segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Leão abatido emociona. Homem caído nos trilhos atrapalha

Cecil tinha 13 anos, pedigree raro e porte de astro-rei. Atração maior do Parque Nacional de Hwange, no Zimbábue, o esbelto felino africano trazia na juba negra o colar GPS monitorado por pesquisadores da Universidade de Oxford, atestando sua importância para o estudo da preservação da espécie.

No início do mês, o animal fora atraído para fora do parque por um guia profissional a serviço de um caçador amador, o dentista americano Walter Palmer. Depois de abatido, decapitado e esfolado, o leão teve a cabeça entregue a Palmer e a história terminaria aí. A cada ano, somente no Zimbábue, uma média de 49 leões selvagens são abatidos legalmente como troféus.

Mas Cecil jamais poderia ter sido abatido legalmente, e a descoberta de sua carcaça movimentou a comunidade ambientalista, tornou-se viral nas redes sociais, foi noticiada com destaque em jornais do mundo inteiro e enterneceu multidões.

Caso tenham lido o noticiário e visto as imagens do garboso felino quando vivo, é provável que a diretoria da SuperVia, a concessionária que opera os trens da região metropolitana do Rio, e os membros da Agetransp, a agência reguladora que fiscaliza os transportes no estado, também tenham se sensibilizado com a desumanidade cometida contra o nobre animal.

Pena que quando um ser humano recebe menos consideração do que um vira-lata morto as sensibilidades feridas respondem a outros chamados, prioridades e cálculos.

O carioca Adílio Cabral tinha 33 anos e nenhum pedigree social. Terminara de cumprir pena de prisão por tráfico de drogas seis meses antes e vendia doces como ambulante. Na terça-feira, ele levara a mãe ao médico e teria pulado o muro da estação de Madureira quando foi colhido por um trem expresso que seguiu viagem.

Seu corpo ficara sobre os trilhos, a circulação de trens não foi interrompida e a rotina da estação seguiu seu curso até a aproximação de outro trem.

É então que se inicia o impensável. Imagens captadas pelo celular de uma testemunha mostram o maquinista parar a composição a poucos metros do corpo inerte, à espera de instruções. À sua frente, ladeando os trilhos, estão meia dúzia de indivíduos. Um deles, de capacete, uniforme laranja e identificado como funcionário da SuperVia, acena para o maquinista passar com o trem por cima do corpo de Adílio depois de dar uma calculada na altura da carroceria. Outros dois parecem participar do cálculo visual. Quando a composição se afasta, o grupo se aproxima dos trilhos e parece conferir se se algo mudou em Adílio. É a vida que segue.

No entender da SuperVia, a autorização de passar com o trem pela segunda vez sobre o corpo do vendedor ambulante foi acertada para evitar o problema maior — a retenção de diversos trens lotados em horário de pico. Ademais, afirmou o comunicado da concessionária, ficara constatado que o trem tinha altura suficiente para fazê-lo sem risco de atingir e vilipendiar a vítima.

Não cabe aqui listar todas as aberrações embutidas na explicação e no procedimento dessa empresa já tão coalhada de multas, cujo contrato de operação no estado está garantido até 2048. Cabe, porém, apontar a linguagem de falsa eficiência empresarial e a delirante simulação de normalidade de um serviço instituído para atender a humanos.

A concessionária alegou que seis mil passageiros teriam sido prejudicados caso o fluxo fosse interrompido. Sem dúvida. Aliás, seria a enésima paralisação de serviço a que são rotineiramente submetidos. Com uma diferença. Desta vez, a empresa poderia arriscar submeter a seus milhares de usuários uma pergunta simples e direta: “Você prefere passar o trem por cima de um ambulante morto ou aceita chegar em casa mais tarde?” Ao contrário da concessionária, é possível que a maioria preferisse aguardar. Sem quebradeira, em respeito a uma vida que podia ser a de um deles.

No caso do leão Cecil, ocorreu um fenômeno quase oposto. O excesso de luto e militância viral foi muito além da simpatia genuína pelo felino e do interesse habitual por questões envolvendo espécies em extinção.

Desde que o caso foi noticiado, ocorreu a morte de um dos últimos cinco rinocerontes-brancos do norte existentes no planeta, restando portanto apenas quatro antes da extinção definitiva dessa subespécie. No entanto, ninguém se comoveu.

Cecil mobilizou meio mundo por ser conhecido, fotogênico e popular. E pelas circunstâncias de uma morte sob medida e um vilão ideal para mobilizar as redes sociais em torno de um justicialismo eletrônico.

Cecil morrera porque o doutor Walter Palmer pagara o equivalente a R$ 160 mil para ostentar a cabeça do animal entre seus troféus de caça. Algum dia, quem sabe, alcançaria a glória de poder ter em sua propriedade os chamados “cinco grandes” (um leão, um elefante, um búfalo do Cabo, um leopardo, um rinoceronte), espécie de Grand Slam para caçadores de luxo.

Com um vilão desses pela frente, ativistas precisaram de pouco tempo para disseminar a sua identidade, dados pessoais e profissionais de seus familiares e círculo de relacionamentos mais próximos. Casado e pai de dois filhos, Palmer teve de fechar o consultório, dispensar os funcionários, indicar clientes para outros dentistas, ter sua existência na internet invadida por hackers tanto bem-humorados quanto ameaçadores.

Alguns o mandam apodrecer no inferno, outros fazem aparecer a foto do leão Cecil quando se digita o nome do dentista, outros ainda sugerem ao Estado Islâmico cuidar de Palmer. Como é de praxe no caso de ataques em mídias sociais, eles funcionam mais para lavar a alma dos justiceiros e satisfazer a indignação dos mais exaltados.

Mas contêm um risco. Como alerta Max Fisher, diretor de conteúdo do site Vox, eles podem extravasar do mundo virtual para o real antes que a vítima seja julgada pelo sistema judiciário institucional.

Uma coisa parece certa: Walter Palmer não vai conseguir exibir o troféu conquistado tão cedo.

Dorrit Harazim

Continua-se estúpído


Todo sonho da democracia é erguer o proletariado ao nível de estupidez alcançado pela burguesia 

Gustave Flaubert

O mau pagador de promessas


Devo, não nego. Pagarei quando puder. E com a ajuda de vocês. Governadores, prefeitos, deputados, senadores. Mas apelo sobretudo a você. Você pai ou mãe de família, que perdeu seu poder de consumo, perdeu o emprego, perdeu salário e crédito, perdeu conforto e esperança, perdeu economias, perdeu sua lojinha, sua microempresa, seu apartamento, seu carro. Perdeu até as estribeiras, porque se sente intimidado por gangues das ruas e dos palácios.


Você precisa vestir minha camisa, que é a camisa do Brasil, agora em tamanho menor devido à dieta argentina. Você tem de acreditar, mesmo que o PT tenha provado ser um mau pagador de promessas. Eu e o Guido no ano passado pedalamos a mesma bicicleta, aquela de dois lugares, para atropelar todas as contas que atravessavam nosso caminho glorioso. Mesmo assim você precisa se sacrificar.

Você precisa nos ajudar a manter bem altos os lucros dos bancos, porque eles sempre se dão bem, já reparou? Com a ajuda de cortes, câmbio e juros, os grandes tiveram lucros históricos. Você precisa aceitar calado a redução do salário, você precisa cuidar de seu rombo particular. Porque o meu rombo no primeiro semestre foi inédito na história, um deficit de R$ 1,6 bilhão de janeiro a junho. Um rombão, tudo é aumentativo por aqui, mensalão, petrolão, eletrolão.

Você precisa reunir a família, assim como eu reuni os meus parentes próximos e distantes, os governadores dos Estados. Para explicar que a gastança e o desperdício têm de parar. E, claro, eles entenderam que, se eu for atingida, eles vão junto. Como se não bastasse o Brasil perder selo internacional de bom pagador, ganhará o selo de mau gastador.

Você precisa sobretudo comprar nossa “pauta-bomba”, que é a seguinte: cortaremos na carne, na sua carne, entendeu? Não falo de churrasco de fim de semana, esse já era. Falo de cortes mais nobres. Cortes de gastos públicos, que eu e o Levy prometemos. Vamos cortar no sal grosso: no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), na Saúde e na Educação. Morô? Não, esse verbo não, lembra o sobrenome daquele juiz que não larga o meu pé nem o de meus companheiros empreiteiros. Juiz posudo, metido a italiano da gema, com ternos bem cortados e essa obsessão de lavar tudo a jato, como se a água e meu governo fossem acabar amanhã.

Você sabe que tem gordura nos hospitais e nas escolas, não? Gordura no chão, nos corredores, nas salas de cirurgia e de aula. Ah, você deixa esses itens do orçamento doméstico para cortar por último? Você preserva ao máximo a saúde e a educação de sua família e prefere cortar primeiro os supérfluos? Entendi: é porque você valoriza a vida e o futuro deles e a oportunidade real de crescimento digno e sustentável.

Por isso a classe média não vai para a frente, cai no cheque especial, paga juros escorchantes no cartão de crédito. E a gente (nós e os intelectuais do PT) tem ojeriza a esse pessoal conservador, não afeito a riscos, enfim, uma classe média reacionária. Não é uma categoria politizada. Além de ser gigante, difícil de ser manobrada, a classe média cultua a ideologia do bem-estar da família. E ponto.

Você também sabe que a gente gosta de dar esmola aos pobres e de adular os ricos. É a tal governabilidade, uma receita infalível. Posar de mãe de miseráveis e se locupletar com os grandes projetos. Vimos agora que o nuclear entrou na dança premiada. Minha geladeira vive abarrotada de energéticos para aguentar o tranco de nossa House of Cards.

Graças a Deus que lá também, no Congresso, acabou a mamata. E também a proteção que dávamos ao ex-PMDB comportado de Sarney. Agora o Congresso quer me derrubar, prefere o diretor da escola, aquele que parece uma esfinge e não diz nada, você sabe quem é, só espera mais um passo meu em falso. Bota falso nisso. Agosto começou e deveria ser menor. Vou arrumar umas viagens internacionais.

Já nos livramos da Catta Preta, a advogada de delatores que se mudará para Miami por medo. Você também tem medo, não? É a lógica de gangues que impera no país. Viu as cenas no Brás, em São Paulo, com cidadãos, muitos idosos, cercados e roubados por abutres? Você se sente ameaçado por taxas e impostos, por assaltantes, golpistas e policiais, por empresas de serviço, todo mundo tascando um pedacinho seu? Tente um pacto, como eu.

Esqueçam minhas pedaladas fiscais, me ajudem a aprovar minhas contas no TCU, não deixem que a Caixa e o Banco do Brasil cobrem de mim mais de R$ 1 bilhão em taxas dos programas sociais. Reclamem menos da inflação de hoje porque ela tende a piorar amanhã. Não critiquem inaugurações de clínicas sem médicos ou fechamento de escolas sem professores. Não somos um governo-bomba.

Ruth de Aquino

Ontário e otários

Os jornais desse fim de semana trouxeram a notícia de que “centenas de mulheres de topless participaram nesse sábado de uma marcha em Waterloo, no Estado de Ontário, no Canadá, para protestar pela atitude da polícia local que reprimiu três alegres irmãs que, sem camisa e sutiã, pedalavam suas bicicletas pelas ruas do lugar.” Estavam com calor e lá o topless é permitido por lei. A polícia agiu com abuso por repreendê-las. Com cartazes, todas as manifestantes, de topless, alertavam: “eles são peitos, não são bombas”. Fontes ouvidas afirmaram que essa não era a dúvida. Sabia-se serem peitos, o que ficou definitivamente esclarecido para quem diferentemente pensasse.
 

Senti uma inveja absurda dos canadenses. Não pela fantasia da cena composta de centenas de mulheres de topless, pedalando alegres em protesto, mas por viverem num país onde um abuso da polícia, de tão frágil ordem, viria a ser objeto de densa manifestação popular. Imaginem essa mesma circunstância migrada para o Brasil, que ostenta sem solução um dos maiores quadros de insegurança pública, a par da ineficiência de sua força policial. Andaríamos pelados, no civil e no religioso.

Apenas para ilustrar o que é a vida num país onde a ordem, o direito, a justiça e a liberdade são patrimônios intocáveis e trazendo para o Brasil essa avaliação para dimensionarmos o desconforto que vivemos, brasileiros, com a instabilidade institucional que todos os dias nos ameaça, desconstrói nosso trabalho e nossas esperanças. O tempo passa e há 500 dias que vivemos do que será a operação Lava-jato (graças a Deus, produzindo bons e elogiáveis resultados), que há meses temos medidas econômicas absolutamente necessárias, ameaçadas pelo temperamento e vontade particular de um tipo como o deputado Eduardo Cunha, presidente da Câmara Federal. Acusado de ter recebido vultosa propina de empreiteiras hoje investigadas pela citada operação, esse senhor se opõe às investigações não com os seus argumentos de defesa, não com a sua história de parlamentar, mas com o poder que tem de obstruir a tudo para que todos nós, o país, sejamos dele dependentes ou prejudicados.

Na mesma postura vemos o presidente do Senado Federal, Renan Calheiros, também investigado, que se contrapõe ao Ministério Público que o acusou das mesmas práticas de seu colega (colega em toda extensão da palavra) presidente, de haver sido beneficiado pela propina, ambos para não dificultarem o andamento de obras públicas e seus superfaturamentos. Ninguém duvidou, ninguém veio em socorro deles nem tampouco de outros acusados no Senado e na Câmara.
 

 O senador Fernando Collor, cuja ficha revela práticas igualmente capituladas no Código Penal, surpreendido com uma frota milionária de carros importados na garagem da Dinda, igualmente protestou contra o MPF e o Procurador Geral da República. Collor também foi para o confronto pessoal.

Nenhum deles se defendeu com argumentos e provas. Vociferaram, ameaçaram, vão endurecer o controle da Câmara e do Senado. Ameaçam obstruir a recondução do procurador Rodrigo Janot ao comando da PGR porque esse aceitou denunciá-los. Nós só assistimos. O que somos?
Luiz Tito 

Aproxima-se a curva do caminho

Charge O Tempo 01/08

Se de um cidadão dizemos que ele tem quase toda honra, estaremos dizendo ser um desonrado. Se de um país falamos dispor de quase toda liberdade, desnecessário concluir tratar-se de uma ditadura. Assim, se de um governo referimos estar perto de cumprir suas promessas, na verdade aceitamos que fracassou.

O governo da presidente Dilma fica devendo tirar o Brasil da miséria, pois é a miséria que gradativamente o envolve. Importa menos se a propaganda oficial divulga que milhões ingressaram na classe média. Na verdade, a classe média é que recuou até eles. Da mesma forma, não dá para aceitar a fantasia de multidões disporem de carteira de trabalho, quando se constata estarem recebendo o salário mínimo. Outra ilusão é verificar que essa merreca, ao contrário do que estabelece a Constituição, não basta para o trabalhador e sua família enfrentarem despesas de habitação, alimentação, vestuário, transporte, educação, saúde e até lazer.

Em suma, se as elites vão bem, o povo continua muito mal. Basta atentar para a multiplicação de favelas nas grandes e nas pequenas cidades. Nelas, não se aplicam as regras e as leis pretensamente válidas para a nação. Como o número dos que habitam esses conglomerados logo irá ultrapassar o das comunidades à sua volta, invertendo a equação, a conclusão será de que eles, e não os outros, constituem a próxima e verdadeira estrutura social objeto de todo e qualquer governo. Numa palavra, não se trata de ampliar programas como “bolsa família” e “minha casa, minha vida”, a título de esmola, mas de ter presente serem seus integrantes os próximos determinantes da ação do governo. Em pouco tempo serão o próprio, isto é, o governo. Hoje, estão no poder. Amanhã, serão o poder.

Essa transição é traumática. E cruel. Numa primeira etapa leva os lideres da maioria reprimida à tentação de alçar-se à minoria. O Lula surge como o melhor exemplo dessa metamorfose. Basta ver como vive, como mora e como mudou. Um milhão de Lulas, no entanto, mudarão a perspectiva, bem como as regras do jogo ainda vigente.

Não adianta, pelo advento desse processo inexorável, jogar a culpa das contradições no governo Dilma. Nem nela, pessoalmente, por maior incompetência que revele na compreensão do fenômeno social.

Dirão os ingênuos que sempre foi assim e nunca o processo se inverteu: as massas jamais conquistaram o controle da situação, ainda que aqui e ali se tivessem rebelado, balançando as estruturas dispostas acima delas. Só que agora é diferente.

Os excluídos, cada vez mais e melhor informados, tomam pacífica consciência da exclusão. Essa a grande consequência da revolução tecnológica. Não mais através da mídia comprometida e amestrada, mas diretamente, primeiro agrupadas em guetos, logo ocupando maiores espaços, as massas assumirão o controle do processo. Quanto mais demissões, fome, miséria e doença, mais se aproximará a curva do caminho.

Carlos Chagas 

Miragem?

Resultado de imagem para ajuste fiscal chargeO ajuste fiscal é uma miragem. Sempre que se está chegando perto dele, ele escapa e fica distante. É preciso devolver à sociedade a perspectiva de crescimento
Delfim Netto

Criticar o PT, agora, é fácil

Com a crise multiforme se expandindo em todas as dimensões da vida política, econômica e social, com os escândalos vindo a lume como saem os lenços, amarradinhos um ao outro, da cartola do mágico, com a crise pedindo passagem a bordoadas e deixando pelo caminho as vítimas da inflação, da recessão e do desemprego, aí, meu caro leitor, é muito fácil criticar o governo petista.

Dureza foi apontar os males do petismo quando, antes de assumir poder político real, ele era o megafone de todas as reivindicações, perante os portões das fábricas e dos palácios. Difícil era confrontá-lo quando, como grande inquisidor das condutas de seus adversários, orientava os mais candentes sermões em favor - lembram? - da moralidade e da austeridade. O petismo, então, se vestia de justiça, solidariedade, direitos humanos, superação dos desníveis sociais; e atraía multidões. Os ouvidos da CNBB, por exemplo, se encantaram para sempre. A partir de então, vá o partido para onde for, a entidade marcha ao seu lado. Até frei Betto largou o PT de mão. Mas a CNBB, não.

À luz da história, analisando partidos políticos com condutas semelhantes, era fácil perceber para onde estávamos sendo conduzidos. Ante o que acontecia no Brasil, não. Aqui, tendo em vista a fragilidade das nossas instituições e a pouca credibilidade dos partidos políticos já afeitos ao exercício do poder, era mais complicado perceber que o petismo significava o canto das sereias, atraindo a nação para os rochedos e para o naufrágio.

Em 2003, o PT chegou ao poder e em 2005, quando estourou o mensalão, tornou-se comum encontrar com leitores que me paravam na rua para afirmar que eu profetizara. Mas era bem o contrário. Bastavam as entrelinhas e o entreouvido e, principalmente, ler o passado. Aquelas ideias e aquele modo de fazer política, em toda parte, produziram o resultado que passávamos a observar por aqui. Não obstante, foram necessários outros 12 anos, um descomunal estrago, e uma crise do tamanho da que aí está, para que, finalmente, ampla maioria da população compreendesse o que já deveria estar bem sabido.

"Coxinhas! Golpistas! Lacerdinhas! Ultradireitistas! Fascistas!". É assim que argumentam, hoje, muitos defensores do governo. Xingam os que afirmam algo tão óbvio quanto que o governo, acabou e que as instituições precisam resolver a encrenca. Conduta rasteira, chã, mas eu os entendo. Não há argumento que lhes lave as mãos e lhes limpe os calçados. Outros, depois de haver preparado o caminho do petismo ao poder como esfregadores de gelo no jogo de curling, e segurado a barra ao longo de 13 anos, agora se posicionam contra. Mas não mudam de lado! Para estes, o governo não serve. E a oposição tampouco. São os mais perigosos porque se alinharão, ao fim e ao cabo, com algo ainda pior do que isso que aí está
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Percival Puggina

Dilma, leniente ou cúmplice

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O PT sempre tratou seus adversários com um solene desprezo. Lula, que exerceu um único mandato de deputado federal, disse em certa ocasião que havia no Congresso 300 picaretas. Pouco mais, portanto, que a soma de deputados e senadores.

E o que ele fez quando assumiu a presidência da República pela primeira vez? Passou a governar com os picaretas. Se bem pagos, eles dão pouco trabalho.

Comparado com Dilma, dizem que Lula é um craque. Que sempre soube fazer política. Mas que tipo de política ele fez depois de se tornar inquilino do mais prestigiado gabinete do Palácio do Planalto?

O da farinha pouca, meu pirão primeiro? O do toma lá me dá cá? O do é dando que se recebe? O que aos amigos confere tudo, e aos inimigos os rigores da lei? A resposta é sim a todas as perguntas.

Nunca antes na história deste país houve tanta corrupção. E ela deve ser debitada, de preferência, na conta de Lula e de Dilma.

Não há maior engodo do que se atribuir a descoberta da ladroagem à independência concedida pelos governos do PT à Polícia Federal. O país já está crescidinho. Suas instituições estão sólidas e suportam crises.

A reeleição para cargos majoritários aumentou o apetite dos políticos pelo poder. Ninguém mais se elege pensando em fazer um bom governo em quatro anos. Elege-se pensando em obter um novo mandato.

E aí se gasta o que não se pode, rouba-se com vista à próxima eleição, e suborna-se para atrair apoios, garantindo-se mais tempo de propaganda eleitoral no rádio e na televisão.

No caso da presidência da República, mas não só, nunca antes a corrupção fez parte de um esquema tão ambicioso para a eternização no poder de um determinado partido.

É do PT, de Lula e de Dilma a responsabilidade política pelo que aconteceu. Foram eles que mais se beneficiaram de tudo. Se agora receiam que a polícia lhes bata à porta… Sabem o que fizeram.

Por cálculo político, esperteza ou porque creem, 10 entre 10 estrelas da política afirmam que Dilma é uma pessoa honrada. Que jamais roubou um tostão e que jamais roubaria.

O vilão é Lula. Foi nos governos dele que tudo começou. Fernando Henrique Cardoso defendeu essa tese em entrevista recente a uma revista alemã. Gentil homem!

 
Perguntem às estrelas se elas acreditam que Dilma é distraída a ponto de desconhecer o que se passava ao alcance dos seus olhos ou ouvidos. Dez entre 10 estrelas da política, sob a garantia de anonimato, responderão que não. É impossível que não soubesse ou que não desconfiasse.

Dou de barato que não roubou. Não a considero, porém, uma tola formidável capaz de ser enganada facilmente.

Quer dizer que Dilma nunca fez ideia que dinheiro sujo, derivado de negócios entre empreiteiras e a Petrobras, irrigou suas campanhas?

Que diretores da Petrobras, nomeados por Lula, desviaram recursos para alimentar os caixas do PT e de aliados?

E que cargos presenteados por ela a políticos sempre serviram ao roubo e continuarão servindo? Só a Petrobras perdeu algo como 19 bilhões de reais.

Dilma, ministra das Minas e Energia, chefe da Casa Civil, presidente do Conselho de Administração da Petrobras, presidente da República, não viu que a empresa estava sendo saqueada?

E que não era a única?

Se não viu deve pedir desculpas e as contas por leniência. Se viu, deve ser mandada embora.

A alternativa é a manutenção no poder de alguém sem autoridade política para governar um país conturbado.

Ricardo Noblat