Mais de três dezenas de senadores são alvos de investigação no Supremo. Só Renan Calheiros (PMDB-AL) tem 12 delas nas costas. O ex-líder do PMDB, que ao ver o presidente Michel Temer abatido migrou para a oposição, exemplifica bem os pesos e medidas do STF. Acusado de peculato, virou réu em dezembro do ano passado e não foi suspenso, continua a exercer seu mandato. É o que a lei prevê até ser julgado e ter a sua sentença proferida.
Diante do gigantismo da bandidagem, os bilhões afanados e a cada vez mais sofisticada rede do crime de corrupção, a descrença popular nos políticos é compreensível. Para muitos, a melhor solução é linchar todos, jogar na cadeia os 32 senadores investigados e a outra centena de deputados. Prender o presidente Temer e seus auxiliares. Justiçar em vez de fazer Justiça.
Apedrejar sem investigar remete a práticas da Idade Média, que só perseveram entre uma minoria fundamentalista do Islã. Mas, de certa forma, é o que tem sido feito por aqui. Delação virou prova, vazamentos determinam as sentenças populares, na maior parte das vezes tecida por torcida, ignorância, má-fé ou tudo isso.
Tem-se uma briga de facções, todas arremessando pedras, usando a suspeita ou a investigação de crimes ainda não comprovados para destruir seus oponentes. E o fazem sem medir consequências – todas elas danosas à democracia e ao Estado de Direito.
Para proteger o ex Lula, também enrolado em cinco processos, um deles perto de ser finalizado na primeira instância, os que apedrejam Temer o fazem sob o mesmo argumento que o presidente tem usado contra a Procuradoria-Geral da República (PGR): a perseguição. E os que querem ver Lula na cadeia possivelmente amargarão a frustração de o ex ser condenado por Sérgio Moro, mas continuar em liberdade. Não por bondade do juiz de Curitiba, mas por ser réu primário. É a lei.
Lula fora da cadeia causará tanta indignação e descrença na Justiça quanto a soltura de Aécio ou a possível – e até previsível – decisão da Câmara de Deputados de não autorizar que o processo contra Temer ande.
Se isso ocorrer, vão proliferar as teorias de um grande acordo para livrar todos, algo almejadíssimo, mas quase ficcional.
Um acordão é desejo de 10 em cada 10 investigados. Frequenta jantares de Brasília. Mas amarga a mais doce das sobremesas quando os convivas se confrontam com a imensa impopularidade de uma eventual anistia.
Há ainda os que se consideram senhores da concertação e se arvoram a falar em nome da salvação nacional – que não deixa de ser um acordo, visto que à margem da lei.
Gente do porte do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que recentemente passou a só ver saída com eleições gerais, tese que atraiu apoio de Lula e Renan, e outros tucanos de alta plumagem, que pregam parlamentarismo-já, rejeitado em plebiscito há pouco mais de uma década.
Gente que teria responsabilidade de apregoar a Constituição e que escolhe fazer pouco dela. Gente que deveria saber que é na crise que se revela o valor da Carta. Que mudá-la açodadamente é permitir que ela se mova de acordo com a força do vento – diga-se, de um aventureiro qualquer.
Não deveria existir condenação sem investigação e prova -- ainda que imaterial, já que corruptos não passam recibo. Não deveria existir alternativa fora da lei, muito menos fora da Constituição. Pior: quando a sensação geral é a de que há mais bandidos do que mocinhos, qualquer um acha que pode encarnar o xerife.
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