. Então, ou a conversa não é séria, o fim do SUS é apenas uma ameaça, ficará tudo igual, mas pior, ou seria prudente e civilizado contribuir para um debate mais rigoroso.
O primeiro item de qualquer interlocução sensata sobre o SUS é o reconhecimento de que as restrições financeiras conjugadas a nomeações explicitamente clientelistas para o Ministério da Saúde, pelo governo interino, são a antítese do alocação eficiente de gastos. A seguir, é preciso não deixar passar em branco que a saúde foi objeto de cortes prévios e que as anunciadas medidas de limitação de despesas significariam perpetuar o desnivelamento. A terceira preocupação refere-se à relação entre a redução do peso da dívida e dos juros e impacto sobre as políticas sociais.
As divergências não são entre defensores irracionais e irresponsáveis de políticas universais e militantes perfilados para salvação da economia. Ser favorável ao equilíbrio fiscal não significa opor crescimento econômico ao desenvolvimento social e humano. A questão crucial é definir se recursos resultantes da equação menos divida e juros, mais investimentos, retornarão para assegurar o progressivo bem-estar social ou servirão para aprofundar as iniquidades.
Quando o assunto é SUS, alto lá. Passar a tesoura em políticas universais e manter as desonerações fiscais para determinados grupos de pressão é um requinte de crueldade. Em 2015, os gastos tributários do governo federal com saúde foram R$ 25 bilhões, um quarto do total do orçamento destinado ao SUS. Cortes de despesas que atingem a maioria da população e a reiteração da solicitude para direcionar fundos públicos para financiar gastos privados terão resultados previsíveis. Perderemos capacidade de resposta aos problemas de saúde. O enfrentamento de epidemias e realização de transplantes são atribuições públicas porque aplicamos regras elementares da organização de sistemas de saúde de países desenvolvidos. Nababos (expressão utilizada por um defensor da redução da política de saúde a um programa miserável para miseráveis), seja aqui, seja em países ricos, ficam em uma fila única de transplantes, entre outras razões porque não se encontra coração, fígado, medula, na prateleira, e sim dentro de seres humanos. O Brasil realiza transplante porque o SUS existe. A torcida para que pessoas possam continuar a viver, viver até melhor pós-transplante e o desvelo com o transporte dos órgãos e os critérios de prioridade para a definição de receptores existem porque somos sensíveis ao valor da vida.
Ligia Bahia
Sistemas públicos de saúde pressupõem que o valor da vida de cada um é exatamente igual à dos outros, são projeções da coragem coletiva, todos salvam e são igualmente protegidos. Assim, organizam e atualizam a histórica experiência humana e as decisões políticas envolvidas com a prevenção de doenças e cuidados aos enfermos. Caracterizam-se pela preservação de valores solidários e investimentos crescentes das sociedades que os constituíram. No mundo, os gastos com saúde, especialmente os públicos, vêm aumentando, passaram de 3% do PIB em 1948 para 10% em 2013. Mas, no Brasil, os gastos federais com saúde como proporção do PIB mantiveram-se estáveis, enquanto a população crescia e envelhecia. Entre 2014 e 2015, houve retração porque os orçamentos da Saúde são vinculados à arrecadação e, portanto, ao crescimento econômico.
Alguns economistas brasileiros julgam que o SUS está errado, justificam mais e definitivos cortes em função do mau uso que se faz das verbas para a saúde. Propõem que os que podem paguem, quem não o conseguir tenha uma assistência financiada pelos impostos e que o atendimento no SUS seja cobrado. Numa mesma frase expõem propostas diferentes, preveem ora o desmonte, ora a preservação dos centros de alta complexidade públicos. Então, ou a conversa não é séria, o fim do SUS é apenas uma ameaça, ficará tudo igual, mas pior, ou seria prudente e civilizado contribuir para um debate mais rigoroso.
O primeiro item de qualquer interlocução sensata sobre o SUS é o reconhecimento de que as restrições financeiras conjugadas a nomeações explicitamente clientelistas para o Ministério da Saúde, pelo governo interino, são a antítese do alocação eficiente de gastos. A seguir, é preciso não deixar passar em branco que a saúde foi objeto de cortes prévios e que as anunciadas medidas de limitação de despesas significariam perpetuar o desnivelamento. A terceira preocupação refere-se à relação entre a redução do peso da dívida e dos juros e impacto sobre as políticas sociais.
As divergências não são entre defensores irracionais e irresponsáveis de políticas universais e militantes perfilados para salvação da economia. Ser favorável ao equilíbrio fiscal não significa opor crescimento econômico ao desenvolvimento social e humano. A questão crucial é definir se recursos resultantes da equação menos divida e juros, mais investimentos, retornarão para assegurar o progressivo bem-estar social ou servirão para aprofundar as iniquidades.
Quando o assunto é SUS, alto lá. Passar a tesoura em políticas universais e manter as desonerações fiscais para determinados grupos de pressão é um requinte de crueldade. Em 2015, os gastos tributários do governo federal com saúde foram R$ 25 bilhões, um quarto do total do orçamento destinado ao SUS. Cortes de despesas que atingem a maioria da população e a reiteração da solicitude para direcionar fundos públicos para financiar gastos privados terão resultados previsíveis. Perderemos capacidade de resposta aos problemas de saúde. O enfrentamento de epidemias e realização de transplantes são atribuições públicas porque aplicamos regras elementares da organização de sistemas de saúde de países desenvolvidos. Nababos (expressão utilizada por um defensor da redução da política de saúde a um programa miserável para miseráveis), seja aqui, seja em países ricos, ficam em uma fila única de transplantes, entre outras razões porque não se encontra coração, fígado, medula, na prateleira, e sim dentro de seres humanos. O Brasil realiza transplante porque o SUS existe. A torcida para que pessoas possam continuar a viver, viver até melhor pós-transplante e o desvelo com o transporte dos órgãos e os critérios de prioridade para a definição de receptores existem porque somos sensíveis ao valor da vida.
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