sexta-feira, 13 de abril de 2018

Lula e os seus ricos

Lula repetiu em seu último discurso: estava sendo preso porque promove os pobres contra os ricos, já que estes, das elites, odeiam quando os pobres melhoram de vida.

Demagógico e falso.

Falso porque os ricos adoram quando mais pessoas, pobres ou não, entram nas faculdades, especialmente as particulares, e viajam de avião. Isso mesmo, adoram, porque as elites são donas das escolas, cujas ações subiram às nuvens com os programas de financiamento e bolsas pagas pelo governo. Assim como são donas das companhias aéreas - e dos hotéis e das lojas - cuja demanda disparou nos anos de ouro dos países emergentes.

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Verdade que a vida dos pobres melhorou nos anos do governo Lula. Mas melhorou em todo o mundo emergente, dando origem a nova classe média. Isso resultou de uma feliz combinação de crescimento global, que puxou a demanda e os preços das comodities, com políticas econômicas que preservaram a estabilidade da moeda e das contas públicas.

Ou seja, não é que o Brasil de Lula cresceu porque ele aplicou políticas a favor dos mais pobres. Foi um puro ciclo de expansão capitalista, baseada na renda das comodities (soja, minério de ferro, carnes) e na ampliação do consumo, via renda e crédito. Isso aconteceu no Brasil, na Índia, no Chile, na Tailândia, no Peru e por todos os países parecidos.

Os capitalistas adoraram. O agronegócio decolou, a indústria automobilística dobrou sua capacidade, os shoppings se multiplicaram, as vendas no varejo esquentaram.

A diferença entre os governos do PT, Lula e Dilma, foi para pior. Reparem: na época de ouro, primeira década dos anos 2000, todos os emergentes cresceram forte. Depois da crise financeira global, o Brasil teve uma breve recuperação e depois afundou numa crise de recessão e inflação alta. Isto, sim, foi inédito. Tirante os bolivarianos Venezuela e Argentina, isso não aconteceu em nenhum outro emergente importante. Todos mantiveram um nível de crescimento, ainda que menor, e mantiveram a estabilidade da moeda e equilíbrio das contas públicas, com juros baixos, muito baixos.

Como os governos petistas conseguiram estragar tudo?

Porque o dinheiro público acabou e a renda externa das comodities caiu. Lula do segundo mandato, Dilma, seus economistas e estrategistas continuaram acreditando que ampliar o número de beneficiados do Bolsa Família e elevar o salário mínimo, mandando os bancos públicos conceder crédito a torto e a direito - isso seria a mágica do eterno bem estar.

Quando as famílias, endividadas e vítimas dos juros altíssimos, para combater uma inflação crescente, pararam de consumir, Lula colocou a culpa no ódio dos ricos.

Ora, os ricos estavam bravos era com a recessão. Quiseram se livrar do governo Dilma porque a gestão petista estava tirando os pobres das faculdades, dos aviões e das lojas.

Não foi porque Lula atacou os capitalistas. Mas porque estabeleceu uma relação espúria com boa parte do capital. Foi a perversa combinação de capitalismo de estado com capitalismo de amigos, cujo resultado é corrupção e ineficiência. Isso não foi novo. Está nos livros.

Acontece assim: o governo amplia seu controle na economia, via estatais, aumento do gasto público direto e regulações, que dirigem crédito favorecido e isenção de impostos para setores selecionados. O governo entrega obras, compra serviços e mercadorias - de remédios e pontos de exploração de petróleo - das empresas amigas. Estas cobram preço superfaturado e devolvem parte de seus ganhos para os que controlam o governo.

O governo petista não foi o governo dos ricos. Foi o governo de parte dos ricos, os seus amigos. Quem mais se beneficiou não foi o pobre do Nordeste, mas a maior empresa nacional, a Odebrecht, levada por Lula (e pelo BNDES) a se tornar uma multinacional de obras e de corrupção.

O pobre do Nordeste ganhou mais Bolsa Família, mas não foi isso que o levou para a classe D. Foi a expansão das comodities, o crescimento e a consequente geração de empregos.

Essas pessoas voltaram à pobreza com a recessão e inflação - e, sobretudo, com a destruição de estatais como a Petrobras e Eletrobras. Estas foram levadas a gastar recursos de que não dispunham e obrigadas a entrar no maior esquema de corrupção do mundo emergente, um verdadeiro produto brasileiro de exportação.

A corrupção também foi global, mas pelo menos os governos de outros países mantiveram uma estabilidade macroeconômica.

Por aqui, ainda bem que surgiu a Lava Jato. Ao contrário do que diz Lula, não se trata da reação dos ricos contra os pobres. A Lava Jato só pega ricos - e de todos os lados da política.

E o povo não foi às ruas para defender Lula. De algum modo, entendeu que salvar Lula nesse processo é como salvar Odebrecht, Temer, Renan, Aécio e por aí vai.

Carlos Alberto Sardenberg

Debate entre esquerda e direita sobre prisão de Lula erra feio

A prisão de Lula envergou o debate público numa direção tão patética quanto perigosa.

Segundo a interpretação dominante à esquerda, a Lava Jato estaria deslocando o poder político para a direita, revertendo uma década de progresso social no altar do conservadorismo que ganha adeptos a cada dia.

Segundo o papo à direita, a implosão do PT e dos movimentos que lhe dão apoio estaria abrindo espaço para uma renovação modernizante, capaz de produzir retidão fiscal com abertura econômica e segurança pública. Para essa turma, populismo fiscal, assistencialismo e corrupção desenfreada são atributos petistas. Basta fazer uma boa limpeza.

Esse debate é patético porque erra no diagnóstico e esconde o que interessa.

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Tanto a esquerda quanto a direita que nasceram na redemocratização da década de 1980 foram para a cama com o atraso —aquela velha elite política que, sem ter ideologia, vende apoio ao governo de plantão em troca de privilégios para si e para os grupos que representa.

A lista de exemplos é extensa: FHC com Antonio Carlos Magalhães, Lula com José Sarney, Dilma Rousseff com Sérgio Cabral e todos eles com a família Odebrecht e tantas outras dinastias políticas e econômicas país afora.

Isso não significa que esquerda e direita tenham sido iguais. Cada uma fez as suas reformas preferidas. Mas tais reformas sempre foram lentas e parciais, sem jamais ameaçar a segurança da velha elite do atraso.

Para governar, esquerda e direita negociaram um pacto conservador. Ao fazê-lo, ambas contribuíram para manter mais ou menos intocado o esquema arcaico que faz do Brasil este celeiro de injustiça, violência e arbítrio.

Nesses 30 anos, nunca a esquerda ou a direita ameaçaram os alicerces institucionais que nos condenam ao subdesenvolvimento: clientelismo, patronagem e as outras práticas de colonização do Estado que inviabilizam a oferta de bens públicos para a maioria da população.

Portanto, não surpreende que tantos estejam dispostos a votar em Jair Bolsonaro. Afinal, no establishment não sobrou ninguém capaz de oferecer uma saída para o Brasil pós-Lava Jato.

Ocorre que Bolsonaro não é diferente. Defensor histórico dos interesses sindicais da corporação militar, ele também montará seu pacto com o atraso para tentar vencer esta eleição. Se ganhar, será incapaz de entregar a mudança profunda que a sociedade procura.

Enquanto a conversa pública não se dedicar a entender como se faz para mudar as regras do jogo que dão tanto poder ao atraso, estaremos condenados a repetir os erros do passado, esteja o Palácio do Planalto na mão da esquerda, da direita, de um centro amorfo ou de um pateta radical.

Pequena digressão

Logo no começo da fundação dos Quinze-Vingts, sabe-se que os asilados eram todos iguais e seus assuntos se decidiam por votação. Distinguiam perfeitamente, pelo tato, a moeda de cobre da de prata; nenhum deles tomou jamais vinho de Brie por vinho de Borgonha. Seu olfato era mais fino que o de seus patrícios que tinham dois olhos. Aprofundaram-se perfeitamente nos quatro sentidos. Isto é, ficaram sabendo acerca deles tudo quanto é possível; e viveram tranquilos e felizes na medida em que os cegos o podem ser. Infelizmente, um de seus professores julgou possuir noções claras sobre o sentido da vista; fez-se ouvir, intrigou, granjeou partidários; reconheceram-no afinal como chefe da comunidade. Pôs-se a julgar soberanamente em matéria de cores, e aí é que foi a perdição.


Esse primeiro ditador dos Quinze-Vingts formou primeiro um pequeno conselho, com o qual se tornou depositário de todas as esmolas. Por esse motivo, ninguém se atreveu a resistir-lhe. Decidiu ele que todas as roupas do Quinze-Vingts eram brancas; os cegos acreditaram; não falavam senão de seus belos trajes brancos, embora não houvesse entre eles um único dessa cor. Como todo o mundo começasse então a zombar deles, foram queixar-se ao ditador, que os recebeu muito mal; tratou-os de inovadores, de espíritos fortes, de rebeldes, que se deixavam seduzir pelas opiniões errôneas daqueles que tinham olhos e ousavam duvidar da infalibilidade de seu senhor. Dessa querela, formaram-se dois partidos.

O ditador, para os apaziguar, baixou um decreto segundo o qual todas as suas vestes eram vermelhas. Não havia uma única veste vermelha entre os Quinze-Vingts. Riram-se deles mais do que nunca. Novas queixas da comunidade. O ditador enfureceu-se, os outros cegos também. Disputaram longamente, e só se restabeleceu a concórdia quando foi permitido, a todos os Quinze-Vingts, suspenderem o juízo sobre a cor de sua roupa.

Um surdo, ao ler esta pequena história, confessou que os cegos tinham feito muito mal em querer julgar a respeito de cores, mas permaneceu firme na opinião de que só aos surdos compete falar de música.

Voltaire

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Chien Chung Wei, Watercolor on ArtStack #chien-chung-wei #art
Chien Chung Wei

'Uma ideia'

Lula preso deveria ser página virada na história política do País, mas temo que não seja. É óbvio que a prisão do principal chefe populista brasileiro em mais de meio século virou símbolo de enorme relevância numa esfera, a da política, que vive de símbolos. Não é pouca coisa ver atrás das grades um poderoso e rico, como Lula. Também não se pode ignorar o efeito para a autoestima de enorme parcela da população da noção do fim da impunidade. Um homem que nunca demonstrou grandeza exibiu-se apequenado e raivoso ao ser preso em meio a seguidores da seita que ainda conduz. Contudo, não é o destino do indivíduo aqui o mais relevante.

Ironicamente, Lula foi condenado e inicialmente preso por crime incomparavelmente menor em relação aos que cometeu, e não considero como pior deles o formidável aparato de corrupção que presidiu com a alegre colaboração de elites sindicais, acadêmicas, empresariais e o corporativismo público e privado. Apequenar o Brasil lá fora, diminuindo nosso peso específico, destruir o tecido de instituições (começando pelo da Presidência), fazer a apologia da ignorância e decretar o atraso no desenvolvimento econômico compõem pesada conta que mal começou a ser paga. O Brasil teve o azar de abraçar o lulopetismo na curva de subida de um benéfico superciclo global de commodities que não se repetirá por muito tempo. Em outras palavras, a pior e imperdoável obra lulista foi ter desperdiçado uma (única?) oportunidade de livrar o País rapidamente de desigualdade e injustiça sociais.


A prisão de Lula, paradoxalmente, não parece estar aprofundando entre nós o debate em torno dos eixos que seriam essenciais para recuperar o País em prazo mais dilatado – digamos, a próxima geração. Será que, além dos erros de conduta do indivíduo Lula, percebe-se que a crise em que estamos (começando pela econômica) é resultado do apego a ideias completamente equivocadas? O ímpeto de punir aumentou e, junto dele, consolida-se a perigosa noção de que vale tudo para pôr rápido na cadeia quem for denunciado – claro, diante da ineficiência da Justiça não chega a ser tão espantosa assim a evolução dessa mentalidade punitiva. Estamos na fase de mandar às favas os princípios (o verbo mais usado é outro, impublicável), contanto que o safado esteja preso. Porém, temo ter de afirmar que já caímos na armadilha, começando pelas elites pensantes, de acreditar ingenuamente que lavando a jato corruptos o sistema político volta a funcionar.

Não parece ter ganhado ainda sentido e direção claros essa onda de descontentamento e indignação que encurralou a política e agora fracionou perigosamente o Judiciário – que de fato manda hoje na política, por meio de figuras populares que não foram eleitas. Primeiras instâncias do Judiciário, por exemplo, pegaram o gosto de sangue e emparedam instâncias superiores pela atuação política em redes sociais e mídia. Por sua vez, as instâncias superiores estão profundamente divididas e renderam-se ao hábito de falar dentro e fora do plenário do STF para o que consideram que sejam suas audiências prediletas. Nesse quadro fluido e volátil não consigo identificar um Estado-Maior ou Central da Conspiração (muito menos das Forças Armadas).

No plano geral da política hoje não há quem puxe, só há empurrados. Por um fluxo que pede “mudança” sem apontar qual (fora o anseio, legítimo e correto, pelo impecável ficha-limpa). Falta algo importante ainda para que o encarceramento do populista sem caráter corresponda a uma página de histórica virada. Meu receio é de que a prisão de Lula acabe surgindo como grande evento que, na percepção do dia a dia, não se revela tão grande assim. Nesse sentido, vale a pena citar o que ele disse ao discursar para integrantes da seita no dia da prisão, quando declarou ser ele mesmo “uma ideia”. É ela que nos atrasou e conduziu à beira do abismo. Precisa ser derrotada, e ainda não foi.

Utopia... no Brasil

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Um partido que tenha como base princípios, valores e uma prática honesta e competente poderá, quem sabe, ser o primeiro passo para que seja retomado um sonho
Paulo de Tarso Venceslau, ex-guerrilheiro que participou do sequestro do embaixador dos EUA, e fundador do Partido dos Trabalhadores (PT), também geriu as finanças de duas prefeituras importantes conquistadas pelos petistas em São Paulo – Campinas e São José dos Campos

'Você sabe quem está prendendo?'

Usando o poder da lei, como tirar do palco alguém ali colocado e consagrado pela opinião pública? Um ator cuja aparição no cenário político ocorreu em tempos nos quais tudo era proibido, e a cadeia não era um espaço controlado pelo devido processo legal, mas algo corrente para quem queria mudar ou resistir — os chamados “subversivos”?

E a subversão, como estamos finalmente percebendo, sem as lentes do nosso autoritarismo, que é parte do poder à brasileira. Naquela época, entretanto, poucos ousavam resistir. E foi nesse clima que surgiu o operário do ABC. O metalúrgico não modulado intelectual ou ideologicamente, mas ousado o suficiente para enfrentar o regime militar. É lamentável que tal personagem tenha sido enredado por si mesmo e pela índole equivocada do seu partido, a ponto de hoje ser o inverso do que prometia sua luminosa trajetória política.
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Mesmo vivendo num imenso território falamos, lemos e escrevemos numa única língua. Mas usamos idiomas ambíguos no nosso modo de navegação social. Fomos monarquistas-escravocatas e hoje somos republicanos alérgicos à igualdade. A regulagem impessoal de uma fila — que requer espera, como digo no livro “Fila & democracia”, escrito com Alberto Junqueira — enerva e irrita, mostrando como a cidadania ainda é concebida pelo modelo dos patrões-barões.

O sistema é democrático, mas se a liberdade é idolatrada, pois ela se confunde com o direito à reclamação e ao confronto; a igualdade — que obriga a contenção justamente pela consciência da igualdade do outro — é vivida com ambiguidades. Para muitos, o reconhecimento do outro é um sinal de inferioridade. Poucos o tomam como um sinal de respeito pelo próximo como um igual, embora eventualmente divergente. Hoje vemos com consternação a “esquerda” reagir negativamente diante de um princípio que ela própria adotou.

Eu cito um jornal, mas você (esquerdista) diz com desprezo: “Esse eu não leio!” Você transforma a notícia em interpretação e, quando lhe interessa, faz o oposto, fazendo a interpretação virar o fato. Essa é a postura que nega a alternativa e a alteridade. Estamos no reino do tudo ou nada. Um espaço no qual fica em suspenso a atribuição de responsabilidade individual. A culpa é — como diz um raivoso Lula prestes a se entregar — sempre do outro.
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Esquecemos que a igualdade e a liberdade trabalham. De fato, os cargos que ocupamos também nos ocupam e modelam. Ou deveriam modelar — e se nos modelam para o mal, devem ser politizados. Ou seja: discutidos com bom senso e boa-fé. Honestamente.

Se como porteiro ou lixeiro eu, como professor, sou obrigado a fazer certas coisas, imagine as demandas do papel de presidente da República. Como é que um presidente que prometeu não errar no sentido de mudar o Brasil envolveu-se a ponto de ser condenado criminalmente? Acho isso mais do que vergonhoso: é desolador.
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Discutimos tudo, menos os conflitos entre papéis sociais. Pode um juiz julgar um caso no qual um parente está evolvido? Quais os limites dos favores que um administrador público pode se permitir? Pode um cargo público ser concedido apenas por amizade ou motivação política? Passando por cima dos conflitos de interesse, liquida-se o principio da igualdade, da competência, da competição, da eficácia e do mérito. O resultado é a contradição e a crise porque o papel —como a língua, a ideologia, a roupa, o dinheiro, o amor, a farda, a beca, a comida, o vinho e tudo o mais — cobra e exige a sua parte. Tornam-se mais ou menos presentes nas nossas vidas. E quando surgem a olho nu diante do ator, há a crise.

Como disse Marx, ou é a farsa ou tragédia.
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Sabemos quem estamos prendendo quando tomamos consciência das nossas contradições. O que testemunhamos no caso Lula é uma dupla resposta para o problema da igualdade perante a lei. A residência no sindicato dos metalúrgicos é o retorno clássico às origens: uma tentativa de renascimento. O discurso enfurecido e absurdo da inocência é o da evitação recorrente da culpabilidade. A resistência programada para “ver no que vai dar”, apostando no quanto pior melhor, é o teste de quem se convenceu estar acima da lei.

O que vimos não foi o combate do poder do eleito pelo povo contra uma Justiça golpista. Foi a tentativa evasão do poder da Justiça pela truculência.

Felizmente não deu certo. No fundo, reitero, testemunhamos mais um ato reacionário de resistência à igualdade como valor. Um ato melancolicamente realizado por um ex-presidente criminalmente condenado e por partidos políticos autoritários. A rendição de Lula, enfim, foi um funeral para quem ainda acredita no socialismo.

Roberto DaMatta

Paisagem brasileira

Cidade de Goiás (GO)

Temer analisa projeto que dribla lei de improbidade e estimula a impunidade

Michel Temer recebeu há três dias, em 10 de abril, ofício assinado pelos presidentes de seis entidades que representam no país as corporações dos juízes, procuradores e auditores. O documento pede ao presidente que vete integralmente o projeto de lei 7448/2017. Chegou ao Planalto na semana passada. Foi aprovado sem alarde no Congresso. Se for sancionado, anotaram os signatários do alerta enviado a Temer, “pode se tornar uma lei de impunidade, significando verdadeiro contorno à Lei de Improbidade, com artifícios para isentar de responsabilidade o agente público.” Tudo isso em plena era da Lava Jato.

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No rodapé deste post você encontra os nomes das entidades que escreveram a Temer. Se preferir, pode ler o ofício aqui. A íntegra da proposta considerada tóxica pelos representantes do Judiciário, do Ministério Público e dos órgãos de controle está disponível aqui. Deve-se a apresentação do projeto ao senador Antonio Anastasia (PSDB-MG). Foi aprovado sem passar pelos plenários do Senado e da Câmara. Senadores e deputados atribuíram caráter “terminativo” às votações realizadas nas comissões de Constituição e Justiça das duas Casas.

O projeto injetou 11 artigos novos na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, de setembro de 1942. Alegou-se que o objetivo das mudanças seria o de aprimorar as decisões dos gestores públicos e disciplinar a atuação de quem tem a incumbência de fiscalizá-los e julgá-los. No final, haveria mais segurança jurídica e menos imprevisibilidade. Entretanto, aos olhos das autoridades que lidam com o combate à improbidade, a nova lei servirá como “reduto para a impunidade” do administrador corrupto (pode me chamar de apadrinhado de político).

Uma das novidades previstas no projeto é que procuradores, magistrados e auditores, ao interpretar “normas sobre a gestão pública”, terão de levar em conta “os obstáculos e as dificuldades reais do gestor”, além de observar “as exigências das políticas públicas a seu cargo”. Na carta a Temer, os críticos do projeto indagaram: “Que dificuldades reais seriam essas?”

Para juízes, procuradores e auditores, criou-se “uma modalidade de interpretação casuística, arbitrária.” Avaliam que o novo dispositivo legitima a lógica segundo a qual “os fins justificam os meios”. Algo “incompatível com a administração pública.” O efeito prático da análise de “obstáculos e dificuldades”, acrescentaram os autores da carta, é a formação de “campos de impunidade para o gestor ou administrador”.

Noutro trecho, a proposta submetida à sanção de Temer prevê que, antes de questionar a validade de atos e contratos firmados por gestores públicos, os órgãos de controle e o Judiciário terão de levar em conta “as orientações gerais da época”. O projeto proíbe que se utilize uma “mudança posterior de orientação geral” para declarar “inválidas situações plenamente constituídas”.

O projeto traz uma definição de “orientações gerais”. São “interpretações e especificações contidas em atos públicos de caráter geral ou em jurisprudência judicial ou administrativa majoritária, e ainda as adotadas por prática administrativa reiterada e de amplo conhecimento público.”

No ofício a Temer, os servidores que têm a atribuição funcional de conter a atuação de larápios no serviço público escreveram que as tais “orientações gerais” constituem uma “categoria tão aberta quanto a leitura textual sugere, isso porque fala em ‘atos públicos de caráter geral’. O que seriam ‘atos públicos de caráter geral’?”

Diz a carta a certa altura: “O aspecto central de maior preocupação reside no fato de que se criam modalidades e justificativas abertas para eventual convalidação de atos ou de contratos inexistentes ou nulos.” Isso “fere os princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência.”

Em conversa com o blog, um ministro do Superior Tribunal de Justiça tachou o projeto de “absurdo”. Ao comentar o trecho que legaliza “prática administrativa reiterada e de amplo conhecimento público”, o magistrado declarou: “Suponha uma cidade qualquer em que o prefeito não faça contratos administrativos, mas acertos de boca. Todo mundo conhece a prática na cidade. O prefeito anterior fazia a mesma coisa. Ninguém poderá puni-lo, porque será uma prática administrativa reiterada, de amplo conhecimento público.”

Se for sancionada por Temer, a nova lei criará um “regime de transição” para que administradores se adaptem a decisões administrativas ou judiciais que estabeleçam “interpretação ou orientação nova sobre norma de conteúdo indeterminado, impondo novo dever ou novo condicionamento de direito.” Trata-se de outra anomalia, alertaram os críticos no documento protocolado no Planalto:

“No que diz respeito especificamente à decisão judicial, ela não impõe ‘novo’ dever”, anota o ofício. “O dever é anterior à decisão judicial, por isso não faz sentido, ao menos na esfera judicial, a previsão de um ‘regime de transição’.” Dito de outro modo: um juiz não cria deveres, apenas cobra obrigações previstas em lei. São pilhados em malfeitos os gestores públicos que cometem malfeitorias. Sempre que isso ocorre, precisam de punição, não de “transição”.

Há na proposta um certo requinte de crueldade com o contribuinte brasileiro. Além de dificultar o combate à corrupção, cerceando o trabalho dos órgãos de controle e do próprio Judiciário, o projeto prevê o seguinte: “O agente público que tiver de se defender, em qualquer esfera, por ato ou conduta praticada no exercício regular de suas competências e em observância ao interesse geral terá direito ao apoio da entidade, inclusive nas despesas com a defesa.” No português das ruas: o sujeito é processado por suspeita de roubar o erário e o brasileiro em dia com a Receita Federal paga o advogado.

Noutro trecho, o projeto legaliza a seguinte armadilha: “Nas esferas administrativa, controladora e judicial, não se decidirá com base em valores jurídicos abstratos sem que sejam consideradas as consequências práticas da decisão.” Há mais: “A motivação demonstrará a necessidade e a adequação da medida imposta ou da invalidação de ato, contrato, ajuste, processo ou norma administrativa, inclusive em face das possíveis alternativas.” No limite, se uma lei como essa estivesse em vigor há quatro anos, não haveria Lava Jato.

Flerta com o ridículo uma proposta que proíbe a punição com base em “valores jurídicos abstratos” e menciona do início ao fim abstrações como “interesses gerais”, “dificuldades reais”, “orientações gerais da época…” Ao condicionar o cancelamento de atos e contratos às “consequências práticas da decisão”, o projeto afirma, com outras palavras, o seguinte: “Se operações como a Lava Jato vão debilitar a Petrobras e a indústria da construção civil, é melhor buscar uma adequação da medida”. Ou, por outra: “Se houve corrupção na refinaria Abreu e Lima, mas a obra já está 40% pronta, convém levar em conta as consequências práticas antes de chutar o pau da barraca.”

Superando o lulopetismo

Em que pesem as bravatas de Lula da Silva e de seus fanáticos seguidores, a prisão do ex-presidente foi a culminação de um longo processo de desmoralização do PT e, principalmente, do lulopetismo. Hoje basicamente restrito aos grotões remotos do País, a algumas centrais sindicais e a intelectuais teimosamente apegados a utopias, o movimento que leva o nome do demiurgo de Garanhuns vem perdendo potência a olhos vistos, embora ainda conserve alguma força para causar danos ao País.

Isso não significa, contudo, que aquilo que o lulopetismo representa tão bem – isto é, a ideia de que os problemas podem ser resolvidos por obra apenas da vontade de resolvê-los – esteja superado. Ao contrário: antes de ser causa, o lulopetismo é o produto mais bem-acabado da incapacidade atávica de uma parte considerável do País de enfrentar os problemas nacionais.

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O sr. Lula da Silva descende de uma extensa linhagem de populistas e demagogos que há muito tempo alimentam as fantasias de milhões de brasileiros pobres. Quando chegou sua vez de exercer o poder, o chefão petista estimulou esses eleitores a imaginar que um carro popular comprado a prestações a perder de vista ou um diploma numa universidade de quinta categoria bastariam para alçá-los à sonhada classe média. Não à toa, em seu discurso de despedida antes de ser preso, o ex-presidente enfatizou que, em sua opinião, foram essas “conquistas” da era lulopetista que enfureceram “as elites” e resultaram na “perseguição política” destinada a alijá-lo da disputa eleitoral. No limite, assim diz o discurso de Lula, quem está preso não é ele, é o povo que ele encarna.

Descontando-se o exagero da retórica, o fato é que o lulopetismo personifica a ilusão, bastante disseminada, de que é possível melhorar as condições de vida no País e fazê-lo progredir sem a necessidade de esforço e responsabilidade. Seu inebriante sucesso desde que chegou ao poder, em 2003, e a manutenção de parte significativa de seu apoio popular mesmo em meio a tantos escândalos são a prova de que muitos brasileiros – e não apenas os mais pobres – continuam a considerar justo esperar que o Estado lhes seja um generoso provedor, que fornece subsídios de todo tipo, empregos públicos cheios de privilégios, bolsas assistencialistas para diversos fins, financiamentos a juros irreais, incentivos fiscais os mais variados e, para os mais ricos, participação no butim das estatais e dos contratos públicos.

Embora tenha nascido pregando a ideia de que era preciso ensinar a pescar em vez de dar o peixe, o lulopetismo cresceu e se tornou potência eleitoral ao prometer peixes para todos, à custa dos generosos cofres públicos. O PT aderiu alegremente à demagogia que tanto dizia combater em seus primeiros anos e transformou os arroubos palanqueiros de Lula em política de Estado de seus governos. O resultado disso, além dos devastadores escândalos de corrupção protagonizados pelo PT e por seus associados – mensalão e petrolão –, foi a mais profunda e duradoura crise econômica da história nacional. A realidade se impôs à ficção demagógica de Lula.

No entanto, nada garante que o retrocesso representado pelo lulopetismo será mesmo superado. Está cada vez mais claro que os candidatos que dizem disputar o espólio eleitoral de Lula não se dispõem a negar as premissas que engendraram o desastre lulopetista. Ainda está para ser testada a capacidade do presidiário Lula da Silva de transferir votos nessa vexatória condição, mas certamente haverá quem, na melhor tradição do atraso nacional, se apresente como seu herdeiro – se não direto, ao menos ideológico. E isso significa que, mais uma vez, a campanha eleitoral estará eivada da mesma mentalidade que resultou no lulopetismo e que alinha o País, em alguns aspectos, ao que há de mais persistentemente subdesenvolvido na América Latina.

Pode-se dizer que haverá uma verdadeira revolução no Brasil se, apesar de tudo isso, das urnas emergir um governo com disposição para convencer os brasileiros de que simplesmente não é possível atingir o desenvolvimento sem trabalho, esforço e sacrifícios.

Gente fora do mapa

rice fields, Dehang, Hunan, China | flicker
Campos de arroz na vila de  Dehang (China)

O Brasil precisa de um Supremo que apenas respeite os princípios do Direito

Transmitir os julgamentos pela TV foi um erro judiciário gigantesco. Transformou os onze juízes em vedetes da ribalta, que travam uma disputa patética para mostrar quem se exibe mais. Qualquer processo se torna uma batalha de egos inflamados. Salvo as exceções de praxe, a maioria dos ministros tem uma atuação farsesca e lúdica, querendo demonstrar erudição e conhecimento de trivialidades jurídicas. Como não são profissionais do showbiz, é claro que lhes falta a noção do “timing”, fazendo com que suas supostas performances sejam enfadonhas e soporíferas, não há quem aguente.

No injustificável afã de demonstrar conhecimento, os atores acabam se perdendo tecnicalidades jurídicas, ao interpretar o teor de artigos, parágrafos, incisos, alínea. Nesse contorcionismo intelectualoide, esquecem que isso não significa fazer justiça nem aplicar o Direito, muito pelo contrário.
Como se sabe, o Direito é uma das ciências sociais que se baseiam na lógica. Seu objetivo é dirimir conflitos de interesses mediante o respeito a uma série de pressupostos historicamente consagrados.

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Há os princípios explícitos, que os parlamentares brasileiros fizeram questão de listar na Constituição ou em outras leis – Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade, Eficiência, Interesse Público, Finalidade, Igualdade, Razoabilidade, Motivação e Proporcionalidade.

Mas sobre todos eles paira um princípio maior, a Racionalidade, que não consta em lei, mas está perpetuado pelos costumes, no Direito Consuetudinário. Para fazer justiça e aplicar o Direito, é preciso ser racional. E se qualquer dispositivo legal não for lógico e descumprir algum dos princípios jurídicos, jamais deve ser aplicado. Aliás, é justamente para isso que existe o Supremo. Para garantir que se faça justiça e impedir que existam normas ilógicas e inconstitucionais.

No Brasil, porém, as coisas parecem funcionar ao contrário. No Supremo, trava-se uma luta absurda para impedir que condenados em segunda instância possam ser presos. Entre os 194 países da ONU, apenas um deles decreta prisão após terceira instância, e o Brasil agora pode aderir a essa doutrina retrógrada, apenas porque alguns exibicionistas que vestem a toga do Supremo se apegam a tecnicalidades e imperfeições na redação das leis, para justificar um retrocesso jurídico que levará o Direito brasileiros de volta à Idade Média, quando as leis eram feitas para proteger os poderosos.

A pretendida blindagem de criminosos execráveis como Lula, Dirceu, Cabral, Geddel, Estevão, Aécio, Serra, Temer, Padilha, Cunha & Cia., sem a menor dúvida, descumpre todos os princípios jurídicos – Legalidade, Impessoalidade, Moralidade, Publicidade, Eficiência, Interesse Público, Finalidade, Igualdade, Razoabilidade, Motivação e Proporcionalidade. Mas há ministros no Supremo que não conseguem enxergar essa pétrea realidade.

A saúva

Meu maior problema com o PT, e com a esquerda como um todo, é a sua incapacidade de diálogo, a sua aversão ao contraditório e, sobretudo, a sua militância arrogante e patrulheira, que exige que todos se posicionem exatamente da mesma forma. Já estive em países de pensamento único e não gostei.
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Há movimentos de direita igualmente obtusos e intolerantes, mas de modo geral eles se apresentam exatamente como são, toscos e primitivos. A sua embalagem é mais sincera; eles não pretendem ser “bons”, e nem falam do alto de um pedestal de virtudes
Cora Rónai, "A nova saúva"

Energia - atenção para não perder o bonde

E prossegue a verdadeira revolução no setor de energias. Agora, anuncia a Organização das Nações Unidas (ONU), por intermédio do Instituto Humanitas Unisinos (10/4), que “a energia solar agregou mais capacidade de geração elétrica que o setor de combustíveis fósseis em 2017”. A publicação ONU Meio Ambiente informa em Tendências globais no investimento em energias renováveis 2018 que a energia solar atraiu muito mais investimento que no ano anterior: US$ 160,8 bilhões, ou 18% mais. Um investimento também “maior que o registrado em qualquer outra tecnologia” (Unisinos.br, 10/4/2018).

A força principal nesse avanço veio da China, com aumento de 58% em relação ao ano anterior – US$ 86,5 bilhões, ou 53 gigawatts (GW). Esse investimento dominou a nova capacidade no setor, assim como os investimentos globais. Passou-se para 98 GW. E outras fontes renováveis agregaram 59 GW – a carvão (35 GW), gás (38 GW), petróleo (3 GW), energia nuclear (11 GW). As aplicações em grandes hidrelétricas – US$ 2.789,8 bilhões – foram maiores do que as destinadas a novas geradoras a carvão e gás, que tiveram US$ 103,8 bilhões em investimentos.

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Os custos decrescentes das energias eólica e solar, segundo o relatório, continuam impulsionando os investimentos. O ano de 2017 foi o oitavo consecutivo em que os investimentos mundiais em energias renováveis excederam US$ 200 bilhões. Desde 2004 já foram investidos US$ 2,9 trilhões nessas fontes de energia. É um panorama em que a informação nesse setor é vital, pode determinar a boa ou má sorte de um empreendimento. A corrida em muitos municípios pode levar também a resultados adversos – na geração ou ampliação de empregos e da renda, no aumento do PIB municipal e na arrecadação de impostos. Há fatores a serem observados: empregos nessas circunstâncias costumam ser temporários. Na preparação dos solos, nas obras civis e na montagem dos equipamentos é mobilizado um razoável número de trabalhadores temporários – embora empresas com atuação regional tragam seus próprios trabalhadores para atuar de 12 a 18 meses; em prazo bem menor, a regra é que fiquem de 6 a 15 pessoas (heitorscalambrini@gmail.com).

Preocupação adicional está em questões específicas para cada setor, principalmente quanto à preservação de florestas nativas. “O modelo predominante de expansão da geração eólica no Brasil”, segundo o professor Heitor Scalambrini (7/4/2018), “e a instalação de grande quantidade de aerogeradores (o que pressupõe grandes superfícies de terras nas mãos das empresas) pode significar preocupação com áreas preservadas por usinas solares e eólicas ”. Até porque há certa preocupação com usinas solares e térmicas; ao fim de 12 a 18 meses, a operação das usinas será feita por poucos trabalhadores qualificados; e a geração de renda fica para proprietários que arrendam terras para as torres. Mas em muitas delas o ganho é pequeno para o agricultor arrendatário.

Em regiões montanhosas os trabalhos e os equipamentos podem levar ao desmatamento. Em muitos lugares do Nordeste, principalmente, esse tipo de problema tem sido frequente. E tem levado até à rejeição total do projeto, como aconteceu recentemente em Bonito, ou em Brejo da Madre de Deus, ambos no Estado de Pernambuco, onde foi rejeitada uma usina eólica que poderia conduzir a desmatamento, com prejuízo para a retenção de água destinada ao abastecimento local.

De qualquer forma, muitos fatores têm de ser considerados. Um ranking nacional solar fotovoltaico desenvolvido pela Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar) indica que o Estado de Minas Gerais o lidera, com 50,7 megawatts (MW), ou 24,3% da potência instalada no País, seguido pelo Rio Grande do Sul com 30,2 MW (14,5%), São Paulo (26,8 MW ou 12,8%), Ceará (12,8 MW ou 6,2%) e Santa Catarina (12 MW ou 5,8%). Embora esteja fora desse ranking, o Estado de Goiás em um ano quadruplicou a geração distribuída de energia, em que o consumidor-gerador recebeu crédito pela produção excedente. Passou de 2 mil quilowatts em fevereiro de 2017 para 8,5 mil um ano depois, especialmente com a geração de energia solar fotovoltaica (O Popular, 25/3). Residências, indústrias e empresas diversas investiram para reduzir suas contas de luz. Ainda em Goiás, um grande projeto da Unievangélica, que anunciou na semana passada que terá a maior usina solar urbana do País (1.885 megawatts/hora produzidos por placas, que permitirão economia anual de R$ 1 milhão, a partir de 2019. O retorno do investimento é calculado em até oito anos).

De acordo com a Bloomberg, a energia solar é a que mais se tem destacado no mundo nos últimos tempos, pela expansão (US$ 160 bilhões em 2017, ou 18% mais que no ano anterior); 48% de todo o investimento em energia limpa é feito nesse setor. No Brasil o investimento em 2017 foi de US$ 6,2 bilhões, ou 10% mais que em 2016. E 48% de todo o investimento mundial em energia limpa é realizado na área da energia solar.

A expansão no Brasil para chegar a um gigawatt com projetos de energia solar fotovoltaica conectados na matriz elétrica significa potência suficiente para abastecer 500 mil residências no País ou o consumo de 2 milhões de pessoas. Até 2024, segundo a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), 1,2 milhão de geradores deverão ser instalados em casas e empresas em todo o País, representando 15% da matriz energética. O mercado de energia fotovoltaica deverá movimentar cerca de R$ 100 bilhões. Sem falar que o País já tem mais de 500 parques eólicos (Eco21, dezembro-2017). O número de microgeradores e a microgeração de energia já superou 17 mil conexões.

É mesmo uma revolução. Quem não estiver atento perderá o bonde. Ou se atrasará.

Síndrome de Estocolmo na política nacional

A Síndrome de Estocolmo é o nome dado a uma condição onde alguns reféns de sequestros desenvolvem empatia ou afeto pelo seu captor. Essa relação não funciona necessariamente para os dois lados, pois o captor muitas vezes demonstra desprezo e frieza em relação ao seu prisioneiro.

No entanto, quando há, na percepção do refém, uma sensação de que seu sequestrador compartilha de valores semelhantes, essa sensação, associada ao medo, aguça o senso de sobrevivência. Assim, a vítima torna-se simpática ao malfeitor que lhe aprisiona.

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O apoio altamente emocional, afastado de avaliações frias, claras e lógicas em relação a um determinado político gera uma situação análoga à síndrome de Estocolmo. Principalmente quando não há, por parte do político, a recíproca de sentimentos e sensações.

O pouco que foi ofertado por um determinado líder político a seus seguidores é interpretado como generosidade e bondade e não como obrigação que ele tem pelo cargo que exerce.

Na síndrome de Estocolmo Política (assim como na clínica), existem 4 efeitos psicológicos e físicos, que são perfeitamente alinhados com a devoção política, são eles:

1.Cognitivo: existe uma confusão mental, geradora de uma memória seletiva, que leva a lembrar apenas de eventos que justifiquem a percepção positiva que se tem do “captor” político;

2. Emocional: a dependência ao captor político e uma devoção quase religiosa ao que ele diz ou sente. No caso da na versão clínica, existe um sentimento de culpa por ter essa apreciação ilógica, porém, no caso político, o sentimento de culpa é substituído e surge uma satisfação por assumir o papel de apoiador do seu captor;

3. Social: ansiedade e irritabilidade. No caso político, essa irritabilidade também surge quando o venerado é criticado, com ou sem razão. É o famoso “tomar as dores” do político, como se ele precisasse disso. Na realidade, é apenas a potencialização da doença;

4. Física
: se na versão clínica, um dos efeitos é o surgimento de problemas de saúde; na versão política isso também pode ocorrer devido à alta ansiedade causada pelo medo de perda da incorporação das “benesses” realizadas pelo político favorito e também pelo repúdio às críticas de terceiros.

De qualquer forma, a paixão desenvolvida por um líder político substitui as raias da lógica e ingressa numa fantasia apaixonada que só quem vive consegue explicar ou justificar. Há uma sensação de conexão pessoal com aquele indivíduo que mesmo tendo realizado coisas positivas dentro de sua obrigação (ressalto, ele não fez qualquer favor ao povo), trouxe mais mal do que bem.

A percepção desse mal, no entanto, é dissolvida e colocada como insignificante perante as ditas coisas boas que fez. Isso quando não são justificadas pelos pares como artifícios necessários para a realização do “bem coletivo”. Passam a agir como se fosse correto apropriar-se privadamente de algo para executar benefício a algum grupo, que, por sinal, são exatamente aqueles que o defendem.

Quando um indivíduo se encontra nesse ponto, ele está envolto numa Síndrome de Estocolmo Política e seu papel de refém se torna prazeroso, pois, além de trazer um sentido, por incrível que possa parecer, gera a sensação de relevância por fazer parte de algo não compreendido pelos outros, e considerado por eles como histórico.

Thiago de Aragão