Para evitar a humilhação, restava ao velho líder operário a possibilidade do Supremo Tribunal Federal – STF rever a sua própria decisão de mandar cumprir as sentenças logo que um réu seja condenado em segunda instância. Alguns dos juízes gostariam que o plenário reexaminasse a questão. Afinal de contas, de acordo com a Constituição, e em nome da presunção de inocência, ninguém deve ser preso até ao derradeiro trânsito em julgado de uma sentença condenatória.
Mas o STF, tão célere noutros casos, mostra-se desta vez, por decisão da juíza Carmen Lúcia, que preside, renitente a reavaliar a situação – mantendo fechada a porta pela qual Lula poderia escapar.
Resta, assim, ao ex-presidente a possibilidade de algum dos juízes do Supremo, em decisão unilateral, aceitar o habeas corpus preventivo que a sua defesa já apresentou. Mas, mesmo isso, permanece em aberto e o PT vive nestes dias a angústia de ver passar o tempo e com isso avolumar-se a possibilidade do seu líder histórico ser submetido a uma humilhação nacional e internacional.
Mas, face ao comportamento desigual da justiça – muito leniente com políticos de outros quadrantes – muitos aqui consideram que esse quadro idílico não corresponde à realidade. Agora mesmo, a presidente do Supremo não se eximiu de receber em sua casa o atual presidente, Michel Temer, contra quem impendem graves acusações de corrupção por parte do ministério público.
A amarga ironia para Lula e o PT é que foram eles próprios que – em nome da luta contra a corrupção – apoiaram algumas medidas que agora se viram contra eles: a forma de designação do PGR, a lei da delação premiada e a possibilidade de prisão logo após sentença em segunda instância…
Agora, resta saber se essa dinâmica vai prosseguir, prendendo Lula, ou se o sistema acabará, no último momento, por evitar o choque que tal medida não deixaria de provocar, mesmo sabendo que haverá no país uma curta maioria em favor da sua prisão.
Para os juízes e procuradores que a si próprios se vêm como justiceiros e regeneradores, a não prisão de Lula seria enorme desilusão; mas, para os políticos, herdeiros de uma tradição secular de compromissos, seria uma salvaguarda do próprio sistema. E sempre poderiam dizer que Lula, afinal, não é um cara qualquer – foi talvez o presidente mais popular da história do país e o que mais projetou o Brasil no plano externo. E é, ainda hoje e apesar de tudo, o preferido de pelo menos um terço do eleitorado.
O que espanta, neste confronto, é que não se vislumbrem soluções de maior equilíbrio: a emissão de um perdão como Ford fez com Nixon ou uma condenação com pena suspensa – garantindo a condenação moral, mas evitando a humilhação do confinamento.
Para já, parece ser grande a tentação de queimar um capital simbólico remanescente, maculado, é certo, mas real, em nome de um outro ainda só emergente e relativo. Brasil, país regenerado ou autofágico?
Carlos Fino
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