A leitura da sentença é didática. Em 536 tópicos, 109 páginas, o juiz Sérgio Moro resume as investigações da Polícia Federal e do Ministério Público Federal, realizadas com apoio da Suíça, indicando cada um dos documentos comprobatórios da acusação.
Provas fartas, difíceis de serem rebatidas. Desmoronamento de falsos álibis e das teses de nulidade pretendidas pela defesa, a maior parte delas, como Moro faz questão de citar, negada pelo então relator da Lava-Jato no Supremo, ministro Teori Zavascki, morto há pouco mais de dois meses.
A sentença mete medo porque não há acusação sem prova. Nem mesmo apoio na tese de domínio de fato, tão contestada na época do mensalão. Não se embasa em relatos de delatores (embora os use para corroborar os delitos), mas em documentos, extratos, assinaturas.
E como os investigadores e a origem dos delitos são os mesmos, fica claro que também será assim no Supremo para aqueles que gozam de privilégio de foro.
Ainda que já tivessem sido alertados para o requinte que as investigações adquiriram, políticos enrolados com a Lava-Jato aparentemente continuavam sem crer nisso. Especialmente os que passaram ao largo do mensalão, processo restrito à instâncias superiores, sem a montagem de uma equipe especial de primeiro grau para as apurações. Na época, também não se viu colaboração internacional do porte da que se tem hoje.
Tanto é assim que a roubalheira não cessou pós-mensalão. Como as penas mais severas recaíram para os operadores do esquema e não para os políticos, imaginava-se que mesmo diante de um escândalo de maiores proporções valeriam as regras da impunidade e da incapacidade de a investigação produzir provas.
“Nem Eduardo Cardozo, quando era ministro da Justiça da Dilma, acreditava que a Polícia Federal fosse capaz de rastrear isso”, diz um agente federal que participou das investigações da Lava-Jato.
Sem falar uma única palavra sobre o teor das apurações – para as quais defende sigilo absoluto --, ele diz que governo algum, nem Lula, nem Dilma, nem Michel Temer, tem como interferir no trabalho da PF. Nem para o bem nem para o mal. Eles “desconhecem o nível do desenvolvimento dos setores de inteligência da PF”, que começou a interagir com o que há de mais sofisticado em matéria de rastreamento de dinheiro no planeta a partir dos atentados de 11 de setembro de 2001, nos Estados Unidos, um marco para a cooperação das polícias em todo o mundo.
Em cada novo ato do MPF, da PF e de Moro, o apavoramento se agudiza.
Na mesma quinta-feira em que Moro sentenciou Cunha, parlamentares do PT, Zé Geraldo (PA), Wadih Damous (RJ), e do PSB, Danilo Forte (CE), se revezaram em acusações grosseiras ao juiz, convidado especial para um debate na Câmara dos Deputados sobre o novo Código Penal.
Fora a descortesia, a virulência dos ataques revela o despreparo (e o desespero) dos deputados para lidar com a situação posta: Moro vai julgar fatos a partir de provas apresentadas pelo MPF e pela PF.
Não importa quem é o réu. Na quinta-feira foi Eduardo Cunha, o ex-todo-poderoso do PMDB. Em um futuro próximo, o ex-presidente Lula, hoje sem a regalia do foro de função. E, ainda que apeláveis ao Supremo, as decisões de Moro têm sido na maior parte das vezes referendadas pela Corte superior.
E - justiça seja feita - nada disso seria possível sem a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, sem a inteligência. São elas que propiciam que o martelo da Justiça possa pôr fim à impunidade.
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