Mesmo no período do regime militar, com todas as limitações ao livre exercício da política (não havia pluripartidarismo e os mandatos podiam ser cassados pelo Executivo), vicejou uma oposição aguerrida, centrada no extinto MDB.
E foi essa oposição que acabou por conquistar a sociedade civil, minar a credibilidade do regime militar e, por fim, derrubá-lo, sem enfrentamento. Surgiu então o que se convencionou chamar de Nova República, que, como se veria, não era nem nova, nem muito menos republicana - e sai de cena agora, com a remoção do PT.
Os militares voltaram para a caserna e os políticos, numa expressiva amostragem, para a cadeia. Mas esse não é o ponto. O essencial é entender por que se estabeleceu o vazio oposicionista.
A Lava Jato vem esclarecendo, gradualmente. A roubalheira promovida pelo PT não excluiu a dos adversários. De certa forma, a ocultou, pela desproporção entre ambas. A escala petista extrapolou a convencional, dos milhões. Ultrapassou até a dos bilhões. O TCU examina, presentemente, contratos irregulares do BNDES que somam a singela quantia de R$ 1, 3 trilhão. Nada menos.
Mas o que são R$ 8 bilhões diante de R$ 1,3 trilhão, que, além de atender empresários amigos, como os da Friboi, providenciaram obras de infraestrutura em países bolivarianos e ditaduras africanas? Entre outras, porto e malha aeroportuária em Cuba, metrô em Caracas, porto no Uruguai, estradas na Bolívia etc.
O Brasil, não tendo problemas de infraestrutura, empenhou-se generosamente em resolver os dos vizinhos. Não todos, claro: só os com assento no Foro de São Paulo. A auxiliá-lo, o braço laborioso das empreiteiras patriotas: Odebrecht, OAS, Andrade Gutierrez etc.
A oposição não foi esquecida, como revelou a delação da Odebrecht; ficou com as migalhas do banquete. Mas roubo é roubo. Se alguém rouba um Mercedes-Benz e outro um Fiat Uno, ambos são ladrões e estão inclusos no mesmo artigo do Código Penal.
Pois bem: a oposição optou pelo Fiat Uno, e agora começa a aparecer sua frota de calhambeques, que mostra que pelo menos não ficou a pé. Isso explica a pouca ênfase dos tucanos no curso do impeachment (efetuado por imposição das megamanifestações de rua) e a insistência em sustentar a honestidade da ex-presidente Dilma Roussef, desmentida nas delações da Odebrecht – e confirmada pelos marqueteiros João Santana e Mônica Moura.
A delação dos marqueteiros, tornada pública na quinta-feira, um dia após o depoimento de Lula ao juiz Sérgio Moro, confirma o termo “organização criminosa”, cunhado pelo ministro Celso de Mello, do STF, ao tempo do Mensalão, para definir o PT e seus aliados.
A questão é: quem não era aliado? É claro que há exceções, mas no plano individual. Há, sim, gente honesta no Congresso, mas impotente para se sobrepor aos tentáculos da sofisticada organização criminosa, carinhosamente apelidada de Orcrim.
O que, pois, hoje, está em jogo é a busca desesperada de uma “saída política” que reduza ao mínimo o universo de sentenciados. Anistia-se o pessoal do Fiat Uno (caixa dois e delitos menores), pune-se uma parcela dos ladrões de Mercedes-Benz (admite-se a esta altura o próprio Lula, o Chefe) e poupa-se a organização. A Orcrim.
Há empenho quanto a isso nos três Poderes, o que explica os recentes atritos entre ministros do STF – e destes com procuradores do Ministério Público. O ministro Edson Fachin, relator da Lava Jato na segunda turma do STF, foi voto vencido na soltura de José Dirceu. E, para evitar novo revés, decidiu remeter o pedido de habeas corpus de Antonio Palocci ao plenário da Corte.
Palocci, diante do panorama com que a semana se encerrou – fechamento do Instituto Lula, depoimento desastroso do ex-presidente a Sérgio Moro, delação de Mônica Moura e João Santana e Operação Bullish -, decidiu reativar sua delação premiada.
A Lava Jato sai fortalecida de uma semana que se iniciou na sequência do revés representado pela soltura de José Dirceu. Vem aí o strip-tease do sistema financeiro, diante do qual tudo o que se viu até aqui é apenas aperitivo para o banquete que se descortina.
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