quinta-feira, 30 de março de 2017

O mau exemplo

“Espero que a decisão possa servir de exemplo a ser aplicado a muitas outras acusadas grávidas ou mãe de crianças que delas dependem e que respondem, encarceradas, a ações penais em todo território nacional
Juiz Marcelo Bretas no despacho para que Adriana Ancelmo deixe Bangu 8 e vá cumprir pena em casa.

De boas intenções, o inferno está cheio, sabe há muito não só o juiz evangélico da 7ª Vara Federal Criminal do Rio. O desejo humanitário de que a liberação da mulher do ex-governador sirva para que outros magistrados sigam a medida não é justificativa. Não parece plausível a concessão do benefício à ex-primeira-dama estadual parceira do marido ex-governador no assalto descarado aos cofres públicos para ser exemplo.

Aplicar a letra da lei, que não é cumprida, sem o espírito de Justiça, foi mais uma concessão de privilégio como qualquer outro que se vê às centenas no país.

À atitude de quixotesco humanitarismo, se sobrepõe o interesse de uma população já vilipendiada por uma série de concessões privilegiadas a ladrões públicos. Mostrar a deferência como demonstrou, o gesto do juiz foi mais um daqueles procedimentos típicos de uma sociedade em que se reverencia o poder mesmo quando este é criminoso.

Quando tanto se espera a mão forte da Justiça na guerra contra a corrupção, vemos um gesto de pelica na cara das milhares de mães presidiárias, ladras de fraldas e ninharias, mas que pagam como a ex-primeira-dama deveria pagar na cadeia.

A liberação, confirmada via assinatura digital de Paris, mais pareceu uma sucessão de escárnios à inteligência dos pobres mortais contribuintes (ou seriam reles pagadores de impostos medievais?). Veio ainda acompanhada da pegadinha jurídica de que a ex ficará, em casa, angelicamente, sem acesso a telefone e internet. Num país em que é livre o acesso dentro dos presídios a celulares, mesmo sob vigilância, como garantir que no luxo do próprio apartamento não lhe será concedido o pecadilho de teclar um celular?

E assim de privilégio em privilégio se alarga ainda mais o abismo entre população e os poderes que deviam lhe servir e proteger.
Luiz Gadelha

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