A pajelança foi reveladora porque os ministros do Supremo, normalmente vistos como semideuses, reconheceram que também estão sujeitos à condição humana. Aceitaram a muleta de um desagravo depois que Dias Toffoli, presidente da Corte, num gesto de rara prepotência, abriu por conta própria um inquérito sigiloso para identificar autores de ameaças virtuais aos magistrados e seus familiares.
A coisa foi inadequada porque o rol de apoiadores do Supremo inclui certas entidades cujos dirigentes e associados merecem interrogatório, não reconhecimento público. O ato foi inútil porque, considerando-se o histórico de suas decisões mais recentes, o Supremo tomou gosto pelo comportamento de alto risco. Nesse contexto, pomadas como manifestos de apoio e inquéritos secretos podem aliviar momentaneamente as dores, mas não resolvem o problema.
Bons juízes, como se sabe, não devem aderir cegamente aos clamores da comunidade. Mas também não precisam virar as costas para a sociedade. Generalizou-se no Brasil a percepção de que não há local mais seguro para os corruptos do que o Supremo Tribunal Federal. Juízes de primeira instância aprenderam a prender. Certos ministros da Corte Suprema especializaram-se em soltar.
O Supremo envernizou sua reputação com decisões favoráveis a minorias e grupos sociais vulneráveis. Foi assim com a validação da Lei Maria da Penha, a interrupção da gravidez em casos de fetos anencefálicos, o direito ao aborto no primeiro trimestre da gravidez, o reconhecimento da união homoafetiva e das cotas para negros e deficientes em universidades. Mas nada disso atenua a má repercussão da política de celas abertas patrocinada por ministros como Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski.
Alheio a todos os sinais de alerta, o Supremo adotou comportamento que levou à auto-desmoralização. Os ministros insultam-se diante das câmeras. Um deles julga casos de amigos. Outro decide sobre ex-chefes. E os demais fingem não ver. Há duas turmas na Corte. Uma notabilizou-se por prender. Outra solta a mais não poder. A primeira e a segunda instância condenam larápios. O Supremo os protege. Acaba de transformar a Justiça Eleitoral numa espécie de novo foro privilegiado para políticos em apuros.
De temeridade em temeridade, desceu à lata do lixo todo o prestígio social que o Supremo amealhara no julgamento do mensalão. A corrupção endêmica e reincidente fez do brasileiro um pretenso especialista em Supremo. Mesmo quem não entende de leis percebeu que certos magistrados não são necessariamente magistrados certos.
Foi contra esse pano de fundo que se avolumaram nas redes sociais, no noticiário, nos meios acadêmicos e no Ministério Público as críticas ao Supremo. Solidificou-se a percepção de que a Corte encostou sua reputação na desmoralização que atinge o sistema político e os outros Poderes. A diferença é que os outros agentes públicos foram arrastados para o caldeirão pela Lava Jato. As togas saltaram para dentro do melado por conta própria.
As críticas descambaram para as ameaças nas redes sociais? A integridade dos magistrados está ameaçada? Se a resposta for positiva para esse tipo de pergunta, o remédio é a abertura de inquéritos isentos de segredo, requisitados a quem de direito, seguidos da consequente responsabilização dos transgressores. Fora disso, remendos como manifestos oportunistas, longe de revitalizar, acabam por rebatizar a instância máxima do Poder Judiciário de Suprema Impotência.
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