Fernando Gabeira escreveu na sua última coluna que não tem mais ânimo nem para dar conselhos, nem para atirar pedras. Não só ele. O desânimo é a sensação predominante no país. O Brasil degringolou, derrotado pelo desalento, pela apatia e pelo destino vira-lata que insiste em morder os calcanhares de quem, em algum momento, achou que as coisas estavam bem encaminhadas.
Mas quando? Antes da Copa? Nos meses áureos pré-Olimpíadas? Nos discursos triunfantes de Lula e de Sérgio Cabral?
Ali, naquele Brasil sorridente que decolava na capa da “The Economist”, gestava-se o tempo de hoje. Ali enchiam-se as barragens de rejeitos, ali se fazia de conta que a pobreza tinha acabado, e que ir à escola era o mesmo que aprender. Ali se formaram alguns milhões de jovens que têm diplomas mas não têm nem emprego nem empregabilidade, que votam em mitos e que sentem saudades do que não viveram.
O melhor retrato daquele Brasil confiante é a sua seleção infantilizada, entrando de mãos dadas no estádio de futebol, lágrimas escorrendo pela cara, toda trabalhada na fé, supostamente invencível, apenas para ser massacrada pela realidade da eficiência.
Não gosto nem de pensar que tempos estamos gerando agora.
Houve época em que os ministros da Educação faziam de conta que sabiam o que estavam fazendo; hoje nem isso.
Os franceses, que têm palavras para tudo, têm a definição perfeita para o que sentimos: "malaise". Uma primeira busca no Google revela que "malaise"
é “uma sensação geral de desconforto, doença ou mal-estar cuja causa exata é difícil de identificar”. Mas "malaise" se aplica também ao corpo político, e o Cambridge Dictionary explica melhor o seu significado: “um sentimento geral de se estar doente ou sem energia, ou o sentimento desconfortável de que algo está errado, especialmente com a sociedade, e que nós não podemos mudar a situação”.
Somos um país doente: quem não está cego pela ideologia está abatido com o que vê. Temos muitos motivos para isso, mas um dos principais está na inadequação de Jair Bolsonaro ao cargo que ocupa. Ele não entende que representa, ou deveria representar, todos os brasileiros; não percebe que o país está desmanchando pelas costuras, e que pôr lenha na fogueira não é uma boa política de governo.
Era de se imaginar que, tendo vencido as eleições por ficar ausente dos debates, ele fosse capaz de aprender o valor do silêncio; mas, ao contrário, ele acha que, com a presidência, ganhou carta branca para insultar quem não lhe deu o seu voto nem concorda com a sua visão do mundo.
Ao mesmo tempo, era de se esperar que a vitória nas urnas o apaziguasse e trouxesse à tona o seu lado melhor; mas a questão é que Bolsonaro não tem um lado melhor.
Ele é um homem mau que se orgulha disso.
É exaustivo viver no estado de insegurança que o seu estilo agressivo cria no país, porque o que esse estilo revela é que, em última análise, o presidente não é movido pelo desejo de fazer um Brasil melhor, mas apenas pelo prazer perverso de se vingar, seja das incontáveis categorias e setores que percebe como “inimigos”, seja do simples fiscal do Ibama que o multou por pescar em local proibido.
Um homem com 89 milhões de inimigos é o pior comandante que se pode ter.
Cora Rónai
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