domingo, 27 de novembro de 2016

Com Fidel, morre um símbolo. Nada mais, nada menos

Fidel Castro não vive mais: para muitos na América Latina, é como se, na Alemanha, o ex-chanceler federal Helmut Kohl tivesse morrido. Por mais diferentes que essas personalidades históricas sejam entre si, por menos comparável que seja o significado de suas políticas, ambas têm algo muito em comum: seu significado simbólico para uma fase histórica cuja melhor definição ainda é "o pós-Guerra".

Gerações inteiras cresceram com Fidel Castro, de ambos os lados do Oceano Atlântico. Cuba e Castro evocam a Baía dos Porcos e a crise dos mísseis, clímax da Guerra Fria numa época altamente explosiva que, olhando em retrospectiva, parece hoje quase tranquila.

O "Líder Máximo" foi, ao longo de décadas, uma figura de proa do comunismo, adorado por uns, odiado por outros. Após a morte prematura do muito mais carismático Che Guevara, Castro herdou o papel de figura simbólica da Revolução Cubana.

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Mesmo que seu rosto nunca tenha estampado as camisetas dos social-românticos europeus e americanos, foi ele que transmitiu a imagem mais positiva do comunismo. Nos anos 1970 e 1980, a ditadura cubana respirava um ar de placidez tropical que exercia um grande poder de atração. Acrescente-se a isso a imagem de um Davi contra um Golias: a pequena ilha caribenha no imenso oceano do imperialismo americano.

Nada despertou tanto a simpatia do Ocidente para com o comunismo quanto Cuba. Também por isso, o "socialismo tropical" era um espinho especialmente doloroso na carne de muitos de seus adversários. Para os fãs de Fidel, mais um motivo para amá-lo – na América Latina, porém, sobretudo um motivo de orgulho. Para sentir um pouco de sub-reptícia alegria pelo fato de o pequeno Estado insular ter quase forçado a grande potência do Norte a cair de joelhos, não era preciso ser comunista.

O maior significado de Castro, contudo, foi para aqueles que depositavam verdadeiras esperanças na Revolução Cubana, para quem socialismo e comunismo estavam associados à visão de uma vida melhor. Estes eram e são muitos na América Latina, a região da desigualdade social.

E nem tudo era ruim em Cuba: seu sistema de saúde é considerado, até hoje, um dos melhores da América Latina, e mesmo nas piores épocas os cubanos estavam melhor do que os haitianos, apenas uma ilha mais adiante.

A grande maioria dos nostálgicos não teve oportunidade de confrontar seus sonhos com a realidade. Apenas através das reportagens da mídia se podia e se pode constatar que o mundo melhor em Cuba se concretizou só parcialmente e apenas através dos subsídios da ainda existente União Soviética, e que o seu preço foi a liberdade.

Até hoje, é difícil noticiar a partir de Cuba e sobre ela, e o que durante a Guerra Fria era descartado pela parte interessada como propaganda, é denominado hoje "imprensa da mentira". Desse modo, o mito Fidel pôde preservar sua magia, e assim ele será pranteado por muita gente, em todo o mundo, como um herói íntegro no combate pelos pobres. Nesse contexto, pouco importa que os ideais da Revolução há muito já tenham sido enterrados por ele, e que também o seu país há muito venha trilhando um caminho diverso.

O comunismo de Castro caiu com a União Soviética. A variante do novo século se chama "Revolução Bolivariana", e o novo mecenas, a Venezuela, está abrindo falência. Por isso, Cuba já se voltou para um caminho mais capitalista, procura agora uma aproximação com os EUA. Nesse novo modelo de Cuba, porém, até agora não se fala de liberdade.

A morte de Fidel Castro não vai alterar em nada a trajetória de Cuba. O homem que já em vida virara um monumento há anos não mais tinha nada para dizer. De algum modo, no entanto, ele vai me fazer falta, o barbudo de uniforme com o charuto, que me acompanhou desde a juventude.

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