quinta-feira, 27 de agosto de 2020
Nove milhões de brasileiros deixaram de comer por falta de dinheiro durante a pandemia
A pandemia do novo coronavírus afetou a qualidade e a quantidade de comida que as crianças e adolescentes brasileiros estão consumindo. Além disso, em diversos outros aspectos, os lares onde eles vivem foram mais afetados pela crise econômica e social que se instalou após a chegada do vírus no Brasil. É o que concluiu pesquisa do Ibope e Unicef realizada com adultos que vivem com adolescentes e crianças entre 4 e 17 anos. De acordo com o levantamento, 21% dos entrevistados afirmaram que vivenciaram momentos em que os alimentos acabaram e não havia dinheiro para comprar mais. Entre os que vivem com crianças e adolescentes em casa, esse percentual foi de 27%. Sem ter a quem recorrer, como programas de distribuição de alimentos, 6% disseram que a única saída foi deixar de comer, o que representa cerca de nove milhões de brasileiros deixando de realizar alguma refeição por falta de dinheiro. Nos lares com crianças e adolescentes, esse percentual sobe para 8%.
O estudo ainda mostra que a comida, quando tem, é de pior qualidade em muitos casos. Quase metade (49%) dos brasileiros sofreu alguma mudança nos hábitos alimentares neste período de quarentena. Entre as famílias que vivem com crianças ou adolescentes o impacto foi ainda maior: 58%. Isso inclui o aumento do consumo de alimentos industrializados, refrigerantes e fast food, o que contribuiu para a evolução de uma outra epidemia, explica Cristina Albuquerque, chefe de saúde do Unicef Brasil. “A covid-19 pode trazer um agravamento da epidemia da obesidade entre crianças, adolescentes e nas famílias”, afirmou.
A mesa vazia é reflexo direto da crise econômica que abalou principalmente as famílias mais pobres durante a pandemia. Mais da metade dos entrevistados (55%) disse que o rendimento caiu desde o início da pandemia. Em muitos casos, a redução se deu por causa das demissões, já que 64% afirmaram que estavam trabalhando antes da chegada do coronavírus ao Brasil, mas, no momento da pesquisa, realizada em julho, este percentual havia caído para 50%. Já os lares com crianças e adolescentes foram especialmente afetados também neste campo: nessas casas, 63% afirmaram que o rendimento caiu. Em 25% desses lares, a renda diminui pela metade. Já nas casas sem crianças, a mesma redução foi observada por 14%.
O levantamento mediu também o impacto da pandemia na educação e revelou um dado um tanto surpreendente: 91% afirmaram que as crianças e adolescentes continuaram realizando as atividades escolares durante a pandemia. O percentual chamou a atenção das autoridades do Unicef que apresentaram os dados para a imprensa na manhã desta terça-feira. Mas, por outro lado, foi frisado que é preciso questionar a qualidade desse vínculo escolar que foi mantido remotamente nos últimos meses. “A grande questão é entender a qualidade com que essa frequência de atividades tem sido realizada”, afirmou Ítalo Dutra, chefe de educação do Unicef Brasil.
Deste grupo que seguiu realizando as atividades escolares mesmo de casa, a pesquisa registrou disparidade entre a rede pública e a particular. Enquanto 94% dos alunos da escola privada seguiu realizando as atividades, na rede pública foram 89%. A Internet foi o meio utilizado por 97% dos estudantes da rede particular para seguir estudando, e para 81% da rede pública.
As aulas e atividades remotas, no entanto, não demandaram dedicação somente dos estudantes. A maioria (73%) afirmou que eles tiveram ajuda de alguém em casa para realizar as atividades. E 63% receberam tarefas cinco dias por semana para serem cumpridas.
A pesquisa foi realizada entre os dias 3 e 18 de julho, com entrevistas por telefone feitas com 1.516 pessoas acima de 18 anos de todas as regiões do país.
O estudo ainda mostra que a comida, quando tem, é de pior qualidade em muitos casos. Quase metade (49%) dos brasileiros sofreu alguma mudança nos hábitos alimentares neste período de quarentena. Entre as famílias que vivem com crianças ou adolescentes o impacto foi ainda maior: 58%. Isso inclui o aumento do consumo de alimentos industrializados, refrigerantes e fast food, o que contribuiu para a evolução de uma outra epidemia, explica Cristina Albuquerque, chefe de saúde do Unicef Brasil. “A covid-19 pode trazer um agravamento da epidemia da obesidade entre crianças, adolescentes e nas famílias”, afirmou.
A mesa vazia é reflexo direto da crise econômica que abalou principalmente as famílias mais pobres durante a pandemia. Mais da metade dos entrevistados (55%) disse que o rendimento caiu desde o início da pandemia. Em muitos casos, a redução se deu por causa das demissões, já que 64% afirmaram que estavam trabalhando antes da chegada do coronavírus ao Brasil, mas, no momento da pesquisa, realizada em julho, este percentual havia caído para 50%. Já os lares com crianças e adolescentes foram especialmente afetados também neste campo: nessas casas, 63% afirmaram que o rendimento caiu. Em 25% desses lares, a renda diminui pela metade. Já nas casas sem crianças, a mesma redução foi observada por 14%.
O levantamento mediu também o impacto da pandemia na educação e revelou um dado um tanto surpreendente: 91% afirmaram que as crianças e adolescentes continuaram realizando as atividades escolares durante a pandemia. O percentual chamou a atenção das autoridades do Unicef que apresentaram os dados para a imprensa na manhã desta terça-feira. Mas, por outro lado, foi frisado que é preciso questionar a qualidade desse vínculo escolar que foi mantido remotamente nos últimos meses. “A grande questão é entender a qualidade com que essa frequência de atividades tem sido realizada”, afirmou Ítalo Dutra, chefe de educação do Unicef Brasil.
Deste grupo que seguiu realizando as atividades escolares mesmo de casa, a pesquisa registrou disparidade entre a rede pública e a particular. Enquanto 94% dos alunos da escola privada seguiu realizando as atividades, na rede pública foram 89%. A Internet foi o meio utilizado por 97% dos estudantes da rede particular para seguir estudando, e para 81% da rede pública.
As aulas e atividades remotas, no entanto, não demandaram dedicação somente dos estudantes. A maioria (73%) afirmou que eles tiveram ajuda de alguém em casa para realizar as atividades. E 63% receberam tarefas cinco dias por semana para serem cumpridas.
A pesquisa foi realizada entre os dias 3 e 18 de julho, com entrevistas por telefone feitas com 1.516 pessoas acima de 18 anos de todas as regiões do país.
'Vitória' do Mito
O Brasil já está num platô há dois meses e meio e parte do erro é irrecuperável. Vamos ter ainda um grande número de mortes por um tempo, até que uma hora vai cair, vamos ter uma imunidade coletiva forçada. É uma tristeza, um dos experimentos mundiais mais dolorosos já feitos
Sai Friedman, entra Samuelson
O principal guru do ministro da Economia, Paulo Guedes, é o grande patrono da Chicago School of Monetary Economics: o economista ultraliberal Milton Friedman, nascido e criado no Brooklyn, em Nova York, filho de um casal de judeus imigrantes da Ucrânia. Friedman queria estudar matemática, mas os professores Arthur F. Burns e Homer Jones o influenciaram a estudar economia. Burns, pela dedicação à pesquisa; Jones, porque conseguiu uma bolsa de US$ 300 para ele estudar na Universidade de Chicago, da qual se tornou professor em 1946, por 30 anos. Em 1962, no livro Capitalismo e Liberdade, no qual reuniu suas principais conferências, defendeu a abolição de subsídios agrícolas, tarifas/cotas de importação, controle de aluguéis, salário mínimo, moradia subsidiada, licenciamento profissional, seguridade social, monopólio estatal dos correios, agências regulatórias e alistamento militar obrigatório. Vendeu 500 mil exemplares.
Em 1976, Friedman ganhou o Nobel de Economia, para o qual foi fundamental sua atuação no Chile, como conselheiro dos economistas chilenos egressos da Universidade de Chicago que implantaram as reformas liberais do general Augusto Pinochet, o ditador chileno que havia deposto Salvador Allende, em 1973, equipe da qual o ministro Guedes fez parte. Vem daí a associação de Friedman ao autoritarismo — as reformas somente foram possíveis depois de um banho de sangue —; porém, ele teve uma única conversa com Pinochet. Entretanto, suas palestras fizeram grande sucesso e seus conselhos foram seguidos à risca: cortes rápidos e severos nos gastos do governo para conter a inflação, instituições mais abertas ao comércio internacional e políticas compensatórias para aliviar a vida das classes mais pobres.
Ontem, o presidente Jair Bolsonaro assinou medida provisória que cria um novo programa de habitação do governo federal, batizado de Casa Verde e Amarela, concebido para substituir o programa Minha casa, Minha Vida, criado em 2009, no governo Lula, para ser o carro-chefe da eleição da presidente Dilma Rousseff. Além de financiamento de imóveis, o programa de Bolsonaro prevê ações voltadas à regularização fundiária, à reforma de imóveis e à retomada de obras. Os juros do financiamento das habitações do programa serão menores nas regiões Norte e Nordeste.
A previsão do governo é gastar R$ 25 bilhões do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e R$ 500 milhões do Fundo de Desenvolvimento Social (FDS, fundo privado, mantido por bancos) e gerar 2,3 milhões de novos postos de trabalhos até 2024, entre diretos, indiretos e induzidos. O ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, será o responsável pelo programa, que vai ampliar o número de famílias beneficiadas mediante redução na taxa de juros do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço “para a menor da história”, além de mudanças na remuneração dos agentes financeiros.
Político hábil, Marinho convenceu o presidente Jair Bolsonaro e ganhou a queda de braço com Guedes. Economista, é um desenvolvimentista. Investimentos em habitação, ou seja, na construção civil, setor mais dinâmico da economia das cidades e grande empregador de mão de obra direta, têm grande “efeito multiplicador” na economia. É aí que entra o Paul Samuelson, ganhador do prêmio Nobel de 1970, um dos economistas mais influentes do século, defensor da aplicação desse conceito na política econômica. Físico e economista, Samuelson é autor de Fundamentos da Análise Econômica, ou Economics, um clássico da teoria econômica, que extrapola o campo da matemática na análise da complexidade da econômica.
O “multiplicador” é um efeito de segunda ordem sobre o sistema econômico criado pelo investimento. A expansão de um componente específico da renda nacional gera um resultado final maior do que o inicial para o PIB total. Qualquer alteração nas contas de consumo, investimento, gastos governamentais ou exportações impacta os indicadores de crescimento. Há três tipos de multiplicadores: o monetário, o fiscal e o keynesiano. O “multiplicador monetário” ocorre por meio do sistema bancário que, ao emprestar o que recebe através dos depósitos do público, multiplica a base monetária da economia, ou seja, o total de moeda disponível. O tomador do empréstimo vai investir esse dinheiro em produção para obter lucros superiores aos juros negociados com o banco. A poupança vira investimento e aumenta a renda. Já o “multiplicador fiscal” é uma mudança nos gastos governamentais, que impactará toda a renda nacional, com progressivo aumento no consumo e da renda, impactando generalizadamente na demanda agregada. Ou seja, a expansão do gasto público.
O “multiplicador keynesiano” refere-se ao impacto gerado pelo investimento. Quando há um aumento dos investimentos produtivos das empresas, haverá aumento na produção e mais contratação de mão de obra. Essa renda se reverte em consumo e poupança, sendo que o consumo é reinjetado na produção, aumentando ainda mais a renda nacional. A poupança será utilizada na sequência para investir em mais produção (por meio do multiplicador bancário) que será puxada pela demanda, com a ampliação do consumo. Ou seja, cada aumento na equação do PIB — consumo, investimento, gastos do governo ou exportações líquidas — gera um aumento na renda nacional. O problema é que essa conta não fecha numa situação como a que o Brasil está vivendo, sem poupança interna nem capacidade de endividamento. O próximo passo será “furar o teto” dos gastos públicos e emitir moeda.
Em 1976, Friedman ganhou o Nobel de Economia, para o qual foi fundamental sua atuação no Chile, como conselheiro dos economistas chilenos egressos da Universidade de Chicago que implantaram as reformas liberais do general Augusto Pinochet, o ditador chileno que havia deposto Salvador Allende, em 1973, equipe da qual o ministro Guedes fez parte. Vem daí a associação de Friedman ao autoritarismo — as reformas somente foram possíveis depois de um banho de sangue —; porém, ele teve uma única conversa com Pinochet. Entretanto, suas palestras fizeram grande sucesso e seus conselhos foram seguidos à risca: cortes rápidos e severos nos gastos do governo para conter a inflação, instituições mais abertas ao comércio internacional e políticas compensatórias para aliviar a vida das classes mais pobres.
Ontem, o presidente Jair Bolsonaro assinou medida provisória que cria um novo programa de habitação do governo federal, batizado de Casa Verde e Amarela, concebido para substituir o programa Minha casa, Minha Vida, criado em 2009, no governo Lula, para ser o carro-chefe da eleição da presidente Dilma Rousseff. Além de financiamento de imóveis, o programa de Bolsonaro prevê ações voltadas à regularização fundiária, à reforma de imóveis e à retomada de obras. Os juros do financiamento das habitações do programa serão menores nas regiões Norte e Nordeste.
A previsão do governo é gastar R$ 25 bilhões do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e R$ 500 milhões do Fundo de Desenvolvimento Social (FDS, fundo privado, mantido por bancos) e gerar 2,3 milhões de novos postos de trabalhos até 2024, entre diretos, indiretos e induzidos. O ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, será o responsável pelo programa, que vai ampliar o número de famílias beneficiadas mediante redução na taxa de juros do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço “para a menor da história”, além de mudanças na remuneração dos agentes financeiros.
Político hábil, Marinho convenceu o presidente Jair Bolsonaro e ganhou a queda de braço com Guedes. Economista, é um desenvolvimentista. Investimentos em habitação, ou seja, na construção civil, setor mais dinâmico da economia das cidades e grande empregador de mão de obra direta, têm grande “efeito multiplicador” na economia. É aí que entra o Paul Samuelson, ganhador do prêmio Nobel de 1970, um dos economistas mais influentes do século, defensor da aplicação desse conceito na política econômica. Físico e economista, Samuelson é autor de Fundamentos da Análise Econômica, ou Economics, um clássico da teoria econômica, que extrapola o campo da matemática na análise da complexidade da econômica.
O “multiplicador” é um efeito de segunda ordem sobre o sistema econômico criado pelo investimento. A expansão de um componente específico da renda nacional gera um resultado final maior do que o inicial para o PIB total. Qualquer alteração nas contas de consumo, investimento, gastos governamentais ou exportações impacta os indicadores de crescimento. Há três tipos de multiplicadores: o monetário, o fiscal e o keynesiano. O “multiplicador monetário” ocorre por meio do sistema bancário que, ao emprestar o que recebe através dos depósitos do público, multiplica a base monetária da economia, ou seja, o total de moeda disponível. O tomador do empréstimo vai investir esse dinheiro em produção para obter lucros superiores aos juros negociados com o banco. A poupança vira investimento e aumenta a renda. Já o “multiplicador fiscal” é uma mudança nos gastos governamentais, que impactará toda a renda nacional, com progressivo aumento no consumo e da renda, impactando generalizadamente na demanda agregada. Ou seja, a expansão do gasto público.
O “multiplicador keynesiano” refere-se ao impacto gerado pelo investimento. Quando há um aumento dos investimentos produtivos das empresas, haverá aumento na produção e mais contratação de mão de obra. Essa renda se reverte em consumo e poupança, sendo que o consumo é reinjetado na produção, aumentando ainda mais a renda nacional. A poupança será utilizada na sequência para investir em mais produção (por meio do multiplicador bancário) que será puxada pela demanda, com a ampliação do consumo. Ou seja, cada aumento na equação do PIB — consumo, investimento, gastos do governo ou exportações líquidas — gera um aumento na renda nacional. O problema é que essa conta não fecha numa situação como a que o Brasil está vivendo, sem poupança interna nem capacidade de endividamento. O próximo passo será “furar o teto” dos gastos públicos e emitir moeda.
Um cenário de colapso social?
O que ocorre com as condições de vida das pessoas econômica e socialmente vulneráveis nos períodos seguintes às pandemias? Walter Scheidl, historiador da Universidade de Stanford, analisou a evolução global das desigualdades sociais e econômicas da humanidade desde o período da Idade da Pedra (fase da pré-história) até o século XXI. Dedicou uma parte do livro para avaliar como as epidemias impactaram as desigualdades em diferentes períodos históricos.
Embora tenha dado especial atenção à investigação sobre a devastadora Peste Negra, com mortes estimadas que variaram de 50 milhões a 200 milhões de pessoas durante o século XIV na Eurásia, dedicou sua análise também para outras experiências históricas de pandemias. Como as epidemias são consideradas um fenômeno recorrente da história mundial, deixaram-nos algumas lições sobre as questões econômicas e sociais que emergem ao final de seu ciclo.
Entre essas lições, destaca-se que em todas elas ocorreram: 1) a extraordinária perda de milhares ou milhões de vidas; 2) sacrifícios inusitados no bem-estar social das populações e no atendimento de suas necessidades básicas; 3) empobrecimento generalizado das sociedades, com queda persistente da renda e do emprego; 4) intensificação dos conflitos distributivos da renda e da riqueza entre os diferentes grupos sociais; 5) a eliminação, ao longo do tempo, pelas estruturas institucionais prevalecentes, da descompressão das desigualdades sociais através do nivelamento das perdas.
Mas a principal lição da história se refere à constatação de que as cicatrizes econômicas e sociais das mazelas pós-pandemias serão mais ou menos profundas dependendo do contexto histórico de três fatores: o estado geral da nação no período pré-pandemia; a intensidade e a duração da fase das contaminações e das mortes; e o conjunto de ações e intervenções de natureza mitigatória e compensatória das autoridades estabelecidas.
No caso brasileiro, o período pré-pandemia não era nada favorável. A economia crescia lentamente; o número de pobres e miseráveis posicionava o Brasil como o sétimo país mais desigual no Mundo; o número de desempregados, subempregados e desalentados chegava a 28 milhões; o percentual das famílias brasileiras endividadas era superior a 65%. Vale dizer, um ponto de partida com elevado passivo social, ao qual iria se somar a degradação dos indicadores de desenvolvimento humano durante o ciclo da pandemia.
Durante esse ciclo, a situação socioeconômica dos brasileiros tornou-se menos dramática por causa dos auxílios emergenciais, trabalhistas e de financiamentos favorecidos pelo governo federal. Contudo, não se pode subestimar a crise socioeconômica para a qual estamos caminhando no período pós-pandemia, o que nos leva a pensar até mesmo em um cenário de colapso social, dentro do princípio da precaução no processo de planejamento.
Para evitar que esse cenário venha a ocorrer são necessárias pelo menos três ações programáticas: a manutenção do auxílio emergencial em valores justos e realistas enquanto os mercados de trabalho não reagirem; a manutenção das atuais políticas sociais compensatórias institucionalizadas; e a formulação e a implementação de uma estratégia de retomada do crescimento econômico multissetorial e multirregional.
Embora tenha dado especial atenção à investigação sobre a devastadora Peste Negra, com mortes estimadas que variaram de 50 milhões a 200 milhões de pessoas durante o século XIV na Eurásia, dedicou sua análise também para outras experiências históricas de pandemias. Como as epidemias são consideradas um fenômeno recorrente da história mundial, deixaram-nos algumas lições sobre as questões econômicas e sociais que emergem ao final de seu ciclo.
Entre essas lições, destaca-se que em todas elas ocorreram: 1) a extraordinária perda de milhares ou milhões de vidas; 2) sacrifícios inusitados no bem-estar social das populações e no atendimento de suas necessidades básicas; 3) empobrecimento generalizado das sociedades, com queda persistente da renda e do emprego; 4) intensificação dos conflitos distributivos da renda e da riqueza entre os diferentes grupos sociais; 5) a eliminação, ao longo do tempo, pelas estruturas institucionais prevalecentes, da descompressão das desigualdades sociais através do nivelamento das perdas.
Mas a principal lição da história se refere à constatação de que as cicatrizes econômicas e sociais das mazelas pós-pandemias serão mais ou menos profundas dependendo do contexto histórico de três fatores: o estado geral da nação no período pré-pandemia; a intensidade e a duração da fase das contaminações e das mortes; e o conjunto de ações e intervenções de natureza mitigatória e compensatória das autoridades estabelecidas.
No caso brasileiro, o período pré-pandemia não era nada favorável. A economia crescia lentamente; o número de pobres e miseráveis posicionava o Brasil como o sétimo país mais desigual no Mundo; o número de desempregados, subempregados e desalentados chegava a 28 milhões; o percentual das famílias brasileiras endividadas era superior a 65%. Vale dizer, um ponto de partida com elevado passivo social, ao qual iria se somar a degradação dos indicadores de desenvolvimento humano durante o ciclo da pandemia.
Durante esse ciclo, a situação socioeconômica dos brasileiros tornou-se menos dramática por causa dos auxílios emergenciais, trabalhistas e de financiamentos favorecidos pelo governo federal. Contudo, não se pode subestimar a crise socioeconômica para a qual estamos caminhando no período pós-pandemia, o que nos leva a pensar até mesmo em um cenário de colapso social, dentro do princípio da precaução no processo de planejamento.
Para evitar que esse cenário venha a ocorrer são necessárias pelo menos três ações programáticas: a manutenção do auxílio emergencial em valores justos e realistas enquanto os mercados de trabalho não reagirem; a manutenção das atuais políticas sociais compensatórias institucionalizadas; e a formulação e a implementação de uma estratégia de retomada do crescimento econômico multissetorial e multirregional.
Assinar:
Postagens (Atom)