Nos dias em que deveria desvendar os miúdos e graúdos do poder brasiliense, a Lava Jato foi muito mais notícia pelas críticas que recebeu do que pelos fatos que revelou. Não sem motivo. Os investigadores se esmeraram em atravessar a rua para escorregar em cascas de banana. Fizeram “coletiva em off” para vazar investigação ainda sigilosa, e, ironicamente, pressionaram blogueiro para descobrir a fonte de um outro vazamento.
Na competição pelo interesse do público, a Operação Satélites atingiu astros da política nacional, mas perdeu as manchetes para a reclamação de ministro do Supremo contra vazamentos – que atribuiu à Procuradoria-Geral da República – e sua ameaça de invalidar uma seleção de depoimentos de empreiteiros que entregam os morubixabas de Brasília. Foi meio truco meio xeque, mas deu certo: tirou a picanha do prato dos procuradores.
Na zoeira que mistura a podridão da Carne Fraca com o cimento superfaturado da Lava Jato tudo vira ruído e pouco sobra de significado concreto, além da impressão genérica de corrupção geral. Nessa explosão de fatos e versões, é muito mais fácil ocultar um indivíduo na multidão do que em um porão. Assim, o ministro da Justiça vai escapando de ter chamado de “grande chefe” e defendido quem seus subordinados da Polícia Federal acusam de comandar a corrupção no Ministério da Agricultura.
Se as investigações já competem entre si pelos olhos do público, qual a chance de mais alguém, além dos diretamente interessados, prestar atenção a uma discussão técnica, aborrecida e importante como o debate sobre se o voto para o Legislativo deve ser em lista ou nominal? Quem ainda lembra da acusação de que o ministro-chefe da Casa Civil mandou empreiteiros suspeitos entregarem R$ 1 milhão no escritório do amigo do presidente? Quem ouviu falar da carne fria quando só se fala em Carne Fraca?
Uns já saíram da agenda, outros nem sequer entraram. É natural que seja assim. A atenção humana é limitada, e a capacidade de processamento do cérebro é um milionésimo da quantidade de dados com os quais ele é bombardeado diariamente. Ignorar e selecionar é a única alternativa para não enlouquecer. Mas nem toda seleção é feita pelo indivíduo. Na maior parte, é terceirizada para algoritmos do Facebook, para editores de notícias (cada vez menos) e para suas fontes de informação (cada vez mais).
A briga para determinar a agenda pública acaba sendo, no fim das contas, a única que importa. O atual detentor do título de campeão mundial da modalidade é Donald Trump. Ele desenvolveu uma capacidade imbatível de chamar a atenção e desviá-la sempre que precisa. Faz isso várias vezes ao dia por meio do Twitter, de caras e bocas em “photo ops” ou de bonecos de ventríloquo.
No Brasil, a competição pelo microfone é feroz entre policiais federais, procuradores, juízes de primeira instância e ministros do Supremo. Já os parlamentares, corruptores e governo preferem o silêncio. Estimulam o ruído alheio para embaralhar a comunicação. Ao mesmo tempo, cuidam para que a agenda que lhes é negativa perca evidência, deixe de ser prioridade e caia no esquecimento. Soterrar é muito mais eficiente do que censurar.
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