sábado, 21 de julho de 2018

Vampiros no banco de sangue

O diretor de Desenvolvimento Setorial da ANS, Rodrigo Aguiar, não pode ser acusado de esconder o jogo. Em entrevista ao Globo, ele defendeu a cobrança extra aos pacientes e informou que a agência “não é um órgão de defesa do consumidor”. Quem ousaria pensar o contrário?

A fala não revela apenas desprezo pelos clientes, que já penavam para pagar as mensalidades antes da nova regra. Também escancara a captura das agências reguladoras por grandes grupos econômicos. No caso da ANS, quem dá as ordens são os planos de saúde.

A autarquia ANS não é o Procon, mas foi criada para fiscalizar as empresas e impedir que o mercado atropele os consumidores. Não se trata de uma opinião. Basta ler a lei que criou a agência, no governo FH.


O texto afirma que a finalidade institucional do órgão é “promover a defesa do interesse público na assistência suplementar à saúde”. Entre suas principais atribuições, fixa a de “articular-se com os órgãos de defesa do consumidor visando à eficácia da proteção e à defesa do consumidor de serviços privados”.
Na segunda-feira, a ministra Cármen Lúcia suspendeu a resolução da ANS que permitiu a cobrança extra de até 40% sobre consultas e exames. Na decisão, ela anotou: “Saúde não é mercadoria. Vida não é negócio. Dignidade não é lucro”.

O diretor da agência não entendeu ou não quis entender o recado. Na entrevista a Luciana Casemiro, ele desdenhou de quem questiona a submissão da ANS aos planos. Reduziu as críticas a “fala repetida” e “retórica de falar mal das agências”.
O lobby da saúde sempre foi influente em Brasília. A novidade é que a turma perdeu o pudor e passou a operar às claras. O presidente Michel Temer entregou o ministério a Ricardo Barros, um deputado do PP que teve a campanha patrocinada pelo setor. Ele avisou logo que não fiscalizaria a qualidade dos planos. “Ninguém é obrigado a contratar”, justificou.

A ANS é feudo do MDB. O relatório que avalizou a indicação de Rodrigo Aguiar foi assinado pelo senador Valdir Raupp, réu na Lava-Jato. Um observador do que ocorre na agência diz que seria impreciso falar em raposas cuidando do galinheiro. Neste caso, ele prefere a imagem de vampiros no banco de sangue.

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