No dia 31 de agosto do ano passado, a presidente Dilma Rousseff teve seu mandato cassado, sob a alegação de que ela cometeu crime de responsabilidade ao editar três decretos de créditos suplementares sem autorização do Congresso e ao atrasar o repasse de recursos do Tesouro a bancos públicos para pagamento de programas sociais, no que ficou conhecido como "pedaladas fiscais". Campanhas histéricas acusavam seu governo de corrupção, e, no entanto, Dilma perdeu o mandato por questiúnculas técnicas que ninguém até hoje conseguiu me explicar direito.
Tão confusa mostrou-se aquela votação que, embora os senadores entendessem que a presidente Dilma Rousseff cometeu um crime – o que ocasionou a punição com sua destituição do cargo -, eles recusaram a aplicar-lhe a pena, que a tornaria inelegível para cargos públicos por oito anos. Numa espetacular amostra de como funciona o jeitinho brasileiro, cassaram seu mandato ao mesmo tempo em que preservavam os direitos políticos.
Assim como é impossível aceitar que o Congresso tomou sua resolução contra Dilma Rousseff baseado em rigorosa documentação contábil – e não em inconfessáveis interesses escusos -, é impossível entender que a decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) tenha se escorado em critérios objetivos e não em razões políticas. Dizendo-se preocupado com nossa democracia, o ministro do Supremo Tribunal Federal, e presidente do TSE, Gilmar Mendes, alertou para o fato de que, aos olhos estrangeiros, temos produzido mais cassações agora que durante o período da ditadura...
Aceitando as considerações dos advogados de defesa, tanto de Dilma Rousseff quanto de seu vice, de não arrolar na acusação documentos e depoimentos que mostravam à exaustão a existência de um sistema de pagamento de propinas para a abastecer a chapa vencedora das eleições de 2014, os ministros do Tribunal Superior Eleitoral, capitaneados por Gilmar Mendes, livraram Michel Temer da cassação e, ironicamente, mantiveram a presidente cassada elegível nas próximas eleições.
Antes, no dia 25 de maio, o juiz Sergio Moro havia inocentado a mulher do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), Claudia Cruz, da acusação de crime de lavagem de dinheiro e evasão de divisas na Operação Lava Jato. De acordo com o Ministério Público Federal, Claudia Cruz teria recebido em uma conta secreta na Suíça mais de US$ 1 milhão proveniente de propina recebida por seu marido. Esse dinheiro teria sido usado na compra de artigos de luxo e despesas em viagens internacionais.
Em seu despacho, Moro considerou a atitude de Claudia Cruz "altamente reprovável", seus gastos "extravagantes" e "inconsistentes" com a renda de um agente público, no caso, Eduardo Cunha, mas não viu dolo em sua atitude. O juiz acatou o argumento de Claudia Cruz de que, embora jornalista, em casa conservava-se apenas como "esposa e mãe": "é bastante plausível a sua alegação de que a gestão financeira da família era de responsabilidade do marido", escreveu.
A ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Maria Thereza de Assis Moura, já havia, em março, autorizado a advogada Adriana Ancelmo, mulher do ex-governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, a cumprir prisão domiciliar, sob o argumento de que ela tem que se manter ao lado dos filhos menores (de 11 e 14 anos). Adriana Ancelmo tem 45 acusações por lavagem de dinheiro desviado dos cofres públicos – Cabral é réu em 10 processos por corrupção.
No Brasil é assim: a Justiça é para quem pode...
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