Esse primeiro ditador dos Quinze-Vingts formou primeiro um pequeno conselho, com o qual se tornou depositário de todas as esmolas. Por esse motivo, ninguém se atreveu a resistir-lhe. Decidiu ele que todas as roupas do Quinze-Vingts eram brancas; os cegos acreditaram; não falavam senão de seus belos trajes brancos, embora não houvesse entre eles um único dessa cor. Como todo o mundo começasse então a zombar deles, foram queixar-se ao ditador, que os recebeu muito mal; tratou-os de inovadores, de espíritos fortes, de rebeldes, que se deixavam seduzir pelas opiniões errôneas daqueles que tinham olhos e ousavam duvidar da infalibilidade de seu senhor. Dessa querela, formaram-se dois partidos.
O ditador, para os apaziguar, baixou um decreto segundo o qual todas as suas vestes eram vermelhas. Não havia uma única veste vermelha entre os Quinze-Vingts. Riram-se deles mais do que nunca. Novas queixas da comunidade. O ditador enfureceu-se, os outros cegos também. Disputaram longamente, e só se restabeleceu a concórdia quando foi permitido, a todos os Quinze-Vingts, suspenderem o juízo sobre a cor de sua roupa.
Um surdo, ao ler esta pequena história, confessou que os cegos tinham feito muito mal em querer julgar a respeito de cores, mas permaneceu firme na opinião de que só aos surdos compete falar de música.
Voltaire
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