A presidente Dilma Rousseff nunca se entusiasmou com a criação de novos assentamentos rurais para a reforma agrária. Adotou sempre a ideia de que é mais produtivo melhorar os assentamentos já existentes. O Movimento dos Sem Terra (MST) e outras organizações reagiram inicialmente e acusaram a presidente de abandonar a bandeira da reforma agrária. Com o tempo, porém, se alinharam à nova política. Hoje a luta pela terra não está mais no centro das suas preocupações.
Essa mudança de foco é o tema do artigo “Sem-terra: da centralidade da luta pela terra à luta por políticas públicas”, assinado pelo professor e pesquisador João Fabrini e publicado na mais recente edição do Boletim Dataluta – publicação mensal do Núcleo de Estudos, Pesquisas e Projetos de Reforma Agrária (NERA), vinculado à Unesp. De acordo com as observações do especialista, os movimentos ”passaram priorizar a luta por políticas públicas, diferente do que ocorria no passado em que as ocupações de terra possuíam centralidade”.
As políticas públicas pelas quais esses movimentos lutam, segundo o autor, visam “dotar o meio rural de condições adequadas de educação, moradia, energia elétrica, internet, comunicação, crédito, agroindústria, inserção da produção camponesa no circuito comercial”.
Em outras palavras, passaram a fazer aquilo que o governo quer. Ou, como diz o autor, a ação deles “coaduna com o projeto atual do governo federal”.
Na prática, o MST concentra esforços para fazer acordos com o objetivo de estender aos assentamentos programas sociais já existentes. Entre eles podem ser citados Programa Luz Para Todos, Programa Nacional de Habitação Rural, Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) e Programa de Aquisição de Alimentos (PAA).
O que teria levado os movimentos a redefinirem sua estratégia? O autor aponta fatores conjunturais e estruturais. Menciona, por exemplo, o avanço do capitalismo nas regiões rurais e a diminuição das áreas improdutivas que poderiam ser destinadas à reforma agrária.
Diz ele: “O capital interessou-se pela agricultura com o aumento de ganho de produtividade, pois a produção na terra estaria dando mais ‘lucro’ do que a especulação, minando o rentismo que sempre caracterizou o espaço agrário brasileiro. A elevação dos preços dos produtos de exportação fez os latifundiários dedicarem ou entregarem suas terras à produção, diminuindo a oferta de terras improdutivas que poderiam ser destinadas à reforma agrária.”
Ele também considera a mudança na política do governo, atribuindo-a a dois fatores: “Esse recuo está relacionado ao fato do governo não entender a realização da reforma agrária e a pequena agricultura como parte do projeto de desenvolvimento do Brasil, bem como à atuação política dos setores ruralistas fortemente representados no Congresso Nacional. A aliança pragmática do governo com o setor ruralista para garantir governabilidade da nação colocou um conjunto de obstáculos para as desapropriações.”
Na visão do autor, sem desapropriações os sem terra não se sentem animados a ocupar propriedades rurais.
O autor cita que “enquanto no período de governo Lula e FHC foram desapropriados 48 milhões de hectares e 21 milhões de hectares, respectivamente, no governo Dilma, foram desapropriados apenas 2,3 milhões de hectares”. Em 2013 ocorreram apenas 10 desapropriações de terras para reforma agrária.
Hoje os protestos promovidos pelo MST estão voltados para órgãos do governo, como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e sedes de ministérios.
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