Em paralelo, no STF, outros processos da Lava Jato atingem mais de uma centena de políticos importantes de vários partidos; a votação, no Congresso Nacional, de reformas tão necessárias quanto impopulares, a voracidade parlamentar por mais e mais vantagens e recursos públicos; a crise dos estados, a insegurança nas cidades; o primeiro ano de um governo controverso, os 14 milhões de desempregados.
A pergunta que mais tenho ouvido nos últimos meses é: como sair desse labirinto? Não sei. Arrisco dizer o que “deveria” ser feito — mas, não é —, componho uma narrativa do que seria ideal, mas que também a mim não parece possível: retomar a grandeza da Política, construir nova lideranças, fazer reformas profundas no que tenho chamado de “instrumentos políticos de poder”, transformar o quadro fisiológico, estabelecer limites ao poder, tornar o sistema mais representativo, crível, funcional…
Confesso, porém, não acreditar que algo disto seja possível; não neste momento, pelo menos. Não se afobe não, que nada é mesmo para já. A Grande Política se faz com gente — pessoas capazes e dispostas; abertas a ouvir, pesar, trocar, construir. Se faz com projetos e estratégias, colocando-se no lugar do outro: empatia, comunicação e persuasão. Não há matéria-prima para isto, não por enquanto.
Apaixonado pelo futebol e intrigado pelo problema da “Liderança Política” — sua crise, é evidente já há muito tempo —, há anos, dizia que o país carecia de um Didi. Não, não se trata do mais famoso dos já saudosos e hoje líricos e inofensivos Os Trapalhões; trapalhões (mais perigosos) há às mancheias. Refiro-me ao jogador de futebol, craque do Botafogo e da seleção brasileira, Valdir Pereira, o “príncipe etíope”, como lhe apelidou Nelson Rodrigues.
Didi foi herói do título mundial de 1958 por uma cena ao mesmo tempo viril e singela. Como se sabe, em 1950, o Brasil perdera a Copa do Mundo em casa (foi a primeira, outras vieram) e estava naturalmente traumatizado. Nelson Rodrigues alertava para o complexo de vira-latas que dominava o país, sentimento de inferioridade comum em momentos com aquele — e como este.
Pois em 1958, o Brasil chegou novamente a uma final (contra a Suécia) e aos 4 minutos de jogo levou o primeiro gol. Claro que o moral baixou, a desconfiança, o medo e o desânimo se expandiram. Pois, Didi foi às redes, pegou a bola, colocou-a embaixo do braço; cabeça erguida, caminhou lentamente ao meio-de-campo para recomeçar o jogo. Respirou, deu tempo ao time, reorganizou a equipe. Final: Brasil 5, Suécia 2. Brasil campeão mundial.
Imaginava, há pelo menos 10 anos — várias vezes, escrevi sobre isto — que a política nacional carecia de um Didi: um sujeito capaz de acalmar, organizar; serenamente, comandar o time. Por incompleto e injusto, era um pensamento tolo: ao pegar a bola, Didi tinha a seus pés Gilmar dos Santos Neves, o maior goleiro da história do Brasil; Djalma e “a enciclopédia” Nilton Santos, nas laterais; Belline e Orlando, na zaga; Zito a seu lado, no meio-de-campo; na frente: Garrincha, Vavá. Pelé e Zagalo. Pelé e Garrincha, juntos, nunca perderam um jogo. Didi tinha uma equipe, o Brasil tinha plantel; sozinho, o “príncipe” não faria milagres.
Também na política, o Brasil já teve time — não tem mais, mas já teve. Hoje, o esquadrão dos Cínicos se defronta com a massa do Farisaísmo. Pernas-de-pau passam por craques; não importa se enfiam as mãos na bola, fazem firula, jogam-se na área; agitam as torcidas. Não há fair play e as regras ficaram velhas. Quem não torce nem por um nem pelo outro — quem é saudoso do Futebol-Política maiúsculo do passado — leva garrafada na arquibancada, apanha de ambos os lados.
Na verdade, ninguém mais se interessa por este esporte. Ele pegou má fama, as pessoas vão ao estádio para amaldiçoá-lo. Ferozes, as torcidas se insultam, prometem se pegar nas ruas; com sinalizadores fazem muita fumaça; vândalos prejudicam a partida, retirando a visibilidade do público que assiste pela TV.
O juiz ocupou o campo; mais que os jogadores, é a estrela da partida. A punição é necessária, mas poucos percebem que ela não basta. Não se discute novas regras, não se forma novos jogadores, nem se educa. Os times estão acuados, o cartão vermelho é para sempre. Não há reservas, a banca está em crise. Sem Didi, sem time, sem bola, as galeras torcem pelo juiz — a favor e contra. Esse jogo perdeu a lógica ou foi a lógica que perdeu o jogo? Campeonatos assim terminam mal.
Também na política, o Brasil já teve time — não tem mais, mas já teve. Hoje, o esquadrão dos Cínicos se defronta com a massa do Farisaísmo. Pernas-de-pau passam por craques; não importa se enfiam as mãos na bola, fazem firula, jogam-se na área; agitam as torcidas. Não há fair play e as regras ficaram velhas. Quem não torce nem por um nem pelo outro — quem é saudoso do Futebol-Política maiúsculo do passado — leva garrafada na arquibancada, apanha de ambos os lados.
Na verdade, ninguém mais se interessa por este esporte. Ele pegou má fama, as pessoas vão ao estádio para amaldiçoá-lo. Ferozes, as torcidas se insultam, prometem se pegar nas ruas; com sinalizadores fazem muita fumaça; vândalos prejudicam a partida, retirando a visibilidade do público que assiste pela TV.
O juiz ocupou o campo; mais que os jogadores, é a estrela da partida. A punição é necessária, mas poucos percebem que ela não basta. Não se discute novas regras, não se forma novos jogadores, nem se educa. Os times estão acuados, o cartão vermelho é para sempre. Não há reservas, a banca está em crise. Sem Didi, sem time, sem bola, as galeras torcem pelo juiz — a favor e contra. Esse jogo perdeu a lógica ou foi a lógica que perdeu o jogo? Campeonatos assim terminam mal.
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