Crescemos e continuamos a ser julgados. Hoje nos observam por mil janelas, algoritmos invisíveis. Sabem o que gostamos ou nos desagrada, o que pensamos e o que desejamos. Os robôs se encarregam até de nos lembrar do que eles acreditam que gostaríamos de comprar. Somos observados por mil olhos espalhados pelo planeta. Logo poderemos ser vistos até mesmo do cosmo. Vistos e julgados.
O menino ou a menina não vê minhas rugas, não repara se eu ando erguido ou encurvado pelo tempo, não lhe importa o que ganho ou o que sonho. Não entende que eu posso me cansar. Sou sempre, para ele, seu super-herói.
Fora deste planeta, os olhares dos outros se tornam juízos. Minha filha Maya, quando era muito pequena e já ia à escola, gostava que as mães levassem para casa suas colegas para brincar. Com meus preconceitos de adulto, tentava indagar o que os pais delas faziam. Minha filha me olhava espantada e me dizia: “Sei lá!” E se eu insistia, ela respondia: “Não me interessa o que os pais delas são. Eu gosto das minhas amigas e pronto”.
Hoje os meios de comunicação publicam, cada vez mais frequentemente, estudos sobre como transformar nossa dura rotina diária em lugares e momentos de simples prazer. Incitam-nos a saborear as “pequenas alegrias”.
Teriam de nos lembrar que existe esse mundo infantil, um paraíso perdido, onde podemos nos espelhar e nos refugiar sem que sejamos julgados, e onde somos sempre acolhidos com o frescor da primeira vez.
O escritor italiano da máfia, Leonardo Sciascia, me disse que não somos inocentes nem quando nascemos. É verdade, mas é verdade que o mundo da infância, com seus espaços de fantasia ainda não contaminados pelo pecado de julgar, nos oferece esse lugar onde podemos nos sentir protegidos do o olho escrutador do Big Brother.
O mundo adulto anda cada vez mais inquieto e cético, incapaz de aceitar que também pode haver momentos de descanso e poesia, de silêncio e aceitação, de perdão e não apenas de raiva e brigas.
Se há algo que faz as crianças sofrerem e se sentirem adultos prematuramente é ver seus pais brigando. Eles nos querem juntos e felizes. Choram, mas não gostam das lágrimas dos adultos. Elas lhes dão medo e insegurança. Obrigam-lhes a crescer fora do tempo, como as guerras empurram os adultos ao envelhecimento. Também as guerras verbais — que abundam nas redes sociais—, que matam, às vezes, mais do que as armas de fogo.
São as crianças que mais e melhor amam a paz. Não devemos lhes dar, por favor, brinquedos de guerra. Melhor os que cultivam suas fantasias e ilusões. Tempo terão de dar de cara com a violência que embrutece a Humanidade.
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