segunda-feira, 16 de outubro de 2017

Sem esculacho, por favor!

Guarde esta data: 11 de outubro de 2017, véspera do dia de Nossa Senhora Aparecida, a padroeira do Brasil.

Foi quando o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a última palavra em matéria de lei não será mais dele, mas do Congresso no caso de punição de parlamentar acusado por crime comum.

Revoguem-se as disposições em contrário, inclusive o Código de Processo Penal. Publique-se de imediato.


Sessão memorável, concluída depois de 13 horas de discussões com o voto de desempate da ministra Cármen Lúcia, presidente do tribunal. Sim, a que já havia dito que “a população clama por Justiça e é contra a impunidade”.

Ou que a ”ética não é uma escolha, mas a única forma de se viver sem o caos”. Ou ainda que “sem o Poder Judiciário forte, livre e imparcial não teremos uma democracia”.

Cármen, a boa de frases, gaguejou antes de deixar claro de que lado ficaria. Talvez não contasse com a contundência do voto do ministro que a antecedeu, Celso de Mello.

As decisões do STF, segundo ele, “não estão sujeitas a revisão, nem dependem para sua eficácia de ratificação ou ulterior confirmação por qualquer das casas do Congresso, pois não assiste ao Parlamento a condição de instância arbitral de revisões da Corte”.

É fato que o tribunal seguirá aplicando a parlamentares as medidas cautelares previstas no Código de Processo Penal. Mas uma vez que as aplique, caberá ao Congresso confirmá-las ou suspendê-las. Ou às assembleias. Ou às câmaras municipais.

Era o que desejavam os interessados em salvar Aécio Neves (PSDB-MG), e em se salvarem também. Por tibieza, jais sabedoria, o STF rendeu-se às pressões de um Congresso repleto de criminosos.

Diz-se que a submissão foi para evitar o perigo de o país ser engolfado por uma crise institucional, o que ocorreria se o Senado descumprisse a ordem de punir Aécio, afastado do mandato e confinado à noite em casa por embolsar propina.

A ameaça de crise era blefe. Uma semana antes, o Senado indicara por 50 votos contra 21 que não ousaria confrontar o STF.

Como não confrontou quando o senador Delcídio Amaral (PT-MTS) foi preso, acusado de oferecer proteção a um delator para que não delatasse.

Como não confrontou da vez passada em que Aécio foi afastado do mandato e posto em prisão domiciliar.

A Câmara engoliu a seco a interdição judicial do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). Depois cassou-lhe o mandato.

Boa de frases, Cármen também é boa de intenções, embora careça de experiência para lidar com políticos espertos, de influência sobre colegas determinados a fazer prevalecer seus pontos de vista, e de coragem para afirmar-se em momentos difíceis.

Deixou-se impressionar pela reação de gente do tipo Renan Calheiros (PMDB-AL) e Romero Jucá (PMDB-RR). Resultado: perdeu, ministra! E também a democracia.

Essa gente corre o risco de ser derrotada na sessão de amanhã do Senado, destinada a selar a sorte de Aécio. Quer o voto secreto para escapar à execração pública no caso de uma decisão favorável a ele.

Em 2015, foi Aécio que entrou com ação no STF para barrar a adoção do voto secreto na sessão que referendou o afastamento e a prisão de Delcídio. O voto foi aberto.

O STF perdeu a queda de braço com o Congresso, mas nem por isso merece ser esculachado. Se antes o Senado não puniu Aécio como deveria, poderá fazê-lo agora, quando nada para tentar salvar a própria face, e a de uma Justiça que preferiu se pôr de joelhos.

Triste país!

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