terça-feira, 5 de janeiro de 2016
1500, o ano que não terminou
Um menino de dois anos foi assassinado. Um homem afagou seu rosto. E enfiou uma lâmina no seu pescoço. O bebê era um índio do povo Kaingang. Seu nome era Vitor Pinto. Sua família, como outras da aldeia onde ele vivia, havia chegado à cidade para vender artesanato pouco antes do Natal. Ficariam até o Carnaval. Abrigavam-se na estação rodoviária de Imbituba, no litoral de Santa Catarina. Era lá que sua mãe o alimentava quando um homem perfurou sua garganta. Era meio-dia de 30 de dezembro. O ano de 2015 estava bem perto do fim.
E o Brasil não parou para chorar o assassinato de uma criança de dois anos. Os sinos não dobraram por Vitor.
Sua morte sequer virou destaque na imprensa nacional. Se fosse meu filho, ou de qualquer mulher branca de classe média, assassinado nessas circunstâncias, haveria manchetes, haveria especialistas analisando a violência, haveria choro e haveria solidariedade. E talvez houvesse até velas e flores no chão da estação rodoviária, como existiu para as vítimas de terrorismo em Paris. Mas Vitor era um índio. Um bebê, mas indígena. Pequeno, mas indígena. Vítima, mas indígena. Assassinado, mas indígena. Perfurado, mas indígena. Esse “mas” é o assassino oculto. Esse “mas” é serial killer.
A fotografia que ilustrou as poucas notícias sobre a morte do curumim mostra o chão de cascalho e concreto da estação rodoviária. Um par de sandálias havaianas azul, com motivos infantis. Uma garrafa pet, uma estrelinha de brinquedo, daquelas de fazer molde na areia, uma tampa de plástico do que parece ser um baldinho de criança, uma pequena embalagem em formato de tubo, um pano florido amontoado junto à parede, talvez um lençol. É apresentada como “local do crime” ou como “os pertences do menino”.
Essa foto é um documento histórico. Tanto pelo que nela está quanto pelo que nela não está. Nela permanece o descartável, os objetos de plástico e de pet, os chinelos restados. Nela não está aquele que foi apagado da vida. A ausência é o elemento principal do retrato.
Os indígenas só podem existir no Brasil como gravura. Apreciados como ilustração de um passado superado, os primeiros habitantes dessa terra, com sua nudez e seus cocares, uma coisa bonita para se pendurar em algumas paredes ou estampar aqueles livros que decoram mesas de centro. Os indígenas têm lugar se estiverem empalhados, ainda que em quadros. No presente, sua persistência em existir é considerada inconveniente, de mau gosto. Há vários projetos tramitando no Congresso para escancarar suas terras para a exploração e o “progresso”. Há muitos territórios indígenas devidamente reconhecidos que o governo de Dilma Rousseff (PT) não homologa porque neles quer construir grandes obras ou porque teme ferir os interesses do agronegócio. Há uma Fundação Nacional do Índio (Funai) em progressivo desmonte, tão fragilizada que com frequência se revela também indecente. No passado, os índios são. No presente, não podem ser.
Como diz o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, os indígenas são especialistas em fim de mundo, já que o mundo deles acabou em 1500. Tiveram, porém, o desplante de sobreviver ao apocalipse promovido pelos deuses europeus. Ainda que centenas de milhares tenham sido exterminados, sobreviveram à extinção total. E porque sobreviveram continuam sendo mortos. Quando não se consegue matá-los, a estratégia é convertê-los em pobres nas periferias das cidades. Quando se tornam pobres urbanos, chamam-nos de “índios falsos”. Ou “paraguaios”, em mais um preconceito com o país vizinho. No passado, os índios são alegoria. “Olha, meu filho, como eram valentes os primeiros habitantes desta terra.” No presente, são “entraves ao desenvolvimento”. “Olha, meu filho, como são feios, sujos e preguiçosos esses índios fajutos.” Os índios precisam ser falsos porque suas terras são verdadeiras – e ricas.
Se Vitor era um entrave, esse entrave foi removido. Por isso essa foto é um documento histórico. Se houvesse alguma honestidade, é ela que deveria estar nas paredes.
Parece não bastar que Vitor, um bebê de dois anos, passasse semanas no chão de uma rodoviária porque a violência contra seu povo foi tanta e por tantos séculos e ainda hoje continua que seus pais, Sônia e Arcelino, precisam deixar a aldeia para vender artesanato. A preços baixos, porque desvalorizados são os artesãos. É importante perceber o nível de desamparo que leva alguém a considerar rodoviária um lugar seguro e acolhedor. Terminais rodoviários são locais de passagem, e a família de Vitor, assim como a de outros indígenas, abriga-se lá porque há movimento. Rodoviária é lugar de ninguém. E por isso nela costumam caber os mendigos, os meninos de rua, os bêbados, as putas, os loucos, os párias. E os índios. Ou cabiam. E já não cabem mais.
Leia mais o artigo de Eliane Brum
E o Brasil não parou para chorar o assassinato de uma criança de dois anos. Os sinos não dobraram por Vitor.
Sua morte sequer virou destaque na imprensa nacional. Se fosse meu filho, ou de qualquer mulher branca de classe média, assassinado nessas circunstâncias, haveria manchetes, haveria especialistas analisando a violência, haveria choro e haveria solidariedade. E talvez houvesse até velas e flores no chão da estação rodoviária, como existiu para as vítimas de terrorismo em Paris. Mas Vitor era um índio. Um bebê, mas indígena. Pequeno, mas indígena. Vítima, mas indígena. Assassinado, mas indígena. Perfurado, mas indígena. Esse “mas” é o assassino oculto. Esse “mas” é serial killer.
A fotografia que ilustrou as poucas notícias sobre a morte do curumim mostra o chão de cascalho e concreto da estação rodoviária. Um par de sandálias havaianas azul, com motivos infantis. Uma garrafa pet, uma estrelinha de brinquedo, daquelas de fazer molde na areia, uma tampa de plástico do que parece ser um baldinho de criança, uma pequena embalagem em formato de tubo, um pano florido amontoado junto à parede, talvez um lençol. É apresentada como “local do crime” ou como “os pertences do menino”.
A morte dos curumins não muda nenhuma
política, as fotos de sua ausência não comovem milhões
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Os indígenas só podem existir no Brasil como gravura. Apreciados como ilustração de um passado superado, os primeiros habitantes dessa terra, com sua nudez e seus cocares, uma coisa bonita para se pendurar em algumas paredes ou estampar aqueles livros que decoram mesas de centro. Os indígenas têm lugar se estiverem empalhados, ainda que em quadros. No presente, sua persistência em existir é considerada inconveniente, de mau gosto. Há vários projetos tramitando no Congresso para escancarar suas terras para a exploração e o “progresso”. Há muitos territórios indígenas devidamente reconhecidos que o governo de Dilma Rousseff (PT) não homologa porque neles quer construir grandes obras ou porque teme ferir os interesses do agronegócio. Há uma Fundação Nacional do Índio (Funai) em progressivo desmonte, tão fragilizada que com frequência se revela também indecente. No passado, os índios são. No presente, não podem ser.
Como diz o antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, os indígenas são especialistas em fim de mundo, já que o mundo deles acabou em 1500. Tiveram, porém, o desplante de sobreviver ao apocalipse promovido pelos deuses europeus. Ainda que centenas de milhares tenham sido exterminados, sobreviveram à extinção total. E porque sobreviveram continuam sendo mortos. Quando não se consegue matá-los, a estratégia é convertê-los em pobres nas periferias das cidades. Quando se tornam pobres urbanos, chamam-nos de “índios falsos”. Ou “paraguaios”, em mais um preconceito com o país vizinho. No passado, os índios são alegoria. “Olha, meu filho, como eram valentes os primeiros habitantes desta terra.” No presente, são “entraves ao desenvolvimento”. “Olha, meu filho, como são feios, sujos e preguiçosos esses índios fajutos.” Os índios precisam ser falsos porque suas terras são verdadeiras – e ricas.
Se Vitor era um entrave, esse entrave foi removido. Por isso essa foto é um documento histórico. Se houvesse alguma honestidade, é ela que deveria estar nas paredes.
Parece não bastar que Vitor, um bebê de dois anos, passasse semanas no chão de uma rodoviária porque a violência contra seu povo foi tanta e por tantos séculos e ainda hoje continua que seus pais, Sônia e Arcelino, precisam deixar a aldeia para vender artesanato. A preços baixos, porque desvalorizados são os artesãos. É importante perceber o nível de desamparo que leva alguém a considerar rodoviária um lugar seguro e acolhedor. Terminais rodoviários são locais de passagem, e a família de Vitor, assim como a de outros indígenas, abriga-se lá porque há movimento. Rodoviária é lugar de ninguém. E por isso nela costumam caber os mendigos, os meninos de rua, os bêbados, as putas, os loucos, os párias. E os índios. Ou cabiam. E já não cabem mais.
Leia mais o artigo de Eliane Brum
A lavagem do futuro
A proposta da Base Nacional Comum Curricular mutila processos globais. Aposta na sincronia contra a diacronia. É fanática pelo presentismo. Incentiva ódios raciais e valores terceiro-mundistas superados. Combate o eurocentrismo com um brasilcentrismo inconsistente. É uma aposta no obscurantismo
A Revolução Cultural do PT
O Ministério da Educação está preparando uma Revolução Cultural que transformará Mao Tsé-Tung em um moderado pedagogo, quase um “reacionário burguês.” Sob o disfarce de “consulta pública”, pretende até junho “aprovar” uma radical mudança nos currículos dos ensinos fundamental e médio — antigos primeiro e segundo graus. Nem a União Soviética teve coragem de fazer uma mudança tão drástica como a “Base Nacional Comum Curricular.”
No caso do ensino de História, é um duro golpe. Mais ainda: é um crime de lesa-pátria. Vou comentar somente o currículo de História do ensino médio. Foi simplesmente suprimida a História Antiga. Seguindo a vontade dos comissários-educadores do PT, não teremos mais nenhuma aula que trata da Mesopotâmia ou do Egito. Da herança greco-latina os nossos alunos nada saberão. A filosofia grega para que serve? E a democracia ateniense? E a cultura grega? E a herança romana? E o nascimento do cristianismo? E o Império Romano? Isto só para lembrar temas que são essenciais à nossa cultura, à nossa história, à nossa tradição.
Mas os comissários-educadores — e sua sanha anticivilizatória — odeiam também a História Medieval. Afinal, são dez séculos inúteis, presumo. Toda a expansão do cristianismo e seus reflexos na cultura ocidental, o mundo islâmico, as Cruzadas, as transformações econômico-políticas, especialmente a partir do século XI, são desprezadas. O Renascimento — em todas as suas variações — foi simplesmente ignorado. Parece mentira, mas, infelizmente, não é. Mas tem mais: a Revolução Industrial não é citada uma vez sequer, assim como a Revolução Francesa ou as revoluções inglesas do século XVII.
O apagamento da História, ao estilo Ministério da Verdade de “1984,” não perdoou a história dos Estados Unidos — neste caso, abriu exceção somente para a região onde esteve presente a escravidão. Do século XIX europeu, tudo foi jogado na lata de lixo: as unificações alemã e italiana, as revoluções — como a de 1848 —, os dilemas político-ideológicos, as mudanças econômicas, entre outros temas clássicos e indispensáveis à nossa História.
Os policiais da verdade não perdoaram também a História do Brasil. Os movimentos pré-independentistas — como as Conjurações Mineira e Baiana — não existiram, ao menos no novo currículo. As transformações do século XIX, a economia cafeeira, a transição para a industrialização foram desconsideradas, assim como a relação entre as diversas constituições e o momento histórico do país, isto só para ficar em alguns exemplos.
Mas, afinal, o que os alunos vão estudar? No primeiro ano, “mundos ameríndio, africanos e afro-brasileiros.” Qual objetivo? “Analisar a pluralidade de concepções históricas e cosmológicas de povos africanos, europeus e indígenas relacionados a memórias, mitologias, tradições orais e a outras formas de conhecimento e de transmissão de conhecimento.” E também: “interpretar os movimentos sociais negros e quilombolas no Brasil contemporâneo, estabelecendo relações entre esses movimentos e as trajetórias históricas dessas populações, do século XIX ao século XXI.” Sem esquecer de “valorizar e promover o respeito às culturas africanas, afro-americanas (povos negros das Américas Central e do Sul) e afro-brasileiras, percebendo os diferentes sentidos, significados e representações de ser africano e ser afrobrasileiro.”
No segundo ano — quase uma repetição do primeiro — o estudo é sobre os “mundos americanos.” Objetivo: “analisar a pluralidade de concepções históricas e cosmológicas das sociedades ameríndias a memórias, mitologias, tradições e outras formas de construção e transmissão de conhecimento, tais como as cosmogonias inca, maia, tupi e jê.” Ao imperialismo americano, claro, é dado um destaque especial. Como contraponto, devem ser estudadas as Revoluções Boliviana e Cubana; sim, são exemplos de democracia. E, no caso das ditaduras, a sugestão é analisar o Chile de Pinochet — de Cuba, nem tchum.
No terceiro ano, chegamos aos “mundos europeus e asiáticos.” Se a Guerra Fria foi ignorada, não foi deixado de lado o estudo da migração japonesa para o Paraguai na primeira metade do século XX (?). O panfletarismo fica escancarado quando pretende “problematizar as juventudes, discutindo massificação cultural, consumo e pertencimentos em diversos espaços no Brasil e nos mundos europeus e asiáticos nos séculos XX e XXI.” Ou quando propõe “relacionar as sociedades civis e os movimentos sociais aos processos de participação política nos mundos europeus e asiáticos, nos séculos XX e XXI, comparando-os com o Brasil contemporâneo.”
Quem assina o documento é o ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro, um especialista brasileiro em Thomas Hobbes. Porém, Hobbes ou o momento em que viveu (o século XVII inglês) são absolutamente ignorados pelos comissários-educadores. Para eles, de nada vale conhecer Hobbes, Locke, Platão, Montesquieu, Tocqueville, Maquiavel, Rousseau ou Sócrates. São pensadores do mundo europeu. O que importa são as histórias ameríndias, africanas e afro-brasileiras.
O documento está recheado de equívocos, exemplos estapafúrdios, de panfletarismo barato, de desconhecimento da História. Os programas dos cursos universitários de História foram jogados na lata de lixo e há um evidente descompasso com a nossa produção historiográfica. A proposta é um culto à ignorância. Nenhuma democracia no mundo ocidental tem um currículo como esse. Qual foi a inspiração? A Bolívia de Morales? A Venezuela de Chávez? A Cuba de Castro? Ou Lula, aquele que dissertou sobre a passagem de Napoleão Bonaparte pela China?
Marco Antonio Villa
No caso do ensino de História, é um duro golpe. Mais ainda: é um crime de lesa-pátria. Vou comentar somente o currículo de História do ensino médio. Foi simplesmente suprimida a História Antiga. Seguindo a vontade dos comissários-educadores do PT, não teremos mais nenhuma aula que trata da Mesopotâmia ou do Egito. Da herança greco-latina os nossos alunos nada saberão. A filosofia grega para que serve? E a democracia ateniense? E a cultura grega? E a herança romana? E o nascimento do cristianismo? E o Império Romano? Isto só para lembrar temas que são essenciais à nossa cultura, à nossa história, à nossa tradição.
O apagamento da História, ao estilo Ministério da Verdade de “1984,” não perdoou a história dos Estados Unidos — neste caso, abriu exceção somente para a região onde esteve presente a escravidão. Do século XIX europeu, tudo foi jogado na lata de lixo: as unificações alemã e italiana, as revoluções — como a de 1848 —, os dilemas político-ideológicos, as mudanças econômicas, entre outros temas clássicos e indispensáveis à nossa História.
Os policiais da verdade não perdoaram também a História do Brasil. Os movimentos pré-independentistas — como as Conjurações Mineira e Baiana — não existiram, ao menos no novo currículo. As transformações do século XIX, a economia cafeeira, a transição para a industrialização foram desconsideradas, assim como a relação entre as diversas constituições e o momento histórico do país, isto só para ficar em alguns exemplos.
Mas, afinal, o que os alunos vão estudar? No primeiro ano, “mundos ameríndio, africanos e afro-brasileiros.” Qual objetivo? “Analisar a pluralidade de concepções históricas e cosmológicas de povos africanos, europeus e indígenas relacionados a memórias, mitologias, tradições orais e a outras formas de conhecimento e de transmissão de conhecimento.” E também: “interpretar os movimentos sociais negros e quilombolas no Brasil contemporâneo, estabelecendo relações entre esses movimentos e as trajetórias históricas dessas populações, do século XIX ao século XXI.” Sem esquecer de “valorizar e promover o respeito às culturas africanas, afro-americanas (povos negros das Américas Central e do Sul) e afro-brasileiras, percebendo os diferentes sentidos, significados e representações de ser africano e ser afrobrasileiro.”
No segundo ano — quase uma repetição do primeiro — o estudo é sobre os “mundos americanos.” Objetivo: “analisar a pluralidade de concepções históricas e cosmológicas das sociedades ameríndias a memórias, mitologias, tradições e outras formas de construção e transmissão de conhecimento, tais como as cosmogonias inca, maia, tupi e jê.” Ao imperialismo americano, claro, é dado um destaque especial. Como contraponto, devem ser estudadas as Revoluções Boliviana e Cubana; sim, são exemplos de democracia. E, no caso das ditaduras, a sugestão é analisar o Chile de Pinochet — de Cuba, nem tchum.
No terceiro ano, chegamos aos “mundos europeus e asiáticos.” Se a Guerra Fria foi ignorada, não foi deixado de lado o estudo da migração japonesa para o Paraguai na primeira metade do século XX (?). O panfletarismo fica escancarado quando pretende “problematizar as juventudes, discutindo massificação cultural, consumo e pertencimentos em diversos espaços no Brasil e nos mundos europeus e asiáticos nos séculos XX e XXI.” Ou quando propõe “relacionar as sociedades civis e os movimentos sociais aos processos de participação política nos mundos europeus e asiáticos, nos séculos XX e XXI, comparando-os com o Brasil contemporâneo.”
Quem assina o documento é o ex-ministro da Educação Renato Janine Ribeiro, um especialista brasileiro em Thomas Hobbes. Porém, Hobbes ou o momento em que viveu (o século XVII inglês) são absolutamente ignorados pelos comissários-educadores. Para eles, de nada vale conhecer Hobbes, Locke, Platão, Montesquieu, Tocqueville, Maquiavel, Rousseau ou Sócrates. São pensadores do mundo europeu. O que importa são as histórias ameríndias, africanas e afro-brasileiras.
O documento está recheado de equívocos, exemplos estapafúrdios, de panfletarismo barato, de desconhecimento da História. Os programas dos cursos universitários de História foram jogados na lata de lixo e há um evidente descompasso com a nossa produção historiográfica. A proposta é um culto à ignorância. Nenhuma democracia no mundo ocidental tem um currículo como esse. Qual foi a inspiração? A Bolívia de Morales? A Venezuela de Chávez? A Cuba de Castro? Ou Lula, aquele que dissertou sobre a passagem de Napoleão Bonaparte pela China?
Marco Antonio Villa
Flácidos solilóquios
Olhando de longe, parece confusão. De perto, é confusão. Muito barulho. Ou ruídos apenas. É ajuntamento de instrumentos sem formar orquestra. Vozes que não formam coral. Acusações e desentendimentos. Brigas. É a isso que tudo foi reduzido. Nenhuma luz. Muito calor.
A cada discussão improdutiva, os adjetivos tem mais destaque. Mais importância. Constroem menos, mas constrangem (ou tentam constranger) mais. Tanta preocupação com a forma denuncia ausência completa de conteúdo.
Tudo consequência do desconforto com a diversidade de opiniões. Excesso de certezas. Falta de debate. Primitivismo. Nas noticias. No noticiário. Nas mídias sociais. Por toda parte. Até onde alcança a vista. Ou até onde aguentam os ouvidos.
Viver é fazer escolhas. Por isso é natural que existam opiniões divergentes. E é condição necessária que cada sociedade escolha métodos e maneiras de lidar com estas divergências. Intolerância é apenas um deles. E dos mais ineficientes.
Sociedades mais desenvolvidas reconhecem a existência de divergências. E lidam com elas produtivamente. Reconhecem que diversidade não é caos. E que caos não é bom para ninguém. Investem em regras, escritas ou não, para regular e resolver disputas, sempre tentando considerar e conciliar crenças e interesses divergentes. Diversidade de opinião vira oportunidade.
Reconhecer diferenças e o direito a elas. Mas começam a convivência identificando as similaridades. Sem isto, coexistência é impossível. Afinal, não se convive apenas ressaltando as discordâncias. Dialogo se constrói através do reconhecimento de que existem também consensos.
Entre os consensos, talvez os mais importantes sejam aqueles que determinam as regras do jogo. Ou seja, estabelecem o que pode e o que não pode ser feito. São impessoais, universais, independentes de valores ou crenças.
Regras claras e aceitas aprofundam o conteúdo e elevam a qualidade da discussão. Não condicionam quem deve ou não deve ser punido de acordo com conveniências ou interesses mutáveis ou imutáveis. Focam isto sim, nos comportamentos que devem ser coibidos, independente (ou apesar) de seus autores.
São estas regras que nos faltam. Sem elas, tudo é confusão, caos, ruído. Discussões estéreis. Flácidos solilóquios que sequer fazem dormitar o bovino.
A cada discussão improdutiva, os adjetivos tem mais destaque. Mais importância. Constroem menos, mas constrangem (ou tentam constranger) mais. Tanta preocupação com a forma denuncia ausência completa de conteúdo.
Tudo consequência do desconforto com a diversidade de opiniões. Excesso de certezas. Falta de debate. Primitivismo. Nas noticias. No noticiário. Nas mídias sociais. Por toda parte. Até onde alcança a vista. Ou até onde aguentam os ouvidos.
Viver é fazer escolhas. Por isso é natural que existam opiniões divergentes. E é condição necessária que cada sociedade escolha métodos e maneiras de lidar com estas divergências. Intolerância é apenas um deles. E dos mais ineficientes.
Sociedades mais desenvolvidas reconhecem a existência de divergências. E lidam com elas produtivamente. Reconhecem que diversidade não é caos. E que caos não é bom para ninguém. Investem em regras, escritas ou não, para regular e resolver disputas, sempre tentando considerar e conciliar crenças e interesses divergentes. Diversidade de opinião vira oportunidade.
Reconhecer diferenças e o direito a elas. Mas começam a convivência identificando as similaridades. Sem isto, coexistência é impossível. Afinal, não se convive apenas ressaltando as discordâncias. Dialogo se constrói através do reconhecimento de que existem também consensos.
Entre os consensos, talvez os mais importantes sejam aqueles que determinam as regras do jogo. Ou seja, estabelecem o que pode e o que não pode ser feito. São impessoais, universais, independentes de valores ou crenças.
Regras claras e aceitas aprofundam o conteúdo e elevam a qualidade da discussão. Não condicionam quem deve ou não deve ser punido de acordo com conveniências ou interesses mutáveis ou imutáveis. Focam isto sim, nos comportamentos que devem ser coibidos, independente (ou apesar) de seus autores.
São estas regras que nos faltam. Sem elas, tudo é confusão, caos, ruído. Discussões estéreis. Flácidos solilóquios que sequer fazem dormitar o bovino.
Já é ruína
Numa noite de outubro, dois anos atrás, ela convocou uma cadeia nacional de rádio e televisão para comunicar: “Passamos a garantir, para o futuro, uma massa de recursos jamais imaginada para a Educação e para a Saúde.”
Enlevada num tom de realismo mágico, anunciou a alquimia: “A fabulosa riqueza que jazia nas profundezas dos nossos mares, agora descoberta, começa a despertar. Desperta trazendo mais recursos, mais emprego, mais tecnologia, mais soberania e, sobretudo, mais futuro para o Brasil.”
Para gerenciar a riqueza submersa a mais de quatro mil metros no Atlântico, Dilma Rousseff criou a estatal Empresa Brasileira de Administração de Petróleo e Gás Natural S.A.(PPSA). Deu-lhe amplos poderes para defender os interesses da União, o que inclui a gestão dos contratos de partilha, controle dos custos e das operações de exploração e produção de todo petróleo extraído da camada pré-sal.
Não é pouco. A combalida Petrobras, que nesses campos já produz mais de um milhão de barris, planeja concentrar investimentos numa área de tamanho equivalente a 150 mil campos de futebol, a 170 quilômetros de distância do litoral do Estado do Rio. Libra, como é conhecida nos mapas marítimos, é uma das maiores áreas do planeta reservada à exploração de petróleo. Foi leiloada a uma sociedade composta pela Petrobras, a anglo-holandesa Shell, a francesa Total e as chinesas CNPC e CNOOC.
Dilma continua com o seu discurso surrealista, com toques de absolutismo groucho-marxista: “Eu represento a soberania nacional, do pré-sal, a defesa dos 30%, a defesa do conteúdo nacional... Esse golpe (o processo de impeachment) não é contra mim, é contra o que eu represento, contra a soberania, contra o modelo de partilha do pré-sal”— disse semanas atrás a uma plateia de sindicalistas aliados do governo.
Longe do espelho d’água do Palácio do Planalto, sobram certezas sobre o desgoverno na condução dos negócios do pré-sal. A empresa estatal (PPSA) criada para recolher a “massa de recursos jamais imaginada” para Saúde e Educação mal começou e já está sucateada.
Tem 15 empregados, acumula prejuízos e patrimônio líquido negativo. Sem dinheiro, atravessou 2015 sobrevivendo da caridade privada. Fornecedores cederam-lhe licenças temporárias gratuitas de software.
Perplexos, auditores do Tribunal de Contas da União registraram: “Há sérios riscos de se comprometer ou até inviabilizar a realização de importantes tarefas técnicas, tais como: a) interpretação sísmica e modelagem geológica; b) construção de modelos estáticos e dinâmicos para simulação de fluxo em reservatórios petrolíferos; c) análise de dados de perfuração de poços e de desempenho petrofísica; d) testes de modelagem de escoamento.”
É real a ameaça aos resultados econômicos para a União, adverte o tribunal.
Com 28 meses de existência, a estatal do pré-sal pode ser vista como novo símbolo do governo Dilma. Parecia que ainda era construção, mas já é ruína.
José Casado
Enlevada num tom de realismo mágico, anunciou a alquimia: “A fabulosa riqueza que jazia nas profundezas dos nossos mares, agora descoberta, começa a despertar. Desperta trazendo mais recursos, mais emprego, mais tecnologia, mais soberania e, sobretudo, mais futuro para o Brasil.”
Arrematou, com esmero ilusionista: “Começamos a transformar uma riqueza finita, que é o petróleo, em um tesouro indestrutível, que é a Educação de alta qualidade. Estamos transformando o pré-sal no nosso passaporte para uma sociedade mais justa.”
Para gerenciar a riqueza submersa a mais de quatro mil metros no Atlântico, Dilma Rousseff criou a estatal Empresa Brasileira de Administração de Petróleo e Gás Natural S.A.(PPSA). Deu-lhe amplos poderes para defender os interesses da União, o que inclui a gestão dos contratos de partilha, controle dos custos e das operações de exploração e produção de todo petróleo extraído da camada pré-sal.
Não é pouco. A combalida Petrobras, que nesses campos já produz mais de um milhão de barris, planeja concentrar investimentos numa área de tamanho equivalente a 150 mil campos de futebol, a 170 quilômetros de distância do litoral do Estado do Rio. Libra, como é conhecida nos mapas marítimos, é uma das maiores áreas do planeta reservada à exploração de petróleo. Foi leiloada a uma sociedade composta pela Petrobras, a anglo-holandesa Shell, a francesa Total e as chinesas CNPC e CNOOC.
Dilma continua com o seu discurso surrealista, com toques de absolutismo groucho-marxista: “Eu represento a soberania nacional, do pré-sal, a defesa dos 30%, a defesa do conteúdo nacional... Esse golpe (o processo de impeachment) não é contra mim, é contra o que eu represento, contra a soberania, contra o modelo de partilha do pré-sal”— disse semanas atrás a uma plateia de sindicalistas aliados do governo.
Longe do espelho d’água do Palácio do Planalto, sobram certezas sobre o desgoverno na condução dos negócios do pré-sal. A empresa estatal (PPSA) criada para recolher a “massa de recursos jamais imaginada” para Saúde e Educação mal começou e já está sucateada.
Tem 15 empregados, acumula prejuízos e patrimônio líquido negativo. Sem dinheiro, atravessou 2015 sobrevivendo da caridade privada. Fornecedores cederam-lhe licenças temporárias gratuitas de software.
Perplexos, auditores do Tribunal de Contas da União registraram: “Há sérios riscos de se comprometer ou até inviabilizar a realização de importantes tarefas técnicas, tais como: a) interpretação sísmica e modelagem geológica; b) construção de modelos estáticos e dinâmicos para simulação de fluxo em reservatórios petrolíferos; c) análise de dados de perfuração de poços e de desempenho petrofísica; d) testes de modelagem de escoamento.”
É real a ameaça aos resultados econômicos para a União, adverte o tribunal.
Com 28 meses de existência, a estatal do pré-sal pode ser vista como novo símbolo do governo Dilma. Parecia que ainda era construção, mas já é ruína.
José Casado
O poder das palavras
Um dos sinais mais eloquentes da fraqueza do Partido dos Trabalhadores é o seu menosprezo pelo estudo e pela teoria. Ele nunca teve um jornal, a forma por excelência de discussão dos partidos de massa. E a sua revista de estudos, "Teoria e Debate", há décadas sobrevive à margem da dinâmica partidária, pouco influenciando nos seus destinos.
Nesses tempos de convulsão, a ausência de pensamento organizado faz com que o partido medre num deus nos acuda intelectual. No máximo, elefantes da sigla recorrem ao cavalo de batalha de fazer política via grande imprensa, na qual misturam fatos do cotidiano com questões de fundo.
Foi o que ocorreu no fim de semana, com as entrevistas dos ministros Jaques Wagner e Patrus Ananias, o primeiro à Folha e o outro a "O Globo". Wagner disse que o PT errou ao não promover uma reforma política e se "lambuzou" no financiamento de campanhas eleitorais – eufemismo para grossa corrupção.
Já Ananias misturou expressões católicas e maoístas para reclamar de o partido não ter feito nem "exame de consciência" nem "autocrítica construtiva", que conduziriam a um "mea culpa público".
Não é pouco: ambos aludem reformas estruturais e à degeneração de parte da direção do PT, cujos membros abandonaram a defesa de interesses dos trabalhadores para se locupletarem. Mas as suas palavras são largamente insuficientes. Wagner e Ananias não saem do epidérmico, sem avançar uma argumentação consistente. O PT vive assim num paradoxo permanente.
Por um lado, ele é o mais democrático dos partidos nacionais. Faz congressos e conferências periódicas. As minorias se expressam e os filiados votam livremente resoluções as mais diversas. De outro, temas cruciais não são esmiuçados a fundo, de maneira a que se saiba o contexto no qual a organização pretende intervir.
Nessa incongruência, Rui Falcão é o presidente ideal para o PT. Advogado de formação e jornalista profissional, além de leitor de Balzac, ele bem sabe do gume da palavra escrita, do seu valor para definir rumos possíveis e convincentes.
Até agora, porém, Rui Falcão tem usado tudo o que sabe para em matéria de escrita obter o contrário: documentos partidários anódinos, que diluem antagonismos para chegar a obviedades cegas. De caso pensado, prescinde da lâmina cortante da prática afiada em estudos e criatividade.
O menoscabo pela teoria não diz respeito só ao PT. O Brasil teve a sua maior catástrofe ecológica, o rompimento da barragem da Samarco. E a Rede, de Marina Silva, não produziu nada que preste acerca das implicações ambientais do modo de desenvolvimento em vigor.
Não é preciso retornar à sacrossanta herança escravocrata para perceber que ela explica algo, mas não tudo, da pasmaceira intelectual na presente conjuntura. O marasmo não é geral porque há um punhado de exceções. É o caso de André Singer, Paulo Arantes, Tarso Genro e Marcos Nobre, que têm publicado ensaios bastante diversos entre si. O que os une é o silêncio que a direção do PT lhes dispensa.
Como a crise não arrefece (ontem mesmo as bolsas caíram ao redor do mundo), uma hora o partido terá que enfrentá-la a sério. Aí, o PT será obrigado a pensar a sua história e as decisões que vem tomando. Só então as palavras poderão readquirir o seu poder maior, o de nortear a ação.
Cada macaco pesado em seu galho gordo
Sempre que vejo aquelas cenas de guerra em filmes épicos, fico me perguntando o que devem sentir os caras do exército que levam o bumbo e a corneta. Sim, porque morrer montado numa baioneta ou empunhando metralhadoras é algo bem diferente, psicologicamente.Defender-se com tambores não parece ser a coisa mais sensata do mundo para quem está diante de uma guerra, mas é parte do jogo e assim deve ser encarada.
É por isso que discordo do comentário do Well, que acha que “discussões e defesas de pontos de vista” são perda de tempo. O que vale é a ação. Pois eu lembro ao ilustre comentarista que alguém precisa levar o bumbo e a corneta numa guerra. Nem por isso são menos corajosos aqueles que manejam este tipo de instrumento. Nem por isso estão a salvo dos tiros de canhão dos inimigos. Fazem seu papel na contenda, igualmente digno de heroísmo.
Digo isso porque também é cansativo ter de explicar aos aqui presentes que não adianta partir para o confronto físico, como querem alguns. É justamente o contrário. Só a consciência do que estão fazendo estes bandidos pode moldar uma sociedade mais vigilante quanto a vigarices. É um processo. Um longo processo de conscientização e do despertar da percepção do que são e o que fazem com os pobres cofres públicos.
É a denúncia constante de um método e de seus agentes. Se vocês querem saber, o país parou porque secou a propina. Era ela que movia as gordas partes pudicas desse Estado com elefantíase. Que azeitava o andamento dos carimbaços. Sem ela, ficam sem gorjeta os garçons do erário. Ficam sem café os tomadores de café das repartições públicas. Contratados apenas para agitar bandeirinhas, esses escrotos com crachá não sabem fazer outra coisa na vida. Ou alguém acha mesmo aqui que dona du chefe precisa de mais de cem mil cargos de confiança pendurados em suas tetas públicas?
Esse é o exército dessa gente, meus caros. O ralo por onde nossa grana se esvai feito lama rala. A origem e o destino de uma seita vagabunda, que não aceita ser defenestrada do poder para pegar no batente. Denunciar isso “diuturna e noturnamente” tem sido o meu papel por aqui. O nosso papel. Meu bumbo e minha corneta em meio à guerra. Nem por um minuto pensei em trocar o instrumento por uma garrucha, e sim por uma vistosa panela.
Essa gente tem que sucumbir na base da panelada no lombo, meus caros. Do linchamento moral. Da consciência de que serão encaminhados ao ostracismo, jogados na lata do lixo de história. Quantos aqui já entenderam não se tratar de um caso de política, mas de polícia? Algemas na tigrada é o que eu espero em 2106. Prendam o líder do bando e vocês verão o país que nascerá dessa providência. Simples assim.
É por isso que discordo do comentário do Well, que acha que “discussões e defesas de pontos de vista” são perda de tempo. O que vale é a ação. Pois eu lembro ao ilustre comentarista que alguém precisa levar o bumbo e a corneta numa guerra. Nem por isso são menos corajosos aqueles que manejam este tipo de instrumento. Nem por isso estão a salvo dos tiros de canhão dos inimigos. Fazem seu papel na contenda, igualmente digno de heroísmo.
É a denúncia constante de um método e de seus agentes. Se vocês querem saber, o país parou porque secou a propina. Era ela que movia as gordas partes pudicas desse Estado com elefantíase. Que azeitava o andamento dos carimbaços. Sem ela, ficam sem gorjeta os garçons do erário. Ficam sem café os tomadores de café das repartições públicas. Contratados apenas para agitar bandeirinhas, esses escrotos com crachá não sabem fazer outra coisa na vida. Ou alguém acha mesmo aqui que dona du chefe precisa de mais de cem mil cargos de confiança pendurados em suas tetas públicas?
Esse é o exército dessa gente, meus caros. O ralo por onde nossa grana se esvai feito lama rala. A origem e o destino de uma seita vagabunda, que não aceita ser defenestrada do poder para pegar no batente. Denunciar isso “diuturna e noturnamente” tem sido o meu papel por aqui. O nosso papel. Meu bumbo e minha corneta em meio à guerra. Nem por um minuto pensei em trocar o instrumento por uma garrucha, e sim por uma vistosa panela.
Essa gente tem que sucumbir na base da panelada no lombo, meus caros. Do linchamento moral. Da consciência de que serão encaminhados ao ostracismo, jogados na lata do lixo de história. Quantos aqui já entenderam não se tratar de um caso de política, mas de polícia? Algemas na tigrada é o que eu espero em 2106. Prendam o líder do bando e vocês verão o país que nascerá dessa providência. Simples assim.
A quem rezam!
No Brasil, a palavra “esquerda” continua o ópio dos intelectuais. Pressupõe uma “substância” que ninguém mais sabe qual é, mas que “fortalece”, enobrece qualquer discurso. O termo é esquivo, encobre erros pavorosos e até justifica massacres. E eles se sentem “vítimas” da nossa desconfiança de estúpidos que ainda não viram a “verdade”. Eles não querem entender que a miséria do país é uma consequência, e não a causa. Eles amam a miséria, a academia cultiva a “desigualdade” como uma flor. A miséria tem de ser mantida “in vitro” para justificar teorias velhas e absolver incompetência. Para eles, o socialismo é um dogma. Diante dele, abole-se o sentido crítico. É como duvidar da virgindade de Nossa Senhora.Arnaldo Jabor
Agente da ignorância
Não importa em que ponto do espectro político você se veja, em algum momento deste ano a frase “Isso a imprensa não mostra” chegou aos seus ouvidos. E você concordou. É natural: em tempos extremados, jornais são alvo de cobrança ainda mais intensa, e nem sempre respondem à altura. Mas, antes de repetir esse bordão como uma sentença, cabe reflexão.
Esse consumo nem sempre é intencional. O American Press Institute revela que dois terços dos jovens entre 18 e 34 anos diariamente acessam notícias online, que chegam a eles por meio de perfis de amigos nas redes sociais. É nesse ponto que as coisas se complicam.
No Facebook, por exemplo, os usuários têm acesso a 1.500 mensagens, em média, por dia, mas só têm tempo para ver 300. Para que essas poucas centenas sejam as mais interessantes, entram em cena algoritmos matemáticos que selecionam assuntos de acordo com perfil, histórico de navegação, presença de fotos ou vídeos e, mais recentemente, pela colaboração de pessoas pagas para usar o Facebook e oferecer um feedback da eficiência desses filtros.
Uma consequência é que os usuários ficam menos expostos a opiniões diferentes das suas. Um estudo publicado na revista “Science”, em maio de 2015, mostra que os entrevistados identificados como “progressistas” são expostos a 24% de conteúdo diverso de sua crença, enquanto, para os “conservadores”, o índice era de 35%.
Não que a internet seja má ou uma “Matrix” que controle a que informações as pessoas poderão ter acesso. São as escolhas individuais que definem o conteúdo, não a partir da utilidade da informação, mas de quanto ela é agradável. Não confrontado por ideias diversas das suas, o usuário é livre para se aferrar a preconceitos e radicalismos. Num processo em que não faltam hedonismo e narcisismo, somos cada vez mais agentes de nossa própria ignorância.
Cabe-nos ser leitores críticos, seja nas mídias tradicionais ou nas digitais, buscar fontes de informação confiáveis e precisas, bem como nos abrirmos a argumentos que questionem nossas crenças antes de formarmos opinião e, principalmente, de agirmos. Mas isso, nosso individualismo não mostra.
Frederico Duboc
A “Pesquisa Brasileira de Media” revela que apenas um em cada cinco brasileiros lê jornais, e menos de um em cada dez o faz diariamente. Isso não quer dizer que a população seja desinformada. No Brasil, metade dos lares está conectada à internet, e 81,5 milhões de pessoas navegam pelo celular – o segundo eletrônico mais comum nas casas do país, apenas atrás da TV. E, para 10% da população, segundo o Instituto Reuters para Estudo do Jornalismo, mídia social é a principal fonte de acesso a notícias (jornais respondem por 4%).
Esse consumo nem sempre é intencional. O American Press Institute revela que dois terços dos jovens entre 18 e 34 anos diariamente acessam notícias online, que chegam a eles por meio de perfis de amigos nas redes sociais. É nesse ponto que as coisas se complicam.
No Facebook, por exemplo, os usuários têm acesso a 1.500 mensagens, em média, por dia, mas só têm tempo para ver 300. Para que essas poucas centenas sejam as mais interessantes, entram em cena algoritmos matemáticos que selecionam assuntos de acordo com perfil, histórico de navegação, presença de fotos ou vídeos e, mais recentemente, pela colaboração de pessoas pagas para usar o Facebook e oferecer um feedback da eficiência desses filtros.
Uma consequência é que os usuários ficam menos expostos a opiniões diferentes das suas. Um estudo publicado na revista “Science”, em maio de 2015, mostra que os entrevistados identificados como “progressistas” são expostos a 24% de conteúdo diverso de sua crença, enquanto, para os “conservadores”, o índice era de 35%.
Não que a internet seja má ou uma “Matrix” que controle a que informações as pessoas poderão ter acesso. São as escolhas individuais que definem o conteúdo, não a partir da utilidade da informação, mas de quanto ela é agradável. Não confrontado por ideias diversas das suas, o usuário é livre para se aferrar a preconceitos e radicalismos. Num processo em que não faltam hedonismo e narcisismo, somos cada vez mais agentes de nossa própria ignorância.
Cabe-nos ser leitores críticos, seja nas mídias tradicionais ou nas digitais, buscar fontes de informação confiáveis e precisas, bem como nos abrirmos a argumentos que questionem nossas crenças antes de formarmos opinião e, principalmente, de agirmos. Mas isso, nosso individualismo não mostra.
Frederico Duboc
A última tentativa
Não parece difícil interessar o empresariado nesse objetivo: basta divulgar que os estabelecimentos oficiais de crédito vão abrir linhas para as empresas que se proponham a atividades capazes de criar empregos. E gerar lucro. Não haverá quem resista, mesmo cabendo ao governo vigiar e fiscalizar a ação de quantos buscam levar vantagem em tudo, em especial diante da flácida e desmoralizada função do poder público.
Em paralelo, torna-se essencial a transparência, quer dizer, afastar a hipótese de conluio entre o Estado e a iniciativa privada para superfaturamentos, propinas e escamoteações de toda ordem. Que tal entregar a supervisão das medidas de recuperação econômica ao Ministério Público?
Entre fevereiro e março, prevê-se, estarão afastados os obstáculos decorrentes da crise do impeachment. Disporá o governo de mecanismos para dedicar-se prioritariamente à última tentativa. Sugestões tem aparecido como meteoros, desde o aumento das alíquotas de imposto de renda até a adoção da nova CPMF, sem esquecer taxações maiores ao lucro, às grandes fortunas e ao direito de herança. Junto com tais restrições, haverá que desbastar os empecilhos burocráticos ao livre desenvolvimento da economia.
Abre-se um fresta, mesmo pequena, frente ao caos e à desesperança, mas sem vontade política nada se fará. O derradeiro apelo dos detentores do poder precisará atingir as massas e a classe média, até penalizando as elites, mas jamais a ponto de transformá-las em vitimas.
Em suma, essa última tentativa de recomposição do país indica a convergência. Começando pela importância de cada segmento ceder o necessário, jamais acima disso. O governo, o empresariado, os trabalhadores, o Congresso e a intelectualidade precisarão dispor-se ao sacrifício dentro de seus limites possíveis.
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