sexta-feira, 31 de março de 2017
Representação
Há muito mais operários, trabalhadores no campo e empregados em geral — enfim, povão — do que a soma de todos os empresários, evangélicos, rentistas, latifundiários etc. do nosso Brasil. O que quer dizer que a grande, a eterna crise que vivemos, é uma crise de representatividade. Minorias com interesses restritos têm suas bancadas amestradas no Congresso. A imensa maioria do país tem representação escassa, em relação ao seu tamanho, e o que passa por “esquerda” na oposição mal pode-se chamar de bancada, muito menos de coesa. Só a ausência de uma forte representação do povo explica que coisas como a terceirização e a futura reforma da Previdência passem no Congresso como estão passando, assoviando. Os projetos de terceirização e reforma da Previdência afetam justamente a maioria da população, a maioria que não está lá para se defender. Li que a Lei das Privatizações vai ser mais “dura” do que sua versão original, que não agradou aos empresários. Os empresários pediram para o Temer endurecer. Os empresários têm o ouvido do Temer. O povo era um vago murmúrio, longe das conversas no Planalto.
Não há muita diferença entre o que acontece hoje e como era na Velha República, em que o país era governado por uma casta autoungida, que só representava a si mesma. Agora é até pior, pois a aristocracia de então não se disfarçava. Hoje, temos uma democracia formal, mas que também representa poucos, e se faz passar pelo que não é.
Claro, sempre é bom, quando se critica o Congresso, destacar as exceções, gente que na sua briga para torná-lo mais representativo quase redime o resto. Que se multipliquem.
Luis Fernando Verissimo
Padrinhos e afihados
Não foi surpresa para esta coluna a prisão de cinco dos sete conselheiros do Tribunal de Contas do Estado, e a condução coercitiva do chefão da Alerj, Jorge Picciani, velhos conhecidos das rodas de malandragem oficial carioca. Para ser conselheiro, não é preciso saber nada, nem ter conhecimentos de Administração Pública, Direito ou Contabilidade, mas de um padrinho, a quem fica devendo a vida inteira.
É uma boca rica, vitalícia, com salário de mais de R$ 30 mil, carro com motorista, viagens, penduricalhos que aumentam o salário, incontáveis “oportunidades de negócios”, foro privilegiado, impunidade garantida, para gente de confiança de Marcello Alencar e de Sérgio Cabral, que os nomearam com a cumplicidade da Alerj de Picciani, que os aprovou.
E depois são eles que vão julgar, aprovar ou reprovar as contas dos seus padrinhos? Não podia mesmo dar certo. Espanta é ter durado tanto tempo. Agora a tsunami se encaminha para o lodaçal da Alerj e para os tribunais superiores do estado. Ratos togados em polvorosa.
Alguns são vagabundos, outros incompetentes sem escrúpulos, outros bandidos mesmo, e assim será enquanto forem nomeados pelo governador e a Alerj. Só o concurso publico pode selecionar os mais preparados e dar verdadeira independência e algum sentido ao Tribunal de Contas do Estado. O resto é conversa mole e ineficiência, com consequências nefastas para as contas públicas e para os contribuintes que as pagam.
Juízes de primeira instância só entram por concurso, um dos mais difíceis das carreiras de Estado. Nas promoções para tribunais superiores, até chegar ao Supremo Tribunal Federal, é fundamental o apoio, digamos, político, para crescer, superando experiência, excelência e eficiência profissionais. Mas, naturalmente, não vem de graça.
Mas não gera conflito de interesses? Gera, mas ninguém liga. Por exemplo, o ministro Dias Toffoli serviu durante anos ao PT e à Casa Civil de José Dirceu, que o indicou e apoiou decisivamente para o STF, mas se julgou apto e insuspeito para julgar Dirceu no mensalão, e absolvê-lo. Ninguém no plenário reclamou.
Nelson Motta
É uma boca rica, vitalícia, com salário de mais de R$ 30 mil, carro com motorista, viagens, penduricalhos que aumentam o salário, incontáveis “oportunidades de negócios”, foro privilegiado, impunidade garantida, para gente de confiança de Marcello Alencar e de Sérgio Cabral, que os nomearam com a cumplicidade da Alerj de Picciani, que os aprovou.
E depois são eles que vão julgar, aprovar ou reprovar as contas dos seus padrinhos? Não podia mesmo dar certo. Espanta é ter durado tanto tempo. Agora a tsunami se encaminha para o lodaçal da Alerj e para os tribunais superiores do estado. Ratos togados em polvorosa.
Juízes de primeira instância só entram por concurso, um dos mais difíceis das carreiras de Estado. Nas promoções para tribunais superiores, até chegar ao Supremo Tribunal Federal, é fundamental o apoio, digamos, político, para crescer, superando experiência, excelência e eficiência profissionais. Mas, naturalmente, não vem de graça.
Mas não gera conflito de interesses? Gera, mas ninguém liga. Por exemplo, o ministro Dias Toffoli serviu durante anos ao PT e à Casa Civil de José Dirceu, que o indicou e apoiou decisivamente para o STF, mas se julgou apto e insuspeito para julgar Dirceu no mensalão, e absolvê-lo. Ninguém no plenário reclamou.
Nelson Motta
Roubo também é cultura
O ex-ministro da Justiça José Eduardo Cardozo declarou à Lava Jato que caixa dois no Brasil “é cultural”. Se é para falar de cultura, cabe um adendo: o maior fenômeno cultural brasileiro hoje, disparado, é ainda haver integrantes do bando à solta e falando pelos cotovelos. Na Suíça, numa boa, Dilma Rousseff ridicularizou os brasileiros discursando em francês de padaria. A Interpol deve estar em greve.
O ridículo não está no vexame – que é a especialidade da casa. Os brasileiros foram ridicularizados, mais uma vez, pelo crime que compensa: esfolou o país e saiu pelo mundo contando história triste (às gargalhadas). No Brasil, Lula anunciou que vai “andar pelo país alertando [sobre] o que está em jogo”. Não se sabe o que está em jogo, fora a necessidade urgente de substituir o jatinho da Odebrecht.
Procuradores celebram os três anos da Lava Jato, ostentando os números impressionantes da operação. Parabéns. Mas cumpre avisar: se não for até onde tem de ir, a Lava Jato vai morrer na praia.
Lula e Dilma à solta – inocentes e perseguidos – é a legitimação da narrativa: corrupção no Brasil é um problema “endêmico, disseminado, cultural etc.” – enfim, todos esses conceitos que irmanam filósofos bonzinhos e assaltantes partidários. E aliviam, delicadamente, os governos Lula e Dilma: os políticos sempre roubaram, a diferença é que agora foram pegos. Se não bastar, tem a sobremesa: Sergio Moro é fascista e odeia o PT. No cafezinho, a lista do companheiro Janot, que iguala todo mundo (e deveria ser encabeçada pelo próprio).
Pronto. Levanta, sacode a propina e dá a volta por cima (enredo 2018).
Tríplex, Atibaia, OAS/Granero, Odebrecht/Instituto Lula, Pasadena/Cerveró, Bessias/Delcídio, Schahin/Bumlai, Vaccari/Focal – a torrente de escândalos dentro do escândalo parece telenovela: é preciso sempre um próximo capítulo para manter a audiência. É claro que se não fosse o trabalho incansável da bancada petista no Supremo, com o auxílio luxuoso do companheiro Janot e outros áulicos na órbita de Cardozo, o ministro cultural, Lula e Dilma já estariam em cana há muito tempo. Agora, o novo capítulo capaz de esquentar novamente a novela se chama BNDES.
Está mais do que evidente que o bilionário banco público foi usado, com pesado tráfico de influência palaciano, para irrigar o esquema. Lula inclusive é réu num dos casos envolvendo financiamento do BNDES a obras da Odebrecht no exterior. Mas eis que surge a denúncia de golpe: manobras políticas estariam barrando o trabalho dos integrantes do Tribunal de Contas da União responsáveis pela investigação das operações do banco. Com todo o respeito, isso é uma piada.
Não que o TCU não tenha competência para fazer esse trabalho. O órgão teve seu papel na identificação das pedaladas que embasaram o impeachment. Mas, sem tração política forte, o TCU é um barquinho de papel na tempestade. O relatório das pedaladas não naufragou porque, em dado momento, conseguiu-se levar os olhos do Brasil inteiro para dentro do Tribunal de Contas. Vamos falar sério: para quebrar a muralha de escândalos do BNDES, só a Lava Jato.
O banco está agora nas mãos respeitáveis de Maria Silvia Bastos Marques – que não está interessada em caça às bruxas, mas não obstruirá nenhuma ação que vise depurar a instituição. É uma presidente com espírito público mais do que comprovado numa carreira impecável. A hora é essa, prezados gladiadores da força-tarefa! Comemorem os três anos da Lava Jato mergulhando fundo no BNDES. As cifras voadoras ali prometem transformar o petrolão em esmola.
Até a cobertura de Lula que não é de Lula, em São Bernardo, já foi sequestrada pela Justiça – e não parece haver enredo podre que impeça o filho do Brasil de desfilar por aí como candidato a presidente. Enquanto o totem dos coitados profissionais não for derrubado, o caminho para 2018 estará aberto aos que vivem desse truque – incluindo Dilma e os genéricos (Marina, PSOL, Ciro Gomes, Requião e demais integrantes da grande Família Adams brasileira).
Adendo cultural: nos próximos anos, você vai ajudar a pagar uma dívida de R$ 200 bilhões só na conta de luz. Procure saber. O que você já sabe é que esse populismo coitado não precisa nem de crime para te roubar.
O ridículo não está no vexame – que é a especialidade da casa. Os brasileiros foram ridicularizados, mais uma vez, pelo crime que compensa: esfolou o país e saiu pelo mundo contando história triste (às gargalhadas). No Brasil, Lula anunciou que vai “andar pelo país alertando [sobre] o que está em jogo”. Não se sabe o que está em jogo, fora a necessidade urgente de substituir o jatinho da Odebrecht.
Procuradores celebram os três anos da Lava Jato, ostentando os números impressionantes da operação. Parabéns. Mas cumpre avisar: se não for até onde tem de ir, a Lava Jato vai morrer na praia.
Lula e Dilma à solta – inocentes e perseguidos – é a legitimação da narrativa: corrupção no Brasil é um problema “endêmico, disseminado, cultural etc.” – enfim, todos esses conceitos que irmanam filósofos bonzinhos e assaltantes partidários. E aliviam, delicadamente, os governos Lula e Dilma: os políticos sempre roubaram, a diferença é que agora foram pegos. Se não bastar, tem a sobremesa: Sergio Moro é fascista e odeia o PT. No cafezinho, a lista do companheiro Janot, que iguala todo mundo (e deveria ser encabeçada pelo próprio).
Pronto. Levanta, sacode a propina e dá a volta por cima (enredo 2018).
Tríplex, Atibaia, OAS/Granero, Odebrecht/Instituto Lula, Pasadena/Cerveró, Bessias/Delcídio, Schahin/Bumlai, Vaccari/Focal – a torrente de escândalos dentro do escândalo parece telenovela: é preciso sempre um próximo capítulo para manter a audiência. É claro que se não fosse o trabalho incansável da bancada petista no Supremo, com o auxílio luxuoso do companheiro Janot e outros áulicos na órbita de Cardozo, o ministro cultural, Lula e Dilma já estariam em cana há muito tempo. Agora, o novo capítulo capaz de esquentar novamente a novela se chama BNDES.
Está mais do que evidente que o bilionário banco público foi usado, com pesado tráfico de influência palaciano, para irrigar o esquema. Lula inclusive é réu num dos casos envolvendo financiamento do BNDES a obras da Odebrecht no exterior. Mas eis que surge a denúncia de golpe: manobras políticas estariam barrando o trabalho dos integrantes do Tribunal de Contas da União responsáveis pela investigação das operações do banco. Com todo o respeito, isso é uma piada.
Não que o TCU não tenha competência para fazer esse trabalho. O órgão teve seu papel na identificação das pedaladas que embasaram o impeachment. Mas, sem tração política forte, o TCU é um barquinho de papel na tempestade. O relatório das pedaladas não naufragou porque, em dado momento, conseguiu-se levar os olhos do Brasil inteiro para dentro do Tribunal de Contas. Vamos falar sério: para quebrar a muralha de escândalos do BNDES, só a Lava Jato.
O banco está agora nas mãos respeitáveis de Maria Silvia Bastos Marques – que não está interessada em caça às bruxas, mas não obstruirá nenhuma ação que vise depurar a instituição. É uma presidente com espírito público mais do que comprovado numa carreira impecável. A hora é essa, prezados gladiadores da força-tarefa! Comemorem os três anos da Lava Jato mergulhando fundo no BNDES. As cifras voadoras ali prometem transformar o petrolão em esmola.
Até a cobertura de Lula que não é de Lula, em São Bernardo, já foi sequestrada pela Justiça – e não parece haver enredo podre que impeça o filho do Brasil de desfilar por aí como candidato a presidente. Enquanto o totem dos coitados profissionais não for derrubado, o caminho para 2018 estará aberto aos que vivem desse truque – incluindo Dilma e os genéricos (Marina, PSOL, Ciro Gomes, Requião e demais integrantes da grande Família Adams brasileira).
Adendo cultural: nos próximos anos, você vai ajudar a pagar uma dívida de R$ 200 bilhões só na conta de luz. Procure saber. O que você já sabe é que esse populismo coitado não precisa nem de crime para te roubar.
De raposas e galinheiros
A corrupção parece ter atingido o estado da arte no Brasil. Até aqui, tinha-se por certo que a roubalheira se dava basicamente como resultado da relação promíscua entre administradores públicos e empresários. Restava ao espoliado contribuinte a esperança de que os esquemas podiam ser detectados pelas instituições fiscalizadoras, como os Tribunais de Contas, responsáveis pela verificação da contabilidade da União, dos Estados e dos municípios. Diante da inusitada prisão de cinco dos sete conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ), porém, a sensação que fica é que o galinheiro está entregue às raposas, pois a função de tais conselheiros deveria ser a de zelar pelo bom emprego do dinheiro público.
Numa operação conjunta do Ministério Público e da Polícia Federal no Rio, a partir da delação premiada de um ex-presidente do TCE-RJ, descobriu-se que quase todos os conselheiros cobravam propinas para ignorar irregularidades cometidas por empreiteiras e por empresas de ônibus no Estado. Suspeita-se também que membros da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro estejam envolvidos. O presidente da Assembleia, Jorge Picciani (PMDB), por exemplo, foi conduzido coercitivamente para depor. Por envolver membros de um Tribunal de Contas Estadual e deputados estaduais, o caso está sob a autoridade do Superior Tribunal de Justiça.
A atual operação é um desdobramento de outra, realizada em dezembro, quando o então presidente do TCE-RJ, Jonas Lopes, foi levado para depor depois de ter sido denunciado por executivos de empreiteiras. Ele foi acusado de participar de um esquema referente à aprovação de uma linha do metrô do Rio e da concessão do estádio do Maracanã, em 2013, sob as bênçãos do então governador Sérgio Cabral. Conforme a denúncia, Lopes pediu às empreiteiras 1% sobre o valor dos contratos, cerca de R$ 60 milhões, para que o tribunal liberasse os editais. Cabral, que hoje está preso, teria recebido 5%. Depois de denunciado, Lopes se afastou do cargo e negociou a delação premiada.
Com quase todos os conselheiros na cadeia, o TCE-RJ pode não funcionar por tempo indeterminado. Pelo visto, não fará falta para o distinto público, embora fique desfalcado o tesouro da onorabile società.
Essa assombrosa situação enseja a constrangedora suspeita de que os Tribunais de Contas possam estar servindo como balcão de negócios, uma vez que de seu aval depende a continuidade de obras públicas. E essa suspeita é antiga.
Em 2007, foi apresentada uma proposta de emenda constitucional para reestruturar os Tribunais de Contas, acabando com a vitaliciedade dos cargos e instaurando um órgão para controle externo dessas cortes. O projeto não caminhou, mas expressava a desconfiança de que a corrupção nos TCEs não era um fato isolado – havia denúncias contra conselheiros dos tribunais de ao menos 12 Estados. As acusações tinham quase sempre o mesmo teor: cobravam-se propinas para não dificultar a vida das empreiteiras contratadas pelo Estado.
Dez anos depois, a situação não parece ter mudado. Recentemente, dois funcionários de alto escalão da Andrade Gutierrez disseram à força-tarefa da Lava Jato que a empreiteira pagava propina para pelo menos um conselheiro do Tribunal de Contas de São Paulo, com o objetivo de ter aprovados seus contratos referentes a diversas obras, como as do metrô.
Mas nada supera, em dimensão e desfaçatez, o que aconteceu no Tribunal de Contas do Rio de Janeiro. Em razão do rematado absurdo, a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil correu a dizer que apoia a ação da Justiça contra os conselheiros daquele tribunal e defendeu “a melhoria dos instrumentos de controle do sistema”. O primeiro passo para isso é entender que, ao contrário do ditado popular, não é a ocasião que faz o ladrão – como diz o conselheiro Aires em Esaú e Jacó, de Machado de Assis, “a ocasião faz o furto; o ladrão nasce feito”. O fundamental, portanto, é manter esses ladrões o mais longe possível dos potes de mel.
Numa operação conjunta do Ministério Público e da Polícia Federal no Rio, a partir da delação premiada de um ex-presidente do TCE-RJ, descobriu-se que quase todos os conselheiros cobravam propinas para ignorar irregularidades cometidas por empreiteiras e por empresas de ônibus no Estado. Suspeita-se também que membros da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro estejam envolvidos. O presidente da Assembleia, Jorge Picciani (PMDB), por exemplo, foi conduzido coercitivamente para depor. Por envolver membros de um Tribunal de Contas Estadual e deputados estaduais, o caso está sob a autoridade do Superior Tribunal de Justiça.
Com quase todos os conselheiros na cadeia, o TCE-RJ pode não funcionar por tempo indeterminado. Pelo visto, não fará falta para o distinto público, embora fique desfalcado o tesouro da onorabile società.
Essa assombrosa situação enseja a constrangedora suspeita de que os Tribunais de Contas possam estar servindo como balcão de negócios, uma vez que de seu aval depende a continuidade de obras públicas. E essa suspeita é antiga.
Em 2007, foi apresentada uma proposta de emenda constitucional para reestruturar os Tribunais de Contas, acabando com a vitaliciedade dos cargos e instaurando um órgão para controle externo dessas cortes. O projeto não caminhou, mas expressava a desconfiança de que a corrupção nos TCEs não era um fato isolado – havia denúncias contra conselheiros dos tribunais de ao menos 12 Estados. As acusações tinham quase sempre o mesmo teor: cobravam-se propinas para não dificultar a vida das empreiteiras contratadas pelo Estado.
Dez anos depois, a situação não parece ter mudado. Recentemente, dois funcionários de alto escalão da Andrade Gutierrez disseram à força-tarefa da Lava Jato que a empreiteira pagava propina para pelo menos um conselheiro do Tribunal de Contas de São Paulo, com o objetivo de ter aprovados seus contratos referentes a diversas obras, como as do metrô.
Mas nada supera, em dimensão e desfaçatez, o que aconteceu no Tribunal de Contas do Rio de Janeiro. Em razão do rematado absurdo, a Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil correu a dizer que apoia a ação da Justiça contra os conselheiros daquele tribunal e defendeu “a melhoria dos instrumentos de controle do sistema”. O primeiro passo para isso é entender que, ao contrário do ditado popular, não é a ocasião que faz o ladrão – como diz o conselheiro Aires em Esaú e Jacó, de Machado de Assis, “a ocasião faz o furto; o ladrão nasce feito”. O fundamental, portanto, é manter esses ladrões o mais longe possível dos potes de mel.
A Lava Jato avança de verdade
A Lava Jato colocou pela primeira vez na mira não apenas políticos com nome e sobrenome, mas todo um partido, o PP (Partido Progressista), acusado de improbidade administrativa, pedindo a devolução para os cofres de Estado de 2 bilhões de reais. É uma novidade na guerra contra a corrupção. Isso, junto com a condenação do ex-presidente do Congresso Eduardo Cunha a 15 anos de prisão, tudo no mesmo dia, revela que a Lava Jato não demonstra sentir medo frente às possíveis manobras que, contra ela, parecem estar tramando no Congresso com o debate sobre uma lei de responsabilidade que, aprovada nesse momento e às pressas, pode ser vista como uma tentativa de amarrar as mãos dos juízes em sua luta contra a corrupção. A decisão de pedir a condenação de todo um partido e de 10 de seus líderes políticos significa que o juiz Moro e sua equipe avançam de verdade e que o resultado final de suas investigações ainda é difícil de adivinhar.
O PP aparece no grande esquema de corrupção que surgiu do escândalo da Petrobras como um dos que apresenta talvez maior número de políticos acusados. No entanto, no jogo de xadrez político em que se movem as investigações, o PP não deixa de ser um satélite da cena principal. Pelos mesmos motivos que se pede a condenação do PP, a Lava Jato poderá pedir também a do PMDB e, sem dúvida, a do PT, acusado de ter sido o motor e idealizador do grande esquema de corrupção para se perpetuar no poder. Os outros partidos teriam sido convidados do grande banquete.
Aqueles que já criam hipóteses de que a prisão de Cunha e o primeiro pedido de condenação de um partido são apenas os entreatos do grande objetivo de chegar a Lula e seu partido, o PT, como responsável máximo da trama de corrupção, se perguntam até onde quer chegar a Lava Jato. À extinção dos partidos? O promotor Deltan Dallagnol se antecipou ao afirmar que não pretendem “paralisar a ação política”, mas “agarrar os corruptos pelo bolso”. Isso em teoria, porque na prática, poderia levar à dissolução de algumas forças políticas como ocorreu na Itália nos anos 90 com a Operação Mãos Limpas. Decapitados os partidos de seus maiores líderes, para os quais é pedida a perda de cargos e direitos políticos, e com a obrigação de devolver esses valores colossais como multa, para muitos poderia significar um golpe mortal.
Mas a frase de Dallagnol de que a Lava Jato pretende “agarrar os corruptos políticos pelo bolso” terá um forte eco na opinião pública. É só olhar as redes sociais para observar que o mantra das pessoas nas ruas é “que devolvam o que foi roubado”. E isso inclui os políticos como pessoas e os partidos como organizadores. O mínimo que se pode dizer é que a Lava Jato, que sabe que conta com o capital do forte apoio da sociedade na luta contra a corrupção, quis marcar seu território na guerra já nem dissimulada, entre a justiça e uma classe política que é vista como encurralada e no banco dos réus.
Teremos que esperar os próximos passos da Lava Jato e do Supremo para saber o que está sendo preparado para a eleição presidencial do ano que vem, porque as águas não podem estar mais revoltosas e qualquer surpresa é possível. No dia 10 de maio, pela primeira vez, Lula vai se sentar no banco dos acusados para ser interrogado como réu pelo juiz Moro. Talvez seja um ensaio de até onde pode chegar isso que foi chamado de “o fim do mundo” e que ameaça, sobretudo, ser o fim de uma era e de uma classe política. A grande incógnita é quem poderá herdar seus despojos e quem vai ganhar destaque depois do campo arrasado em que se está transformando a política brasileira. Não é um momento fácil nem indolor para o Brasil embora, como já escrevemos outras vezes, depois de cada pôr do sol sempre espera um novo amanhecer.
O PP aparece no grande esquema de corrupção que surgiu do escândalo da Petrobras como um dos que apresenta talvez maior número de políticos acusados. No entanto, no jogo de xadrez político em que se movem as investigações, o PP não deixa de ser um satélite da cena principal. Pelos mesmos motivos que se pede a condenação do PP, a Lava Jato poderá pedir também a do PMDB e, sem dúvida, a do PT, acusado de ter sido o motor e idealizador do grande esquema de corrupção para se perpetuar no poder. Os outros partidos teriam sido convidados do grande banquete.
Aqueles que já criam hipóteses de que a prisão de Cunha e o primeiro pedido de condenação de um partido são apenas os entreatos do grande objetivo de chegar a Lula e seu partido, o PT, como responsável máximo da trama de corrupção, se perguntam até onde quer chegar a Lava Jato. À extinção dos partidos? O promotor Deltan Dallagnol se antecipou ao afirmar que não pretendem “paralisar a ação política”, mas “agarrar os corruptos pelo bolso”. Isso em teoria, porque na prática, poderia levar à dissolução de algumas forças políticas como ocorreu na Itália nos anos 90 com a Operação Mãos Limpas. Decapitados os partidos de seus maiores líderes, para os quais é pedida a perda de cargos e direitos políticos, e com a obrigação de devolver esses valores colossais como multa, para muitos poderia significar um golpe mortal.
Mas a frase de Dallagnol de que a Lava Jato pretende “agarrar os corruptos políticos pelo bolso” terá um forte eco na opinião pública. É só olhar as redes sociais para observar que o mantra das pessoas nas ruas é “que devolvam o que foi roubado”. E isso inclui os políticos como pessoas e os partidos como organizadores. O mínimo que se pode dizer é que a Lava Jato, que sabe que conta com o capital do forte apoio da sociedade na luta contra a corrupção, quis marcar seu território na guerra já nem dissimulada, entre a justiça e uma classe política que é vista como encurralada e no banco dos réus.
Teremos que esperar os próximos passos da Lava Jato e do Supremo para saber o que está sendo preparado para a eleição presidencial do ano que vem, porque as águas não podem estar mais revoltosas e qualquer surpresa é possível. No dia 10 de maio, pela primeira vez, Lula vai se sentar no banco dos acusados para ser interrogado como réu pelo juiz Moro. Talvez seja um ensaio de até onde pode chegar isso que foi chamado de “o fim do mundo” e que ameaça, sobretudo, ser o fim de uma era e de uma classe política. A grande incógnita é quem poderá herdar seus despojos e quem vai ganhar destaque depois do campo arrasado em que se está transformando a política brasileira. Não é um momento fácil nem indolor para o Brasil embora, como já escrevemos outras vezes, depois de cada pôr do sol sempre espera um novo amanhecer.
O Lula da Odebrecht: pai e filho demitem o espírito nada santo
Ok, é importante saber como as coisas se deram no pântano do caixa 2, que a delação da maior empreiteira do Brasil vem ajudando a drenar. Mas o povo quer mesmo saber o que Emílio Odebrecht, seu filho Marcelo e os executivos metidos na ladroagem colossal têm a dizer sobre bandalheiras muito mais repulsivas que envolvem o governo lulopetista em geral e, em particular, o chefão que renega o que concebeu, finge ignorar o que pariu, finge não enxergar o que viu, nada tem embora muito possua e, mesmo soterrado por montanhas de provas dos crimes que ornamentam o portentoso prontuário, continua a proclamar-se a alma viva mais pura do mundo.
O país quer contemplar a derrocada moral de Lula pelos olhos de Emílio e Marcelo Odebrecht. As valiosíssimas caixas pretas do Petrolão guardam todos os detalhes das bandidagens que envolvem o mais famoso integrante da Safadíssima Trindade. Basta que pai e filho contem tudo o que sabem para que seja remetido ao fogo do inferno o espírito que de santo nunca teve nada.
Augusto Nunes
Qual foi o papel de Lula na montagem do que Celso de Mello qualificou de esquema criminoso de poder? Que proezas consumou durante a tentativa de captura do Estado que mobilizou figurões do PT, do PMDB e do PP, larápios fantasiados de diretores da Petrobras, ministros canalhas, doleiros vigaristas e outras sumidades das catacumbas fora da lei? Além da maior das estatais, do BNDES e da Eletrobras, quais foram os tentáculos do polvo federal algemados pela quadrilha que sonhava com a eternização no poder — e com a anexação de fortunas superlativas ao caixa das empresas e às contas no exterior dos receptadores das propinas? Como foi a metamorfose degenerativa que transformou Lula em camelô de empreiteira e no palestrante mais caro da história?
O país quer contemplar a derrocada moral de Lula pelos olhos de Emílio e Marcelo Odebrecht. As valiosíssimas caixas pretas do Petrolão guardam todos os detalhes das bandidagens que envolvem o mais famoso integrante da Safadíssima Trindade. Basta que pai e filho contem tudo o que sabem para que seja remetido ao fogo do inferno o espírito que de santo nunca teve nada.
Augusto Nunes
Condenação de Cunha desfaz o teatro do foro
A principal dúvida do Brasil em tempos de Lava Jato é: com foro ou com Moro? Ao condenar o ex-todo-poderoso da Câmara Eduardo Cunha a 15 anos e 4 meses de cadeia, Sergio Moro expôs involuntariamente o teatro em que se converteu o debate no Congresso sobre o fim do foro por prerrogativa de função, que assegura a congressistas e ministros o privilégio de serem julgados pelo Supremo Tribunal Federal. No momento, o chamado foro privilegiado soa como sinônimo de impunidade. E sentenças como a que foi imposta a Cunha realçam a ineficiência que faz do topo do sistema judiciário uma espécie de paraíso para os salafrários da política.
Convém dizer que o Supremo não precisa ser um Éden de criminosos. O próprio Sergio Moro, em debate na Comissão de Justiça Câmara, lembrou nesta quinta-feira que a Suprema Corte produziu condenações em série do julgamento do mensalão. O problema é que o Supremo não tem vocação penal. E a Lava Jato sobrecarregou o tribunal. Com a delação da Odebrecht, os criminosos de gravata estão saindo pelo ladrão nos escaninhos do Supremo.
Num instante em que outros personagens sem mandato —Lula, por exemplo— estão na fila da primeira instância como condenações esperando para acontecer, é nula a hipótese de o Legislativo eliminar ou atenuar o alcance do foro privilegiado. Se Eduardo Cunha ainda tivesse mandato parlamentar, estaria nos arredores dos cofres de Brasília, não trancafiado num xadrez de Curitiba. Sua condenação torna o acompanhamento do debate travado no Congresso muito divertido. Deputados e senadores discutem os malefícios do foro privilegiado como se brincassem de roleta-russa protegidos pela certeza de que manipulam uma sinceridade completamente descarregada.
Num instante em que outros personagens sem mandato —Lula, por exemplo— estão na fila da primeira instância como condenações esperando para acontecer, é nula a hipótese de o Legislativo eliminar ou atenuar o alcance do foro privilegiado. Se Eduardo Cunha ainda tivesse mandato parlamentar, estaria nos arredores dos cofres de Brasília, não trancafiado num xadrez de Curitiba. Sua condenação torna o acompanhamento do debate travado no Congresso muito divertido. Deputados e senadores discutem os malefícios do foro privilegiado como se brincassem de roleta-russa protegidos pela certeza de que manipulam uma sinceridade completamente descarregada.
O país onde alimentar passarinhos é crime
Vivemos uma era onde experiências são mais valiosas que compras. E o turismo de vida selvagem, aquele que te oferece momentos Animal Planet, BBC, National Geographic ou Discovery Channel, vende experiências supremas.
Estar próximo e interagir com bichos vivos proporciona aqueles momentos PQP que atraem visitantes a UCs das ilhas Antípodes ao Zimbabwe, gerando cadeias de negócios, integrando comunidades isoladas à economia global e criando empregos.
Na pior das hipóteses, bichos são conservados porque são mais valiosos vivos do que mortos. Na melhor, há o salto civilizatório e eles passam a ser companheiros de nossa jornada neste planeta, com os mesmos direitos à existência.
A necessidade humana de proximidade e interação gerou negócios antes improváveis como visitar gorilas em Uganda, passar o dia com onças no Pantanal, observar baleias, caminhar com pinguins e mergulhar com tubarões.
Os tubarões chamam a atenção porque um dos padrões da indústria são excursões onde os simpáticos bichinhos são alimentados pelos dive-masters e fazem a alegria dos turistas. Um resultado é que os tubas são totalmente protegidos em países como as Bahamas pois são um motor da economia.
Existem outros empresários de bichos que criaram negócios similares, que beneficiam todos os envolvidos. Aqui em São Paulo, um dos locais mais agradáveis para observar aves é a Trilha dos Tucanos, em Tapiraí. Além de uma bela floresta, sistema de trilhas, hospedagem e restaurante, o que atrai birders e fotógrafos ao lugar são os comedouros que atraem montes de aves silvestres que se tornaram habituadas às pessoas.
Tucanos também é um dos melhores lugares que conheço para, como diz o povo da educação ambiental, sensibilizar as pessoas. Ter um grupo de saíras e catirumbavas comendo banana na mão de uma criança por cinco minutos vale mais que seis meses catando latas para reciclagem ou fazendo papel na escola.
Tucanos não é única a ter comedouros para aves, que são comuns em reservas e propriedades privadas em todo o Brasil e fazem a alegria de passarinhos e seus amigos. O que chama a atenção é que, com pouquíssimas exceções, comedouros de aves são explicitamente banidos das unidades de conservação manejadas pelo Estado.
Sempre que pergunto a razão, ouço que é “é proibido pela lei” e explicações do tipo “altera o comportamento”, o que não explica coisa alguma. Construir um centro de visitantes, ter veículos nas estradas de serviço, iluminação noturna ou abrir um aceiro também altera o comportamento da fauna, mas fazemos isso em uma UC porque os benefícios são entendidos como maiores do que os malefícios.
Qualquer um que já gastou algum tempo olhando a reação das pessoas – especialmente crianças – visitando um comedouro de aves decente já percebeu como estes podem ser uma ferramenta poderosa para conquistar corações e mentes contra atividades que são as verdadeiras desgraças, como a caça e a tradição de ter aves em gaiola.
Os que turistam em UCs pelo mundo também já descobriram que somos uma Coréia do Norte com relação a práticas comuns e correntes. Para não ir longe, nos Estados Unidos – onde parques nacionais são considerados “America’s Best Idea” – todo centro de visitantes de qualquer UC tem comedouros para que todos, inclusive aqueles com limitação de mobilidade, possam ter um gostinho da fauna alada.
Dá trabalho? Claro, a higiene é fundamental. Altera o comportamento? Lógico. Isso é ruim? Não. O importante é que altera o comportamento das pessoas. Ninguém é convencido de algo por conta de sua racionalidade. Somos convencidos pelas nossas emoções, e aí está a chave da razão de as experiências que oferecem contato próximo com o mundo natural serem transformadoras.
Além disso, há toda uma série de programas de monitoramento pelo mundo afora que utilizam comedouros e plataformas de Ciência Cidadã para acompanhar as tendências populacionais das aves e relacioná-las a coisas como o uso da terra e mudanças climáticas. Programas que, por sinal, incluem comedouros instalados em escolas. Alguém captou a ideia?
Proibir comedouros de aves em UCs brasileiras faz muito mais mal do que bem. Cada parque sem comedouros é uma oportunidade perdida de educar e sensibilizar, e de mostrar algo que pode ser feito em casa e ser parte do processo de erradicar a tradição das gaiolas.
O que aconteceria se alguém propusesse que cada UC brasileira tenha comedouros de aves? Na minha experiência irá esbarrar no “é ilegal”, “altera comportamento” e outras desculpas que não são desculpas. Se há alguma lei que proíbe oferecer bananas a passarinhos, ela merece uma banana.
Indo além, e voltando ao começo. Alimentar tubarões é comum em UCs marinhas do mundo todo, com pilhas de pesquisas sobre o assunto que vão do monitoramento de populações, passam pela economia e chegam à ausência de impactos significativos no seu comportamento.
Um dos exemplos de como o Brasil é torto é que em Fernando de Noronha ninguém está autorizado a fazer um shark diving como nas Bahamas, ao mesmo tempo que os mesmos tubarões são mortos no entorno do parque para fazer o famigerado tubalhau.
Aliás, lembre-se de que quem compra produtos feitos com carne, dentes e outras partes de tubarões e cações está ajudando estas espécies a desaparecer.
Ainda no mar, outra atividade que envolve oferecer alimento a animais para proporcionar momentos PQP é a observação de aves marinhas. No Brasil essa atividade ainda é incipiente mas em outros países é uma indústria consolidada, com operadores e excursões regulares saindo de portos na África do Sul, Chile, Peru, Nova Zelândia, Estados Unidos, Portugal, entre muitos mais.
Como observador de aves, tenho um fraco pelos albatrozes e petréis que são as grandes estrelas da maioria dos pelágicos pelo mundo afora e já participei em várias excursões nestes países. Um dos mais interessantes é a Nova Zelândia.
A nação-ilhas é o hotspot da diversidade de albatrozes e petréis do mundo e um dos campeões de sua conservação. Aves marinhas formam um dos grupos de aves mais ameaçados, com 15 das 22 espécies de albatrozes sob ameaça de extinção porque muitas aves são mortas por barcos espinheleiros (os que pescam tubarões, atuns e mecas. Peixes que você não deveria consumir) e porque cães, gatos, ratos e camundongos introduzidos – e vândalos – dizimam suas colônias reprodutivas.
A Nova Zelândia é uma campeã nos esforços de conservação dessas aves, com projetos que incluem a erradicação de predadores introduzidos, criação de UCs marinhas, desenvolvimento de técnicas de pesca que minimizam a mortalidade, monitoramento das embarcações de pesca e promoção de acordos internacionais como o Acordo para a Conservação de Albatrozes e Petréis – ACAP, do qual o Brasil é signatário.
Outra coisa na qual a Nova Zelândia é campeã é o ecoturismo. Ali há diversos operadores que levam as pessoas para ver, ao vivo e a cores, a diversidade de albatrozes, petréis e aves marinhas que o país tem.
Se minha experiência vale algo, ver um albatroz-real com três metros de envergadura ao alcance da mão, um grupo com dezenas de albatrozes de quatro espécies diferentes acompanhando seu barco ou petréis-gigantes lutando sumô causam aquela sensação que faz você se perguntar por que há quem use drogas ao invés de observar aves.
Estas excursões permitem o contato próximo com essas aves quase lendárias, que normalmente ninguém vê nem sabe que existem. Quando o pessoal do Projeto Albatroz começou a trabalhar para que o governo brasileiro participasse das negociações do ACAP descobriu que poucos em Brasília sabiam o que era um albatroz...
Também são a única oportunidade que mortais comuns têm para ver espécies raríssimas, como o New Zealand Storm Petrel. Considerado extinto em 1850, foi redescoberto em 2003 por observadores de aves numa saída pelágica. Hoje há todo um programa de pesquisa e monitoramento da espécie -- uma das aves mais raras do mundo --, enquanto as excursões comerciais para observá-la continuam.
Falar em excursões comerciais para observar espécies criticamente em perigo causa urticária em algumas pessoas por aqui. Que aumentará se eu disser que alguns destes tours, como em Kaikoura (vídeo!), são feitos em unidades de conservação marinhas.
Para “piorar”, todas as excursões para observar aves marinhas na Nova Zelândia adotam a prática (padrão no mundo todo, por sinal) de lançar alimento na água para atrair as aves. Sim, leitores e leitoras, lá eles alimentam os passarinhos para que os visitantes possam vê-los de perto. E ainda ganham dinheiro com isso.
E não é qualquer comida que é usada. A preferência é por um purê feito com restos de salmão, criado nas muitas fazendas marinhas do país. Proteína com óleo de peixe é irresistível para as aves.
Estes dois parágrafos devem conter uns quatro ou cinco pecados se seguirmos o padrão do planejador ambiental brasileiro. Para os neozelandeses, que devem ter o melhor histórico de manejo de aves marinhas e de conservação marinha, é usual.
Estar próximo e interagir com bichos vivos proporciona aqueles momentos PQP que atraem visitantes a UCs das ilhas Antípodes ao Zimbabwe, gerando cadeias de negócios, integrando comunidades isoladas à economia global e criando empregos.
Na pior das hipóteses, bichos são conservados porque são mais valiosos vivos do que mortos. Na melhor, há o salto civilizatório e eles passam a ser companheiros de nossa jornada neste planeta, com os mesmos direitos à existência.
Os tubarões chamam a atenção porque um dos padrões da indústria são excursões onde os simpáticos bichinhos são alimentados pelos dive-masters e fazem a alegria dos turistas. Um resultado é que os tubas são totalmente protegidos em países como as Bahamas pois são um motor da economia.
Existem outros empresários de bichos que criaram negócios similares, que beneficiam todos os envolvidos. Aqui em São Paulo, um dos locais mais agradáveis para observar aves é a Trilha dos Tucanos, em Tapiraí. Além de uma bela floresta, sistema de trilhas, hospedagem e restaurante, o que atrai birders e fotógrafos ao lugar são os comedouros que atraem montes de aves silvestres que se tornaram habituadas às pessoas.
Tucanos também é um dos melhores lugares que conheço para, como diz o povo da educação ambiental, sensibilizar as pessoas. Ter um grupo de saíras e catirumbavas comendo banana na mão de uma criança por cinco minutos vale mais que seis meses catando latas para reciclagem ou fazendo papel na escola.
Tucanos não é única a ter comedouros para aves, que são comuns em reservas e propriedades privadas em todo o Brasil e fazem a alegria de passarinhos e seus amigos. O que chama a atenção é que, com pouquíssimas exceções, comedouros de aves são explicitamente banidos das unidades de conservação manejadas pelo Estado.
Sempre que pergunto a razão, ouço que é “é proibido pela lei” e explicações do tipo “altera o comportamento”, o que não explica coisa alguma. Construir um centro de visitantes, ter veículos nas estradas de serviço, iluminação noturna ou abrir um aceiro também altera o comportamento da fauna, mas fazemos isso em uma UC porque os benefícios são entendidos como maiores do que os malefícios.
Qualquer um que já gastou algum tempo olhando a reação das pessoas – especialmente crianças – visitando um comedouro de aves decente já percebeu como estes podem ser uma ferramenta poderosa para conquistar corações e mentes contra atividades que são as verdadeiras desgraças, como a caça e a tradição de ter aves em gaiola.
Os que turistam em UCs pelo mundo também já descobriram que somos uma Coréia do Norte com relação a práticas comuns e correntes. Para não ir longe, nos Estados Unidos – onde parques nacionais são considerados “America’s Best Idea” – todo centro de visitantes de qualquer UC tem comedouros para que todos, inclusive aqueles com limitação de mobilidade, possam ter um gostinho da fauna alada.
Dá trabalho? Claro, a higiene é fundamental. Altera o comportamento? Lógico. Isso é ruim? Não. O importante é que altera o comportamento das pessoas. Ninguém é convencido de algo por conta de sua racionalidade. Somos convencidos pelas nossas emoções, e aí está a chave da razão de as experiências que oferecem contato próximo com o mundo natural serem transformadoras.
Além disso, há toda uma série de programas de monitoramento pelo mundo afora que utilizam comedouros e plataformas de Ciência Cidadã para acompanhar as tendências populacionais das aves e relacioná-las a coisas como o uso da terra e mudanças climáticas. Programas que, por sinal, incluem comedouros instalados em escolas. Alguém captou a ideia?
Proibir comedouros de aves em UCs brasileiras faz muito mais mal do que bem. Cada parque sem comedouros é uma oportunidade perdida de educar e sensibilizar, e de mostrar algo que pode ser feito em casa e ser parte do processo de erradicar a tradição das gaiolas.
O que aconteceria se alguém propusesse que cada UC brasileira tenha comedouros de aves? Na minha experiência irá esbarrar no “é ilegal”, “altera comportamento” e outras desculpas que não são desculpas. Se há alguma lei que proíbe oferecer bananas a passarinhos, ela merece uma banana.
Indo além, e voltando ao começo. Alimentar tubarões é comum em UCs marinhas do mundo todo, com pilhas de pesquisas sobre o assunto que vão do monitoramento de populações, passam pela economia e chegam à ausência de impactos significativos no seu comportamento.
Um dos exemplos de como o Brasil é torto é que em Fernando de Noronha ninguém está autorizado a fazer um shark diving como nas Bahamas, ao mesmo tempo que os mesmos tubarões são mortos no entorno do parque para fazer o famigerado tubalhau.
Aliás, lembre-se de que quem compra produtos feitos com carne, dentes e outras partes de tubarões e cações está ajudando estas espécies a desaparecer.
Ainda no mar, outra atividade que envolve oferecer alimento a animais para proporcionar momentos PQP é a observação de aves marinhas. No Brasil essa atividade ainda é incipiente mas em outros países é uma indústria consolidada, com operadores e excursões regulares saindo de portos na África do Sul, Chile, Peru, Nova Zelândia, Estados Unidos, Portugal, entre muitos mais.
Como observador de aves, tenho um fraco pelos albatrozes e petréis que são as grandes estrelas da maioria dos pelágicos pelo mundo afora e já participei em várias excursões nestes países. Um dos mais interessantes é a Nova Zelândia.
A nação-ilhas é o hotspot da diversidade de albatrozes e petréis do mundo e um dos campeões de sua conservação. Aves marinhas formam um dos grupos de aves mais ameaçados, com 15 das 22 espécies de albatrozes sob ameaça de extinção porque muitas aves são mortas por barcos espinheleiros (os que pescam tubarões, atuns e mecas. Peixes que você não deveria consumir) e porque cães, gatos, ratos e camundongos introduzidos – e vândalos – dizimam suas colônias reprodutivas.
A Nova Zelândia é uma campeã nos esforços de conservação dessas aves, com projetos que incluem a erradicação de predadores introduzidos, criação de UCs marinhas, desenvolvimento de técnicas de pesca que minimizam a mortalidade, monitoramento das embarcações de pesca e promoção de acordos internacionais como o Acordo para a Conservação de Albatrozes e Petréis – ACAP, do qual o Brasil é signatário.
Outra coisa na qual a Nova Zelândia é campeã é o ecoturismo. Ali há diversos operadores que levam as pessoas para ver, ao vivo e a cores, a diversidade de albatrozes, petréis e aves marinhas que o país tem.
Se minha experiência vale algo, ver um albatroz-real com três metros de envergadura ao alcance da mão, um grupo com dezenas de albatrozes de quatro espécies diferentes acompanhando seu barco ou petréis-gigantes lutando sumô causam aquela sensação que faz você se perguntar por que há quem use drogas ao invés de observar aves.
Estas excursões permitem o contato próximo com essas aves quase lendárias, que normalmente ninguém vê nem sabe que existem. Quando o pessoal do Projeto Albatroz começou a trabalhar para que o governo brasileiro participasse das negociações do ACAP descobriu que poucos em Brasília sabiam o que era um albatroz...
Também são a única oportunidade que mortais comuns têm para ver espécies raríssimas, como o New Zealand Storm Petrel. Considerado extinto em 1850, foi redescoberto em 2003 por observadores de aves numa saída pelágica. Hoje há todo um programa de pesquisa e monitoramento da espécie -- uma das aves mais raras do mundo --, enquanto as excursões comerciais para observá-la continuam.
Falar em excursões comerciais para observar espécies criticamente em perigo causa urticária em algumas pessoas por aqui. Que aumentará se eu disser que alguns destes tours, como em Kaikoura (vídeo!), são feitos em unidades de conservação marinhas.
Para “piorar”, todas as excursões para observar aves marinhas na Nova Zelândia adotam a prática (padrão no mundo todo, por sinal) de lançar alimento na água para atrair as aves. Sim, leitores e leitoras, lá eles alimentam os passarinhos para que os visitantes possam vê-los de perto. E ainda ganham dinheiro com isso.
E não é qualquer comida que é usada. A preferência é por um purê feito com restos de salmão, criado nas muitas fazendas marinhas do país. Proteína com óleo de peixe é irresistível para as aves.
Estes dois parágrafos devem conter uns quatro ou cinco pecados se seguirmos o padrão do planejador ambiental brasileiro. Para os neozelandeses, que devem ter o melhor histórico de manejo de aves marinhas e de conservação marinha, é usual.
As campeãs nacionais continuam roendo os bolsos dos brasileiros
O envolvimento da JBS e da BRF nos casos investigados pela Operação Carne Fraca é o mais recente capítulo do livro, ainda longe do fim, produzido pelas “campeãs nacionais” — dois colossos estatais e um punhado de empresas brasileiras escolhidas pelo governo Lula para transformar-se, com financiamentos do BNDES e incentivos fiscais de pai para filho, em multinacionais suficientemente poderosas para enfrentar de igual para igual conglomerados estrangeiros de grande porte e escancarar a pujança da potência econômica que o presidente milagreiro inventou.
Até o início do governo Dilma, quando a realidade se impôs à fantasia, o BNDES despejou mais de R$ 30 bilhões na aventura megalomaníaca. As empresas eleitas pelo Planalto tinham boa saúde financeira, mas o critério que mais pesou na escolha das campeãs foi o tamanho dos desembolsos em campanhas eleitorais e o grau de intimidade que ligava os principais executivos ao presidente da República e seus parceiros no poder.
Mais relevante do que a localização de produtos com salmonela, recheados por papelão ou com prazo de validade vencido ─ abjeções bem menos frequentes do que alardeou a Polícia Federal num primeiro momento – foi a confirmação, pela Carne Fraca, de que também nesse setor viceja o tumor que corrói toda a economia brasileira: a lucrativa promiscuidade entre o público e o privado.
Alardeada como a supertele nacional, a Oi acabou protagonizando, em junho de 2016, o mais portentoso pedido de recuperação judicial da história do país, com dívidas que ultrapassavam os R$ 65,4 bilhões.
A varinha de condão do governo pousou sobre a Oi em 2008, quando a Anatel aprovou a compra da Brasil Telecom pela Telemar, o maior negócio do setor depois da privatização da Telebras, em 1998. A fusão, que deu origem à Oi, não aconteceria sem que Lula tivesse modificado uma regra da Lei Geral de Telecomunicações, que proibia um controlador de possuir duas concessionárias de telefonia fixa. As mudanças foram autorizadas em menos de 30 dias. Sob o argumento de que convinha apoiar uma empresa brasileira na competição com grupos privados estrangeiros que atuavam no país, a Telemar recebeu, via Banco do Brasil e BNDES, R$ 6,8 bilhões para a compra da operadora.
Três anos antes, por uma coincidência feliz (para a empresa e para o beneficiário do negócio), a Brasil Telecom havia investido R$ 5 milhões na insignificante Gamecorp, empresa que tinha como único trunfo a presença entre os sócios proprietários de Fábio Luís Lula da Silva, filho do ex-presidente. Até então uma companhia de pequeno porte, a Gamecorp movimentou mais de R$ 300 milhões entre 2005 e 2016 e é hoje um dos alvos da Operação Lava Jato
Criada para tornar-se o gigante dos lácteos, a LBR pediu recuperação judicial em 2013, legando ao BNDES um prejuízo de R$ 700 milhões. Enquanto isso, Eike Batista, que fez seu império X cair nas graças do governo federal pagando por baixo do pano generosas porcentagens, foi além da falência: virou réu por corrupção e lavagem de dinheiro e está preso desde janeiro. Entre 2003 e 2014, o BNDES abençoou o empresário com R$ 10 bilhões, dos quais apenas R$ 6 bilhões foram efetivamente contratados.
Entre as futuras campeãs estavam a Eletrobras e a Petrobras. Como, pelas regras da OMC, o BNDES não pode financiar estatais, o banco emprestou dinheiro em condições singularmente privilegiadas para os fornecedores da Eletrobras. O objetivo, alegou o governo, era permitir à empresa disputar contratos também no exterior. Obrigada a baixar as tarifas de energia para ajudar a bancar uma redução média de 20% na conta de luz em 2012 e envolvida em diversos casos de corrupção, a Eletrobras está tecnicamente quebrada.
Maior empresa nacional, a Petrobras quase teve o mesmo destino. Depois de 13 anos como alvo preferencial da ganância dos políticos, forçada a comprar refinarias sucateadas, desperdiçar bilhões de reais em projetos ruinosos concebidos por governantes estrangeiros amigos de Lula e vergar-se ao aparelhamento oportunista, a estatal só escapou da completa destruição porque a Lava Jato descobriu o esquema do Petrolão.
No setor alimentício, a Brasil Foods (BRF), dona da Sadia e da Perdigão, e a JBS, controladora das marcas Friboi e Seara e líder mundial entre as empresas que lidam com proteína animal, pareciam imunes a concorrentes até a explosão da Operação Carne Fraca. “Quando se faz uma política de campeões nacionais e o governo arbitra, automaticamente se cria uma cadeia de perdedores”, disse em 2015 o empresário Graciano Roberto Russo, ex-controlador do frigorífico Independência, num depoimento à CPI do BNDES. Um dos “perdedores”, o Independência quebrou em 2009, enquanto a JBS se consolidava como gigante global sob o guarda-chuva do BNDES.
Se tamanha interferência do Estado na economia é absurda, ainda mais espantosos foram os critérios de seleção utilizados pelos pais da ideia malograda. As escolhas beneficiaram invariavelmente empresas que mantinham estreitas (e estranhas) relações com o governo (e com os donos do poder). As consequências dessa suspeita intimidade, escancaradas pela Operação Lava Jato, acabam de ser novamente expostas pela Carne Fraca: dezenas de fiscais alheios aos interesses do povo, cargos públicos preenchidos por indicações políticas, abusos generalizados e corrupção institucionalizada.
Essa política nasceu condenada à morte breve. Sepultada há tempos, continua roendo os bolsos de todos os brasileiros que pagam impostos.
Até o início do governo Dilma, quando a realidade se impôs à fantasia, o BNDES despejou mais de R$ 30 bilhões na aventura megalomaníaca. As empresas eleitas pelo Planalto tinham boa saúde financeira, mas o critério que mais pesou na escolha das campeãs foi o tamanho dos desembolsos em campanhas eleitorais e o grau de intimidade que ligava os principais executivos ao presidente da República e seus parceiros no poder.
Alardeada como a supertele nacional, a Oi acabou protagonizando, em junho de 2016, o mais portentoso pedido de recuperação judicial da história do país, com dívidas que ultrapassavam os R$ 65,4 bilhões.
A varinha de condão do governo pousou sobre a Oi em 2008, quando a Anatel aprovou a compra da Brasil Telecom pela Telemar, o maior negócio do setor depois da privatização da Telebras, em 1998. A fusão, que deu origem à Oi, não aconteceria sem que Lula tivesse modificado uma regra da Lei Geral de Telecomunicações, que proibia um controlador de possuir duas concessionárias de telefonia fixa. As mudanças foram autorizadas em menos de 30 dias. Sob o argumento de que convinha apoiar uma empresa brasileira na competição com grupos privados estrangeiros que atuavam no país, a Telemar recebeu, via Banco do Brasil e BNDES, R$ 6,8 bilhões para a compra da operadora.
Três anos antes, por uma coincidência feliz (para a empresa e para o beneficiário do negócio), a Brasil Telecom havia investido R$ 5 milhões na insignificante Gamecorp, empresa que tinha como único trunfo a presença entre os sócios proprietários de Fábio Luís Lula da Silva, filho do ex-presidente. Até então uma companhia de pequeno porte, a Gamecorp movimentou mais de R$ 300 milhões entre 2005 e 2016 e é hoje um dos alvos da Operação Lava Jato
Criada para tornar-se o gigante dos lácteos, a LBR pediu recuperação judicial em 2013, legando ao BNDES um prejuízo de R$ 700 milhões. Enquanto isso, Eike Batista, que fez seu império X cair nas graças do governo federal pagando por baixo do pano generosas porcentagens, foi além da falência: virou réu por corrupção e lavagem de dinheiro e está preso desde janeiro. Entre 2003 e 2014, o BNDES abençoou o empresário com R$ 10 bilhões, dos quais apenas R$ 6 bilhões foram efetivamente contratados.
Entre as futuras campeãs estavam a Eletrobras e a Petrobras. Como, pelas regras da OMC, o BNDES não pode financiar estatais, o banco emprestou dinheiro em condições singularmente privilegiadas para os fornecedores da Eletrobras. O objetivo, alegou o governo, era permitir à empresa disputar contratos também no exterior. Obrigada a baixar as tarifas de energia para ajudar a bancar uma redução média de 20% na conta de luz em 2012 e envolvida em diversos casos de corrupção, a Eletrobras está tecnicamente quebrada.
Maior empresa nacional, a Petrobras quase teve o mesmo destino. Depois de 13 anos como alvo preferencial da ganância dos políticos, forçada a comprar refinarias sucateadas, desperdiçar bilhões de reais em projetos ruinosos concebidos por governantes estrangeiros amigos de Lula e vergar-se ao aparelhamento oportunista, a estatal só escapou da completa destruição porque a Lava Jato descobriu o esquema do Petrolão.
No setor alimentício, a Brasil Foods (BRF), dona da Sadia e da Perdigão, e a JBS, controladora das marcas Friboi e Seara e líder mundial entre as empresas que lidam com proteína animal, pareciam imunes a concorrentes até a explosão da Operação Carne Fraca. “Quando se faz uma política de campeões nacionais e o governo arbitra, automaticamente se cria uma cadeia de perdedores”, disse em 2015 o empresário Graciano Roberto Russo, ex-controlador do frigorífico Independência, num depoimento à CPI do BNDES. Um dos “perdedores”, o Independência quebrou em 2009, enquanto a JBS se consolidava como gigante global sob o guarda-chuva do BNDES.
Se tamanha interferência do Estado na economia é absurda, ainda mais espantosos foram os critérios de seleção utilizados pelos pais da ideia malograda. As escolhas beneficiaram invariavelmente empresas que mantinham estreitas (e estranhas) relações com o governo (e com os donos do poder). As consequências dessa suspeita intimidade, escancaradas pela Operação Lava Jato, acabam de ser novamente expostas pela Carne Fraca: dezenas de fiscais alheios aos interesses do povo, cargos públicos preenchidos por indicações políticas, abusos generalizados e corrupção institucionalizada.
Essa política nasceu condenada à morte breve. Sepultada há tempos, continua roendo os bolsos de todos os brasileiros que pagam impostos.
Fora da corrupção não há salvação
Cinco conselheiros do Tribunal de Contas do Rio, mais o presidente da Assembleia Legislativa, reúnem-se ao ex-governador Sérgio Cabral e a antigos auxiliares para responder por toda sorte crimes de corrupção. Inclua-se na lista o governador Pezão e se terá a receita de um Estado em decomposição. Sobrará o quê, dessa quadrilha empenhada em enriquecer às custas de um povo entregue à própria sorte?
O Rio já foi a capital do Brasil. Hoje transformou-se em centro do crime organizado. Do tráfico de drogas aos assaltos, sequestros e ao desvio de verbas públicas de toda espécie, não sobrou nada. Para cada canto que o cidadão se vire, escorre lama.
Tem saída? Provavelmente, não. Daqui, só para pior. A corrupção estendeu-se por todos os setores e atividades públicas. Os encarregados de zelar pela ordem entregam-se à desordem. Receber propinas tornou-se regra fundamental de comportamento social.
Claro que existem exceções, do Ministério Público à Polícia Federal, mas o enfraquecimento das elites conduziu à rendição das massas, breve a se transformar em rebelião. Qualquer um que se disponha a protestar diante da roubalheira indiscriminada receberá o repúdio dos que servem como exemplo às avessas. Fora da corrupção não há salvação.
Mulher que roubou desodorantes não teve mesmo tratamento de Adriana Anselmo
A mulher presa gestante ou com filho de até 12 anos de idade incompletos tem direito a requerer a substituição da prisão preventiva pela domiciliar. É o que estabelece a Lei n. 13.257, editada em dia 8 de março de 2016, que alterou artigos do Código de Processo Penal. A ré Adriana Ancelmo, acusada de graves crimes contra o patrimônio público, inclusive formação de quadrilha e lavagem de dinheiro, num esquema em faturou mais de R$ 300 milhões com o marido Sérgio Cabral, requereu e foi atendida pelo juiz Marcelo Bretas. Em segunda instância, Adriana Ancelmo já havia perdido liminarmente.
O processo foi feito diretamente ao Superior Tribunal de Justiça, terceira instância, antes de manifestação definitiva da segunda instância, pela respectiva Turma no Tribunal Regional Federal, e Adriana Ancelmo ganhou o direito de ir para o luxuoso apartamento de mais de 200 metros quadrados, com cinco empregados pagos com dinheiro desviado dos cofres públicos, no aprazível bairro do Leblon, na Cidade Maravilhosa, por decisão tomada na França. Chique, muito chique…
O processo foi feito diretamente ao Superior Tribunal de Justiça, terceira instância, antes de manifestação definitiva da segunda instância, pela respectiva Turma no Tribunal Regional Federal, e Adriana Ancelmo ganhou o direito de ir para o luxuoso apartamento de mais de 200 metros quadrados, com cinco empregados pagos com dinheiro desviado dos cofres públicos, no aprazível bairro do Leblon, na Cidade Maravilhosa, por decisão tomada na França. Chique, muito chique…
O interessante é que o mesmo STJ não costuma ser tão generoso com mulheres pobres, como não o foi com Georgina Gonçalves, que entrou em um supermercado na cidade mineira de Varginha e colocou na bolsa cinco embalagens de chiclete e dois desodorantes. Tudo somado, a conta daria R$ 42,00 – mas Georgina, sem dinheiro, saiu sem pagar do supermercado e foi detida pelos seguranças do estabelecimento, que chamaram a polícia. Os produtos voltaram para as prateleiras. Georgina foi presa em flagrante.
O fato ocorreu em fevereiro de 2011 e até este mês (março/2016) Georgina permaneceu presa. Agora, em apertada votação (3X2), o STF libertou Georgina. Antes disso, Georgina teve seu pedido de habeas corpus negado pelo STJ. O mesmo STJ que concedeu prisão domiciliar em velocidade cósmica para Adriana Ancelmo, que, junto com o maridão, roubou centenas de milhões de reais do povo do estado do Rio de Janeiro.
O fato ocorreu em fevereiro de 2011 e até este mês (março/2016) Georgina permaneceu presa. Agora, em apertada votação (3X2), o STF libertou Georgina. Antes disso, Georgina teve seu pedido de habeas corpus negado pelo STJ. O mesmo STJ que concedeu prisão domiciliar em velocidade cósmica para Adriana Ancelmo, que, junto com o maridão, roubou centenas de milhões de reais do povo do estado do Rio de Janeiro.
No Brasil, por tradição, quem rouba pouco é tratado como ladrão; quem rouba muito (principalmente o dinheiro público) é tratado como barão, conforme quase sempre acontece com presidente, governador, senador, deputado, dirigente de empresas estatais ou particulares, enfim, agentes públicos e privados que sejam poderosos.
Quem mandou Georgina Gonçalves ser pobre e não pertencer às “zelites” acima mencionadas?
Voltando à baronesa Adriana Anselmo, quando seu filho de 11 anos completar 12 anos, será que ela voltará imediatamente para a prisão, na forma da lei?
Quem mandou Georgina Gonçalves ser pobre e não pertencer às “zelites” acima mencionadas?
Voltando à baronesa Adriana Anselmo, quando seu filho de 11 anos completar 12 anos, será que ela voltará imediatamente para a prisão, na forma da lei?
Dois pesos
Nada contra o Juiz despachar de onde for alcançado pelo pedido urgente. Afinal, se há um agente público que não deve em lugar algum desencarnar da função, por si só imensamente sublime, esse alguém é o Juiz de Direito.
A atitude da Ministra Maria Thereza mandando ver do seu Gabinete em Brasília ao lugar onde estava em trabalho, exatamente Paris, os autos do “habeas corpus” que lhe coube por distribuição merece encômios.
Em nós outros, pobres mortais, acende-se uma chama, ainda que tímida, mas insistente, a nos dizer que ainda vale a pena confiar na humanidade.
Centenas de milhares de pessoas, jovens ou velhos, se amontoam agrilhoados sob o peso invisível da injustiça mofando como se fossem animais selvagens inofensivos por já não terem mais músculos saudáveis para continuarem lutando.
Não é segredo que mais da metade dessas pessoas encarceradas são presos provisórios, o que significa dizer que esse atual estado de coisas, desorganizado, corrupto e cruel, sequer é capaz de lhes apontar uma acusação formal que possa resultar em alguma culpa formada.
A força da lei hoje equivale à ineficácia das sumulas. Quando interessa, vale. E o que se passa no coração dos Juízes ou Juízas lá no fundo, quem é maluco de querer adivinhar? Ouse pensar. Só pensar. É ouvir a voz da injustiça travestida de hermenêuticas talvez captadas de algum outro planeta e ficar frio.
O entendimento de agora poderá vir a ser amanhã o mesmo a prevalecer em sentido contrário.
A lei processual penal, por exemplo, determina que se a presidiária, sentenciada ou não, é mãe de filho menor de 12 anos, pode o Juiz converter a segregação em prisão domiciliar.
A Ministra Maria Thereza ante a requisição do remédio heroico, o “habeas corpus”, para atender à súplica de uma mãe presa, ainda sem culpa formada, agiu rapidamente e deferiu a liminar.
Desde ontem que a senhora Adriana Ancelmo, esposa do ex-Governador Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro, não mora mais no complexo penitenciário de Bangú. Quem ficou lá, por enquanto, foi só o seu marido.
Os dois, como é público e notório, estão em prisão provisória à disposição da Justiça Federal, sob graves acusações de malfeitos contra o erário. O casal tem filhos menores e a Ministra do STJ entendeu que eles, os filhos, carecem da companhia materna, na forma prescrita pelo Código de Processo Penal, Artigo 318, Inciso V.
A Policia Federal deu uma geral no apartamento da família Cabral para concluir que a doutora mamãe não fará uso de qualquer meio de comunicação. O que, por tabela, pune também as crianças que ficarão sem internet, sem celular. E tal.
Tudo seria melhor se todos os Juízes do Brasil, incluindo Desembargadores Federais e Estaduais, e também Ministros e Ministras do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, mirassem no exemplo da Ministra Maria Thereza e, assim, incontáveis pedidos de liminares em questões de tanta urgência, urgentíssima, não restariam esquecidos.
Melhor sorte, porém, não teve a senhora Leide Diana Lopes Conde, a qual apesar da semelhança fonética com a Princesa até hoje idolatrada na Inglaterra, vai continuar na cadeia. Ela e o marido.
Horas depois o mesmo STJ negou à senhora Leide o direito de cumprir a pena em casa de modo a dar assistência, apoio e carinho aos seus dois filhos menores. Um de três anos e outro de 8 anos de idade.
Edson Vidigal
A atitude da Ministra Maria Thereza mandando ver do seu Gabinete em Brasília ao lugar onde estava em trabalho, exatamente Paris, os autos do “habeas corpus” que lhe coube por distribuição merece encômios.
Em nós outros, pobres mortais, acende-se uma chama, ainda que tímida, mas insistente, a nos dizer que ainda vale a pena confiar na humanidade.
Não é segredo que mais da metade dessas pessoas encarceradas são presos provisórios, o que significa dizer que esse atual estado de coisas, desorganizado, corrupto e cruel, sequer é capaz de lhes apontar uma acusação formal que possa resultar em alguma culpa formada.
A força da lei hoje equivale à ineficácia das sumulas. Quando interessa, vale. E o que se passa no coração dos Juízes ou Juízas lá no fundo, quem é maluco de querer adivinhar? Ouse pensar. Só pensar. É ouvir a voz da injustiça travestida de hermenêuticas talvez captadas de algum outro planeta e ficar frio.
O entendimento de agora poderá vir a ser amanhã o mesmo a prevalecer em sentido contrário.
A lei processual penal, por exemplo, determina que se a presidiária, sentenciada ou não, é mãe de filho menor de 12 anos, pode o Juiz converter a segregação em prisão domiciliar.
A Ministra Maria Thereza ante a requisição do remédio heroico, o “habeas corpus”, para atender à súplica de uma mãe presa, ainda sem culpa formada, agiu rapidamente e deferiu a liminar.
Desde ontem que a senhora Adriana Ancelmo, esposa do ex-Governador Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro, não mora mais no complexo penitenciário de Bangú. Quem ficou lá, por enquanto, foi só o seu marido.
Os dois, como é público e notório, estão em prisão provisória à disposição da Justiça Federal, sob graves acusações de malfeitos contra o erário. O casal tem filhos menores e a Ministra do STJ entendeu que eles, os filhos, carecem da companhia materna, na forma prescrita pelo Código de Processo Penal, Artigo 318, Inciso V.
A Policia Federal deu uma geral no apartamento da família Cabral para concluir que a doutora mamãe não fará uso de qualquer meio de comunicação. O que, por tabela, pune também as crianças que ficarão sem internet, sem celular. E tal.
Tudo seria melhor se todos os Juízes do Brasil, incluindo Desembargadores Federais e Estaduais, e também Ministros e Ministras do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, mirassem no exemplo da Ministra Maria Thereza e, assim, incontáveis pedidos de liminares em questões de tanta urgência, urgentíssima, não restariam esquecidos.
Melhor sorte, porém, não teve a senhora Leide Diana Lopes Conde, a qual apesar da semelhança fonética com a Princesa até hoje idolatrada na Inglaterra, vai continuar na cadeia. Ela e o marido.
Horas depois o mesmo STJ negou à senhora Leide o direito de cumprir a pena em casa de modo a dar assistência, apoio e carinho aos seus dois filhos menores. Um de três anos e outro de 8 anos de idade.
Edson Vidigal
quinta-feira, 30 de março de 2017
Armas de distração em massa
Aproximam-se as eleições francesas e alemãs e, em ambos os países, políticos e jornalistas se perguntam como enfrentar eventuais campanhas de uso contínuo de dados falsos, que tanto sucesso tiveram no Reino Unido e nos Estados Unidos. As Armas de Distração em Massa (título de uma canção do grupo francês de rap IAM e de um filme norte-americano bem ruim) são um fenômeno novo porque não fazem parte dos clássicos mecanismos de propaganda política idealizados na Alemanha de entre guerras ou na União Soviética dos anos trinta. Essas ADMs se destinam a mercados ocidentais, com democracias liberais, e foram testadas e aperfeiçoadas por especialistas vinculados à extrema direita ou à chamada direita alternativa, originária dos Estados Unidos.
Sua raiz não está tanto na propaganda política como na manipulação publicitária, e certamente é mais fácil encontrar paralelismos com a campanha montada pelas grandes multinacionais do fumo nos anos sessenta para impedir que seu produto fosse relacionado com o câncer do que com os discursos de Goebbels e Stalin. O economista e apresentador da BBC Tim Harford explica isso muito bem em um artigo intitulado The Problem with Facts.
As ADMs buscam que os debates políticos não se deem no terreno da ação, das medidas necessárias para solucionar determinados problemas, mas que se esgotem dando voltas sobre a falsidade de determinados dados. Faz sentido erguer um muro na fronteira entre o México e os Estados Unidos? Por ora, será preciso desmentir os dados falsos sobre o custo desse muro, difundidos maciça e organizadamente pelos interessados. A "bomba de distração" funciona às maravilhas e as dúvidas sobre o preço se instalam em todos os fóruns de debate, no lugar do sentido e eficácia do tema.
No fundo, trata-se da total negação do debate político porque este tem de se concentrar não em torno de alguns dados, mas em torno de propostas para mudar esses dados e a realidade. As ADMs procuram duas coisas: negar a credibilidade das fontes, por mais conceituadas que sejam, e negar os próprios fatos. O efeito combinado dessas duas estratégias é brutal: a produção intencional de ignorância que, é bom ficar claro, precisa da colaboração não só de políticos e publicitários, mas também de grandes meios de comunicação e jornalistas bem conhecidos, comprados ou voluntários.
A agnotologia, o estudo dessa fabricação premeditada de desconhecimento, teve também um grande momento após a eclosão da crise econômica. Joaquín Estefanía recuperou o poder da palavra para contar como os responsáveis pela Grande Recessão conseguiram introduzir muitíssimo ruído sobre as causas do que ocorreu, quando estavam perfeitamente conscientes de seu próprio papel. O mesmo procedimento se aplica agora às causas do mal-estar político, maciças doses de distração destinadas a desviar a atenção de onde deveria estar: o que se fez e como pode ser corrigido.
Fazer frente a estratégias tão elaboradas não é fácil. É preciso divulgar os dados certos e insistir na autoridade das fontes, claro. Mas existe o perigo de empregar todo o tempo em checar e desmentir os dados falsos, o que proporcionaria um grande êxito aos manipuladores, donos da agenda, do enquadramento dos fatos e do debate, e capazes de ganhar todos os pontos por puro esgotamento do oponente. Assim, os jornalistas alemães e franceses tentam agora adotar uma estratégia diferente: voltar a contar histórias nas quais não se fale da mentira, mas em que se mostre a verdade e sua importância. Grandes histórias sobre a vida real das pessoas.
Sua raiz não está tanto na propaganda política como na manipulação publicitária, e certamente é mais fácil encontrar paralelismos com a campanha montada pelas grandes multinacionais do fumo nos anos sessenta para impedir que seu produto fosse relacionado com o câncer do que com os discursos de Goebbels e Stalin. O economista e apresentador da BBC Tim Harford explica isso muito bem em um artigo intitulado The Problem with Facts.
As ADMs buscam que os debates políticos não se deem no terreno da ação, das medidas necessárias para solucionar determinados problemas, mas que se esgotem dando voltas sobre a falsidade de determinados dados. Faz sentido erguer um muro na fronteira entre o México e os Estados Unidos? Por ora, será preciso desmentir os dados falsos sobre o custo desse muro, difundidos maciça e organizadamente pelos interessados. A "bomba de distração" funciona às maravilhas e as dúvidas sobre o preço se instalam em todos os fóruns de debate, no lugar do sentido e eficácia do tema.
No fundo, trata-se da total negação do debate político porque este tem de se concentrar não em torno de alguns dados, mas em torno de propostas para mudar esses dados e a realidade. As ADMs procuram duas coisas: negar a credibilidade das fontes, por mais conceituadas que sejam, e negar os próprios fatos. O efeito combinado dessas duas estratégias é brutal: a produção intencional de ignorância que, é bom ficar claro, precisa da colaboração não só de políticos e publicitários, mas também de grandes meios de comunicação e jornalistas bem conhecidos, comprados ou voluntários.
A agnotologia, o estudo dessa fabricação premeditada de desconhecimento, teve também um grande momento após a eclosão da crise econômica. Joaquín Estefanía recuperou o poder da palavra para contar como os responsáveis pela Grande Recessão conseguiram introduzir muitíssimo ruído sobre as causas do que ocorreu, quando estavam perfeitamente conscientes de seu próprio papel. O mesmo procedimento se aplica agora às causas do mal-estar político, maciças doses de distração destinadas a desviar a atenção de onde deveria estar: o que se fez e como pode ser corrigido.
Fazer frente a estratégias tão elaboradas não é fácil. É preciso divulgar os dados certos e insistir na autoridade das fontes, claro. Mas existe o perigo de empregar todo o tempo em checar e desmentir os dados falsos, o que proporcionaria um grande êxito aos manipuladores, donos da agenda, do enquadramento dos fatos e do debate, e capazes de ganhar todos os pontos por puro esgotamento do oponente. Assim, os jornalistas alemães e franceses tentam agora adotar uma estratégia diferente: voltar a contar histórias nas quais não se fale da mentira, mas em que se mostre a verdade e sua importância. Grandes histórias sobre a vida real das pessoas.
O mau exemplo
“Espero que a decisão possa servir de exemplo a ser aplicado a muitas outras acusadas grávidas ou mãe de crianças que delas dependem e que respondem, encarceradas, a ações penais em todo território nacionalJuiz Marcelo Bretas no despacho para que Adriana Ancelmo deixe Bangu 8 e vá cumprir pena em casa.
De boas intenções, o inferno está cheio, sabe há muito não só o juiz evangélico da 7ª Vara Federal Criminal do Rio. O desejo humanitário de que a liberação da mulher do ex-governador sirva para que outros magistrados sigam a medida não é justificativa. Não parece plausível a concessão do benefício à ex-primeira-dama estadual parceira do marido ex-governador no assalto descarado aos cofres públicos para ser exemplo.
Aplicar a letra da lei, que não é cumprida, sem o espírito de Justiça, foi mais uma concessão de privilégio como qualquer outro que se vê às centenas no país.
À atitude de quixotesco humanitarismo, se sobrepõe o interesse de uma população já vilipendiada por uma série de concessões privilegiadas a ladrões públicos. Mostrar a deferência como demonstrou, o gesto do juiz foi mais um daqueles procedimentos típicos de uma sociedade em que se reverencia o poder mesmo quando este é criminoso.
Quando tanto se espera a mão forte da Justiça na guerra contra a corrupção, vemos um gesto de pelica na cara das milhares de mães presidiárias, ladras de fraldas e ninharias, mas que pagam como a ex-primeira-dama deveria pagar na cadeia.
A liberação, confirmada via assinatura digital de Paris, mais pareceu uma sucessão de escárnios à inteligência dos pobres mortais contribuintes (ou seriam reles pagadores de impostos medievais?). Veio ainda acompanhada da pegadinha jurídica de que a ex ficará, em casa, angelicamente, sem acesso a telefone e internet. Num país em que é livre o acesso dentro dos presídios a celulares, mesmo sob vigilância, como garantir que no luxo do próprio apartamento não lhe será concedido o pecadilho de teclar um celular?
E assim de privilégio em privilégio se alarga ainda mais o abismo entre população e os poderes que deviam lhe servir e proteger.
Luiz Gadelha
Urgência urgentíssima
São urgentes mecanismos institucionais que garantam um Estado público e um capitalismo privadoCarlos Alberto Sardenberg
A lei ou as conveniências?, eis o dilema do TSE
Ao recomendar a cassação do mandato de Michel Temer em parecer enviado ao TSE, a Procuradoria-Geral Eleitoral tornou mais constrangedora a articulação que se desenvolve nos porões de Brasília para afastar a corda do pescoço do presidente da República. O relator do processo sobre a cassação da chapa Dilma-Temer, ministro Herman Benjamin, também deve votar a favor da interrupção da presidência e Temer. E os ministros do TSE ficarão diante do seguinte dilema: observar a letra fria da lei ou se render à tese segundo a qual o afastamento de Temer a essa altura geraria uma crise que não convém ao país?
Eu conversei com um dos ministros que participarão do julgamento. Sem antecipar o voto, ele me disse que é impossível deixar de levar em conta a conjuntura num julgamento como esse. O ministro se refere ao fato de que, sob Temer, a economia do país parou de piorar. E o seu afastamento levaria a uma eleição indireta que abriria uma janela para o imponderável. Esse tipo de tese ganhou naturalidade depois que o surto de cólera das ruas foi substituído por uma epidemia de passividade.
De fato, não é fácil afastar mais um presidente em tão pouco tempo. Fica ainda mais difícil quando se considera que o substuituto será escolhido numa eleição indireta por um Congresso em que se misturam congressistas sujos e mal lavados. Mas surge uma pergunta simples: o que fazer com as provas de que a chapa eleita em 2014 foi financiada com dinheiro roubado? É esse tipo de jeitinho que transforma o Brasil num país sem jeito. Ao esticar a lei para acomodar dentro dela a conveniência política, o Brasil vai se consolidando como o mais antigo país do futuro do mundo.
De fato, não é fácil afastar mais um presidente em tão pouco tempo. Fica ainda mais difícil quando se considera que o substuituto será escolhido numa eleição indireta por um Congresso em que se misturam congressistas sujos e mal lavados. Mas surge uma pergunta simples: o que fazer com as provas de que a chapa eleita em 2014 foi financiada com dinheiro roubado? É esse tipo de jeitinho que transforma o Brasil num país sem jeito. Ao esticar a lei para acomodar dentro dela a conveniência política, o Brasil vai se consolidando como o mais antigo país do futuro do mundo.
Um clássico, segundo Woody Allen
Woody Allen e Goldie Hawn, no filme "I'm Through With Love" (1996), de Woody
Quem salvará o Rio dos seus políticos?
O destino do Rio de Janeiro depende unicamente dos que votarem no próximo ano para eleger deputados estaduais, federais, senadores e o governador. Ou se promove um gigantesco expurgo político capaz de entrar para a História do Estado e, por tabela, do país ou não haverá salvação.
A indiferença, o desânimo e o desencanto com a politica e os políticos são os maiores aliados dos criminosos de colarinho branco que ainda esperam de alguma forma sobreviver à devastação ora em curso. A polícia e a Justiça, sozinhas, serão incapazes de dar conta do recado.
O Rio está quebrado, econômica e politicamente. E não deve esperar ajuda a não ser dos cariocas. Se causou assombro a prisão de quem o governou por oito ano com índices geralmente altos de aprovação, o que não causará agora a descoberta de que a corrupção arrombou a porta de um tribunal?
O assombro da maioria que leva uma vida dura, sem tempo ou sem meios de cuidar de outra coisa, é compreensível. Não é dos que tiveram mais sorte, são bem informados e acompanham de perto o que se passa nas câmaras do poder. Esses, na melhor das hipóteses, fecharam os olhos.
Podia-se não ter uma ideia precisa do tamanho da quadrilha que se apoderou do aparelho do Estado, ou do volume de dinheiro surrupiado por ela. Mas a identidade dos principais quadrilheiros sempre foi conhecida, bem como a natureza dos seus negócios.
Como foi possível a nomeação para conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do filho de um governador que julgaria mais tarde as contas do próprio pai? Ou de um sujeito que a Justiça Eleitoral havia decidido cassar seu mandato de deputado por abuso de poder econômico?
Os malandros da Lapa conhecem a ficha de Jorge Picciani (PMDB), o presidente da Assembleia Legislativa, avalista do governador citado em delações à Lava Jato, e ultimamente encarregado de negociar com o governo federal o pagamento da dívida do Rio. Ninguém mais conhecia?
A corrupção não é monopólio do Rio. É possível que haja mais corrupção em outros Estados – a ver. Mas o Rio é o cartão postal do país interna e externamente. E o que ele mostra hoje dá nojo e revolta.
A indiferença, o desânimo e o desencanto com a politica e os políticos são os maiores aliados dos criminosos de colarinho branco que ainda esperam de alguma forma sobreviver à devastação ora em curso. A polícia e a Justiça, sozinhas, serão incapazes de dar conta do recado.
O assombro da maioria que leva uma vida dura, sem tempo ou sem meios de cuidar de outra coisa, é compreensível. Não é dos que tiveram mais sorte, são bem informados e acompanham de perto o que se passa nas câmaras do poder. Esses, na melhor das hipóteses, fecharam os olhos.
Podia-se não ter uma ideia precisa do tamanho da quadrilha que se apoderou do aparelho do Estado, ou do volume de dinheiro surrupiado por ela. Mas a identidade dos principais quadrilheiros sempre foi conhecida, bem como a natureza dos seus negócios.
Como foi possível a nomeação para conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do filho de um governador que julgaria mais tarde as contas do próprio pai? Ou de um sujeito que a Justiça Eleitoral havia decidido cassar seu mandato de deputado por abuso de poder econômico?
Os malandros da Lapa conhecem a ficha de Jorge Picciani (PMDB), o presidente da Assembleia Legislativa, avalista do governador citado em delações à Lava Jato, e ultimamente encarregado de negociar com o governo federal o pagamento da dívida do Rio. Ninguém mais conhecia?
A corrupção não é monopólio do Rio. É possível que haja mais corrupção em outros Estados – a ver. Mas o Rio é o cartão postal do país interna e externamente. E o que ele mostra hoje dá nojo e revolta.
Futuro monumento
Há dias, Ancelmo Gois, no "Globo", propôs que o Posto da Torre —o posto de gasolina de Brasília que, há três anos, deu origem e nome à Operação Lava Jato— fosse tombado pelo patrimônio histórico. A ideia seria transformá-lo em monumento nacional, em memória da luta para limpar o país dos executivos da Petrobras, empreiteiros, lavadores de dinheiro, governantes e políticos que, só neste século, roubaram pelo menos R$ 20 bilhões e levaram o país a uma crise como nunca antes.
Não sei se a proposta de Ancelmo terá futuro, mas sou a favor dela. Se o posto se tornar monumento, fará jus a verbas para funcionamento e manutenção. Para isso, terá de deixar de vender gasolina, calibrar pneus ou servir hambúrgueres, mas estas nunca foram suas atividades preferenciais —a própria lavagem de carros, apesar do nome, jamais foi praticada ali. Em compensação, guias conduzirão os visitantes às salas onde se urdiram os primeiros golpes contra a economia e as instituições.
Como ponto subitamente promovido a atração turística, o posto não poderia ter melhor localização. Fica no começo da Asa Sul, perto de um setor hoteleiro e a apenas três quilômetros do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do STF –redutos de vários protagonistas e coadjuvantes do esquema.
Um dia, no futuro, os guias contarão aos incrédulos visitantes que, apesar de ter sido criada para fins até patrióticos –desmascarar as propinas distribuídas aos políticos para que estes fizessem passar emendas que permitiam a certas empresas economizar ou lucrar bilhões, sangrando as necessidades da nação–, a Lava Jato foi combatida pelo presidente e seus ministros, cinco ex-presidentes, os partidos em peso, quase todo o Congresso Nacional e até por alguns togados.
Não sei se a proposta de Ancelmo terá futuro, mas sou a favor dela. Se o posto se tornar monumento, fará jus a verbas para funcionamento e manutenção. Para isso, terá de deixar de vender gasolina, calibrar pneus ou servir hambúrgueres, mas estas nunca foram suas atividades preferenciais —a própria lavagem de carros, apesar do nome, jamais foi praticada ali. Em compensação, guias conduzirão os visitantes às salas onde se urdiram os primeiros golpes contra a economia e as instituições.
Como ponto subitamente promovido a atração turística, o posto não poderia ter melhor localização. Fica no começo da Asa Sul, perto de um setor hoteleiro e a apenas três quilômetros do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do STF –redutos de vários protagonistas e coadjuvantes do esquema.
Um dia, no futuro, os guias contarão aos incrédulos visitantes que, apesar de ter sido criada para fins até patrióticos –desmascarar as propinas distribuídas aos políticos para que estes fizessem passar emendas que permitiam a certas empresas economizar ou lucrar bilhões, sangrando as necessidades da nação–, a Lava Jato foi combatida pelo presidente e seus ministros, cinco ex-presidentes, os partidos em peso, quase todo o Congresso Nacional e até por alguns togados.
Verdades enredadas (uma indústria bilionária)
Porque era sábado de manhã, porque o céu era azul e porque não fazia calor, o morador do Itaim Bibi, em São Paulo, tomou a resolução de sair a pé e comprar um CD para dar de presente a uma amiga que gosta de música. Mas... onde comprar? Ele foi ao Google. Na velocidade da luz, dois endereços se ofereceram na tela. O intrépido habitante do Itaim viu que as lojas ficavam bem perto do seu apartamento e pôs os pés à obra.
Depois de poucos quarteirões, deu com a cara em duas portas esquisitas. Na primeira, funcionava algo como um serviço de design de sobrancelhas (ao menos foi isso que o pedestre acidental registrou do estabelecimento). Na segunda porta, um salão de beleza. Desconcertado, assimilou a sua primeira lição daquele sábado: o Google erra.
O Google não tira da página as lojas que faliram. Seu nome, seus slogans e a foto da fachada continuam lá, em cores vivas, como se essas empresas comercias já não estivessem mortas e enterradas. Nas redes sociais não é diferente. Os usuários dão “likes” em páginas de gente que morreu faz tempo. A internet é isso, um universo de verdades enredadas e mentiras eletrizantes. “Manchetes” anunciando que o ex-presidente Lula acaba de ser preso na Lava Jato, “denúncias” assegurando que Teori Zavascki morreu num atentado tramado por um petista ou por um militar (os “culpados” se alternam) e “alertas” mandando você, na noite de hoje, deixar o celular desligado e fora do quarto para não “pegar câncer” convivem com toda espécie de ilações estapafúrdias.
Estapafúrdias e de enorme impacto. Donald Trump, por exemplo, insiste em acusar Barack Obama de ter grampeado, enquanto ainda era presidente dos Estados Unidos, os telefones da Trump Tower. O próprio FBI já negou essa possibilidade, mas, a esta altura, não se consegue avaliar direito quantos milhões de americanos tomaram por verdade o despautério sem prova de Donald Trump.
Mentiras desse tipo ficam e frutificam. Para se ter uma ideia, uma pesquisa divulgada no final do ano passado pelo YouGov mostrou que, para 53% dos americanos, a informação de que o Iraque, ainda no tempo de Saddam Hussein, estava fabricando armas químicas de destruição em massa era verdadeira. A informação era falsa, grosseiramente falsa, mas foi com base nela que, em 2003, tropas lideradas pelos Estados Unidos invadiram o Iraque. Somente anos mais tarde os envolvidos naquela guerra, de George W. Bush a Tony Blair, admitiram que a acusação era uma fraude, mas o estrago já tinha sido feito.
E continuou a ser feito. Muita gente apoiou o ataque contra o Iraque porque acreditou nas tais armas químicas e seguiu acreditando. Para muitos, aquela história segue sendo verdadeira. Ou seja, para muita gente, o Iraque mereceu ser invadido daquela forma. Aquela notícia falsa moldou, e continua moldando, a opinião pública americana.
Não que as notícias falsas sejam uma criação da internet. Elas sempre existiram e, desde sempre, vêm provocando perseguições, tragédias e extermínios. Muito antes da invenção do computador, um livro inteiramente falsificado, Os Protocolos dos Sábios do Sião, desencadeou vagas de antissemitismo pela Europa. Mas há dois dados novos que mudam tudo.
O primeiro tem que ver com a velocidade, a escala, o alcance e a eficácia. Vários levantamentos mostram que as notícias falsas repercutem mais do que as verdadeiras. E mais rapidamente. Em questão de um dia ou dois, uma figura como Trump consegue fazer a metade dos Estados Unidos acreditar que Barack Obama nasceu no Quênia (o que é mentira, não custa avisar; Obama é americano nato).
O segundo dado novo é econômico. Como têm um incomparável poder de sedução e de engajamento, as notícias falsas viraram um negócio lucrativo no chamado ciberespaço. Dentro do ambiente virtual forjado por empresas como o Google, o Facebook, o YouTube e outras, mentir compensa, e muito.
Como a indústria das redes interconectadas remunera aqueles que postam “conteúdos” pelo número de clicks (quanto mais as pessoas acessam uma notícia, seja ela falsa ou verdadeira, mais o autor arrecada), e como a mentira é fácil de produzir (é barata) e desperta o furor das audiências, um dos melhores negócios da atualidade é contar lorotas. Uma redação profissional (seja um bom jornal ou uma boa revista jornalística), se começar a publicar mentiras, vai perder leitores e anunciantes. Com um site desses aí, como os que ajudaram Trump a se eleger, a equação é invertida: quanto mais mentiras publica, mais atrai leitores e anunciantes.
Isso mesmo: atrai anunciantes. Os anúncios também são distribuídos na rede de acordo com o número de clicks. Um anúncio pode ir parar em qualquer lugar da rede desde que haja muitos clicks por lá. Só muito recentemente os anunciantes começaram a reclamar. Alguns não aceitam mais aparecer em sites que fazem discurso de ódio, apologia do terrorismo e difusão de calúnias.
Conseguirão mudar a regra do jogo? É improvável. Ao menos até aqui, a regra tem sido perversa: o mesmo ambiente econômico que vem condenando algumas das boas redações jornalísticas à falência estimula e recompensa muito bem a irresponsabilidade dos que exploram as notícias falsas.
É bom ficar de olho e torcer para que as coisas mudem. De um jeito ou de outro, da próxima vez que o improvável leitor, interessado em comprar um CD, perguntar ao Google onde é que se vende esse tipo de antiguidade tecnológica e der com a cara na porta de um cabeleireiro, lembre-se de que mesmo aquele endereço errado no qual ele clicou rendeu um trocado para alguém. É assim que é. O divórcio traumático entre a ética jornalística e os cifrões da indústria das redes sociais atravessa como navalha esse desencontro inofensivo que qualquer um de nós pode experimentar num sábado de manhã, assim como determina a indústria de inverdades que pavimentam a fisionomia política do mundo.
Depois de poucos quarteirões, deu com a cara em duas portas esquisitas. Na primeira, funcionava algo como um serviço de design de sobrancelhas (ao menos foi isso que o pedestre acidental registrou do estabelecimento). Na segunda porta, um salão de beleza. Desconcertado, assimilou a sua primeira lição daquele sábado: o Google erra.
O Google não tira da página as lojas que faliram. Seu nome, seus slogans e a foto da fachada continuam lá, em cores vivas, como se essas empresas comercias já não estivessem mortas e enterradas. Nas redes sociais não é diferente. Os usuários dão “likes” em páginas de gente que morreu faz tempo. A internet é isso, um universo de verdades enredadas e mentiras eletrizantes. “Manchetes” anunciando que o ex-presidente Lula acaba de ser preso na Lava Jato, “denúncias” assegurando que Teori Zavascki morreu num atentado tramado por um petista ou por um militar (os “culpados” se alternam) e “alertas” mandando você, na noite de hoje, deixar o celular desligado e fora do quarto para não “pegar câncer” convivem com toda espécie de ilações estapafúrdias.
Estapafúrdias e de enorme impacto. Donald Trump, por exemplo, insiste em acusar Barack Obama de ter grampeado, enquanto ainda era presidente dos Estados Unidos, os telefones da Trump Tower. O próprio FBI já negou essa possibilidade, mas, a esta altura, não se consegue avaliar direito quantos milhões de americanos tomaram por verdade o despautério sem prova de Donald Trump.
Mentiras desse tipo ficam e frutificam. Para se ter uma ideia, uma pesquisa divulgada no final do ano passado pelo YouGov mostrou que, para 53% dos americanos, a informação de que o Iraque, ainda no tempo de Saddam Hussein, estava fabricando armas químicas de destruição em massa era verdadeira. A informação era falsa, grosseiramente falsa, mas foi com base nela que, em 2003, tropas lideradas pelos Estados Unidos invadiram o Iraque. Somente anos mais tarde os envolvidos naquela guerra, de George W. Bush a Tony Blair, admitiram que a acusação era uma fraude, mas o estrago já tinha sido feito.
E continuou a ser feito. Muita gente apoiou o ataque contra o Iraque porque acreditou nas tais armas químicas e seguiu acreditando. Para muitos, aquela história segue sendo verdadeira. Ou seja, para muita gente, o Iraque mereceu ser invadido daquela forma. Aquela notícia falsa moldou, e continua moldando, a opinião pública americana.
Não que as notícias falsas sejam uma criação da internet. Elas sempre existiram e, desde sempre, vêm provocando perseguições, tragédias e extermínios. Muito antes da invenção do computador, um livro inteiramente falsificado, Os Protocolos dos Sábios do Sião, desencadeou vagas de antissemitismo pela Europa. Mas há dois dados novos que mudam tudo.
O primeiro tem que ver com a velocidade, a escala, o alcance e a eficácia. Vários levantamentos mostram que as notícias falsas repercutem mais do que as verdadeiras. E mais rapidamente. Em questão de um dia ou dois, uma figura como Trump consegue fazer a metade dos Estados Unidos acreditar que Barack Obama nasceu no Quênia (o que é mentira, não custa avisar; Obama é americano nato).
O segundo dado novo é econômico. Como têm um incomparável poder de sedução e de engajamento, as notícias falsas viraram um negócio lucrativo no chamado ciberespaço. Dentro do ambiente virtual forjado por empresas como o Google, o Facebook, o YouTube e outras, mentir compensa, e muito.
Como a indústria das redes interconectadas remunera aqueles que postam “conteúdos” pelo número de clicks (quanto mais as pessoas acessam uma notícia, seja ela falsa ou verdadeira, mais o autor arrecada), e como a mentira é fácil de produzir (é barata) e desperta o furor das audiências, um dos melhores negócios da atualidade é contar lorotas. Uma redação profissional (seja um bom jornal ou uma boa revista jornalística), se começar a publicar mentiras, vai perder leitores e anunciantes. Com um site desses aí, como os que ajudaram Trump a se eleger, a equação é invertida: quanto mais mentiras publica, mais atrai leitores e anunciantes.
Isso mesmo: atrai anunciantes. Os anúncios também são distribuídos na rede de acordo com o número de clicks. Um anúncio pode ir parar em qualquer lugar da rede desde que haja muitos clicks por lá. Só muito recentemente os anunciantes começaram a reclamar. Alguns não aceitam mais aparecer em sites que fazem discurso de ódio, apologia do terrorismo e difusão de calúnias.
Conseguirão mudar a regra do jogo? É improvável. Ao menos até aqui, a regra tem sido perversa: o mesmo ambiente econômico que vem condenando algumas das boas redações jornalísticas à falência estimula e recompensa muito bem a irresponsabilidade dos que exploram as notícias falsas.
É bom ficar de olho e torcer para que as coisas mudem. De um jeito ou de outro, da próxima vez que o improvável leitor, interessado em comprar um CD, perguntar ao Google onde é que se vende esse tipo de antiguidade tecnológica e der com a cara na porta de um cabeleireiro, lembre-se de que mesmo aquele endereço errado no qual ele clicou rendeu um trocado para alguém. É assim que é. O divórcio traumático entre a ética jornalística e os cifrões da indústria das redes sociais atravessa como navalha esse desencontro inofensivo que qualquer um de nós pode experimentar num sábado de manhã, assim como determina a indústria de inverdades que pavimentam a fisionomia política do mundo.
'Ou o Brasil acaba com a saúva, ou a saúva acaba com o Brasil'
No artigo “Doenças da carne, doenças da alma”, neste último domingo, no “O Globo”, o jornalista Fernando Gabeira disse que, quando menino, ouvia muito a frase que utilizei como título destas linhas: “Ou o Brasil acaba com a saúva, ou a saúva acaba com o Brasil”.
Mais velho do que Gabeira, que, como Ricardo Noblat, meus contemporâneos no velho e saudoso “Jornal do Brasil”, já deve ter completado 50 anos de jornalismo, eu já a ouço há mais tempo ainda. Nós três envelhecemos, eu mais do que eles, e nenhum dos dois – o Brasil ou a saúva – acabou. Interessante é que, com o tempo, a frase perdeu a força que tinha antes. Hoje, a saúva pode ser enfrentada com êxito e, com certeza, se administrada com competência técnica, já não fará mais nenhum mal às terras e lavouras brasileiras. E seu sentido metafórico (ela passou a ser usada contra outros inimigos, como os políticos) também foi desaparecendo. Por cansaço, provavelmente. O mesmo cansaço que hoje vai tomando conta dos melhores de nossa imprensa tanto televisada quanto escrita. Afinal, ninguém é de ferro.
Você já deve ter ouvido por aí, leitor, que a frase seria do escritor Monteiro Lobato. Na verdade, ela foi cunhada pelo naturalista e botânico francês Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853), que ficou espantado com as formigas que destruíam até árvores frondosas, além de arbustos, pastos e gramas. O poeta, escritor e crítico literário Mário de Andrade a botou na boca de seu personagem Macunaíma: “Pouca saúde e muita saúva os males do Brasil são”. A frase também inspirou o hino da escola de samba São Clemente no Carnaval carioca de 1986.
Eis o final do artigo de Gabeira: “Já escondidos atrás do foro privilegiado, os políticos querem se esconder de novo atrás de listas fechadas, anular provas de delação da Odebrecht, enfim, voltar aos velhos tempos. Não vão acabar com o Brasil. As saúvas não acabaram”.
Concordo, plenamente, com o que disse Gabeira, mas tenho enfatizado sempre que a Lava Jato só terá algum sentido se ela for de fato transformadora não apenas da classe política (escolhida e eleita por nós), mas da sociedade brasileira como um todo. Esta, aliás, deverá ser a primeira e notável transformação. Não adianta tergiversar: somos todos, leitor, responsáveis por nossas escolhas. Somos – aliás, sempre fomos – o país do jeitinho e do pistolão. Às vezes, me vem à cabeça esta ideia maluca: a decepção e a desesperança (e a presença diminuta de pessoas na rua no último domingo) talvez expressem o cansaço crescente que toma conta de todos, sem exceção, quando chegamos à triste conclusão de que o mal está na raiz. É nela que reside a dificuldade para se fazer, por exemplo, a maior de todas as reformas – a política.
Mas o Brasil precisa, também, de outras reformas, como afirmou o economista e ex-presidente do Banco Central, no governo FHC, Gustavo Franco. Precisa – concluiu ele – de “reforma da Previdência. E também da trabalhista, tributária, orçamentária, urbana, rural (agrária), sindical e do ensino médio. Precisa de reforma do ensino superior e inferior, de reforma protestante, do espírito do capitalismo e de reforma ortográfica. Reforma na varanda, no banheiro e na cozinha”.
Só que quem quer voltar a presidir o país é o mesmo Lula, que, dizem, conta com 30% dos votos. Sua campanha para 2018 já começou. Seus assessores, com Mantega à frente, são os mesmos que nos entregaram este país roubado e quebrado. E, muito pior, traído!
Lula, Dilma, Temer...
Mais velho do que Gabeira, que, como Ricardo Noblat, meus contemporâneos no velho e saudoso “Jornal do Brasil”, já deve ter completado 50 anos de jornalismo, eu já a ouço há mais tempo ainda. Nós três envelhecemos, eu mais do que eles, e nenhum dos dois – o Brasil ou a saúva – acabou. Interessante é que, com o tempo, a frase perdeu a força que tinha antes. Hoje, a saúva pode ser enfrentada com êxito e, com certeza, se administrada com competência técnica, já não fará mais nenhum mal às terras e lavouras brasileiras. E seu sentido metafórico (ela passou a ser usada contra outros inimigos, como os políticos) também foi desaparecendo. Por cansaço, provavelmente. O mesmo cansaço que hoje vai tomando conta dos melhores de nossa imprensa tanto televisada quanto escrita. Afinal, ninguém é de ferro.
Eis o final do artigo de Gabeira: “Já escondidos atrás do foro privilegiado, os políticos querem se esconder de novo atrás de listas fechadas, anular provas de delação da Odebrecht, enfim, voltar aos velhos tempos. Não vão acabar com o Brasil. As saúvas não acabaram”.
Concordo, plenamente, com o que disse Gabeira, mas tenho enfatizado sempre que a Lava Jato só terá algum sentido se ela for de fato transformadora não apenas da classe política (escolhida e eleita por nós), mas da sociedade brasileira como um todo. Esta, aliás, deverá ser a primeira e notável transformação. Não adianta tergiversar: somos todos, leitor, responsáveis por nossas escolhas. Somos – aliás, sempre fomos – o país do jeitinho e do pistolão. Às vezes, me vem à cabeça esta ideia maluca: a decepção e a desesperança (e a presença diminuta de pessoas na rua no último domingo) talvez expressem o cansaço crescente que toma conta de todos, sem exceção, quando chegamos à triste conclusão de que o mal está na raiz. É nela que reside a dificuldade para se fazer, por exemplo, a maior de todas as reformas – a política.
Mas o Brasil precisa, também, de outras reformas, como afirmou o economista e ex-presidente do Banco Central, no governo FHC, Gustavo Franco. Precisa – concluiu ele – de “reforma da Previdência. E também da trabalhista, tributária, orçamentária, urbana, rural (agrária), sindical e do ensino médio. Precisa de reforma do ensino superior e inferior, de reforma protestante, do espírito do capitalismo e de reforma ortográfica. Reforma na varanda, no banheiro e na cozinha”.
Só que quem quer voltar a presidir o país é o mesmo Lula, que, dizem, conta com 30% dos votos. Sua campanha para 2018 já começou. Seus assessores, com Mantega à frente, são os mesmos que nos entregaram este país roubado e quebrado. E, muito pior, traído!
Lula, Dilma, Temer...
Igualdade mentirosa
A Constituição Federal estabelece que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade (art. 5º, caput). Os 78 incisos desdobram os direitos e as garantias advindos do princípio da igualdade, ou da isonomia. A igualdade se dá perante a lei – aplicação no caso concreto – e na lei, produzida por ato do legislador.
O princípio veda discriminações de quaisquer naturezas e limita a atuação do legislador, do intérprete, do operador do Direito, da autoridade pública e do particular. É menos penosa a fiscalização do cumprimento do princípio na lei, quando o ato do legislador precisa ser avaliado e aprovado antes de se tornar norma de obrigação geral.
A igualdade perante a lei sofre as limitações advindas de um sistema de proclamação de vontades – como promessas – sem as garantias necessárias à sua aplicação.
Proclamar a igualdade perante a lei tem o mesmo significado de insculpir em letras garrafais que o salário mínimo será suficiente para uma família ter moradia, comida, educação, saúde e lazer.
Diante de estruturas burocráticas e elitistas, constituídas mais para atrapalhar do que facilitar a vida em comunidade, com acesso difícil, cartorial e caro, é muita hipocrisia acreditar que haja igualdade perante a lei.
É dizer que um homem simples manejará os mesmos instrumentos que um bilionário durante o processo, com os mesmos recursos e acessos, quando se sabe que a sociedade brasileira funciona à base de influências e compadrios, movidos pelos chamados embargos auriculares.
Uma pessoa do povo dificilmente chegará perto de um desembargador ou de um ministro, salvo se for empregada dele, o mesmo ocorrendo com advogados de pequenos escritórios. Enquanto isso, as grandes bancas participam constantemente dos banquetes da corte, fazendo dos embargos de pé de ouvido o recurso mais eficiente em defesa de sua clientela.
Quando alguém estranha o benefício concedido a Adriana Ancelmo, mulher de Sérgio Cabral, esquece que ela comandou uma das bancas mais importantes do Rio de Janeiro, esteve no centro do poder e ainda tem muita influência. Diferente de Lurdes Rouca, cuja riqueza são os quatro filhos que ela não tem com quem deixar.
O princípio veda discriminações de quaisquer naturezas e limita a atuação do legislador, do intérprete, do operador do Direito, da autoridade pública e do particular. É menos penosa a fiscalização do cumprimento do princípio na lei, quando o ato do legislador precisa ser avaliado e aprovado antes de se tornar norma de obrigação geral.
Proclamar a igualdade perante a lei tem o mesmo significado de insculpir em letras garrafais que o salário mínimo será suficiente para uma família ter moradia, comida, educação, saúde e lazer.
Diante de estruturas burocráticas e elitistas, constituídas mais para atrapalhar do que facilitar a vida em comunidade, com acesso difícil, cartorial e caro, é muita hipocrisia acreditar que haja igualdade perante a lei.
É dizer que um homem simples manejará os mesmos instrumentos que um bilionário durante o processo, com os mesmos recursos e acessos, quando se sabe que a sociedade brasileira funciona à base de influências e compadrios, movidos pelos chamados embargos auriculares.
Uma pessoa do povo dificilmente chegará perto de um desembargador ou de um ministro, salvo se for empregada dele, o mesmo ocorrendo com advogados de pequenos escritórios. Enquanto isso, as grandes bancas participam constantemente dos banquetes da corte, fazendo dos embargos de pé de ouvido o recurso mais eficiente em defesa de sua clientela.
Quando alguém estranha o benefício concedido a Adriana Ancelmo, mulher de Sérgio Cabral, esquece que ela comandou uma das bancas mais importantes do Rio de Janeiro, esteve no centro do poder e ainda tem muita influência. Diferente de Lurdes Rouca, cuja riqueza são os quatro filhos que ela não tem com quem deixar.
Falta um bom coração
Emma Hanquist |
A colega de uma revista quer saber se eu acho que o Brasil é a terra do “homem cordial”, tendo em vista a “assustadora escalada de corrupção, violência e intolerância”. Recebi esse pedido de entrevista justamente quando estava chocado com o que acontecera aqui perto de casa, na Rua Vinicius de Morais, na cosmopolita Ipanema: um jovem turista argentino fora trucidado por um grupo de brasileiros, dos quais quatro já estão identificados. Atingido por um soco numa briga de bar de madrugada, ele caiu e, desacordado, foi espancado com socos, pontapés e golpes de muleta até a morte. Se não bastasse, isso ocorreu no último sábado, quando veio a falecer a também jovem argentina que, no carnaval, ao entrar por engano numa comunidade, foi baleada por traficantes.
É verdade que episódios como esses não são rotineiros como aqueles que infernizam o dia a dia dos moradores do Rio e de outras grandes cidades: assaltos com faca, que é a nova modalidade, roubos de celulares a bordo de bicicleta, bolsas arrancadas e, enfim, tudo o que engrossa uma estatística de quase 60 mil homicídios por ano. Mas há também contribuições menos explícitas que ajudam a banalizar a violência e a reforçar a sua cultura.
Fica difícil falar em homem cordial num país em que um ex-presidente da República xinga um procurador da Justiça de “moleque”, e um ex-ministro e pré-candidato à Presidência ameaça um juiz de “receber com bala” o agente que fosse prendê-lo. São dois exemplos pouco edificantes fornecidos por Lula e Ciro Gomes num momento de tanta polarização e intolerância, a ponto de transformar, pelo ódio, adversários políticos em inimigos — um ambiente em que pessoas da importância de Chico Buarque e Luis Fernando Verissimo são hostilizadas e agredidas quase fisicamente por quem tem opinião diferente.
Por coincidência, a expressão “homem cordial” foi consagrada pelo pai de Chico, o historiador Sérgio Buarque de Holanda; porém, ela não tem o mesmo significado que lhe dá o senso comum, isto é, não quer dizer necessariamente delicadeza, civilidade, bons modos. O “cordial” a que ele se refere deriva etimologicamente do latim “cor”, coração, o órgão que comanda as ações com predominância das emoções. Desse jeito, o coração pode agir para o bem e para o mal, conforme o impulso de fundo emotivo que o move.
No nosso caso, em que se registra um ato de violência contra a mulher a cada sete minutos, não se pode falar em bom coração. Essa conduta tem mais a ver com o fígado, o órgão especializado em produzir bílis.
quarta-feira, 29 de março de 2017
Planalto diz a aliados: sem reforma da Previdência, governo de Temer acaba
O Planalto elevou o tom nas negociações sobre a reforma da Previdência. Incomodados com a resistência das bancadas governistas em avalizar as mudanças, operadores de Michel Temer afirmam aos aliados que, “sem essa reforma, o governo acaba.” A frase ecoa um raciocínio exposto em privado pelo próprio Temer. O presidente se refere à aprovação dos ajustes previdenciários como uma questão de vida ou morte. E o governo se movimenta como se contasse com uma grande batalha.
O governo assustou-se com as traições que colecionou na votação do projeto que autoriza o trabalho terceirizado. Ciente de que ainda não dispões de uma maioria sólida a favor da reforma da Previdência, o Planalto mobiliza os ministros que representam partidos políticos na Esplanada. Cobra deles reciprocidade, eufemismo para a contrapartida fisiológica embutida no modelo de coalizão —outro eufemismo para cooptação. Mapeiam-se as “insatisfações” das bancadas. Identificam-se as “necessidades” dos parlamentares. Nas palavras de um ministro que conversou com o blog, o governo “utiliza todas as armas de que dispõe” para obter votos.
Convertida em bunker pró-reforma, a casa oficial da presidência da Câmara abrirá novamente suas portas para os ministros partidários na manhã desta quarta-feira (29). A conversa dessa vez será coletiva, não individual. E contará com a presença da ala técnica da infantaria, capitaneada pelo ministro Henrique Meirelles (Fazenda) e pelo secretário da Previdência Social, Marcelo Caetano. A ideia é discutir o mérito da reforma da Previdência.
Para dar consequência prática à reunião, convidou-se também o relator da reforma previdenciária na Câmara, deputado Arthur Maia (PPS-BA). Tenta-se separar os pontos que o governo deseja manter no projeto a ferro e fogo —a idade mínima de 65 anos e a equiparação entre homens e mulheres, por exemplo— dos tópicos que o Planalto admite negociar, tais como as regras de transição e o benefício pago a idosos e portadores de deficiência de baixa renda, o chamado BPC (Benefício de Prestação Continuada).
Nas conversas desta terça-feira, Rodrigo Maia disse que pretende votar a reforma da Previdência no plenário da Câmara até o dia 8 de maio. No final de 2016, ele previa que a votação ocorreria no início de 2017, logo depois que os parlamentares retornassem do recesso de final de ano. As previsões escorregaram para abril. Agora, estão momentaneamente estacionadas em maio.
O governo assustou-se com as traições que colecionou na votação do projeto que autoriza o trabalho terceirizado. Ciente de que ainda não dispões de uma maioria sólida a favor da reforma da Previdência, o Planalto mobiliza os ministros que representam partidos políticos na Esplanada. Cobra deles reciprocidade, eufemismo para a contrapartida fisiológica embutida no modelo de coalizão —outro eufemismo para cooptação. Mapeiam-se as “insatisfações” das bancadas. Identificam-se as “necessidades” dos parlamentares. Nas palavras de um ministro que conversou com o blog, o governo “utiliza todas as armas de que dispõe” para obter votos.
Para dar consequência prática à reunião, convidou-se também o relator da reforma previdenciária na Câmara, deputado Arthur Maia (PPS-BA). Tenta-se separar os pontos que o governo deseja manter no projeto a ferro e fogo —a idade mínima de 65 anos e a equiparação entre homens e mulheres, por exemplo— dos tópicos que o Planalto admite negociar, tais como as regras de transição e o benefício pago a idosos e portadores de deficiência de baixa renda, o chamado BPC (Benefício de Prestação Continuada).
Nas conversas desta terça-feira, Rodrigo Maia disse que pretende votar a reforma da Previdência no plenário da Câmara até o dia 8 de maio. No final de 2016, ele previa que a votação ocorreria no início de 2017, logo depois que os parlamentares retornassem do recesso de final de ano. As previsões escorregaram para abril. Agora, estão momentaneamente estacionadas em maio.
Em defesa da vida
Não estamos a usar a razão para defender a vida. Não soubemos consolidar uma acção colectiva capaz de proteger eficazmente a vida desde os seus primeiros passos - as crianças. E se não soubemos proteger as crianças como vamos poder defender a vida em geral?
Trabalhemos pela dignidade do ser humano qualquer que seja a sua idade. As crianças, sim, todas as crianças, mas também os vehos e o excluídos, os que procuram a paz e o pão e em troca recebem humilhações e indiferença. Talvez o meu olho sobre o mundo seja demasiado pessimista, mas, em consciência não creio que o mundo, tal como é, dê a alguém o direito de ser optimista. Para mudar de vida é preciso mudar a vidaJosé Saramago
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