domingo, 27 de novembro de 2016

Um muro para o Rio?

Levantar um muro no Rio de Janeiro como era feito nas cidades da Idade Média. Essa é a ideia do prefeito recém-eleito da cidade, o evangélico Marcelo Crivellaapós sua recente visita a Israel.

Crivella gostaria de ver o Rio abraçado por um muro, como o de Jerusalém, “para que não entrem armas ou drogas”, como confidenciou, ao voltar de sua viagem, a líderes judeus e evangélicos, de acordo com a publicação da coluna Radar e que repetiu nos últimos dias.

O prefeito eleito não é um novato na política, pela qual transita há mais de vinte anos. Deveria saber que o Rio não precisa de um muro para evitar que as drogas e as armas cheguem aos traficantes. Os facilitadores desse comércio já estão no interior. Os maiores responsáveis pela entrada de drogas e armas, os cúmplices dos traficantes, aqueles que abrem as portas da cidade e da prisão, não vivem nas favelas.


São esses personagens invisíveis, muitos deles às vezes parte da política, que gozam de impunidade e andam em carros blindados e seguros.

Para combater o tráfico de drogas e armas, o Rio não precisa construir muros. Precisa desmascarar aqueles que alimentam esse comércio internacional e os amigos das facções criminosas que atuam dentro das prisões.

Esses sonhos à la Trump de levantar um muro no Rio, (e por que não em todo o Brasil), parece uma provocação neste momento de crise global.

Cada muro evoca medo da liberdade, vontade de fechar as portas a quem é diferente e visto como criminoso. Os muros são o símbolo da irracionalidade.

Os muros físicos são levantados quando perdemos a razão. E a razão não pode estar detida nem sequestrada.

O medo do outro nos obriga a também levantar muros ideológicos e políticos. E quanto mais muros levantarmos, mais nos sentimos inseguros.

A liberdade é a que salva. O medo mata.

A insólita ideia de levantar um muro no Rio me faz lembrar a experiência desagradável que vivi quando cruzei o Muro de Berlim, e a felicidade de vê-lo desmoronar seis meses depois. Lembro que era o aniversário da minha filha Maya. Uma dupla comemoração.

Na verdade, o Rio não precisa ser murado. Já é. Existe um muro entre a cidade rica e a pobre, a dessas mil favelas com quase dois milhões de habitantes que formam o outro Rio.

Essa cidade que, há décadas, sofre violência e morte.

A sorte do Rio rico é que aqueles que vivem e sofrem atrás desse muro das favelas não desce para a cidade, ou apenas desce para trabalhos humildes. É quase seu escudo. São boas pessoas, trabalhadoras, sofridas, vítimas do pecado dos outros.

Se isso acontecesse, se esse muro desabasse, a outra cidade, a dos hotéis de luxo e das praias famosas, a que abriga os reais responsáveis pelo tráfico de drogas e armas perderia sua alegria e algo mais.

O Rio é uma cidade divertida e iconoclasta, com vocação de liberdade. Qualquer muro a sufocaria física e moralmente.

A cidade maravilhosa só precisa dos muros das prisões para abrigar os corruptos e os responsáveis pela violência e a morte de inocentes.

Nenhum comentário:

Postar um comentário