quinta-feira, 2 de maio de 2019

Gente fora do mapa


Ministro da Educação imita senhoras católicas de 1964

O novo ministro da Educação, Abraham Weintraub, quer banir os livros de Paulo Freire e reprimir a “balbúrdia” nas universidades. O discurso não é exatamente novo. Já estava na boca das senhoras católicas que bradavam contra o comunismo em 1964.


Em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, o ministro olavete descreveu as universidades como locais de “bagunça” e “arruaça”. Ele também protestou contra a suposta presença de “gente pelada”, como se os campi fossem praias de nudismo.

A imaginação de Weintraub parece ser fértil. A das ativistas católicas também era. A exemplo do ministro, elas acreditavam que os comunistas estavam em toda parte. Atrás da banca de jornal, no ponto de ônibus, debaixo da cama ou dentro do guarda-roupa, como ironizava o cronista Stanislaw Ponte Preta.

Em Belo Horizonte, as senhoras se uniram na Liga da Mulher Democrata (Limde). De rosário em punho, promoveram passeatas a favor do golpe militar e elegeram a Universidade Federal de Minas Gerais como alvo número um. Suas peripécias estão no livro “Campus UFMG”, que a historiadora Heloisa Starling lança no dia 11 pela editora Conceito.

Em abril de 1964, a Limde intimou o Ministério da Educação a intervir na UFMG para garantir “o afastamento definitivo de professores, livros e funcionários comunistas do convívio com os estudantes”.

Pouco depois, as ativistas reivindicaram a imediata proibição, em todo o país, do método Paulo Freire. Para elas, a técnica do educador para combater o analfabetismo era perigosa e subversiva.

Em 1965, a Limde organizou um abaixo-assinado pela “extinção da carreira de sociólogo”. O manifesto afirmava que era preciso evitar a formação de “agitadores comunistas”. Os sociólogos só conseguiriam habilitação formal em 1980, no fim da ditadura.

As senhoras mineiras eram ousadas. Um dia, indignadas com a realização de um encontro sindical em BH, reuniram a imprensa e prometeram deitar na pista do Aeroporto da Pampulha para impedir a aterrissagem de aviões.

Fica a dica para o ministro Weintraub.

Empobrecer, esquecer, deixar morrer

O projeto nacional de aumento do Produto Interno da Brutalidade Brasileira (PIBB) não é invenção de Jair Bolsonaro. Parte da sociedade brasileira sempre se deixou seduzir, por medo ou interesse próprio, aos cantos do bruto, esse ser que grita soluções simples, erradas e violentas aos problemas do país. Sob o bolsonarismo, a dedicação espalhafatosa a esse programa antiliberal rompe até mesmo com as convenções democráticas de etiqueta que gradualmente se firmaram nos últimos 30 anos.

Um ano atrás, escrevi que três verbos sintetizam o PIBB: matar, castigar e perdoar. O Brasil não é apenas o país que mais mata no mundo. Matamos com critério: o assassinato de negros, ambientalistas, jornalistas, LGBTs e mulheres despontam nos rankings mundiais. Castigamos pelo encarceramento em massa, pela arbitrariedade policial, pelo descaso com vítimas de crimes ambientais ou com qualquer outro grupo vulnerável. Numa trágica ironia, não matamos e castigamos os mesmos que perdoamos. Perdoamos, por exemplo, quem adquire vultosas dívidas com o Estado.


No governo Bolsonaro, “morte, castigo e perdão” se expandem: um projeto anticrime que legaliza e incentiva a letalidade da polícia que mais mata e morre no mundo; a defesa de que cada indivíduo cuide da própria segurança com seu revólver no cofre; a proposta de permitir que ruralistas atirem para matar quem ameace sua propriedade; o perdão de R$ 17 bilhões à dívida rural; a promessa geral de leniência ao “bolsonarista da esquina”, que faz o serviço sujo por sua conta (segundo evidências, crescem ataques homofóbicos e a violência doméstica, por exemplo).

O programa Empobrece Brasil é o mais robusto. Por trás de uma reforma da Previdência que promete liberar amarras do crescimento, cria múltiplas outras: declara guerra à cultura, à produção científica, à educação em geral e à educação pública em particular; na pública, uma guerra especial às humanidades, central na economia do conhecimento e da criatividade; guerra ao professor que conduzir inocentes ao pensamento livre e improdutivo; às proteções ambientais, reduzindo biodiversidade e destruindo a maior riqueza de uma economia pós-carbono. Passa também mensagens insólitas ao mercado internacional: o voluntarismo regulatório que interfere no Banco do Brasil e na Petrobras; a rejeição ao turismo gay (com muito poder aquisitivo, por sinal) e o convite ao turismo sexual; a corrosão do soft power brasileiro nas relações internacionais, que já faz o país sofrer retaliações no comércio (para não falar da vexatória dificuldade de achar sede para a homenagem a Bolsonaro em Nova York). Pergunte à ciência econômica o que faz um país crescer e tire suas conclusões.


Mas empobrecer não é suficiente. É preciso esquecer e deixar morrer: o governo busca inviabilizar a investigação de crimes da ditadura e extinguiu o trabalho de identificação de ossadas das vítimas; propõe “corrigir” menções ao golpe militar nos livros de história; desqualifica o trabalho das comissões da verdade e tenta construir um passado glorioso e heroico; busca “cortar custos” e “simplificar” o Censo, uma das grandes ferramentas de inteligência da política pública com base em evidências; faz vista grossa às crescentes invasões a terras indígenas; esvaziou o Mais Médicos, o que pode causar até 100 mil mortes precoces no interior do país.

Perdão pela lista cansativa, apesar de incompleta. Mais do que um amontoado de informações, a lista dimensiona o conjunto, os princípios aglutinadores e a lógica de fundo. A mão invisível da tragédia brasileira não está tão invisível. A Constituição de 1988 estabelece limites e define objetivos. O bruto não gosta de limites e abomina os objetivos.

P.S.: A “nova era” tem ofuscado o Febejapá, o Festival de Barbaridades Judiciais que Assolam o País, mas o Febejapá nunca para. Aproveitando-se de seu
"momentum' no coração de brasileiras e brasileiros, o STF publicou edital para contratação de “refeições institucionais” por R$ 1,1 milhão. Pedem-se: lagostas, camarões e vinhos com quatro prêmios internacionais. Brioche não, para prevenir qualquer mal-entendido.

Bolsonaro rende-se ao óbvio em rede nacional

Num raro instante de lucidez, o redator que preparou o discurso lido por Jair Bolsonaro em rede nacional de rádio e TV no Dia do Trabalhador acomodou nos lábios do presidente duas pérolas. Eis a primeira: "O caminho é longo". Agora, a segunda: "Unidos ultrapassaremos essas dificuldades iniciais!".

Parecem coisas óbvias. Mas Bolsonaro tropeça no óbvio desde que chegou ao Planalto. Tomado a sério, o reconhecimento de que o"caminho é longo" vale por um desmentido. É como se o capitão pedisse à plateia para esquecer o discuso da campanha, que vendia soluções fáceis, disponíveis na virada da primeira esquina.

A segunda obviedade é ainda mais valiosa. Além de admitir que sua gestão arrosta "dificuldades iniciais", Bolsonaro fala em união para superá-las. Se não for da boca para fora, esse "unidos ultrapassaremos" pode representar um convite ao diálogo com gente que pensa diferente — algo que, para o capitão, seria revolucionário.



Caindo-lhe a ficha sobre a longa distância a percorrer, Bolsonaro talvez pare de jogar pedras no seu próprio caminho. Falou tanto em governar "sem viés ideológico" que acabou enviesando sua gestão. Atrasou o relógio até a Era da Guerra Fria. Vê comunistas embaixo da cama. Não notou que a ideologia —a sua ou a dos outros— é o caminho mais longo entre um projeto e sua realização.

Se o redator do discurso de 1º de Maio foi fiel ao pensamento do orador, Bolsonaro precisa deflagrar um processo de desintoxicação de sua retórica. Jamais roçará algo parecido com uma união se continuar caçando esquerdistas em universidades, censurando comerciais por ojeriza à diversidade, idolatrando polemistas e concedendo salvo-conduto aos filhos para plantar bananeira dentro da sua Presidência.

Ou o capitão se ajusta ou o caminho do seu governo pode não ser tão longo. Ao contrário, talvez seja bem mais curto do que o presidente imagina.

Imagem do Dia


Mais desemprego, novos 'bicos' e menos esperança

Se depender do fortalecimento do mercado de trabalho, não há grande esperança de reanimação do consumo a curto prazo. E, na mão inversa, se depender da reanimação do consumo e, em consequência, da atividade econômica, também não há grande esperança de fortalecimento do mercado de trabalho.

Os números divulgados pelo IBGE na terça-feira mostram um quadro preocupante, expresso nessa espécie de ciclo vicioso. O Brasil fechou o primeiro trimestre com 13,4 milhões de pessoas desocupadas, o que corresponde a 12.7% da força de trabalho, 1,1 ponto ponto porcentual acima da taxa registrada no quarto trimestre de 2018.


Dentro do conceito de mão-de-obra subutilizada, que inclui quem trabalha menos do que poderia ou gostaria e também quem não está à procura de emprego, por desalento, esse contingente mais do que dobra — chegando a 28,3 milhões de pessoas. Praticamente empatado com a soma dos habitantes das cinco capitais mais populosas do País. Mais: nenhum setor apresentou um saldo positivo de contratações, nesse período.

Diante dessa dura realidade, é perfeitamente compreensível que o temor do desemprego volte a aumentar, como mostra o índice calculado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) — depois de recuo observado no fim do ano passado, acompanhando as expectativas otimistas manifestadas com a troca de governo, que, se imaginava, traria pelo menos uma redução de incertezas.

Bolsonaro já se mostrou bastante incomodado com a questão do desemprego. Melhor dizendo, com as estatísticas sobre desemprego. Ele chegou a levantar suspeitas sobre a correção dos critérios utilizados pelo IBGE, despertando fortes críticas de especialistas. Até o momento, porém, não se conhece nenhuma iniciativa específica do governo para pelo menos aliviar o quadro de desemprego no País, num prazo razoável.

É inegável que está em andamento, no mundo todo, uma reviravolta no mercado de trabalho, com a eliminação de várias funções e a criação de outras, principalmente na esteira da corrida tecnológica.

O Brasil, contudo, ainda não embarcou com força total nesse ciclo. A transformação de aplicativos como Uber e iFood nos maiores “empregadores” pode até dar a impressão contrária. Até o momento, porém, trata-se de mais um indicador da deterioração do mercado de trabalho, com até mesmo profissionais qualificados exercendo funções de motoristas ou entregadores de encomendas para garantir a sobrevivência. Um novo tipo de “bico”, mas ainda um “bico”.

Superação é a ordem do dia

Temos pouca capacidade de reação, mas não adianta: precisamos superar o temor e o medo
Maria Arminda do Nascimento Arruda, diretora da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP 

Manifesto

Aos operários da construção civil:

Companheiros

Eugênio de Proença Sigaud
Que Deus e Vargas estejam convosco. A mim ambos desampararam; mas o momento não é de queixas, e sim de luta. Não me dirijo a toda a vossa classe, pois não sou um demagogo. Sou um homem vulgar, e vejo apenas (mal) o que está diante de meus olhos. Estou falando, portanto, com aqueles dentre vós que trabalham na construção em frente de minha janela. Um carrega quatro grandes táboas ao ombro; outro grimpa, com risco de vida, a precária torre do enguiçado elevador; qual bate o martelo, qual despeja nas fôrmas o cimento, qual mira a planta, qual usa a pá, qual serra (o bárbaro) os galhos de uma jovem mangueira, qual ajusta, neste momento, um pedaço de madeira na mesa da serra circular.

Espero. Olho este último homem. Tem o ar calmo, veste um macacão desbotado, usa uma espécie de gorro pardo na cabeça, um lápis vermelho na orelha, uma trena no bolso de trás; e, pela cara e corpo, não terá mais de 25 anos. Parece um homem normal; vede, porém, o que faz. Já ajustou a sua táboa; e agora a empurra lentamente contra a serra que gira. Começou. Um guincho alto, agudo e ao mesmo tempo choroso domina o batecum dos martelos e rompe o ar. Dir-se-ia o espasmo de um gato de metal, se houvesse gatos de metal. Varando o lenho, o aço chora; ou é a última vida da árvore arrancada do seio da floresta que solta esse grito lancinante e triste? De momento a momento seu estridor me vara os ouvidos como imponderável pua.

Além disso o que me mandais, irmão, são outros ruídos e muita poeira: dentro de uns cinco dias tereis acabado o esqueleto do segundo andar e então me olhareis de cima. E ireis aos poucos subindo para o céu, vós que começastes a trabalhar em um buraco do chão.

Então me tereis vedado todo o sol da manhã. Minha casa ficará úmida e sombria; e ireis subindo, subindo. Já disse que não me queixo; já disse: melhor, cronicarei à sombra, inventarei um estilo de orquídea para estas minhas flores de papel.

Nossos ofícios são bem diversos. Há homens que são escritores e fazem livros que são como verdadeiras casas, e ficam. Mas o cronista de jornal é como o cigano que toda noite arma sua tenda e pela manhã a desmancha, e vai.

Vós ides subindo, orgulhosos, as armações que armais, e breve estareis vendo o mar a leste e as montanhas azuladas a oeste. Oh, insensatos! Quando tiverdes acabado, sereis desalojados de vosso precário pouso e devolvidos às vossas favelas; ireis tão pobres como viestes, pois tudo o que hoje ganhais tendes de gastar; ireis na verdade ainda mais pobre do que sois, pois também tereis gastado algo que ninguém vos paga, que é a força de vossos braços, a mocidade de vossos corpos.

E ficará aqui um edifício alto e branco, feito por vós. Voltai uma semana depois e tentai entrar nele; um homem de boné vos barrará o passo e perguntará a que vindes e vos olhará com desconfiança e desdém. Aquele homem representa outro homem que se chama o proprietário; poderoso senhor que se apoia na mais sólida das ficções, a que chama propriedade. O homem da serra circular estará, certamente, com o ouvido embotado; em vossos pulmões haverá a lembrança de muita serragem e muito pó, e se algum de vós despencou do alto, sua viúva receberá o suficiente para morrer de fome um pouco mais devagar.

Não penseis que me apiedo de vós. Já disse que não sou demagogo; apenas me incomodais com vossa vã atividade. Eu vos concito, pois a parar com essa loucura – hoje, por exemplo, que o céu é azul e o sol é louro, e a areia da praia é tão meiga. Na areia poderemos fazer até castelos soberbos, onde abrigar o nosso íntimo sonho. Eles não darão renda a ninguém, mas também não esgotarão vossas forças. É verdade que assim tereis deixado de construir o lar de algumas famílias. Mas ficai sossegados: essas famílias já devem estar morando em algum lugar, provavelmente muito melhor do que vós mesmos.

Ouvi-me, pois, insensatos; ouvi-me a mim e não a essa infame e horrenda serra que a vós e a mim tanto azucrina. Vamos para a praia. E se o proprietário vier, se o banqueiro vier, se o governo vier, e perguntar com ferocidade: “Estais loucos?” – nós responderemos: “Não, senhores, não estamos loucos; estamos na praia jogando peteca”.

E eles recuarão, pálidos e contrafeitos.
Rubem Braga

A Previdência é uma pirâmide

É fundamental que a reforma da Previdência (PEC 6/2019) seja aprovada. O déficit dos regimes de Previdência do INSS, dos funcionários públicos (federais, estaduais e municipais), e dos militares chegou a colossais 5,5% do PIB em 2018.

Será que a indispensável reforma salva e equaciona as contas futuras da Previdência? Não. Lamento ser o portador deste "breaking news": os sistemas de Previdência do Brasil são um esquema de pirâmide, falidos e irremediáveis.


Governos anteriores afirmaram que não havia motivo para preocupação, pois o buraco é coberto pelo Tesouro. Ah, como eu adoro quando o governo me chama de "tesouro"! Este dinheiro sai do nosso bolso, por meio de impostos atuais e impostos futuros que nós e nossos filhos seremos coagidos a pagar.

Na década de 1960, o governo fez uma promessa sedutora e consagrou um pacto abominável com a geração de nossos pais e avós. Prometeu que, ainda que nossos pais não poupassem para sua velhice, o governo pouparia em seu nome. Bastava que contribuíssem mensalmente com 20% de seu salário para o governo. Pronto, o tal do regime de repartição virou lei.

Era uma fraude. O sistema de Previdência não ficou com o dinheiro que o governo tomou dos trabalhadores. O governo o gastou.

A pirâmide envolvia usar a contribuição de Pedro, jovem que está no mercado de trabalho, para pagar João, que está aposentado.

A promessa fraudulenta foi de que haveria cada vez mais trabalhadores entrando no mercado para sustentar o crescente número de aposentados, que vivem cada vez mais.

Por isso, desde 1997 o sistema passou a sangrar. Qual o tamanho do rombo total? O déficit atuarial dos sistemas —recursos que faltam para cobrir os compromissos futuros— é de cerca de estonteantes 250% do PIB.

Destes, estimo que a PEC 6 equacione algo como 60% do PIB. Para efeito de comparação, a dívida oficial acumulada pelo Estado desde 1822 é de 80% do PIB. Ainda faltarão três PECs de similar montante para se alcançar o equilíbrio financeiro da Previdência.

A Lei de Stein determina que aquilo que não pode continuar para sempre terá de parar. Stein não contava com a magia estatal. O governo é a grande ficção através da qual todos tentam viver às custas de todos os demais, dizia Bastiat.

A pergunta central é: o trabalhador brasileiro e seus filhos devem ser condenados a pagar eternamente a dívida gerada pelo pacto, mesmo sem ter chance de receber montante equiparável ao que contribuem (atualmente 30% do salário bruto)? Ou será melhor que os participantes do sistema apurem os haveres e ajustem as contas entre si?

O jovem trabalhador brasileiro em 2019 é como uma noiva iludida pelo parceiro que prometia que cuidaria dela pelo resto da vida.

Ao se casar, descobre que o marido já estava quebrado. O marido convoca a esposa ludibriada a pagar a dívida contribuindo com 30% de tudo que ela e os futuros filhos ganharem durante suas vidas, mesmo sabendo que os 30% serão insuficientes. O que deve fazer a mulher?

Uma separação de dívidas implica que o marido tenha de lidar com seu problema, preservando a família.

Esta é a ideia do regime de contas individuais, ou capitalização, proposto pelo ministro Guedes. O trabalhador deixa de sustentar o rombo do atual regime.

Assim, aquele que ganha R$ 2.000 passará a ganhar R$ 2.850. E, mesmo que poupe R$ 450 por mês em sua conta individual de aposentadoria, terá não apenas salário 20% maior do que hoje como também aposentadoria maior do que a prometida pelo governo.

A pirâmide deve ser descortinada antes que vincule mais gente e afunde o Brasil junto. Trabalhador, este pacto não é seu.
Hélio Beltrão

Pensamento do Dia


Laranja ostentação

Pode-se apontar na Polícia Federal alguma falta de sentido de urgência, mas não de senso de humor. Dois meses após abrir inquérito sobre o escândalo das candidatas laranjas do PSL revelado por esta Folha em fevereiro, a PF fez na segunda-feira (29) a primeira operação de busca e apreensão e batizou-a como Sufrágio Ostentação.

Não que caiba fazer troça com a investigação, da maior seriedade. O PSL, cumpre assinalar, é o partido pelo qual se elegeu o presidente da República, Jair Bolsonaro.

Ademais, no centro da fraude eleitoral encontra-se ninguém menos que seu ministro de Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, então presidente da sigla em Minas Gerais.

O engodo constitui um exemplo acabado dos efeitos imprevistos das boas intenções, no caso a imposição de cota de 30% do fundo partidário para campanhas de candidatas, a fim de promover maior participação feminina na política.

Dirigentes partidários, entre os quais predominam homens, viram aí um outro tipo de oportunidade —para empreender negócios escusos. Parece ter sido esse, pelo menos, o caso do PSL sob comando do futuro ministro de Bolsonaro.

A PF indica agora ter encontrado indícios concretos de prestações de contas mentirosas nas campanhas das laranjas. Quatro candidatas a deputadas estaduais e federais mineiras estão no fulcro da apuração, após declarar gastos avultados, em franca contradição com sua escassa colheita de votos.

O foco da operação Sufrágio Ostentação recaiu sobre gráficas que teriam prestado serviços ao PSL mineiro. A PF trabalha sobre a hipótese de que eles não tenham ocorrido e que os pagamentos em realidade tenham sido carreados para campanhas masculinas ou para empresas próximas do partido.

Além da sede do partido na capital mineira, sete gráficas foram alvo da ação. Uma delas, em Ipatinga, já se achava fora de operação antes do pleito de 2018 e pertence a Reginaldo Donizete Soares, irmão de um assessor que trabalhou com Marcelo Álvaro Antônio.

O inquérito, que corre sob segredo de Justiça, já conta com oitivas de quatro dezenas de testemunhas. O PSL de Minas anunciou encarar com naturalidade o processo e diz colaborar com a investigação. O ministro afirma estar à disposição da PF para esclarecimentos.

O material apreendido nas diligências passará agora por perícia. Presume-se que isso ainda consumirá semanas ou meses.

O presidente Jair Bolsonaro, que com tanta frequência se põe a lançar juízos de valor nas redes sociais sobre a velha política, mantém excessiva e incongruente cautela diante do escândalo com seu ministro. Se até a polícia já aponta os indícios, um afastamento seria a atitude mínima a tomar, ao menos durante o correr da investigação.

A mulher que repassa 2 mil dólares a cada habitante do Alasca todos os anos

Ela gerencia mais dinheiro do que bilionários como Carlos Slim, Mark Zuckerberg ou Françoise Bettencourt (a mulher mais rica do mundo).

Mas, é bom deixar claro, não se trata de sua fortuna pessoal.

Angela Rodell tem nas mãos a responsabilidade de administrar os US$ 65 bilhões (R$ 254,8 bilhões) do Fundo Permanente do Alasca.

Todos os habitantes do Alasca recebem dividendos
 dos lucros do fundo soberano de petróleo

Financiado com receitas do petróleo, esse fundo estatal - o maior dos Estados Unidos - foi criado há mais de quatro décadas para beneficiar os habitantes do Alasca.

Como isso os beneficia? Financiando serviços essenciais (água, estradas, segurança, educação) e entregando um cheque anual a cada morador com um valor próximo a US$ 2.000 (de acordo com os dividendos gerados pelo fundo). O valor é equivalente a R$ 7,8 mil.

Desde que Rodell chegou ao cargo de diretora executiva do fundo em 2015, ele cresceu 23%, graças a uma carteira de investimentos com um desempenho muito bom.

E sua missão era precisamente esta: criar dinheiro.

"É uma grande responsabilidade, mas consegui formar uma equipe de primeiro nível em que posso confiar", diz Rodell em entrevista a BBC News Mundo, o serviço da BBC em espanhol.

Rodell se deu conta de que queria trabalhar no mundo das finanças quando estava cursando mestrado em administração pública.

Foi aí que ela se interessou por mercados de ações e por como os lucros gerados na bolsa poderiam ser úteis para investimentos públicos.

"Eu quis fazer uma ponte entre esses dois mundos", diz.

"Na verdade, não fui boa em fazer fortuna pessoal, mas tenho um grande interesse em criar riqueza para o fundo."

Rodell fez parte de diversos diretórios no Alasca, dedicados a administrar fundos de pensão, habitação, títulos, desenvolvimento industrial e exportações.

Antes de chegar a sua posição atual, ela estava no comando do Departamento de Impostos do Alasca.

Rodell não é uma defensora máxima do pagamento anual a todos os habitantes do Estado e é cautelosa ao dar opiniões de cunho político.

"Nosso trabalho é criar dinheiro e não a questão de como esses recursos são gastos."

No entanto, ela explica que existem dois lados da moeda na entrega de um dividendo anual para cada habitante.

"É uma oportunidade para as pessoas, já que as famílias podem escolher o que fazer com esses recursos."

E aí está justamente a questão-chave: o que eles fazem com o cheque?

Alguns usam o dinheiro para sair de férias, para a educação dos filhos ou para lidar com imprevistos.

"Mas também há efeitos negativos, como incidentes relacionados a álcool, drogas e violência."

Nesse sentido, ela observa que a entrega anual de dinheiro aos moradores tem "custos sociais" com os quais tem de lidar.

"É difícil para mim dizer se (o dinheiro) reduziu ou não a desigualdade", diz Rodell, e esclarece que há 40 anos, quando o fundo foi criado, a ideia era que as companhias de petróleo explorassem esse recurso e aportassem dinheiro para o futuro de todos os habitantes do Alasca.

Neste contexto e sob o conceito de que "o petróleo é de todos", foi decidido que os dividendos devem ser repartidos igualmente.

Isso explica por que não se entrega mais dinheiro aos pobres do que aos mais ricos.

Fato concreto é que há algo de podre, muito podre, na reforma da Previdência

Desde o governo Michel Temer o tema da Reforma da Previdência Social vem ocupando o noticiário da mídia nacional. O assunto é indigesto e impopular, porque provoca uma série de temores e dúvidas, principalmente no que diz respeito aos aspectos legais e mesmo constitucionais, especialmente no tocante ao chamado direito adquirido.

O maior problema é a falta de transparência, que significa um ponto crucial e assustador. Por que manter dados em sigilo, se o assunto interessa a todos brasileiros, especialmente às novas gerações? O que há de tão terrível e grave que não pode ser revelado? Tanto mistério é indicativo de que há algo errado, ou algo de podre, como diria Hamlet, antes de se fingir de louco para se proteger.

Outra coisa que levanta suspeitas é o propalado interesse dos investidores nacionais e estrangeiros de que essa reforma passe, sob pena de não investirem no País, uma espécie de chantagem, enquanto a Bolsa de Valores e o dólar sobem ou descem a cada notícia, numa frenética gangorra.


Afora isso, a imprensa faz uma campanha ferrenha a favor dessa Reforma da Previdência, colocando-a como necessária para que o Brasil saia da atoleiro em que se encontra, com seus mais de 13 milhões de desempregados e outros 15 milhões de subutilizados, como revela o IBGE, chegando a um total de 28,3 milhões.

No meio dessa discussão, em nenhum momento o governo federal demonstra interesse em cobrar judicialmente os grandes devedores da Previdência Social, que incluem grandes grupos, como a JBS e a Marfrig, indústrias como a Teka, e instituições de ensino, além dos clubes de futebol, é claro.

Muito estranho esse desinteresse em aumentar a receita. Porque a cobrança aos sonegadores traria um expressivo aporte financeiro para um caixa dito tão combalido. Muitas conclusões disso tudo devemos tirar. Uma delas de que há que vá ganhar com a Reforma da Previdência , notadamente os grandes bancos , pois os trabalhadores e servidores públicos serão obrigados a eles recorrerem para fazerem um plano de Previdência Privada , sob pena de passarem privações na velhice.

Antes dessa reforma, seria de bom alvitre cobrar a dívida dos grandes devedores do INSS e fechar o gargalo da lendária corrupção existente na autarquia. Seria uma grande começo para recuperar a credibilidade do País.

Preferível trilhar um caminho mais fácil do que tirar de quem pouco tem. E o fato concreto é que há algo de podre nessa reforma da Previdência.