domingo, 16 de julho de 2017

Lula e o incêndio eleitoral

É precária a hipótese de que a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo juiz Sérgio Moro a 9 anos e seis meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro o transforma em um “morto político” e, por conseguinte, sem condições de ajudar o PT a resgatar sua força no espectro do poder.

Erram aqueles que apostam nessa visão. Como o Brasil não fez a tão clamada reforma para mudar padrões, a política continuará a ser realizada com velhas receitas, onde entram condimentos como mistificação das massas, cooptação eleitoral à base da pecúnia, regras que amparam a existência de legendas sem doutrina, entre outras mazelas. Sob essa armação, Luiz Inácio continuará a ser um exímio influenciador de corações e mentes.


Lula, portanto, não estará alijado do processo político-partidário-eleitoral como alguns pensam. Há, até, outras razões que contribuem para lapidar seu perfil de protagonista de primeira linha: detém (ainda) forte dose de carisma, sendo o líder mais populista do país; possui alta visibilidade; domina bem a expressão de palanque; é capaz de mobilizar largos contingentes; e o PT, ao contrário de outros partidos, abriga aguerrida militância.

Por todos esses aspectos, a vida política de Lula não se encerra com a condenação do juiz Moro. Tentemos desenvolver pontos dessa abordagem, a começar com o processo de vitimização em que se envolverá.

Como é sabido, antes do julgamento de Lula pelo Tribunal Regional Federal da 4ª. Região (RS, SC e PR), Luiz Inácio correrá o território, a partir do Nordeste, onde detém grande popularidade. (A 2ª Instância costuma apreciar os casos que chegam a ele no prazo médio de um ano).

A estratégia de mobilização centrípeta – das margens para os centros – tem o intuito de expandir o discurso de que as elites, a partir do Poder Judiciário, querem inviabilizar sua candidatura nas eleições de 2018.

O eleitorado das regiões menos desenvolvidas tende a se solidarizar com seus ídolos, principalmente quando estes vestem o manto de perseguidos de poderosos. O discurso separatista do “nós” contra “eles”, tão do gosto do lulopetismo, voltará a regar as searas carentes.

A locomoção de Lula pelo país terá o objetivo de ressuscitar a imagem do PT, combalido pela crise política e alvo de escândalos de corrupção desde o mensalão; voltar a ser o “pai dos pobres”, recolocado no altar das massas; arrumar a militância desordenada e preparar o caminho dos eleitores em direção às urnas.

Se for condenado e tiver a candidatura impedida, por volta de julho/agosto de 2018, suas andanças não perderão eficácia. Terão o condão de ajudar perfis próximos ao lulismo, ao mesmo tempo em que poderá ser o construtor e fiador de candidatura única das oposições.

Torna-se patente a estratégia lulista de mexer no caldeirão político. A condenação expandirá sua visibilidade e, como é previsível, alargará a fogueira com imensas camadas de lenha. O clima político ajudará a expandir as tensões, eis que todos os partidos, incluindo os que exibem a ética como seu símbolo, contabilizam participantes no gigantesco bornal de receptores de recursos de empresas. O nivelamento dos entes partidários praticamente os deixa na fila dos pecadores ante o confessionário dos caixas eleitorais. Ali, não há inocentes.

Ao lado da eventual alavancagem do petismo sob a fala rouca de Lula, é oportuno registrar previsível contraponto a ser formado por ondas de ódio e indignação com origem no centro da sociedade. O ex-presidente é marcado, hoje, com a mais alta taxa de rejeição na esfera de candidaturas a pleitos majoritários: beira 60% em regiões como o Sudeste. Pois bem, a expansão das ondas de contrariedade ao lulismo está à vista.

O efeito desse fenômeno, como temos sempre lembrado, reside na formação de marolas no meio do lago, a serem empurradas para as lonjuras das margens por tubas de ressonância das classes médias. Quer dizer, a rejeição a Lula deverá crescer no meio da pirâmide social, devendo chegar à base, às classes marginalizadas.

A eventual puxada para cima dos índices de Lula nos fundões do país corresponderá aumento de rejeição.

Esses cenários seriam totalmente previsíveis caso não fôssemos visitados pelo Senhor Imponderável, que, vez ou outra, nos visita, fazendo-se acompanhar de fatos inusitados e eventos surpreendentes. Vivenciamos momentos de elevada tensão na esteira do julgamento pela Câmara da admissibilidade da denúncia contra o presidente da República.

O processo tende a se alongar pelos próximos meses. Seja qual for o desfecho, não se descortina clima ameno na arena política, porquanto delações e investigações, sob a égide da Operação Lava Jato, haverão de deixar a fogueira muito acesa.

Resta aduzir que, confirmada a condenação na 2ª instância, Lula deverá ser recolhido. Preso, agitará a militância, não se descartando mobilizações de rua que deixarão a paisagem pré-eleitoral tomada por emoção e conflitos.

Absolvido, será candidato do PT, com possibilidade de se tornar o candidato único das oposições, que se juntariam para enfrentar outras candidaturas, como a de direita, de Jair Bolsonaro, e a de centro (com engajamento de partidos e grupos à esquerda e à direita), e grande possibilidade de ser preenchida com um quadro do PSDB.

Será o maior teste de nossa democracia, eis que estamos no limiar de uma era pronta para acolher o ideario republicano: ética, transparência, sobriedade, verdade, compromisso.

Firmar-se-á a crença de que o Brasil deverá finalizar o trabalho de assepsia nos vãos da política, com a mudança de regras e instalação de novas cores no desenho institucional.

A nova ordem poderia, até, abrigar o parlamentarismo, cujo vértice estaria apoiado em uma estrutura partidária enxuta e com entes capazes de fazer adequada representação do pensamento nacional. Afinal, o presidencialismo de cunho imperial mostra-se esgotado. Seria a hora de o país se guiar por nova bússola.

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